Horas foram se passando e a noite começou a cair. O festival, que já se encontrava com um alto número de pessoas, ficou completamente cheio. A diversidade de pessoas apenas aumentava, todos os convidados se encontravam ali. Elas seguiam para o mesmo destino, o centro do festival. Obviamente a abertura oficial do grande festival seria o foco.
Se tem uma coisa que todos sabem é que tentar ir pelo fluxo oposto é a pior coisa que se pode fazer, nesse momento era o que Rory estava tentando fazer. Na realidade ela estava conseguindo. Algumas pessoas davam passagem. Enquanto as outras a Princesa empurrava para o lado.
Fora do grande conglomerado de pessoas estava mais tranquilo, ela podia andar sem esbarrar em 5 pessoas toda hora. Seu caminho ia na direção de onde tinha encontrado Hui pela primeira vez, do jeito que conhecia o pirata ele tinha preguiça demais para mudar de lugar. Ainda mais com o número de convidados aumentando a cada segundo.
O homem peixe se encontrava no mesmo lugar, mas estava acompanhado por uma mulher alta. Uma mulher muito bem conhecida e temida.
"Eu estava me perguntando quando a mulher mais temida dos mares iria dar as caras, era óbvio que ele não viria sem sua autorização." A Princesa se aproximou dos dois, ela podia ouvir a ruiva rindo baixo.
"Hui me contou que queria informações sobre isso." A voz da mulher era aveludada e tranquila. Ela apoiou o cotovelo em uma caixa e levantou a mão, dois de seus dedos seguravam o panfleto que Rory tinha entregado a Hui. "Eu não pretendia me meter, mas lembrei que aconteceu um pequeno acidente na sua chegada. Então achei melhor checar."
"Foi apenas um conselho, as pessoas de Kiori não sabem apreciar mais uma gentileza." Ela revirou os olhos e os braços se cruzaram na frente de seu corpo. "E um não tem relação com o outro."
"Seu temperamento só piora com o tempo." A Capitã olhou para o papel e soltou um longo suspiro antes de começar a falar. "É uma festa clandestina e uma boate dos subúrbios, o dono participa de propagandas contra o Conselho. Bom, todos do subúrbio são contra o Conselho. Após o seu doce conselho, se eles verem você nessa boate vão te acusar de conspiração."
"A polícia local recomenda ficar longe daquela região, eles não têm controle do que acontece ali. Pelo o que eu soube fica para a região norte, mas ninguém sabe dizer exatamente como chegar lá." Hui se afastou da sua Capitã e ficou apenas alguns passos de distância da Princesa. Ele não queria que a conversa seguisse o rumo da Capitã. "Se for lá leve alguns guardas, ninguém sabe o que tem lá. As pessoas do subúrbio não vêm para a cidade e as pessoas da cidade não vão para lá."
A princesa pegou o papel da mão da capitã e ficou alguns segundos encarando o anúncio.
"A abertura oficial do Festival está prestes a começar, eu vou atrás desse Quatro Mortes. Capitã Kaleena não gaste sua energia com assuntos sem importância." Ela acenou para os dois, não queria ninguém para a acompanhar e sabia que se demorasse mais os dois iriam junto.
A princesa de Telfy era orgulhosa, entre pessoas e criaturas normais não existia uma que pudesse ser uma ameaça real. A polícia local apenas mostrava incompetência, o conselho gastava tanta energia invadindo terras que não conseguia nem cuidar da própria nação.
"Patéticos, tão inúteis quanto as minhas irmãs."
Fora do grande festival, as ruas estavam bem movimentadas e iluminadas, a maioria das pessoas aparentava estar indo para o festival. Ela não ficou muito tempo prestando atenção naquelas pessoas, seu foco logo voltou para o caminho que fazia. Iria seguir para o Norte da cidade até achar algo que parecesse um subúrbio ou procuraria alguém para pedir informação.
Por alguns segundos a dúvida passou por sua mente, uma cidade onde ela não conhecia nada e estava indo para um lugar onde nem as pessoas dali conheciam. Ela pensou nas discussões com suas irmãs e na primeira vez que os trabalhadores de Kiori invadiram suas terras. A ponta de seus dedos ficaram frias e o ferro do bracelete começou a esquentar.
"Com licença você..."
As pupilas de Rory se encolheram e os olhos arregalaram, o bracelete se transformou em uma adaga pequena e a lâmina foi feita de gelo. A adaga foi apontada para o pescoço da pessoa que se aproximava dela. Uma intenção assassina dominava o olhar da princesa.
O homem não parecia saber o que falar, seu corpo congelou e a mente ficou em um completo branco. Ele levantou as duas mãos como se tentasse mostrar que não era uma ameaça.
"Eu queria apenas... avisar que o festival é para o outro lado." Rory afastou um pouco a adaga percebendo a voz trêmula. "Você parece ser uma turista... o norte da cidade não é recomendado." Os punhos dele se fecharam e ele deu alguns passos para trás.
Rory encarou ele por alguns segundos, ela mexeu levemente a adaga, mas ainda não abaixou ela. Ele não aparentava ter muita força, seu corpo era bem magro. As roupas eram simples, o cabelo na altura do ombro se encontrava bagunçado, parecia que estava voltando do trabalho. Além da pele completamente pálida, a Princesa se perguntava se ele estava realmente bem.
Pelas palavras ele aparentava saber que para aquela região ficavam os subúrbios, Rory sorriu de lado. Perguntar para qualquer guia ou guarda da região não era uma boa ideia. Como Kaleena havia dito, ela ameaçou um dos Conselheiros logo que chegou. Rory deu alguns passos para frente e disse com a voz calma.
"Não tenho interesse no festival, me leve até os subúrbios." A mulher tirou o sorriso dos lábios. "Se está realmente interessado em ajudar uma turista, me leve até os subúrbios." Estava claro que ela não aceitaria um não como resposta.
O homem ficou alguns segundos em choque, provavelmente era a primeira vez que ele via uma situação como aquela. Suas boca abriu e fechou pensando exatamente no que falaria a seguir. A adaga ainda se encontrava na mão da mulher, então ele tinha medo de contrariar ela e acabar sendo manchete de jornal no dia seguinte.
"Os subúrbios não são um bom lugar nesse horário." A voz ainda se encontrava um pouco trêmula.
"Eu não me importo, me leve até lá." Ela fechou os olhos e soltou um suspiro longo, levantou a cabeça e mordeu o seu lábio inferior com força. "Olha você me leva até os subúrbios e todo mundo fica feliz, apenas me deixe em um lugar próximo." Embora ela não deixasse brechas para um não, sua voz se tornava mais amigável. Tornando a ordem, mais como um doce conselho.
A personalidade irritante de Rory se tornava mais maleável quando estava em momentos onde ela não precisava ser A Princesa Rory. Não que ela se tornasse legal, a própria princesa não se considerava uma pessoa legal, apenas se tornava mais suportável.
Ela viu o olhar hesitante do homem e abaixou a mão se afastando. Era uma forma de mostrar que ela não iria machucá-lo, afinal Rory não pediria desculpas.
"Certo." A voz do homem pareceu mais firme.
Ele parecia mais confiante sem algo afiado contra sua garganta, seus olhos procuraram a adaga na mão da mulher, mas ele não encontrou nada. Seus olhos se arregalaram, ela tinha acabado de abaixar a arma. Tudo que ele podia ver era um bracelete de prata, mas a adaga parecia ter sumido completamente.
"As entradas principais estão fechadas pela guarda, você vai ter que entrar pelas entradas secundárias. Ninguém está permitido entrar ou sair de lá."
Nenhum dos dois falava algo, Rory era acostumada a fazer suas viagens em silêncio. Na realidade as viagens eram bem movimentadas, mas o assunto nunca era com ela, então aprendeu a se manter em silêncio. Com o passar do tempo virou um costume, ela quase nunca fala enquanto estava andando ou dentro de algum veículo.
E o homem, bom ele estava com medo de falar algo que pudesse ser visto de forma ruim. Só por conversar com aquela mulher ele já tinha tido uma adaga em seu pescoço e estava sendo um guia para os subúrbios. Essa não era a caminhada tranquila para casa que ele tinha planejado.
Quanto mais eles andavam a iluminação ficava cada vez menos presente e as ruas mais estreitas. Rory mantinha os olhos atentos em cada rua que viravam, ouvindo cada movimento próximo. Confiar em um estranho não era algo que ela faria.
"Aqueles muros dividem os subúrbios da cidade. Existem alguns buracos com escadas para lá." Ele parou de andar e apontou para o enorme muro a alguns metros de distância.
"Você pode ir." Ela não precisava dele ali dentro, afinal ele não aparentava ser uma pessoa que conhecia lá dentro. Na realidade Rory achava que ele iria desmaiar a qualquer momento.
Ela não olhou para trás e apenas seguiu seu caminho. Olhando para os lados ela encontrou algumas pessoas entrando e saindo dos muros, ela se aproximou devagar. Sua guarda permanecia alta durante todo o caminho.
O buraco no muro não era muito grande, duas pessoas poderiam passar ao mesmo tempo e as escadas pareciam ser bem pouco confiáveis.