Eu o encaro de forma mortal e também sibilando, digo: É sério que é essa a sua maior questão no momento?
Pela frase ser grande, ele mal entende e eu volto a focar nos passos cada vez mais altos de meu pai, decidindo que era hora de fazer algo. Eu saio do quarto, fechando a porta atrás de mim e respondendo ao chamado de meu pai:
_Estou aqui. Do que precisa, meu pai?
Narrador on:
Diz, educadamente.
_Olá, princesa do papai, quanto tempo.
Diz o homem de porte médio, cabelos grisalhos, com olhos cansados e um bigode excêntrico, e a chama para um abraço, ele evidentemente estava exausto e em condições normais, Emi aceitaria com prazer aquele carinho, mas por algum motivo ela se sente envergonhada hoje, talvez pela presença do rapaz estranho no quarto ao lado e o fato dele conseguir ouvir muito bem tudo o que eles estão falando, é por isso que ela se esquiva do toque do pai e volta a perguntar:
_Precisa de algo, pai?
Com um sorriso envergonhado no rosto.
Seu pai faz um bico triste nos lábios e logo em seguida diz:
_Você cresceu tão rápido, já está recusando meus abraços.
Finge ficar triste, mas logo retoma a postura, mostrando que era uma brincadeira e fala:
_Tudo bem, sempre soube que esse dia chegaria.
Logo puxando uma cadeira para se sentar. Emi observa calada aos movimentos do pai, esperando que ele a respondesse o que queria, para que fizesse logo. Ele então abre a maleta do trabalho e pega alguns frascos de perfumes, aparentemente muito caros e Emi logo entende do que se tratava.
_Quero que me ajude a escolher o melhor perfume para minha querida filhinha adolescente, que está crescendo e eu não consigo mais decifrar quais seus gostos.
Ele diz, estendendo os frascos, com um sorriso pretensioso nos lábios, ele só queria se sentir um pouco dentro de cada nova fase da filha.
_Papai, eu disse que não precisava trazer mais perfumes, os do mês passado ainda estão na metade.
Era o que ela dizia, mas em seu rosto havia um sorriso bordado e contente por recebê-los.
_Eu disse, quero que escolha algum desses para a minha filha.
Ele brincava.
_Bom, já que insiste.
Ela disse e então pegou cada um dos frascos, um por um e sentiu de cada fragrância, com sentidos apurados para identificar o melhor, que julgou ser um em vidro vermelho fosco com formato de colmeia.
_Quero este.
Ela diz.
_Muito bem, pois este será dado a minha filha.
Ele pega os perfumes não escolhidos e os guarda de volta na maleta, depois se vira para a filha e pega o que restou, o que faz a garota sorrir, e ele logo o estende de volta.
_Olhe filha, o que o papai comprou para lhe dar, uma jovem muito esperta que me ajudou a escolher.
Ele diz e lhe entrega o presente, ela ri.
_Obrigada, querido pai, gostei muito da fragrância, agradeça a ela por mim.
Ela entra na brincadeira e logo o abraça.
Momentos depois, a empregada chega, com algumas compras em mãos, essa era Ayame, uma jovem de cerca de vinte e poucos anos, que trabalhava para as mesmas pessoas desde muito nova e até então não tinha marido ou filhos, por isso continuava a trabalhar com a família. Ela tira os sapatos na entrada e logo vai começar a preparar o jantar para os patrões.
Na hora do jantar, eram apenas os dois e a empregada na pequena mesa, sendo servidos por ela. Todos ali estavam em silêncio, apenas comendo, principalmente Emi, que estava ansiosa como nunca por guardar um segredo dos dois ali presentes.
Ayame também comia sobre a mesa, por ordem do próprio chefe. A verdade é que, apesar de muito bem sucedido, o pai da garota não gostava de esbanjar seu dinheiro, não gastava muito além do necessário, as vezes apenas para presentear a filha ou para comprar um terno mais apresentável, também não tratava pessoas de classes menores de forma inferior e além disso, depois de tantos anos tendo ela em sua casa, todos os dias, já considerava a jovem como parte da família.
Apesar do silêncio, o clima de maneira alguma era de tenção, não para todos, apenas estavam todos concentrados em suas próprias mentes: o homem pensava em soluções para um problema do trabalho, a mulher estava em uma discussão interna, pensando em qual bolo iria preparar para o próximo aniversário de Emi, que se aproximava e a própria Emi se via perdida em um misto de culpa e ansiedade, pensando no que faria após o jantar.
A mente de Emi, essa sim estava em um clima tenso, a distração foi tanta que nem percebeu quando parou de comer e só voltou a notar o que fazia quando Ayame lhe chamou a atenção:
_A comida está ruim?
Ela pergunta, preocupada e faz a garota se assustar com um toque repentino no ombro.
_O que? Sim... Espera, de maneira alguma.
Emi demora para formular o que lhe foi dito e acaba se atrapalhando com as palavras.
_Eu quero dizer que não, me desculpa, estava apenas um pouco distraída.
Ela diz e volta a comer, deixando a outra ainda mais preocupada, pensando no que a incomodava, mas não perguntou, ao invés disso, foi o pai.
_Diga-nos logo, o que está te afligindo?
Ele pergunta, sem muita enrolação, o pai de Emi sempre foi assim e ela havia se acostumado com esse jeito direto dele de ser, mas, naquele momento, tudo o que ela menos queria era ser direta, no entanto, se sentiu incomodada em mentir para ele e então surgiu mais um dilema em sua cabeça: contar ou não a verdade.
Naquele momento, não se sabe ainda se por sorte ou azar da garota, um estalo alto é escutado em um dos cômodos perto da cozinha, coincidentemente ou não, vinha de um cômodo ao lado do quarto onde Atlas estava e ao perceber isso, Emi imediatamente entrou na frente de seu pai, que já ia em direção ao barulho, sem pensar muito.
_Meu Deus, pai, por que o senhor está com uma faca?!
Continua...