[Data ???] - [Horário ???]
[Localização ???]
[3° P. POV]
Em um grande pavilhão enegrecido, iluminado por largas piras fumegantes, cuja tamanha fumaça escura produzida ocultava o altíssimo teto, uma mulher com trajes sombrios caminhava altivamente, enquanto seus passos ecoavam quase sem fim, devido os luxuosos calçados de obsidiana. Ao longo do piso tão polido, a ponto de se assemelhar a um espelho, diversas estátuas pretas, perfeitamente esculpidas na forma dos grandes felinos americanos repousando em suas patas traseiras, arranjavam-se como ferozes e imponentes guardiões vigilantes do lugar. Uma pessoa desatenta poderia associar as figuras a verdadeiros jaguares negros.
Se o capuz, semelhante à cabeça das onças, fosse removido, um rosto feminino seria revelado. Este, porém, já não era mais tão belo. Afinal, perdera seu brilho, após ser maculado pelo ódio, o ressentimento e o rancor.
Ela continuou a avançar, até se aproximar de uma espessa cortina de fumaça. Para pessoas normais, essa névoa seria tão densa a ponto de ser possível tocá-la e impossível de se transpassar. Mas a mulher simplesmente a atravessou, sem qualquer resistência.
Plaff...
Do outro lado, ela se encontrava, não muito longe, de frente a um suntuoso e elaborado trono pretíssimo, parcialmente coberto pelo escarlate sangue dos sacrificados. E neste trono sentava-se um homem musculoso e atraente, de cabelos e olhos tão negros quanto o próprio trono, enquanto sua pele pálida produzia um forte contraste. Seu pé direito parecia ser feito de obsidiana. Faixas amarelas e negras atravessavam seu rosto. Trajava roupas astecas surpreendentemente deslumbrantes. Seria um ser atraente, não fosse sua aura maligna de deus das catástrofes e destruição. O brilho malicioso de seus olhos combinava perfeitamente com o fluido carmesim.
O deus estava sobre uma curta, porém alta, escadaria. E dessa sinistra escadaria, escorria o mesmo sangue das vítimas dos infames sacrifícios exigidos por ele. Todo o líquido vermelho empoçava-se, porém não transbordava. Aliás, o fluxo poderia ser considerado interminável. Não porque era um circuito fechado, mas porque a matança é eterna.
O som veio do momento que a moça pisou no sangue. Mas sequer se importou. Aquilo não era nada que valesse sua atenção. Curvou-se à figura sentada.
Mulher: "Meu senhor, tudo está pronto."
Deus: "*impaciente* Sim, eu já sei! Mas de nada adianta se não soubermos onde está meu irmão... *sorrindo maliciosamente* Hahaha... Eu deveria dizer 'nossos irmãos'!"
A estrondosa risada retumbou pela sala. A mulher foi drasticamente afetada, quase desmaiando no lugar.
Deus: "*sério e em tom reprovador* Você precisa se fortalecer, garota. Se a minha voz já te abala, desista do seu desejo de vingança! Ainda mais agora que ela ganhou novos poderes."
Mulher: "*ainda pálida* S-sim senhor, farei de tudo para ficar mais forte."
Deus: "*sério* É bom mesmo. Não me desaponte, garota. Agora vá. O outro gêmeo já deve estar partindo, e eu preciso segui-lo."
Mulher: "Meu senhor, perdoe-me mas, esta serva indigna poderia acompanhá-lo?"
Logo após, a moça engoliu em seco. Suor frio, calafrios e arrepios. Tudo causado pela presença dele, que enfureceu-se com as ingênuas palavras da tola. Ele lentamente se ergueu do trono, que quase ruiu graças a pura pressão divina do ser. Cada passo abalava a sala, todo o sangue ao seu redor evaporava instantâneamente, só restando o pungente cheiro de fumaça. Mas não qualquer fumaça. Era aquela gerada pelos fogos da guerra, do conflito, das catástrofes e da destruição. Era a fumaça das chamas malignas.
E lentamente, ele se aproximou e a olhou de cima a baixo, observando sua pobre alma. Ela já poderia sentir a foice da Morte roçando sua ressecada garganta.
Deus: "*irritadíssimo, com um tom ameaçador* Garota, você não me ouviu? Você é fraca! Então desista. Não... Eu deveria incinerá-la agora!"
Ela percebeu. Aquele seria seu fim. Queimada pelas chamas daquele que a salvou uma vez. Aconteceu o clássico "Sua vida passou diante de seus olhos como um filme". E a mulher não gostou nem um pouco do que viu. Relembrou sua infância, sua separação, sua ascenção, sua queda e seu amaldiçoado reerguer.
Subitamente, suas forças voltaram. Um ardente desejo de sobrevivência acendeu, cujo volátil e perigoso combustível era seu desejo de vingança por tudo o que aquela pessoa causou. Aquela que a derrubou e indiretamente a fez se unir ao deus inimigo.
Esse desejo foi vislumbrado pelo gigante à sua frente, que discretamente sorriu, pois aquilo era o que o fascinava nos humanos. Mas, mantendo a compostura, rugiu para ela.
Deus: "E então, como vai ser?"
Mulher: "*ainda estava tremendo, mas cerrou os punhos a ponto de sangrar* Eu irei acompanhá-lo, senhor. Nem mesmo a morte poderá me parar."
Deus: "*erguendo as sobrancelhas e com um sorriso ameaçador* Então isso significa que nem eu mesmo posso pará-la? Quanta ousadia..."
Mulher: "*hesitando, mas mantendo a coragem* Sim."
Deus: "*gargalhando sinistramente* Gostei! Eu permito! Você poderá- *com um sorriso ainda mais assustador* Tive uma ideia melhor... Fique aqui."
Desaparecendo com a fumaça, o deus se ausentou por poucos minutos, até retornar. Logo em seguida, ventos pútridos, característicos do Submundo, condensaram, e um novo deus apareceu. Seu rosto estava parcialmente coberto por uma máscara similar a um crânio de cachorro, que ocultava espaços vazios onde deveriam estar seus olhos. Tanto sua alva pele desprovida de vida quanto seus trajes lembravam o couro das salamandras axolotes.
O primeiro deus então falou, sorrindo. Mas aquele sorriso assombrou a mulher penada. Ela sabia que algo terrível estava por vir.
Deus: "Esta é a humana que irá acompanhá-lo, Xolotl."
Xolotl: "*friamente, sem qualquer expressão* Que surpresa, você não mentiu. Ela realmente é a irmã dela. Mas o que você está planejando, Tezcatlipoca?"
Tezcatlipoca: "*com uma risada diabólica* Exatamente o que eu te falei: quero que a leve até nosso irmão Quetzalcoatl. Ela só quer se vingar da irmã traidora."
Xolotl: "*suspira* Eu já devia saber que você não iria revelar nada... Mas não me importo de levá-la até lá. Espero que já esteja pronta, Catarina Izel."
Catarina: "*um pouco confusa* Eh... Sim?"
Xolotl: "*irritado* Seu gato preto sarnento imbecil! Você não disse nada para ela?"
Tezcatlipoca: "*com um sorriso travesso e coçando a nuca* Ops... Tive uma ideia tão boa que esqueci de falar. *Limpando a garganta* Catarina, você é uma boa garota, então permitirei que acompanhe essa lagartixa com cara de cachorro... Perdão... Esse cachorro com cara de lagartixa... Droga... O deus Xolotl em sua honorável missão secreta de resgate. É claro que Xolotl só se preocupa com a cobra bêbada. O que acontecerá com sua irmã após a exorcização é problema seu."
Catarina entendeu as intenções do deus.
Tezcatlipoca: "*com o mesmo sorriso perverso* Nem preciso dizer o que acontecerá se falhar."
Ela concordou. Se de alguma forma falhasse e miraculosamente sobrevivesse, Tezcatlipoca terminaria o que sua irmã começou. Mesmo assim, Catarina não se acorvadou.
Catarina: "*com uma expressão solene* Eu irei cumprir minha missão, meu senhor. Ela não viverá por muito mais tempo."
Xolotl: "*sem qualquer expressão* Neste caso, nós iremos partir logo. Se precisa fazer algo-"
Catarina: "Já estou pronta, senhor deus Xolotl."
Xolotl: "Oh. Então iremos agora. E você pode me chamar apenas de Xolotl. Sou apenas um vassalo de Mictlan."
Tezcatlipoca: "Deixem os cumprimentos para depois. Agora vão logo!"
Xolotl: "*irritado* Seu... Ah, tanto faz. Vamos logo então."
O deus do submundo se desfez nos mesmos ventos pútridos, que envolveram Catarina. Logo, os dois se foram.
Catarina: 'Depois de muito tempo, finalmente poderei me livrar de você. Me aguarde. Eu estou chegando, irmãzinha...'
Mas sem que ambos soubessem, Tezcatlipoca ordenou a uma figura sombria que surgiu de uma fumaça.
Tezcatlipoca: "Siga-os. Eu não confio em nenhum deles. Se algo acontecer, me informe imediatamente. No pior dos casos, pelo menos, saberei onde fica Eldorado."
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{Notas do Autor}
Eu sei, vocês querem saber o que vai acontecer com a turminha na ilha. Mas eu quis aproveitar para extravasar um pouco.
Afinal, não é como se esse capítulo trouxesse alguma informação importante e talvez um spoiler dos próximos volumes da novel, né?
Tchau galerinha!!!!
Afff... Quem eu quero enganar? Não é possível que tenha alguma criança lendo essa bagaça aqui...