- Um Mundo de Magia e Segredos*
PoV: Heitor.
Os dias passam lentamente, e cada nova manhã traz uma pequena descoberta. Ainda sou incapaz de falar ou me mover por conta própria, mas estou começando a entender mais sobre este lugar e sobre minha própria família. As vozes, os gestos e os pequenos hábitos de minha mãe e de meu pai revelam fragmentos de suas personalidades e de suas expectativas para mim.
Helen passa a maior parte do tempo ao meu lado, me observando com um carinho silencioso. Às vezes, ela murmura palavras em um tom suave, quase musical, que parecem uma espécie de canção antiga. Embora eu ainda não entenda a língua, sinto que essas palavras têm poder. No instante em que são pronunciadas, uma energia quente me envolve, como se uma força invisível estivesse protegendo minha existência. Aos poucos, compreendo que essa é a **magia da luz** de Helen. Ela parece invocar esse poder de forma natural, quase inconsciente, para me proteger e confortar.
Meu pai, por outro lado, é uma presença que vai e vem. Por vezes, ele surge no quarto trajando vestes de batalha ou túnicas ricas em detalhes dourados. Há sempre uma postura ereta e imponente em seu andar, e, em alguns dias, noto uma marca escura em seu rosto ou em seu braço – resquícios de lutas das quais nunca ouvi falar. Ele parece ter uma vida dupla, dividida entre a figura paternal e um guerreiro poderoso, alguém que carrega nos ombros a responsabilidade de proteger seu território.
Hoje, entretanto, algo é diferente. Logo ao amanhecer, sou carregado por Helen até um salão iluminado e amplo, decorado com cortinas de veludo azul e ouro, grandes candelabros que brilham intensamente, e um tapete bordado que estende-se até o centro da sala. Meu pai está lá, esperando com uma expressão séria e determinada. Ao lado dele, há uma figura que ainda não vi antes: um homem mais velho, com uma barba branca bem cuidada e vestes longas de um tom roxo profundo, adornadas com símbolos que parecem brilhar levemente.
A presença desse homem enche a sala com uma sensação de poder e respeito. Ele se aproxima, me observando com um olhar atento, e trocando um olhar cúmplice com meu pai. "É ele, Lorde Erick?", pergunta o homem, com uma voz grave e pausada.
Erick assente, e vejo o velho mago se aproximar ainda mais, suas mãos se estendendo para mim. Em sua palma há uma pequena pedra, translúcida, com um brilho suave. "Este é o Cristal de Afinação," explica ele, enquanto sua voz ecoa pelo salão. "Ele revelará se o pequeno herdeiro possui uma afinidade mágica latente."
Helen aperta meu corpo um pouco mais contra ela, como se quisesse me proteger, mas deixa que o velho homem aproxime o cristal. Com um toque leve, ele encosta a pedra em minha testa, e no mesmo instante sinto uma onda de calor e uma leveza que parece percorrer cada célula do meu corpo. É como se algo estivesse se movendo dentro de mim, algo que foi despertado.
A pedra começa a brilhar, e um brilho em várias cores – azul, vermelho, branco e negro – irrompe em todas as direções. O brilho cresce, preenchendo a sala inteira, até que finalmente diminui e se apaga, deixando todos em um silêncio atônito. O velho mago ergue a pedra, encarando-a com olhos arregalados, e logo em seguida olha para Erick e Helen com uma expressão de surpresa.
"Isso... é impossível..." ele murmura. "O herdeiro possui afinidade com todos os quatro elementos principais... e também com luz e escuridão."
Helen deixa escapar um suspiro de espanto, enquanto Erick sorri, um sorriso que beira o orgulho e a ambição. "Então o sangue de nossa linhagem ainda guarda grandes segredos," ele murmura para si mesmo. Há uma faísca de algo em seu olhar, como se ele já estivesse planejando o futuro que virá a seguir.
Eu, por outro lado, ainda estou absorvendo o que acabou de acontecer. Sinto como se tivesse despertado de um longo sono, como se algo que esteve adormecido dentro de mim finalmente tivesse sido trazido à tona. Embora eu ainda seja apenas uma criança, há uma estranha sensação de poder dentro de mim, uma certeza de que fui marcado por algo maior.
Os dias que se seguem após essa revelação são diferentes. Helen e Erick passam mais tempo ao meu lado, conversando sobre meu futuro e sobre as possibilidades que meu talento desperta. Eu vejo Erick em sessões longas de treino, com magos e cavaleiros de alta patente que parecem admirá-lo e segui-lo como líderes leais. Em alguns momentos, Helen entra comigo em seu quarto privado, um lugar cheio de livros antigos, com paredes cobertas por tapeçarias que representam figuras mágicas e animais lendários. É ali que ela começa a sussurrar palavras de encantamento, permitindo que eu sinta a vibração da magia pura no ar.
Com o tempo, eu começo a compreender que este é um mundo onde a magia não é apenas uma habilidade, mas um símbolo de status, de poder e, muitas vezes, de perigo. Aqueles que controlam a magia são vistos como líderes, como protetores e, em alguns casos, como ameaças. E sendo filho de um duque e de uma maga poderosa, sinto que um peso recai sobre meus ombros. Parece que há expectativas, responsabilidades que preciso corresponder.
Certa noite, Helen vem até o meu quarto quando todos já estão dormindo. Ela me pega em seus braços e começa a cantar uma canção suave, quase como uma prece. A melodia é doce, mas há uma nota de melancolia em sua voz. Ela acaricia meu rosto com a ponta dos dedos, e por um instante, seus olhos brilham com lágrimas.
"Você será um grande líder, meu querido", ela sussurra. "Mas a grandeza vem com um preço. Eu te protegerei até o fim, mas o mundo lá fora nem sempre será tão gentil quanto sua família."
E com essas palavras, Helen sela uma promessa de amor e sacrifício.