O barulho lá fora estava cada vez mais alto e preocupante. O dragão, que anteriormente parecia ser o mais capaz de enfrentar esse tipo de ameaça, estava agora debilitado e seria de pouca valia contra outro dragão.
"Pessoal, sinto dizer, mas o Troy está muito debilitado," disse Kowalsk, analisando o dragão que parecia estar piorando.
"E por que 'Troy'?" perguntou Gareno.
"Provavelmente por causa do cavalo de Troia da Ilíada de Homero."
"O que essa maluca está falando?" disse Gareno sem entender nada do assunto, enquanto Thilláila sorria para Kowalsk.
"Estou cada vez mais surpresa com você, Kowalsk. Eu não sabia que era um homem culto."
"Existem muitas coisas sobre mim, Thilláila, que você não sabe," respondeu Kowalsk, orgulhoso de si mesmo.
"Muito bem, pessoal, vamos deixar a paquera para depois e vamos entrar em ação," interrompeu Gareno com ciúmes.
"Então, fala, Gareno, qual é o plano?" insistiu Kowalsk, só para ver como seu companheiro se sairia.
"Vamos nos armar da melhor maneira possível e vamos sair daqui com ou sem dragões nos impedindo. Não sei como está lá fora, e talvez eu nem vá me importar, porque o que eu quero é sair daqui. Já faz muitos anos que não vejo o sol, a lua, as estrelas, nada. Só fico trancado nesse laboratório."
"Nossa, Gareno, agora você pegou pesado. E nós, aqui, não significamos nada para você?"
"Velho soldado, o tempo da brincadeira acabou. Prepare-se para fazer o que faz de melhor e vamos sair daqui."
Os dois companheiros olharam um para o outro e, no momento seguinte, apertaram as mãos, cumprimentando-se e batendo no ombro um do outro.
"Estou com você, amigo, e vamos sair daqui sim. E não será um bando de dragões que vai nos impedir."
Sem entender nada, o senhor Kaminski perguntou: "O que eles estão fazendo?"
"Ah, isso aí é coisa de macho do século 21. Não se preocupe, não. O senhor vai ver pouco disso. A população da Terra foi quase extinta, então há poucos machos alfas que ainda se cumprimentam dessa maneira. Achou estranho?"
"Na verdade, eu achei bem bacana. Mas espera aí, você disse que a população da Terra foi quase extinta?" perguntou um preocupado senhor Kaminski.
"Deixe que eu responda sobre isso para o senhor Kaminski," disse Kowalsk, aproximando-se. "Eu havia esquecido que o senhor não sabia disso e nem teria como saber, já que vivia como uma cobaia em um laboratório. Mas é verdade, já faz alguns anos que o mundo não está mais como conhecíamos. Nós, os seres humanos que escapamos com vida, vivemos escondidos em cavernas, grutas, abrigos subterrâneos, qualquer coisa que possa oferecer um pouco de segurança. A tecnologia que existia para nos proteger não foi eficaz, e por causa disso sofremos todas as consequências de uma guerra tola que poderia ter sido evitada."
"Você sabia que a guerra pode trazer algumas benfeitorias?" perguntou Gareno.
"Me admira isso vindo de você. Por acaso as benfeitorias foram essa mistura que fizeram dentro de você?" perguntou Kowalsk, um tanto decepcionado com seu amigo.
"O que foi, velho soldado? Não gosta do que vê agora ou preferia quando eu estava da forma antiga? Quando eu simplesmente parecia um personagem de filme de terror?"
Subitamente, todos os presentes voltaram seus olhares para o rosto de Gareno e perceberam que ele não se parecia mais com Kowalsk, mas sim com o velho Kaminski.
"O que estão olhando? Por acaso nunca me viram antes?" perguntou Gareno, visivelmente perturbado com a atitude de seus amigos.
Quanto mais perturbado ficava, mais deformado seu rosto parecia ficar até voltar à sua forma original antiga.
"Dê uma olhada no seu rosto," disse Kaminski, entregando-lhe um pequeno espelho.
"Que bruxaria é essa, velho? O que você fez comigo? Diga logo!" gritou Gareno, avançando em direção a Kaminski, que permanecia calmo.
"Tenha calma, meu jovem, tudo vai se resolver."
Percebendo que a situação estava saindo de controle, Kowalsk decidiu intervir, colocando-se no lugar de Kaminski e se preparando para os golpes que viriam.
E vieram de fato: o primeiro, o segundo, o terceiro, mas no quarto golpe ele se esquivou, ao mesmo tempo que acertava um golpe certeiro no queixo de Gareno, seguido de uma rasteira que o derrubou estrondosamente no chão.
"Eu acho melhor você se acalmar, Gareno."
Mas a resposta foi um chute que arremessou Kowalsk alguns metros para cima, sendo aparado de maneira fantástica por Kaminski. Foi algo incrível de se ver, principalmente considerando a diferença de peso entre Kaminski e Kowalsk, sem mencionar o tamanho.
Kowalsk devia ter algo em torno de 1,85 a 1,90 metros, enquanto Kaminski nunca ultrapassaria 1,65 metros. A graça e agilidade com que ele aparou a queda de Kowalsk foram surpreendentes, até mesmo para Gareno, que cessou a confusão.
"Parece que você não quer arrumar confusão com o senhor Kaminski, não é, Gareno?"
Infelizmente, a pergunta de Kowalsk só fez Gareno ficar mais irritado.
"Você está supondo que eu tenho medo desse velho?"
"Acredito que a palavra não seja medo, mas respeito, que é bom e eu gosto. Não é mesmo, soldado Kowalsk?"
Por meio segundo, até Kowalsk se sentiu intimidado por aquela pergunta e pelo olhar fixo que parecia penetrar em sua mente, revirando seus segredos mais sombrios.
Troy, o dragão, parecia estar sentindo melhoras em seu corpo, e como aparentemente tinha se afeiçoado a Kowalsk, posicionou-se ao lado dele para intimidar Kaminski com sua presença.
Mas o ato teve efeito contrário: ao perceber que era Kaminski quem estava sendo intimidado por Kowalsk, Troy rapidamente abaixou a cabeça e os olhos, demonstrando total submissão ao velho aparentemente inútil e inofensivo.
No entanto, Gareno achou que tudo era um truque e, sem aviso prévio, avançou novamente em direção a Kaminski, tentando golpeá-lo com força. Mas sua atitude deu muito errado. Apesar de aparentar toda a calma do mundo, Kaminski contra-atacou com movimentos em velocidade elevada. Tudo aconteceu numa fração de segundo, e o que parecia ser apenas um toque fez Gareno voar para trás, a alguns metros de distância, onde permaneceu.