O toque de Yaam foi rápido e sem nenhuma demonstração de interesse. No entanto, o impacto em Lyria foi devastador. No momento em que seus dedos roçaram o ombro dela, uma onda de imagens e sensações estranhas invadiu sua mente, como se ela fosse puxada para dentro de um redemoinho de memórias que não eram suas.
Lya viu campos de treinamento rigorosos, onde um jovem Yaam era moldado à força, submetido a exercícios exaustivos.
Viu a frieza metódica dos Hyzaam, que exigiam perfeição, e a dor indescritível ao se vincular ao parasita, apagando qualquer traço de emoção ou dúvida que tivesse. A infância dele não era marcada por laços afetivos, apenas por um rígido condicionamento para torná-lo uma arma viva, um guerreiro impecável.
Essas lembranças e sentimentos, enterrados e suprimidos por anos, emergiam através de Lyria como uma avalanche. Quando Yaam afastou a mão, a conexão que havia sido criada foi rompida de forma abrupta. Desorientada, ela olhou para os lados e tentou se localizar na estufa, mas tudo parecia irreal. O corpo sem vida de sua mãe era um borrão distante, ofuscado pelas memórias de Yaam que invadiam sua mente.
Tremendo, não apenas pelo trauma emocional, mas por uma sensação nova e incompreensível que começava a crescer dentro de si, mais uma vez ela paralisou. Algo se movia dentro dela, pequeno, gentil, mas real.
Seus olhos violetas, intensos e ofuscados pelas lágrimas, buscaram os de Yaam.
— O... O que foi isso? – Sua voz vacilou, enquanto uma sensação de calor se espalhava por seu ventre.
Yaam permaneceu impassível, seus olhos sem emoção a analisando, enquanto a voz familiar de Nyxiel sussurrava em sua mente, com uma ironia gelada.
— "Ah, príncipe... O herdeiro Hyzaam, agora misturado com uma mestiça... A ironia é deliciosa, não acha? O que seu querido pai diria disso? O sangue puro dos elfos manchado por aquilo que ele mais despreza."
A resposta de Yaam foi silenciosa, o único movimento perceptível sendo o ligeiro apertar de seus punhos. Os olhos de Lyria ainda estavam fixos nele, aguardando uma explicação, mas Nyxiel continuava, sua voz cheia de um sarcasmo cortante.
— "Se Zahryx descobrir... Será o fim. Não apenas para você, mas para mim também. E claro, para ela, e sua liberdade."
O parasita riu suavemente, e Yaam, mesmo sem qualquer expressão visível, sabia que ele estava certo. Não havia espaço para falhas ou hesitações. Olhou para Lyria novamente, sua postura rígida, distante.
— Você vem comigo. – Sua voz soou fria, sem traço de emoção ou hesitação.
Franzindo a testa, Lya o olhou com incredulidade.
— Ir com você? Nunca. Sei bem o que sua raça faz com os diferentes, elfo. Vocês são monstros. Destruíram muitas vidas, e agora estão aqui para destruir a minha.
As palavras dela não causaram nenhuma reação visível em Yaam. Ele permaneceu imóvel, frio e calculista, com a mesma expressão impenetrável de antes.
— Ouça. Estamos conectados. – Ele disse de forma direta. — Algo aconteceu quando toquei em você, e não pode ser desfeito. Se não vier comigo, morrerá. Os caçadores de recompensas estão atrás de você, e não vão parar.
Lyria o olhou confusa, mas o medo era visível em seus olhos.
— Por que eu deveria confiar em você? Sua raça tem caçado a mim por anos. – Ela sussurrou.
Nyxiel aproveitou o momento de hesitação, falando novamente com um tom de divertimento cruel.
— "Ah... Agora ela também carrega parte de você. Que situação complicada, não acha? Não só isso, consegue sentir? Você gerou algo intrigante com esse simples toque. O herdeiro perfeito, além de ter o dna misturado ao de uma mestiça, será pai, de um pequeno mesticinho. É melhor revelar a gravidade da situação em que ela está. Não existe escolha"
Yaam sabia que não havia tempo para explicações. Ele se aproximou, sua presença imponente e suas palavras cortantes.
— Você não precisa confiar em mim. Mas se quiser sobreviver, vai ter que me acompanhar. – Ele olhou diretamente em seus olhos, sua voz afiada. — Eu sou sua única chance.
O silêncio pairou entre eles por um momento, enquanto Lyria lutava para processar tudo o que havia acontecido. Aquilo só podia ser uma piada de mal gosto, um pesadelo.
Apertando os punhos, ela sentia seu corpo tenso, como se estivesse se preparando para lutar, mas ao mesmo tempo, uma sensação de impotência se espalhava. Tudo ao seu redor estava desmoronando, e agora, a pessoa responsável por isso estava à sua frente, oferecendo uma saída que ela não queria aceitar.
— Sobreviver? – Ela sussurrou, sua voz trêmula, tristeza misturada a raiva. — Você acha que eu quero sobreviver ao custo de me aliar com alguém como você? Prefiro enfrentar os caçadores de recompensas sozinha do que ficar ao lado de um assassino.
Yaam manteve sua expressão imutável, observando Lyria com a mesma frieza de antes. No entanto, suas palavras o cortaram como lâminas.
— Então morra. – Ele disse, sem alterar o tom. — Mas saiba que, se fizer essa escolha, não será apenas a sua vida que estará em jogo. – Seus olhos deslizaram levemente até o ventre dela. — Algo está crescendo dentro de você. Se quiser negar isso, a escolha é sua. Mas não será apenas sua vida que estará perdida.
Lyria sentiu o mundo girar a sua volta, uma mistura de desespero e terror surgindo ameaçando consumi-la.
— O que você está dizendo? – Sussurrou, a voz falhando. — Isso é impossível... Isso não pode ser verdade.
Yaam se aproximou ainda mais, a distância entre eles agora quase inexistente.
— O que aconteceu entre nós foi além do que qualquer um poderia prever. Eu também não queria isso, mas agora estamos conectados. E essa conexão nos prende a algo muito maior. – Ele respirou fundo, sua voz mais controlada. — Esse algo... É uma vida.
Lyria levou as mãos a própria barriga, o toque gentil e hesitante. As lágrimas que ela tentava segurar começaram a cair lentamente.
— Não pode ser verdade. – Ela balançou a cabeça. — Você está mentindo. – Afirmou, os olhos violeta brilhavam em fúria.
— Não estou. – Yaam respondeu com a mesma calma perturbadora. — E sabe que não estou. Se quiser proteger essa vida... Não tem escolha. Vem comigo ou morremos todos.
Os olhos dela se encheram de uma mistura de raiva e dor, e ela soltou uma risada forçada, o som quebrado pela tensão.
— Eu nunca pedi isso! Não pedi nada disso! – Exclamou, a voz finalmente falhando em seu grito.
Yaam permaneceu impassível, como uma rocha no meio da tempestade.
— Eu também não. – Confessou em um tom baixo, quase inaudível, como se aquilo fosse uma admissão que ele não gostava de fazer.
O silêncio pairou entre eles por um momento, o peso da verdade caindo sobre Lyria com força. Ela olhou para o chão, tentando se recompor, mas a se perdeu no vazio. Como tudo aquilo tinha acontecido? Porque?
Erguendo os olhos para ele, ela o encarou.
— Eu vou com você. – Afirmou. A voz baixa, mas cheia de determinação. — Mas isso não significa que confio em você, elfo.
Ele apenas assentiu, e no segundo seguinte se distanciou, a deixando afundada naquela verdade imutável.