Assim que foi encontrado nas mãos do gigante, Walden foi arrastado para cabana e amarrado numa coluna da cabana central, onde o senhor Volkan, os capitães, o general Nefin e o conselheiro do rei dormiam. Acordou com a água sendo despejada em sua cabeça, e então vieram os socos e pontapés. Nefin começou, mas Walden se manteve calado o tempo todo. Depois de tantos socos, sentiu que não conseguiria falar nem mesmo se quisesse. Seu rosto estava inchado, o olho esquerdo já não abria mais, seu bigode loiro estava empapado de sangue que jorrava de seu nariz. Estava quase dormindo, o general já se preparava para lhe dar mais um soco para mantê-lo acordado, quando o capitão Lendall e o conselheiro Yorg entraram pela porta.
– Não há mais o que discutir, capitão. – A voz esganiçada do conselheiro deixava Walden irritado. – Já tomei minha decisão e estou retornando a Rosa d'Oeste apenas para informar o rei e pedir sua permissão.
– O senhor não pode fazer isso – disse Lendall, acompanhando Yorg até sua cama, onde fazia as malas. – Fez uma viagem de três dias, passou uma única noite conosco e já está de partida? O rei Ruzgar vai desconfiar do seu trabalho.
– O rei Ruzgar me deu uma tarefa, garoto. – Yorg parou o que estava fazendo e lançava um olhar severo ao capitão. – O tempo que levo para concluí-la não afeta a qualidade do meu trabalho. Diferente de vocês, vagabundos, eu trabalho rápido.
– Eu garanto que se o senhor ficar aqui por mais alguns dias entenderá que o que aconteceu foi um infortúnio. Um infortúnio que logo será corrigido e não se repetirá.
– Não preciso ficar mais tempo para ver o que eu sempre soube, capitão. Vi homens incompetentes, gananciosos e traidores.
– Não podemos jogar todo o investimento do rei fora desse jeito, senhor. Está se deixando levar pelas palavras de Volkan. Ele pode mesmo ser uma dessas coisas que o senhor disse, podemos afastá-lo do trabalho, mas não podemos encerrar toda essa operação por causa disso.
O conselheiro não respondeu, concentrado em suas malas que já estavam praticamente prontas, já que não teve tempo para desarrumá-las. Lendall lambeu os lábios e ajeitou o cabelo, pensando em suas próximas palavras.
– Walden é o verdadeiro problema aqui. Ele é quem está envenenando este poço de águas cristalinas.
– Cristalinas? Ha! – Yorg se divertiu com a palavra escolhida pelo capitão.
– Tudo bem. Admito que não estamos na melhor e que Walden não é o único problema. Volkan tem atrapalhado o serviço. Não queria dar um machado ao gigante de jeito nenhum e o trabalho só começou a acelerar quando consegui convencê-lo. O senhor mesmo viu como a fera trabalha bem. É burro, mas sabe trabalhar. E garanto que se me der controle sobre a operação e matarmos Walden, tudo correrá bem e depressa.
Yorg fechou sua mala, pronto para partir, virou-se para o capitão, perfurando-o com o olhar.
– O que eu vi, foi um rato ganancioso em vestes de capitão preparado para passar por cima de qualquer um para obter poder. Um rato desesperado para que o rei aceite que sua fera de estimação não é uma ameaça iminente ao reino. – Lendall tinha um olhar invocado, mas o conselheiro não parecia se intimidar. – Já temos problemas com criaturas demais, capitão. Tivemos que construir uma muralha às pressas por que o senhor não foi capaz de matar todos os gigantes que viviam aqui. Por que tu és tão covarde quanto um rato.
O conselheiro desviou do capitão e seguiu até a porta. Lendall estava furioso, mesmo de longe e com o um olho ruim, Walden podia ver que ele estava mais furioso do que nunca com as palavras do conselheiro. O capitão passou a mão pelos cabelos nervosamente.
– E pare de ajeitar esse cabelo o tempo todo – Yorg falou antes de abrir a porta. – Assim como sua índole, sua beleza também é como a de um rato.
O conselheiro se retirou. Walden, estava fraco, mas não conseguiu conter um riso ao ouvir aquilo. Lendall o ouviu, parou de arrumar o cabelo, andou até o prisioneiro com passos fortes e desferiu um chute em seu queixo. Walden ficou acordado apenas tempo suficiente para ver o capitão deixar a cabana.
Lendall caminhou com passos fortes pelo acampamento.
– Tragam pedras! – ordenou a seus homens.
Ninguém o questionou, seu olhar flamejante não admitiria perguntas. Os soldados se moveram rápido e logo estavam de volta. Sacos que outrora vinham de Rosa d'Oeste cheios de comida, agora estavam cheios de pedras de diversos tamanhos. Lendall tomou um dos sacos para si e marchou em silêncio, seus homens não precisavam de palavras para entendê-lo, apenas obedeceram seu olhar raivoso.
Não houve troca de palavras. O mestre Lendall não queria ouvir o que Ingall tinha para dizer e também não queria falar muito. O capitão saudou o gigante com uma pedrada na cabeça. O gigante olhou para cima para tentar conversar com seu mestre, mas outra pedra o forçou a abaixar a cabeça e cobri-la com as mãos acorrentadas. Lendall lançou outra, outra e mais outra.
Os soldados se juntaram ao apedrejamento. As pedras não eram grandes, mas machucavam, caindo com força sobre seu corpo como uma tempestade. Uma pedra grande e pesada caiu sobre seu pescoço e quase o fez gritar, porém Ingall engoliu o grito, sabendo que isso só incitaria os soldados sádicos.
Lendall disparava uma pedra atrás da outra, incessante. A fúria do capitão ainda não tinha esvaído quando esvaziou o saco. Tirou o chicote da cintura e atacou as costas do gigante. Lendall estava cego pelo ódio, alguns soldados pararam de atirar pedras e se afastaram, temendo que o chicote descontrolado os atingisse. As roupas do gigante rasgaram com o ataque, expondo sua pele grossa. Ninguém parou o capitão, nem tinham coragem para tal. Seu cabelo, sempre tão arrumado, caía sobre seu rosto encharcado de suor. Seus dentes estavam expostos como os de um animal feroz sobre sua presa.
O gigante não se mexia. Sua roupa estava rasgada e ensanguentada. Suas costas ardiam e latejavam.
Súbito, o capitão parou. Olhou para os homens que o acompanhavam, todos petrificados com pavor no olhar.
– É isso que acontece quando não se comporta – disse Lendall, meio para o gigante, meio para os homens.