— Vamos para casa, Secilia.
Diz o duque, olhando para a garota e depois virando o rosto para o resto do grupo.
— Rosaria e Olyver, amanhã quero vocês em minha sala, me contem o que aconteceu, tudo o que aconteceu.
O Duque diz de forma dura, olhando um por um, e em seguida se vira seguindo para fora do local. Secilia segue ao lado de seu pai, cabisbaixa, enquanto Helena fica para trás por um instante.
— Obrigado por protegerem ela. Não sei dos detalhes, mas cuidem bem do garoto que encontraram. Um médico da clínica verá ele à noite.
Após dizer isso, com um leve sorriso no rosto, a mulher se vira saindo do local. A família para do lado de fora, próximo à fonte no centro da cidade. O Duque se vira para Secília, olhando de cima.
— Como se sente, Secilia? Se machucou de alguma forma?
O duque pergunta com uma voz mais calma que o normal.
— Não me machuquei, mas Rosaria e… o rapaz, sim.
Secilia omite o nome do garoto antes de seguir a frase.
— Melhor ir para casa descansar. Sua mãe vai te levar, ainda tenho coisas para resolver hoje.
Helena coloca a mão sobre o ombro do marido assim que ele termina a frase.
— Amor, talvez você devesse levar Secilia com você. Acho que precisam de um tempo juntos. Ela já disse que está bem e não consigo ver nenhum ferimento.
O duque olha para sua esposa e suspira. Ele vira o rosto para sua filha.
— Irei me encontrar com algumas pessoas. Você pode vir comigo ou ir para casa descansar com sua mãe, o que prefere?
A garota olha para seu pai e para sua mãe, uma escolha com lado bom e ruim para os dois lados, mas Secilia sempre iria preferir conhecer novas pessoas.
— Irei com o senhor, estou bem, não precisa descansar.
O duque abre um sorriso com a escolha de sua filha.
— Vamos, Secilia, hoje você vai me acompanhar.
O duque começa a andar em direção à mansão. Ao chegar em casa, Helena olha para sua filha e coloca a mão sobre sua cabeça.
— Até mais tarde, querida.
Helena se despede e segue para a biblioteca no segundo andar. Secilia segue para seu quarto, se trocando. Enquanto isso, seu pai espera na sala. Após a garota se arrumar, ambos seguem diretamente para a vinícola.
Ao chegar no local, os funcionários realizam uma reverência de curvatura e retornam ao trabalho, com apenas o assistente seguindo em direção ao Duque.
— Já enviamos as caixas e deixamos as encomendas preparadas na distribuidora. Além disso, alguns dos mercadores já estão chegando à cidade, mas as caravanas só devem começar a chegar amanhã ou pela noite.
O duque segue andando até um dos tanques onde o vinho era produzido.
— Já iniciaram a nova produção?
— Iniciamos a colheita, sem nenhum problema dessa vez. A primeira leva de vinhos já está pronta.
O Duque abre a torneira do tanque sobre um cálice e o move lentamente.
— A estalagem Ildens estava pensando em sediar uma apresentação de pisagem. Por que não cedemos algumas uvas para eles e disponibilizamos uma degustação do vinho modrika e do farvayn?
Secilia diz ao seu pai enquanto ele move o cálice. O duque não olhava para a garota ao ouvir sua recomendação e então prova o vinho.
— Separe uvas suficientes para 4 Lagar. Deve ser suficiente para uma apresentação.
O duque estende a taça para sua filha.
Secilia segura a taça e experimenta levemente o gosto da bebida.
Um vinho de coloração rosa clara com um gosto ácido forte, porém mantendo um sabor doce ao fundo, o que dá uma sensação distinta onde o álcool parecia surgir no começo e sumir logo em seguida, deixando um gosto doce de uva na boca. Este era o vinho Farvayn, feito com uvas de mesmo nome que possuíam a coloração rosa esbranquiçada.
— Vamos.
O duque segue em direção à saída. Secilia deixa o cálice sobre uma bandeja próxima e segue logo atrás de seu pai. A dupla segue andando pela cidade, parando poucas vezes para cumprimentar comerciantes importantes ou alguns poucos mercenários com plaquetas de ouro.
— Os nobres não chegaram ainda. Será se tiveram algum problema no caminho?
Secilia questionava seu pai logo após a conversa com um mercador. O homem olha em direção à distante entrada da cidade onde guardas estão dispostos conferindo os visitantes.
— Nenhum problema grave, apenas um atraso no cronograma, uma rota barrada por pedras. Fomos notificados ontem.
Secilia sorri de relance. Seu pai era preparado. Não é à toa que era um dos poucos duques que mantinha contato direto com a família real.
O duque segue andando por uma rua além da principal, em direção à esquerda da cidade.
O caminho até o local era relativamente longe. A maioria dos nobres usaria uma carruagem para isso, mas o Duque sempre demonstrou certo desgosto pelo exagero, preferindo andar como qualquer pessoa normal. Após esse tempo, os dois chegam à estalagem Ildens, em sua placa se encontra um coração com chamas ao redor.
Ao entrar no local, a dupla é recebida por uma garota vestida com um vestido vermelho e luvas longas.
— Seja bem-vindo, Duque, senhorita.
A garota realiza um cumprimento em curvatura.
— Ele já está esperando na sala de reuniões. Posso ajudá-lo com mais alguma coisa?
O duque olha em volta da estalagem. O local está lotado com diversos comerciantes e mercenários em frente à recepção.
Secilia está um tanto curiosa sobre quem o "ele" se referia, porém não indaga seu pai sobre a situação.
— Avise para Gaurin que a vinícola Lafrey irá patrocinar a pisagem com 4 Lagar.
A garota concorda com a cabeça e indica o caminho para que ela os guie até a sala.
"Achei que iamos apenas avisar do patrocinio, mas faz sentido, ele disse que iriamos ver algumas pessoas"
Secilia pensa olhando para seu pai enquanto seguem a garota em direção a um largo corredor com portas laterais. Ao fim, se encontra apenas uma vermelha com uma águia de ouro na porta.
"Uou, o salão dourado? Será alguém de uma família real ou algum chefe de tribo em Harlas?"
Secilia se pergunta. A recepcionista para no lado esquerdo da porta, abrindo a mesma para a dupla. Era visível uma mesa longa com algumas cadeiras dispostas. O Duque adentra o local mantendo uma expressão severa em seu rosto. Secilia segue logo atrás de seu pai.
Ao adentrar o local, era possível ver mais claramente os detalhes do salão: Paredes vermelhas com quatro vigas dispostas de forma retangular nos cantos da sala em uma tonalidade branca com dourado e uma mesa com entalhes dourados formando uma árvore com diversos ramos.
— A quanto tempo, Andino. Vejo que trouxe sua filha para esta reunião.
Secilia se vira para a ponta esquerda da mesa, percebendo a presença de um homem coruja. Ao olhar de relance, a garota não percebe nada de mais nele, mas ela sente que algo nele é estranho.
"Ele chamou meu pai pelo nome… Quem será ele?"
Secilia se pergunta e o homem olha para a garota com um sorriso no rosto.
— Sinto muito pela demora, diretor Haj'yut (lê-se separando os nomes Haj Yut).
Responde o duque, sentando na cadeira oposta da mesa, mantendo sua expressão serena.
O chamado diretor olha de relance para Secilia e sorri de canto.
— É um prazer, senhorita Secilia. Sou Haj'yut, diretor do Instituto Nalfir.
A garota sorri, fazendo uma reverência, segurando as barras do vestido azul que estava usando. Pela voz, o homem coruja não aparentava ter mais que 40 anos, o que surpreende Secilia, por ele ser o diretor e membro da Torre dos Céus.
A garota senta ao lado direito de seu pai com uma estranha sensação percorrendo seus olhos, a fazendo piscar algumas vezes. Ela sentia como se uma pluma roçasse contra eles.O diretor retoma o olhar para o duque.
…
A reunião teve seu fim próximo do anoitecer, O duque e o diretor apenas discutiram assuntos políticos da relação entre o ducado e o reino mágico.
O trio havia recém-saído da sala e agora se encontra em frente à estalagem.
— Nos vemos no festival. Eu e a Diretora de Karmity decidimos enviar alunos de ambas as instituições. Estou curioso sobre como está o desenvolvimento deles.
Diz o diretor, colocando a mão no queixo e abrindo um sorriso de canto.
— Também estou. Já tem 3 anos que as academias não participam do festival. Quem irá acompanhá-los?
O sorriso se alongou por um instante antes de responder.
— Será uma velha amiga de sua esposa.
Ele olha para Secilia e sorri, retirando de seu bolso uma pulseira de fios laranjas entrelaçados.
— Tome, deve ajudar com o incômodo nos olhos.
A garota pega a pulseira sem entender como ele percebeu, porém seu pai concordou com o presente.
Após a garota colocar a pulseira, o diretor realiza uma reverência simples e se retira do local.
— Vamos retornar para casa, já está bom por hoje.
Disse o duque, se virando em direção à mansão. Secilia observou o diretor seguir em frente, mas ainda havia algo incomodando seus olhos. Porém, agora ela consegue ver algo a mais, como se houvesse uma camada fina transparente ao redor do diretor.
— Ah, será se o doutor foi à Cyclops?
Secilia pergunta ao seu pai, que já estava andando.
— Amanhã, depois que eu conversar com Rosaria e Olyver, eu verei se deixo você ir ver a situação do rapaz.
A voz do Duque saía um tanto séria. Secilia apenas concorda com um "sim" e segue ao lado de seu pai.