Scarlet é uma menina que vê rabiscos em tudo.
Desde criança, ficava apontando para as coisas tentando entender o que eram aquelas marcas.
- Mãe, o que é aquilo.
- Aquilo o quê, minha filha?
Ela apontava para uma placa e a mãe só via o que estava escrito.
- Restaurante Mark.
- Mas e o que é aquilo ali do lado.
A mae olhava e respondia.
- Ali não tem nada, minha filha.
Na escola, ela ficava olhando para as marcas que via nas pessoas e nas coisas.
As garotas do colégio chegou a apelidar de garota da lua. Ela parecia estar sempre avoada sobre as coisas.
- Ih! Olha para aquela menina!
- Para onde que ela está olhando?
- Hahahahahaha!
Viviam dando risada dela. Ela sofria esse tipo de bullying e com o tempo ficou mais fechada e fazia poucas amizades.
Somente uma garota fez amizade com ela. Seu nome era Marisa. Estava sempre curiosa sobre as coisas que ela fazia.
- O que você está olhando?
- Não é nada, não.
- Sempre te vejo olhando para as coisas.
- É difícil de explicar.
- Entendo. Quando puder contar, pode me falar. Eu não vou dar risada e nem contar pros outros.
Era isso que Marisa falava, mas Scarlet sempre tomava cuidado com essas coisas. Não era só o bullying. Era que também não queria ser rotulada de estranha ou de louca por outras pessoas. Quanto mais crescia, maior era a discriminação das outras pessoas.
Ela era rotulada de vários nomes. Escarcéu, Ayluasca, Scarlua e entre outros. Ela ficava mais afastada das demais pessoas. Estava sempre retraída e não se juntava muito com as demais meninas.
Ela tentava entender o que eram aqueles rabiscos. Começou a olhar para as pessoas. Notou que se alguém estava com raiva, apareciam alguns tipos de rabiscos em sua pela e quando estavam tristes outros. Quando estavam felizes outras, quando estava serio eram outras. Quando as pessoas estavam proximas dos objetos, os rabiscos mudavam de acordo com as emoções. E ficavam até outra pessoa com outra emoção mudasse o rabisco do objeto.
- Então era isso o padrão no rabisco nas coisas.
Entendeu como funcionava. Mas não contava para ninguém. Nem contava para Marisa e nem contava para sua mãe.
Sua mãe a via fazendo as coisas e olhando em volta quando era criança. Vivia preocupada sobre o que estaria acontecendo com sua filha.
Achava que poderia ser algum distúrbio.
- O que será que está acontecendo com minha filha?
Rabiscos nas pessoas e nas coisas. Isso tem a ver com as emoçoes deixadas nos locais. As pessoas comuns não veem. Somente ela vê. Era um padrão em tudo. Mas para que servia aquilo e por que só ela que via?
- Não entendo isso. Será que é loucura? Tenho que procurar um psicólogo?
Ela chegou a procurar um psicólogo que viu em um cartaz na escola. Era numa igreja. Mas não sabia como dizer o que ela via.
- Olá, boa tarde!
- Boa tarde!
- Me chamo Pedro. Serei o psicologo que irá lhe atender.
- Me chamo Scarlet.
- Scarlet. Prazer em te conhecer.
Eles apertaram as mãos.
- Em que posso lhe ajudar?
Ela estava tímida.
- Não se preocupe. Nada do que disser sairá saqui da sala. Pode entrar.
Fechou a porta e deitou num divã.
- Me chamo Scarlet, tenho 16 anos e...
- Sim. Continue. Qual o problema?
- Não sei como dizer.
- Não tenha medo. Todos temos problemas e preocupaçoes. Fique tranquila e me diga o que que te está deixando preocupada.
- Eu sofro bullying desse criança no colégio.
- Isso é ruim. Mas qual o motivo desse bullying.
- Eu fico olhando para as coisas em volta de mim. Não presto atenção as vezes na aula.
- Isso pode ser algum tipo de transtorno.
- Transtorno?
- Sim. Pode ser algo relacionado a déficit de atenção.
- Eu não sei se pode ser isso.
- E esse é o motivo do bullying?
- Pensando de maneira geral, sim.
- Maneira geral?
- Sim. Porque tem um motivo para eu ficar olhando para as coisas.
- E o que seria?
- Desde criança eu vejo marcas nas coisas e nas pessoas?
- Marcas?
- Sim. Como se fossem rabiscos.
- E como são essas marcas?
- Depende. Podem ser bolinhas. Riscos sem padrão. Mas todas elas tem razões e motivos para se manterem.
- E o que seria?
- Pelo que vi são de acordo com as emoções das pessoas.
- Emoções?
- Sim.
O psicologo anotava.
- Eu estava pensando que poderia ser pareidolia. Mas pela forma que você descreveu pode ser algo mais extremo.
- Pareidolia?
- Sim. Isso é uma especie de fenômeno de ver coisas diferentes nos objetos. Por exemplo, quando você vê um rosto numa nuvem.
- Entendi. Mas acredito que isso seja uma coisa diferente.
- Sim. Vou ter que pesquisar mais sobre isso.
- O senhor acha que isso possa ser alguma coisa grave.
- Se isso está lhe afetando no bullying, acredito que possamos trabalhar em sua atenção. Mas quanto ao que possa ser essas marcas, ainda terei que pesquisar. Parece algo similar a pareidolia. Mas ainda não tenho como lhe dizer com certeza.
- Entendi, doutor.
- Me chame apenas de Pedro.
- Certo. Pedro.
- Vamos fazer o seguinte. Vou tentar pesquisar sobre isso e na próxima sessão, poderei ver o que da para ajudar nesse ponto. Quanto ao deficit de atenção, vou lhe passar um livro pars ler e fazer alguns exercicios.
- Ok. Pode ser.
- Certo.
Eles saíram de dentro do consultório.
- Lhe vejo no próximo mês.
- Obrigada, doutor Pedro.
- Por nada. Até mais.
Scarlet pegou o livro na biblioteca, mas seu problema nao era déficit de atenção. Ela prestava atenção demais na verdade. Tudo o que acontecia em volta era bem verificado.
- Isso é perda de tempo. Não é esse o problema.
Marcou para a próxima semana o psicologo. Ele ainda não havia conseguido encontrar nada sobre o problema e ficava anotando as informações das coisas que Scarlet estava fazendo. Ela pensava em desistir, mas como a esperança era a última que morre, manteve as sessões para continuar ouvindo o que o psicólogo tinha a dizer. O doutor Pedro era o unico que sabia daquele seu problema.
Um dia, ela viu uma marca no chão.
- Mas o que é isso?
Era uma marca dupla circular com vários ornamentos. Estava alguma coisa escrita em uma linguagem indecifrável.
Era uma rua não movimentada e estava no meio da calçada. Quem foi que pôs aquilo ali?
Ela se aproximou e tentou entender o que era aquilo.
- Parece uma pichação. Mas como eu vou confirmar? Eu vejo essas marcas em tudo e o tempo todo.
Ela pensou que seria incrível se aquilo fosse um portal para outro lugar.
- Se isso me levasse para uma floresta. Algo em meio a um lugar calmo seria incrível.
Após isso, de repente, ela foi transportada para um lugar com a mesma marca no chão, em meio a uma floresta.
- Estou aonde? Como que isso aconteceu?
Sem entender nada, ela se esconde atrás de uma arvore. Ela vê criaturas estranhas.
- Mas o que é aquilo?
Pareciam ser goblins. Criaturas mitológicas que ela já viu em alguns livros de contos quando era criança. Mas aonde estava? Por que teriam aquelas criaturas ali?
- Tenho que voltar por onde vim.
Ela voltou para o local que estavam aquelas mesmas marcas. Pensou em como era o local de onde veio e quando foi ver estava na mesma rua em que havia entrado.
- Como isso aconteceu?
Pegou um papel e desenhou mais ou menos como estavam aquelas marcas dispostas no chão. Enquanto isso, as pessoas passavam pelo local e não percebiam nada de errado.
Voltou para a casa.
- Será que eu consigo desenhar essas mesmas marcas no meu quarto?
Ela começou a desenhar com uma caneta no canto do quarto.
- E agora? Eu vou para lá de novo?
Se ela fosse poderia correr risco de vida. Os goblins eram seres que matavam os homens e estupravam as mulheres. Se fosse lá, poderia ser atacada por um e ela não tinha nada que pudesse usar para se defender.
- Mas se também eu não for, eu nunca vou saber o que era aquele lugar.
Pensou em avisar a sua mãe ou a sua amiga Marisa. Mas era mais provável que elas não acreditassem. Não sabia se elas poderiam ir juntas com ela para aquele lugar. Estava pensando no que elas achariam se fossem pars aquele lugar.
Ela tomou coragem e foi. Ia tentar fazer a mesma coisa do que fez naquela rua.
- Vamos ver no que dá!
Uma luz branca apareceu e a levou novamente para aquele lugar. Um goblin que estava passando a viu.
- Droga!
Começou a correr no meio da floresta enquanto o goblin lhe perseguia.
- O que vou fazer agora?
Ela corria para dentro da floresta. Se perdeu em relação da onde havia vindo.
Havia uma espécie de clareira e uma casa bem adiante. Um homem grande e forte estava cortando lenha proximo da floresta.
- Socorro!
Ele viu ela se aproximando com o goblin bem atrás dela.
- Se abaixe!
Ela se abaixou e o homem pegou o machado e cortou a cabeça do goblin.
- Aah, meu deus!
- Acalme-se!
- Como vou me acalmar se você acabou de o matar?
- Ele era um monstro.
- Sim. Mas...
- Você não é daqui?
- Não.
- Entre! Vou te explicar onde estamos e você vai me explicar o que está fazendo aqui.
O homem guardou o machado e pegou a lenha.
- Vamos! Não virão mais deles enquanto eles me temem aqui na floresta.
Eles entraram. Era uma casa florestal.
- Você mora aqui?
- Sim. Eu moro.
- E de onde vieram aquelas coisas?
- Primeiro você vai me dizer quem você é e de onde veio.
- Me chamo Scarlet. Eu moro em São Paulo.
- Me chamo Bartolomeu. Eu moro nessa floresta há alguns anos. Aqui é próximo a São Paulo.
- Mas como tem goblins nessa floresta.
- Isso é uma longa história. Agora tome um copo de água.
Ela pegou o copo e se sentou. Se acalmou um pouco.
- Você falou que é uma longa história. E o que seria essa história.
- Irei te falar se me explicar como você veio parar aqui.
- Sim. Eu vi uma marca na rua e pensei numa floresta. Quando fui ver, eu vim parar aqui.
- Marcas de teletransporte.
- Marcas de teletransporte?
- Sim. Uma outra longa historia.
- O senhor vai me explicar essas longas histórias.
- Sim. Me mostre aonde está essa marca.
Scarlet apontou mais ou menos a direção. Como ela veio correndo, acabou perdendo o lugar de onde veio. Ela ainda estava com medo e um pouco assustada depois de ver a cabeça do goblin voando com o machado do senhor Bartolomeu. Estava pensando que aquele lenhador no meio da floresta deveria ter uma vida bem solitária naquele lugar isolado.
- Você falou que aqui é perto de São Paulo.
- Sim. Aqui é São Paulo.
- Mas como?
- Tem ainda algumas zonas florestais em São Paulo. E esse é uma delas.
- E sobre a longa história dos goblins.
- Sim. Vou te contar.
Ela havia notado uma coisa. Aquele senhor, Bartolomeu, não tinha marcas. Era a primeira pessoa que viu que não tinha. Os objetos ali também não tinham marcas. Somente aonde ela tocava que ficava com marcas de acordo com os seus sentimento. E naquele momento era medo. As marcas de medo se espalharam na cadeira, na mesa, na porta e no chão daquele lugar. Mas o senhor Bartolomeu parecia ser imune as marcas.
O que eram aquelas marcas? Para que serviriam? E aonde era aquele lugar que estava afinal?
- Tudo começou em outro lugar. Um lugar muito distante daqui. Quando eu ainda era um guerreiro...