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Cinzas do Norte

Frank_Willian_5184
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Synopsis

Chapter 1 - Capítulo 1: Ecos do Passado

A luz fraca do sol filtrava-se pelas janelas empoeiradas do pequeno apartamento, lançando sombras longas e tristes sobre o chão desgastado. Era um espaço que carregava o peso da solidão, e eu me sentava em um canto, cercado pelo silêncio que parecia gritar. Recordações da minha infância se entrelaçavam como fios de uma tapeçaria emaranhada, entre risos perdidos e pesadelos sufocantes.

Lembro-me da minha mãe, seus abraços calorosos antes de sair para trabalhar. As promessas dela sempre pareciam sinceras, mas rapidamente se transformaram em ecos distantes, perdidas na tragédia da sua morte. Com meu pai ausente, fui deixado sob os cuidados de um homem que se tornara o pesadelo em minha vida: meu tio. Ele era um homem de temperamento explosivo, com olhos frios e mãos pesadas, que não hesitava em liberar sua ira sobre mim. 'Eu não posso acreditar que ele é da família', pensava, enquanto seu olhar me atravessava, como se quisesse me despedaçar.

Os dias eram uma luta constante. Na escola, eu era invisível, um alvo fácil para os colegas que se divertiam às minhas custas. Lembro-me de como eles riam e sussurravam entre si, apontando para mim como se eu fosse um estranho em um mundo que não me aceitava. Mas havia uma luz em meio à escuridão: Sarah, a ex-esposa de meu tio. Ela era meu refúgio, a única que parecia entender minha dor. Suas palavras eram como feixes de sol, aquecendo meu coração em um mundo onde o frio se tornava cada vez mais insuportável.

Nos primeiros anos, Sarah agia como uma irmã mais velha, sempre pronta para me proteger dos gritos e das mãos que ameaçavam me atingir. Era bom ter alguém ao meu lado, alguém que me tratava com gentileza. 'Ela é a única que se importa', pensava, enquanto olhava para ela, aliviado por sua presença. A conexão entre nós cresceu de forma lenta e sutil, como uma flor que desabrocha na primavera, e por um tempo, eu consegui esquecer a dor que me cercava.

No entanto, tudo mudou após aquele dia fatídico. Um acesso de raiva tomou conta de meu tio quando ele decidiu que Sarah merecia uma lição. Os gritos dela cortaram o ar, e algo dentro de mim se rompeu. Naquele momento, um fogo ardente despertou em meu peito. 'Não posso deixar isso acontecer', pensei, a adrenalina subindo. Não pensei; simplesmente reagi. Peguei a faca da cozinha, e em um frenesi de desespero e raiva, ataquei. A lâmina penetrou em sua carne, repetidamente, esfaqueando-o até que o peso de suas mãos se afastasse de minha vida para sempre. O eco de suas últimas palavras se misturou ao meu próprio grito de libertação.

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Senti uma mistura estranha de alívio e horror. Havia libertado a mim mesmo, mas ao mesmo tempo, havia cruzado uma linha irreversível. Fugi para o jardim, ofegante, a adrenalina pulsando em minhas veias. 'Eu não posso acreditar que fiz isso', pensei, a realidade começando a se infiltrar em meu entendimento. A sensação de liberdade era amarga, e mesmo assim, uma parte de mim queria acreditar que tudo ficaria bem.

Sarah ficou ao meu lado após aquele evento, mas a dinâmica entre nós mudou. Eu me tornei mais consciente de sua presença, e uma nova camada de conexão começou a se formar entre nós. Ela se aproximava mais, seus toques se tornaram mais íntimos, e eu sentia meu coração acelerar. 'Isso é errado, não é?', eu me perguntava, mas a resposta parecia irrelevante em comparação com a necessidade de sentir seu calor. Aos poucos, fomos cruzando fronteiras que nunca havíamos imaginado. Aos 14 anos, começamos a compartilhar momentos que iam além da amizade, um relacionamento secreto e complexo que floresceu em meio à dor e à solidão.

Certa noite, enquanto estávamos juntos, envoltos em um silêncio que só nós compreendíamos, ela sussurrou: "Você sabe que isso não é certo, não sabe?" Eu a olhei, lutando com a verdade daquelas palavras. "Mas eu não me importo, Sarah. Eu preciso de você", respondi, sentindo a intensidade do momento nos cercar.

Eu sabia que era errado, e ela também, mas a culpa nunca encontrou seu lugar em nossos corações. Nós éramos apenas duas almas perdidas, buscando conforto na escuridão. O mundo ao nosso redor desmoronava, mas dentro de nós, um tipo de amor crescia, intenso e doloroso, como se estivéssemos tentando encontrar um caminho em meio à tempestade.

Por três anos, nossa ligação se intensificou. Sarah tornou-se meu tudo, a única luz em meio à escuridão que me cercava. Em cada toque dela, em cada sorriso, a dor da minha vida anterior parecia dissipar-se, como névoa ao amanhecer. Com ela, descobri um tipo de amor que não sabia que existia, uma intimidade que preenchia os vazios que minha infância havia deixado. Nos momentos em que nossos corpos se encontravam, eu sentia que, finalmente, poderia ser livre. 'Eu a amo', pensava, um mantra que ecoava em minha mente.

Mas a vida, com seu caprichoso jeito de pregar peças, não me deixaria em paz. Quando a doença finalmente a levou, fui novamente deixado sozinho, mergulhado em uma solidão que nunca soubera como deixar para trás. As últimas semanas de Sarah foram uma tortura, cada dia que passava, ela se tornava um pouco mais frágil, e eu, um pouco mais desesperado. Lembro-me de como a respiração dela se tornava cada vez mais difícil, e cada vez que ela sorriu para mim, uma parte de mim quebrava. 'O que eu vou fazer sem você?', a pergunta martelava em minha mente.

"Eu não sei o que vou fazer sem você", confessei, minha voz um sussurro entre as lágrimas. Ela me olhou com uma força que eu nunca conseguiria entender, mesmo naquele estado vulnerável.

"Você é mais forte do que pensa, Alex. Sempre será", respondeu ela, seu olhar profundo e reconfortante, como se tentasse infundir coragem em mim, mesmo quando sua própria força estava se esvaindo. 'Como posso ser forte sem você?', eu me perguntava, a fragilidade de suas palavras preenchendo o espaço entre nós.

Na noite em que ela se foi, o céu estava estrelado, mas a beleza daquelas estrelas não conseguiu penetrar a escuridão que se instalou em meu coração. Eu a segurava em meus braços, a respiração dela diminuindo, e sentia que parte de mim estava morrendo junto. "Por favor, não me deixe", implorei, embora soubesse, no fundo, que não havia nada que eu pudesse fazer.

Após sua morte, o mundo perdeu o sentido. O apartamento, uma vez cheio de risos e segredos, agora era um túmulo silencioso, ecoando a ausência dela. Eu vagava pelos corredores, como um fantasma em minha própria vida. O cheiro de sua essência ainda pairava no ar, uma lembrança dolorosa que eu não conseguia afastar. 'Eu deveria ter feito mais', pensava, consumido pelo arrependimento.

Naquela noite fatídica, voltei para casa após um dia comum, a mente turva de pensamentos tumultuados e arrependimentos. Enquanto caminhava, uma sensação de desassossego me acompanhava. O cheiro de gás se infiltrava pelo ar, mas eu estava tão perdido em meus próprios fantasmas que não percebi o perigo iminente. Os ecos de minhas lembranças com Sarah ecoavam em minha mente: seus risos, seus sussurros, as promessas não cumpridas. 'O que eu poderia ter feito para salvá-la?' minha mente girava. 'Por que eu não lutei mais?'

O momento seguinte foi um clímax de desespero e destruição. Um estrondo que varreu tudo ao meu redor, apagando minha vida em um instante e me deixando no vazio absoluto. As paredes tremeram e tudo o que conhecia se desfez em uma explosão de luz e ruído. Enquanto eu caía na escuridão, uma única reflexão cortava minha mente como uma lâmina: 'Eu deveria ter sido mais forte, mais corajoso. Se eu tivesse lutado mais por ela… talvez ainda estivesse aqui.'

E assim, Alex encontrou seu fim, mas não sua essência. Eu ansiava por uma nova oportunidade, uma chance de reescrever minha história. Mas, ao mesmo tempo, o peso da dor pela perda de Sarah se transformou em uma âncora que me impedia de seguir em frente. 'Desculpe, Sarah', eu sussurrei enquanto a consciência escorregava de mim. 'Eu falhei com você.'