"Kenta, Kenta! Se é você, fala comigo!" Haruki chamou, como quem ora.
[HARUKI!] a voz de Kenta soou ansiosa.
"Sim sou eu! Cara, eu estou morrendo de fome! Preciso de comida," Haruki pediu sem pudores. Mas era estranho falar com um deus e ele responder com a voz de Kenta.
Um balde de frango frito apareceu alguns minutos depois, bem ao seu lado.
"Cara, preciso de muito mais comida, muito mesmo." Haruki pediu novamente pensando nos outros. E mais baldes de frango foram aparecendo ao seu redor.
[ESTOU TOMANDO MUITO CAFÉ! ISSO NÃO ESTÁ ME FAZENDO BEM,...] a voz de Kenta era um murmúrio, ele parecia falar consigo mesmo. E Haruki não podia deixar essa ideia perigosa prosseguir.
"Não, cara, não é o café! Não é você." Ele interrompeu o diálogo interno do amigo. "CHOMP CHOMP CHOMP," mastigando com a boca cheia de frango com voracidade Haruki recomeçou a falar, "Olha, sou eu! E eu posso provar," Haruki falava e mastigava, "Espera um pouquinho e eu provarei."
Um pouco mais saciado, e depois de pensar um pouco, o cantor falou o número do quarto de hotel onde ele estava hospedado, e o número de seu voo para S City.
Kenta não teria como saber dessas informações que só ele sabia.
Haruki maginava que assim que ele confirmasse as informações, Kenta deixaria de pensar que estava louco. O ilustrador soltou um palavrão, bem antes de ter tempo para isso.
[ NÃO É POSSÍVEL!!! ]
"Cara, descobre o que aconteceu comigo. Como eu vim parar aqui? Na real, eu sou muito idiota mesmo! Cara, me tira daqui!" Haruki aí pensando enquanto falava. Ele estava muito angustiado.
[ COMO FAÇO ISSO?! ] Kenta também não parecia estar pensando com clareza.
"Eu é que sei?! Desenha uma porta, uma escada, sei lá!" Haruki pensou nos desenhos que ele assistia quando criança.
O ilustrador fez portas, janelas, escadas, mas tudo terminava no vazio, para onde Haruki não queria se jogar.
Frustrados, os dois ficaram em silêncio por um tempo.
[ISSO É IA - Inteligência Artificial! FOI AQUELE SMARTWATCH!] exclamou Kenta, quebrando o silêncio e assustando o cantor.
"Cara, não sou só eu! Todos os outros caras também foram arrastados para cá no lugar dos personagens. Do Bad Boy até o Estudante, todos estão aqui," explicou Haruki que procurava segurar sua raiva. Afinal Kenta era seu amigo.
O ilustrador soltou outro palavrão, apavorado com as consequências.
[O QUE EU DEVO FAZER?! NÃO POSSO IR A POLÍCIA COM ISSO.]
"Tente descobrir mais sobre esta empresa que desenvolve o smartwatch. Quem são, e o que estão fazendo. Mas tome cuidado, pois devem ser pessoas muito perigosas," Haruki se preocupava que algo pudesse acontecer com seu amigo. E eles ficariam ali sem um aliado no mundo externo.
[VOU FAZER ISSO AGORA!] Kenta prometeu.
"Não! Espere. Eu preciso que você faça duas coisas para mim."
[DIGA.]
"Primeiro eu quero um quarto enorme, com uma cama enorme, com uma jacuzzi enorme, com um banheiro enorme, com uma privada …"
[ENORME?] interrompeu Kenta, perplexo.
"Não!" respondeu o cantor, irritado, "Eletrônica, com música e jato massageador. Ah, com muito papel higiênico. Eu falei que quero um frigobar enorme e cheio de comidas gostosas?!"
[OKAY, MAS UM FRIGOBAR ENORME É UMA GELADEIRA COMUM.] Kenta respondeu em tom levemente repreendedor.
"Ah, que engraçadinho, não é hora de tecnicalidades." Haruki resmungou como uma criança.
[TUDO BEM. MAS QUAL ERA A SEGUNDA COISA?] Kenta perguntou com a voz levemente risonha.
"E outra, eu quero que você tire as almofadas, todas as almofadas da sala de jogos."
[…?]
"Pode fazer isso?" A demora na resposta de Kenta fez Haruki perguntar.
[HAI SAMA. DESEJA ALGO MAIS?] o ilustrador respondeu ironicamente.
O cantor olhou em volta para pensar em coisas que ele pudesse precisar até sair dali, e viu os baldes de frango frito amontoados ao seu redor.
Seu coração rancoroso relembrou do garoto kawaii comendo a papa de bambu. Haruki sentiu-se um lixo.
Envergonhado, ele voltou atrás. "Kenta, esquece as bobagens que eu falei. Precisamos de comida, camas e banheiro. Por favor, faça isso rápido, mesmo que não seja detalhado. Alguns deles estão aqui há uma semana!" Haruki revelou com tristeza.
[SEM CAGAR?! OH MEU DEUS, ISSO VAI SER HORRÍVEL!]
O cantor confessou ao amigo, "Cara, eu mesmo tive que ir nas flores! Como um gato." Haruki balançava a cabeça tentando não imaginar as surpresas pela areia.
[VOU FAZER ISSO RÁPIDO, E VER COMO TIRAR TODOS VOCÊS DAÍ]
"Certo, vou levar esta comida pros rapazes que estão morrendo de fome. Depois falamos mais." Haruki se despediu do ilustrador e levou a comida para a sala de lazer.
"EI, PESSOAL! Acordem para jantar!" Haruki chamou alegremente, sentindo-se muito generoso.
Mesmo os que estavam dormindo acordaram rápido com o aroma de frango frito.
Logo, todos estavam mastigando sem parar e lambendo os beiços, inclusive Haruki. Ele aproveitou o momento para olhar cada um ali. O cantor ficou avaliando se tinha sido um bom negócio abrir mão de sua privada massageadora.
E ele ainda não tinha certeza.
Yoshida Saito comeu com moderação.
Ele havia chegado hoje e não parecia o tipo esganado, suas roupas caras e o cabelo de corte tradicional, modelado com spray ainda estavam impecáveis. O homem mais velho era um exemplo de elegância, saído de uma revista de CEO's.
Mas o resto do grupo era o completo caos.
Sendo o mais jovem deles, Okane Hinata, o pior, as roupas estavam tão sujas que fediam. Esfomeado, engolia grandes nacos de frango e se engasgava no processo, sendo salvo por seu guardião Sasaki Jun que ficava dando tapas em suas costas.
Depois de comerem Haruki explicou ao grupo como conseguiu a comida, e completou,
"Como eu disse, eu assinei o contrato porque o ilustrador é meu amigo do colégio e ele não sabia que eu estava trancado aqui. Nós testamos várias maneiras de sair, mas nada deu certo." Haruki esticou os braços, ao estar saciado.
Eles ficaram pensativos, até que Okane Hinata levantou a mão, "Takeda-senpai, da próxima vez que falar com ele, pode pedir acompanhamentos e bebidas?"
Sasaki jogou uma almofada no garoto, demonstrando sua opinião sobre o comentário.
"Eu devia ter tirado as almofadas mesmo, "resmungou Haruki pensando alto.
"O quê?" questionou Daisuke.
"Nada, nada," Haruki achava estranha essa proximidade do estudante com o Bad Boy, e não sabia porque isso o irritava.
Yoshida Saito fez uma pergunta em tom sério, "E se da próxima vez tentarmos sair daqui de navio?"
Antes que Haruki respondesse a pergunta feita a ele, Noguchi Takashi interrompeu falando, "Nós assinamos um contrato que cedia nossa imagem. Até onde vocês acham que o barco nos levaria? Eu respondo: até o limite da tela. Nós estamos presos aos limites do jogo."
O Nerd era mesmo inteligente, Haruki observou.
Um pouco exaltado Sasaki Jun perguntou, "Então você acha que devemos seguir o roteiro?"
"Mas qual é o roteiro do jogo afinal?" Haruki perguntou, pois tinha só uma vaga ideia do que era um otome game.
Fazendo um sinal para Okane Hinata que ele responderia, Yamada Daisuke começou "Há vários tipos de trama, mas olhando pelos cenários e os arquétipos para os quais fomos escolhidos..." Sua voz era agradável e todos prestaram atenção.
"Que arquétipos?" provocou Sasaki Jun com um meio sorriso.
"Veja bem, analisando apenas a roupa de cada um, posso dizer que Takeda-san é o Atleta, concordam?" o influencer olhou em volta para ver se alguém iria discordar.
Como ninguém discordou, Yamada Daisuke continuou listando os demais, sem falar de si mesmo.
Haruki lembrava de ter visto Yamada Daisuke nos vídeos, onde ele sempre estava maquiado para valorizar cada detalhe de um rosto que ao natural já era perfeito.
No entanto para Haruki, de todos ali, ao natural, sem cuidados e até mesmo com a barba por fazer, o rosto mais bonito era de Sasaki Jun.
'O que será que ele fazia no mundo real?' Percebeu que o estava encarando, quando Jun retribuiu o olhar. Os dois ficaram se desafiando, olhando sem piscar por um longo tempo, enquanto ouviam as conjecturas de Yamada Daisuke continuarem.
"Okay, mas volte ao jogo, eu também não entendo," pediu Yoshida Saito, que tinha acabado de concordar que era o CEO do grupo.
O cantor ficou se perguntando quem eles eram fora do jogo.
Na vida real o que eles faziam. Por quem eles iriam querer voltar.
Ele só sabia de um, Yamada Daisuke, o influencer. E suspeitava que o garoto Kawaii era um estudante mesmo na vida real, ou era assim que ele se comportava.
Mas os outros seriam todos modelos? Poderiam ser, pois eram homens bonitos, altos e sarados.
"Este jogo, como eu dizia, pelo cenário é um Otome de Harém. Então vai aparecer um jogador que pode ser uma garota, ou um garoto. O PC vai querer ser mimado e decidirá quem de nós ele vai querer conhecer para começar uma trilha. Aos poucos, irá passar por todos nós, cumprindo todas as trilhas, até se decidir por qual de nós o PC irá pedir em namoro, noivado, casamento." Yamada Daisuke fez uma pausa olhando a reação dos confinados, então continuou sua explicação.
"A maioria dos Otome é voltado para adolescentes, mas alguns são adultos. Se for o último caso, a pessoa poderá querer... Sexo," ele suspirou e seus ombros caíram, mostrando seu descontentamento.
"Qual o problema?" perguntou Okane Hinata com um amplo sorriso demonstrando que estava tudo bem para ele.
Sasaki Jun bufou,
"Você não vê problema em ser um escravo sexual?" O tom baixo de sua voz assustou mais o estudante do que se ele tivesse gritado.
Hinata-kun abriu a boca, sem conseguir responder.
Yoshida Saito os ignorou e perguntou, "Mas afinal, como se ganha esse tipo de jogo?"
"Não é um jogo para se ganhar. Os personagens do harém estão aqui apenas para o prazer do PC," respondeu o influencer.
Haruki então concluiu, "Sendo assim, não temos uma perspectiva de sairmos do jogo somente seguindo o roteiro, não é mesmo?"
"Acredito que se não encontrarmos alguma alternativa de sairmos por nós mesmos, não será participando de encontros românticos com o jogador que vamos conseguir nossa liberdade," ponderou Yoshida Saito.
Yamada Daisuke colocou o rosto entre as mãos, angustiado.
Okane Hinata comentou,
"Existem Otomes com vários desafios e recompensas. Como o jogo não começou ainda, não sabemos como vai ser. Vamos ser esperançosos, hein!?"
Um silêncio desconfortável abateu sobre o grupo, tirando Haruki, que ponderou o pedido do mais jovem os outros não estavam otimistas. Cada homem ali, do mais adulto ao mais imaturo, mergulhou imerso em seus problemas.
Eles estavam presos!
Era senso comum que foi com Alta Tecnologia que saíram do mundo real para um jogo eletrônico. E esta não era a grande preocupação, descobrir como entraram. Os pensamentos angustiantes que ocupavam suas mentes era se eles teriam como sair da realidade virtual.
"Então temos que descobrir as regras desse jogo. E suponho que teremos que esperar mais um pouco até a chegada do jogador. Ou jogadora," concluiu Yoshida Saito em tom profético.