Mesmo sendo outono, o sol brilhava intensamente aumentando a temperatura na cidade vizinha. O ginásio imenso onde as eliminatórias eram feitas já se encontrava cheio de ônibus e vans com os jogadores de diversos times escolares. A grande quantidade de pessoas ali reunidas era animador para os mais jovens, principalmente para os sedentos a vencer.
Sendo o último a descer do ônibus, Milles se espreguiçava antes de reunir-se com os amigos do time que já estavam eufóricos com a partida. Contudo, seus olhos varriam as ruas na procura de uma pessoa específica, encontrando-a usando um boné escuro enquanto conversava com Theodore e uma outra garota baixinha.
Seus olhos castanhos espreitaram por um momento. Desde aquela noite em que Nicolas havia dito assumir a responsabilidade, nenhum dos dois conversaram. Na verdade, mal tiveram um tempo a sós. De maneira alguma estaria com saudades ou algo do tipo, apenas...
Se sentia vazio.
Estranho.
Odiava isso.
— Parece que temos uma torcida hoje — Comentava Gabriel na roda de amigos, olhando curioso para um grupo que seguia Theodore para dentro do ginásio.
— A gente? Não é a o fã clube do Milles não?
Gabriel soltara um riso baixo negando com a cabeça, apontando para os alunos do primeiro ano que carregavam tambores com eles.
— É a turma que o Theodore está representando no concurso.
— Caralho! Por que a gente não pensou nisso, hein Gabriel? — Reclamava Thunder, ainda com alguns hematomas em seu rosto. — Nossa, a gente podia ganhar uns pontos no concurso.
Apesar dos rapazes estarem conversando ávidamente sobre a torcida que receberiam, talvez, pela primeira vez, Milles mal dava ouvidos.
Ainda no lado de fora, observando os passos de um certo ômega, Milles mordia os lábios sentindo o seu ombro direito formigar. A confusão se tornara constante em sua vida desde o momento que cogitara a hipótese de Nicolas ser sua alma gêmea. Aquele com quem dividiria o resto da sua vida, amando unicamente e compartilhando um laço indestrutível. Só de pensar em tamanhas possibilidades futurísticas, Milles se arrepiava por completo em um misto de sentimentos.
Detestava Nicolas desde o primeiro dia em que disputaram o cargo de capitão do time de vôlei. Não suportava o fato dele ser bom no esporte e liderar o time com naturalidade. Era irritante vê-lo ser bom ao ponto de próprio Milles ter de admitir isso se considerando derrotado por Nicolas.
Repudiava a ideia de Nicolas ser bom de briga detendo um charme por isso. Ser mau-humorado e preguiçoso combinavam com ele, e o fogo intenso que tinha dentro de si era excitante. Milles havia descoberto muito sobre seu capitão ao longo daquela semana. E para o seu horror, cada descoberta o fazia se sentir cada vez mais fascinado.
Era simplesmente assustador perceber o rumo que ele tava tomando. Por isso Milles estava desesperado para frear o que quer que fosse. Queria apenas parar e voltar tudo a como era antes de ter sido beijado na quadra de vôlei da escola.
Estava cansado demais de lutar contra.
Já ficara com Nicolas, não deveria ter bastado?
Certo, certo, admitia ter gostado. Gostou do beijo de Nicolas, de sentir o corpo magro dele sob suas mãos. De ver o quão vulnerável Nicolas ficava quando doente ao ponto de sempre querer estar com ele, grudado na sua pele. Havia gostado de tudo aquilo.
Mas já era hora de dar um basta.
Milles estava cansado demais.
— Hoje ele está mais quieto. — Comentava Boyle, também olhando o capitão. — Sei lá, pensei que fosse brigar horrores com a gente.
— Não quero que irritem o capitão hoje. Temos que vencer a partida da manhã pra sermos qualificados para as quartas de tarde. — Rosnava Milles, franzindo a testa — E eu quero vencer.
— Eu acho que sei qual o seu problema. — Dizia Thunder abraçando os ombros de Milles, ganhando um olhar desconfiado — Ultimamente tu não tem dado uns pegas nas meninas. Isso aí é seca.
Milles revirou os olhos soltando um riso abafado.
— Pode apostar que não tenho estado na seca ultimamente.
— Não te vi com nenhuma menina. E além disso, nem saímos mais desde que as eliminatórias rolaram. Tô achando que você anda fraco, isso sim.
— Não viaja Thunder.
— Tá broxa?
O loiro agarrara a nuca de Thunder apertando as pontas dos dedos com força até ouvi-lo resmungar de dor.
— Não sou patético igual você, seu fedelho.
— Ah, ah tá bom! Foi mal. — Livre do aperto, o rapaz acariciava a própria nuca enquanto resmungava — Só estava me perguntando o que tá rolando contigo.
De maneira alguma diria que não tem saído com nenhuma garota porque o capitão o mordera e criara uma ligação com ele. Jamais diria isso. Muito menos que tem ficado com Nicolas às escondidas, como uma disputa pessoal para saber quem se apaixonaria primeiro.
Seria ridicularizado, sabia disso.
— Não tá rolando nada. E por que está falando disso agora? — Perguntara Milles, adentrando no ginásio junto dos amigos. — Por acaso andou aprontando alguma?
— Hehe, não diria bem aprontando. Apenas uma amiga que é de outra escola te viu jogando semana passada e tá afim de ti. Só isso.
Milles fizera uma careta e recebera um cutucão de Thunder.
— Não to afim.
— Você broxou total! Ah que desperdício...
Milles parou de andar e fuzilou o amigo com um olhar afiado. Broxa? Ele? Jamais! Ele era Milles Mckenzie! Um alfa bonito cujo nível de sedução era sempre nas alturas. Nunca ficaria parado. Ultimamente pode até ter diminuído suas festas, mas era em prol de uma vitória suculenta contra a pessoa que mais odiava no mundo. Só isso.
Nada mais.
Ele ainda gostava de garotas.
Elas eram gostosas.
— Você está me chamando de broxa, seu virjão?
— Oooh, palavras machucam, sabia?
Rindo em escárnio, Milles revirou os olhos impaciente. A última coisa que queria ouvir era ser broxa. Sempre dera conta do recado. Sempre fazia um bom desempenho ao ponto das garotas viciarem nele. Era uma arma letal, pelo menos dentro dos seus conformes e achismos.
Aceitar uma ofensa daquelas? Jamais!
— Quem é a garota?
Um sorriso brilhante surgia no rosto de Thunder, que voltava a abraçá-lo falando mais da suposta garota. Parecia que o atleta tinha tudo esquematizado, como se já soubesse a resposta de Milles sobre a sua proposta.
O time todo se reunira em um vestiário com o nome de sua escola. Cada jogador guardara seus pertences nos armários ficando livres apenas até a hora da partida. Chegaram cedo no ginásio, tendo um tempo considerável para se prepararem. Professor Marcos permitiu que os meninos fossem assistir as primeiras partidas, marcando um ponto de encontro uma hora antes da partida deles.
Antes de se dispersarem, Gabriel tocara os ombros de Milles o fitando preocupado.
— Escutei a sua conversa com o Thunder. Tem certeza que é uma boa ideia?
— Por quê?
Gabriel apontara com o queixo para o ombro direito de Milles. O alfa olhara em volta e abraçara o amigo pelo ombro podendo lhe confidenciar.
— Não sou gay como o capitão. Gosto de garotas, então por que não ficar com elas?
— Porque você foi mordido. — Respondia Gabriel fitando o amigo preocupado. — Ouvi dizer que quando há mordida envolvida, ele poderá saber o que está fazendo.
— Ele nem sabe que me mordeu. Não seria o ideal fingir que nada aconteceu? Posso seguir a minha vida.
— Milles, não faça isso.
— Eu preciso saber, Biel. — Dissera o alfa entredentes — Eu tô sentindo isso aqui por que ele me mordeu ou por estar realmente caindo por ele?
Gabriel calou-se com a dor nítida na voz de Milles. Já havia feito a sua parte de fazê-lo repensar em suas atitudes.
Sim, seria o fim da linha se apaixonar por Nicolas. Aquele maldito baixinho não poderia entregar absolutamente nada que Milles precisava. Não era uma garota. Não fazia a menor ideia se ele lhe renderia prazer na cama. Não haveria companheirismo, e muito menos romantismos. Os dois brigariam o tempo todo.
Seria um relacionamento cansativo.
Milles não queria aquilo.
Queria fugir de Nicolas.
O mais depressa o possível.
Dando tapinhas no ombro de seu melhor amigo, o alfa loiro afastou-se voltando a conversar com Thunder e confirmar o ponto de encontro com a suposta garota. Conhecia o ginásio bem o suficiente para saber o local ideal para ficar com alguém sem ser interrompido.
Passando pelo capitão enquanto seguia o seu caminho para o encontro secreto, Milles tentara não transparecer o pequeno nervosismo que sentia. O coração batia acelerado quando sentira o cheiro de Nicolas, tendo seus ombros poucos centímetros de serem encostados.
Acabaria com aquilo de uma vez por todas.
Seria agora que Milles apertaria o botão do foda-se, e excluiria Nicolas de sua vida.