O que um estudante de ensino médio mais espera em todo o ano não é o vestibular, mas um feriado. Principalmente se ele cair numa quinta-feira, pois a sexta se torna recesso transformando o final de semana em quatro maravilhosos dias de descanso.
Para os jogadores do time de vôlei de Montreal a quarta-feira fora considerado o melhor dia da semana, principalmente quando Milles Mckenzie os convidou para irem à sua casa celebrarem a vitória do time. Visto que seus pais teriam viajado junto com Sadie para Disney, deixando o rapaz sozinho em casa.
No final das contas o time teria o seu churrasco e piscina liberada como prometido.
Ao invés de seguirem para o treino como de costume, os meninos foram ao mercado comprar carne e bebida logo seguindo pra casa de Milles que os aguardava. Theodore ficara um pouco incomodado de também ter sido convidado imaginando que os outros não se sentiriam à vontade consigo, porém Milles acertara em um ponto crucial.
— Ultimamente o baixinho de merda e o Thunder tem se estranhado muito, então seria bom se você estiver lá pra me ajudar caso dê merda.
Conhecia seu melhor amigo bem o suficiente pra saber que não importaria onde ele estivesse, se alguém comprasse briga consigo ninguém o tiraria dela. Mesmo que Milles tivesse mordido Nicolas, o que fora considerado a grande surpresa da semana, ele provavelmente não saberia apartar uma briga do ômega esquentado.
No entanto deveria imaginar que tipo de pensamentos os meninos do time teriam ao vê-lo na casa de Milles.
Ao entardecer, boa parte do time já havia ido embora restando apenas os dois primeiranistas e dois secundaristas aproveitando a beira da piscina com a música tocada no rádio. Beliscando a carne já fria, Theodore olhava para Nicolas que dormia ao seu lado. Como esperado, ele entrara no modo hibernação e dormia encolhido no puff.
— Aqui Theo. — Milles arremessara uma manta que Theodore pegara prontamente.
A desdobrando, cobrira seu amigo o ajeitando ao seu lado. Invejava a tranquilidade de Nicolas dormir em qualquer lugar e em qualquer situação.
— Ele consegue dormir por quantas horas? — Questionava Sam, um primeiranista colega de Bruno e também levantador reserva do time. — Sempre que termina alguma partida ele dorme.
— Se depender dele, dias. Acordando só pra ir no banheiro e comer.
— Bicho preguiça. Queria ser assim, mas seu passasse do meio dia minha mãe me acorda na chinelada.
— A minha também, por acaso é alguma regra que todas as mães devem seguir pra serem mães? Não é possível.
Theodore rira, espiando o amigo dorminhoco. Bem, não poderia dizer que Nicolas dormia tanto por se esforçar em não deixar o seu cheiro escapar. Apesar de que seu esgotamento é mais mental do que físico, já que ele ficara tão preocupado com Milles no final de semana.
Parecia que seu melhor amigo estava se tornando protagonista de alguma história romântica. Estava feliz por vê-lo bem, era o que importava. De relance o ômega olhara para Milles, ele martelava um prego na tampinha de uma garrafa de sodinha, e bebericava sedento.
Talvez aqueles dois fossem o casal mais improvável de acontecer. Jamais imaginaria que eles ficariam juntos.
Tudo graças a...
— Aqui, Theo.
Virando a cabeça para Gabriel que lhe estendia uma garrafa de refrigerante, o ômega sorrira agradecendo. Um sorriso alegre se abrira naquele rosto, sem disfarçar a felicidade em sentir o seu cheiro quando Gabriel se sentara do outro lado de Nicolas, já que ele se esparramara no puff sem deixar espaço perto de Theodore.
— Ah, eu ficaria mais feliz se a Sadie estivesse aqui. — Murmurava Thunder olhando a garrafinha em mãos — Por que ela teve que ir viajar agora? Nem veio assistir a gente.
— Você me arrepia de tão grudento que é com a minha irmã.
— Posso me esforçar o quanto for, ela nunca me olha.
O olhar de relance que Thunder lançara para Gabriel só não fora percebida pelo próprio alfa, que se concentrava em ajeitar as linguiças assadas no pão francês. Theodore engolira o ciúme junto do refrigerante, sem ousar opinar por ali.
— Aliás... Theo, como se sente vindo aqui de novo?
Theodore erguera os olhos para Boyle sem compreender direito suas palavras. O rapaz não parecia conter malícia em suas palavras, mas fitava o ômega com extrema curiosidade.
Nunca tinha conversado com Boyle e Thunder pacificamente. Por sempre estarem grudados em Milles, era de se pensar que tentar explicar alguma coisa para eles seria perda de tempo. Agora não sentia hostilidade vinda deles, provavelmente por Milles ter parado de incomodá-lo como costumava fazer.
Seria uma boa oportunidade pra mostrá-los de que ele não era uma pessoa ruim.
— Como assim? É a primeira vez que venho na casa do Milles.
— Ué... Mas não foi aqui que o lance do Jake aconteceu?
Um arrepio passara na espinha do ômega. Gabriel fechara o pão e o apertara com força, dessa vez prestando atenção na conversa com interesse. Engolindo em seco, Theodore soltara um riso nervoso negando com a cabeça.
— Não sabe onde seu antigo capitão morava?
— Milles era cuzão e nunca convidou a gente pra vir aqui antes. — Reclamava Boyle.
— A porta da rua é serventia da casa, farei uso dela logo logo. — Cantarolava Milles alcançando um pão de alho e o enfiando na boca.
— Estou muito feliz que você tenha, finalmente, deixado a gente vir aqui riquinho. De qualquer forma eu pensei que morassem todos juntos.
— A casa da família do Jake é na rua de trás. — Comentara Theodore ocasionalmente.
— Ah, saquei. É bonita? Qual é melhor, aqui ou lá?
— Vou te afogar na piscina! — Rosnava Milles de boca cheia.
— Não me diga que quer competir com teu primo até em quesito casa? Só perguntei por curiosidade.
— Como assim até no quesito casa? — Questionava Bruno timidamente para Boyle.
— Ah, você não tava na escola ano passado. Milles seeeempre competiu com Jake no vôlei. Seeeeeempre perdeu.
— E eu seeeeeriamente vou chutar o seu traseiro. Cala a boquinha neném. — Avisava Milles em um sorriso cínico.
— Hm... Então o seu primo era o antigo capitão do time. — Murmurava Gabriel antes de morder o sanduíche, fitando o melhor amigo com frieza.
— Até o marrento ali perde pro Jake. Ele era monstro, então é óbvio que seria capitão.
— Ele era bom? — Sam virou-se para Theodore com os olhos brilhando — O quão bom, querubim?
Theodore havia escolhido ficar quieto naquela conversa, já que não se sentia muito confortável em lembrar-se do ocorrido com Jake. Além disso, conseguia sentir os olhares enciumados de Gabriel de longe, que o deixavam com um frio na barriga. Não queria ter falar no assunto por medo de isso render alguma briga mais tarde.
Ao mesmo tempo queria dizer algo, saber o quão enciumado era Gabriel. Ora essa, eles podiam ter passado o cio juntos só que ainda eram apenas ficantes. Não tinham um relacionamento sério e Gabriel não dera sinais de que gostaria de namorá-lo.
Deveria tentar cutucar a onça com a vara curta?
Não... Bem, poderia pelo menos responder a pergunta honestamente. Seria algo técnico, não?
— Hm... Jake consegue jogar bem em qualquer posição, mas os saques dele eram os mais potentes.
— Sério, teve uma vez que o saque acabou indo na fuça de um moleque. Caiu um dente dele. — Dizia Thunder em súbita empolgação. — Mas o Jake foi mó gente boa, e pediu uma pausa pra acompanhar o moleque na enfermaria.
— Uou, queria ter visto isso.
— Pois é, eu também adoraria ver — Murmurava Gabriel em um sorriso congelado. — O quão bom ele deve ser, não é?
— Você ainda gosta dele, pequeno Theo? Tipo, fiquei sabendo que o lance entre vocês era sério.
A pergunta de Boyle pegara Theodore desprevenido. Talvez não apenas o ômega, mas também Gabriel que imediatamente encarava o loiro em expectativa.
Rindo baixo, Theodore deixava a garrafa de refrigerante sobre seu colo negando com a cabeça.
— Depois daquilo nunca mais falei com ele, pra ser sincero. Mas já é passado, não é? Tô em outra.
Sam e Bruno abriam um largo sorriso e entreolhavam-se sabendo muito bem o que significavam suas palavras.
— Na verdade, eu to curioso sobre uma coisa — De repente falara Thunder, apontando para Theodore com um sorriso malicioso — Aquela história do Orkut... Por acaso é real?
Já imaginava que aquele assunto seria tocado, até achara que viera tarde. Nem precisou olhar para o alfa pra saber sua reação, provavelmente estaria avaliando a situação como costumava fazer quado ficava em silêncio. Apesar do gosto amargo em sua boca, Theodore apenas respondera o mais óbvio.
— Não estou namorando o Gabriel.
— Mas tá afim dele?
— Qual é, Thunder. Tu não cansa desse assunto não? — Reclamava Milles.
— Cara, nada tira da minha cabeça que quem está escrevendo aquela história deve saber de alguma coisa. Tipo, devem ter visto vocês dois juntos ou sei lá.
— Você não parece mais incomodado com isso, hein. — Sarneava Boyle dando uma cotovelada no amigo, que ria baixo.
— Fiquei pensando um pouco e pra ser sincero, eu preferia que vocês dois estivessem juntos. Assim a Sadie olharia pra mim, uma vez. — Dizia Thunder baixando os olhos levemente entristecidos.
Ah, aquele olhar. Theodore conhecia muito bem. O olhar de um garoto que tinha sentimentos fortes por uma pessoa e não era correspondido. O amor poderia ser pintado como o sentimento mais belo do mundo, mas esquecia que tudo seriam flores desde que a pessoa soubesse lidar com a solidão que ela carrega.
Amar uma pessoa de longe era solitário e sofrido.
Theodore sabia muito bem daquilo. Apesar de que agora já não se sentisse daquela forma, graças a Gabriel parecer corresponder seus sentimentos.
Ainda assim, compreenderia muito bem a dor por trás daquele olhar.
Respirando fundo, o ômega sorria docemente fitando a garrafinha vazia em suas mãos. A balançava distraidamente quando dissera em frente a todo o time.
— É, eu to afim do Gabriel. — Apoiando o rosto na palma da mão, e o cotovelo em sua perna cruzada, Theodore olhara diretamente para Gabriel que o fitava surpreso. — Não tem como não cair por essa carinha linda.
Os meninos soltaram risos altos para a declaração de Theodore, que piscara para Gabriel antes de voltar a olhar para a garrafinha em mãos.
— Oh Biel, parece que você é o garanhão da vez, hein.
— Dois ômegas querendo você, que difícil! — Ria Boyle. — Apesar da resposta ser bem óbvia.
— Que seria...?
— Ele já ficou com a Sadie. — Lembrava Boyle depois pegar um pedaço de carne e comer. — E ela sempre fica grudada nele, então já devem estar ficando, não é?
A maldita foto da festa. Sempre voltando pra assombrar o ômega. Deixando a garrafa vazia na mesa pra pegar outra oferecida por Milles, Theodore tentava controlar o súbito ciúme que sentia.
Por que raios eles pensavam que Gabriel estava com Sadie só por causa de uma foto? Foi a única vez em que eles ficaram juntos, depois disso nunca mais. Mesmo assim a escola tomava o boato como verdadeiro.
Gabriel e Sadie juntos? Existia algum casal ainda mais repugnante do que eles? Theodore já imaginava que não.
Em compensação, eles que estavam ficando haviam semanas e até mesmo passado o cio juntos, com direito à história na internet, ninguém levara a sério. Apenas olhavam torto em sua direção e fofocavam o colocando como um ômega sedutor sem vergonha.
Ah.. Estava cansado. Definitivamente estava cansado de se esconder. O mesmo ciclo estava recomeçando, dessa vez mais caótico que outrora. Quando Jake segurara a sua mão e estava prestes a assumir a relação, ele tivera de partir para outra cidade o deixando sozinho lidando com a tempestade.
E agora Theodore tinha o alfa do seu lado.
Não qualquer um.
A sua alma gêmea.
Que seus valores lhe dessem licença poética, mas Theodore entraria pro jogo com unhas e dentes.
— Também fiquei com Gabriel, e daí?