Chapter 4 - Inscrição

"Eu te amo."

Luna duvidou dos próprios ouvidos a primeira vez que ouviu essas palavras. Contudo a cada segundo que aquele silêncio desconfortável continuava a se propagar, mais claro ficava que ela não tinha ouvido nada de errado.

E seu coração começou a acelerar, tal qual ela se viu forçada a pensar em algo que tinha tentado ignorar.

A garota nunca esperou que ele olharia para ela. Afinal ela era tão sem graça e esquisita.

As experiências negativas de outros encontros apertavam seu coração. Ela não era feia, na verdade, a maioria a descreveria como bonita, por isso aquela não era a primeira vez que alguém a chamava para sair.

Contudo, todas as outras vezes as pessoas se afastaram dela. Provavelmente se cansaram de lidar com uma menina tão estranha.

"Eu te amo," ele disse mais uma vez e o rosto pálido da garota ficou vermelho como um tomate.

Ela sabia que Davi era diferente. Eles já se conheciam há mais de um ano e ele nunca parecia se cansar dela. E agora ele estava dizendo que a amava.

A verdade era que entrar em um relacionamento parecia assustador. Contudo ela também não conseguia negar o sorriso que se formava no seu rosto, apenas de pensar em ter aquele homem ao seu lado.

A única função da razão, é encontrar a melhor forma de seguir seu coração. Mentalmente a garota repetiu a frase que sua mãe uma vez lhe disse.

E sua decisão estava tomada. Afinal, desde o começo, o seu coração só desejava uma coisa nesse caso. 

Todos os problemas e desafios que viessem depois disso, poderiam ser lidados com a razão. Ela provavelmente daria um jeito nas suas próprias inseguranças, ainda mais se tivesse Davi ao seu lado.

"Estou ainda mais ansiosa para podermos nos ver pessoalmente." Essa foi a resposta da garota, que estava envergonhada demais para dar uma resposta direta.

Como seria de se esperar, o garoto entendeu sua intenção com facilidade. E imaginando o quanto ela devia estar corando, ele riu:

"Você é muito fofa."

Pouco tempo depois disso eles tiveram que se despedir, tal qual Davi 

Que horas será que ele vai chegar? Luna rapidamente pegou uma caneta e um pedaço de papel e começou a fazer contas.

O ônibus do Davi sairia da sua cidade natal em um hora e ele provavelmente chegaria à capital depois de 9 horas. Os barcos para a ilha artificial de Urush, saiam de duas em duas horas. Depois seriam mais alguns minutos para conseguir transporte para Enki.

Considerando tudo, ela conseguia concluir que ele provavelmente chegaria entre 8 da manhã e 10 da manhã. 

Infelizmente nesse horário a garota teria que comparecer a uma reunião do seu departamento. Ela suspirou profundamente, pensando se era ou não uma possibilidade faltar.

No fim, o primeiro encontro deles teria que ficar para mais tarde.

Luna rolou na sua cama frustrada. Ao mesmo tempo, a ansiedade de poder ver Davi pela primeira vez fazia seu coração acelerar.

E a garota não dormiu nada a noite inteira.

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Tal qual chegava perto do seu destino, o garoto podia ver uma cena impressionante. No céu havia uma enorme fenda, que parecia se abrir cortando a realidade. Ao redor, era possível notar que ele estava conectado a várias outras pequenas fendas ao redor.

Embaixo daquela monstruosidade, estava a ilha artificial de Urush e acima dela, flutuando no céu próximo a fenda, estava uma grande construção. Aquela era a cidade de Enki, onde os exploradores ficavam.

Chegando na ilha, Davi logo se sentiu perdido em meio ao caos de carros, pessoas e comércio. Aquele mar de luz era quase psicodélico e a todo lado para o qual olhasse encontrariam alguém vendendo algo.

Por sorte, encontrar o caminho para o círculo mágico de transporte não era particularmente difícil. A primeira pessoa a quem ele perguntou lhe deu as instruções necessárias, então ele seguiu até encontrar uma longa fila.

A espera foi um pouco longa e o preço era caro como esperado. De qualquer forma, ele entrou dentro de uma pequena sala, onde havia um guarda algumas runas estranhas desenhadas no chão. Ele entrou no círculo, que começou a brilhar intensamente.

Então ele estava no seu destino. Mesmo que aquela ilha voadora existisse apenas para a Academia de exploradores, estava longe de ser pequena. Conforme andava pelo lugar, descobriu que havia uma grande área residencial, centros de treinamento, além disso a Academia Enki era simplesmente gigantesca.

Além disso, aquele lugar era realmente diferente da academia de exploradores Midgard, a qual ele conhecia por ter sido onde seu pai estudou. Apesar da Midgard estar em 3° no ranking, ela foi construída sobre uma ilha voadora bem menor que a Enki que era a 8° no ranking.

Enfim, para entrar na academia, era necessário pagar o exorbitante valor da inscrição, bem como passar por alguns testes. A maioria dos testes tinha como objetivo medir em que classe o aluno deveria ficar, mas também havia o teste básico de sobrevivência, para avaliar se ele tinha a capacidade mínima de ingresso.

Ser explorador era um trabalho perigoso, por isso era necessário garantir que os inscritos estivessem prontos para lidar com situações de vida ou morte. Ainda assim, Davi estava confiante de que poderia passar pela prova de sobrevivência básica. 

Apesar de sua falta de talento, ele era muito determinado; além do mais, tudo o que precisaria fazer seria enfrentar e escapar de alguns monstros de classe baixa.

Depois de caminhar mais um pouco, Davi finalmente chegou ao prédio administrativo da Enki, uma construção imponente, em um estilo clássico, que se destacava entre os demais arranha-céus da capital. 

Ao entrar no hall de recepção, seus olhos foram imediatamente atraídos pela grandiosidade do lugar: o piso era de mármore branco reluzente, refletindo a luz suave e levemente dourada que emanava de grandes lustres de cristal. 

À esquerda, havia uma parede com um enorme emblema dos exploradores, que tinha um imponente dragão em seu centro, representando a coragem e poder dos mais poderosos humanos que seriam como a criatura lendária. Além disso haviam várias pinturas glamurosas e outras decorações que Davi considerava excessivas.

Por fim, o lugar também tinha algumas coisas úteis, como telas interativas, onde os novos alunos podiam consultar informações e orientações sobre os horários dos testes e atividades iniciais.

E, no final da sala, havia uma bancada com vários recepcionistas prontos para ajudar os novos alunos no que fosse necessário.

Depois de conferir a programação no painel, o garoto trocou algumas mensagens com sua amiga, mas felizmente ela não teria tempo de ir o encontrar antes do teste. Por isso eles combinaram de se ver depois de tudo.

Em seguida, Davi foi até a bancada e conseguiu fazer a suaincrição. Com lágrimas nos olhos ele zerou sua conta bancária e pegou o valor necessário. Depois disso ele se dirigiu ao auditório, onde ocorreria uma palestra da diretora da academia. 

Ao entrar, encontrou mais uma sala exageradamente decorada, ressaltando o poder e orgulho do lugar. Era uma sala enorme, com lugares para mais de mil pessoas ouvirem palestra, em fileiras e mais fileiras de cadeiras. Pelo menos os acentos eram bastante confortáveis, então ele não reclamaria de forma alguma.

Naturalmente um lugar cheio como aquele estava preenchido pelo barulho de inúmeras pessoas conversando. E mesmo que os professores tentassem conseguir a atenção dos alunos, não era tão fácil assim. Contudo de repente todo o barulho acabou, tal qual os alunos ouviram os passos firmes do salto de uma certa mulher.

E tal qual aqueles olhos profundamente escuros encararam a sala, todos sentiram o peso da sua presença. Até mesmo respirar parecia se tornar mais difícil, na presença daquela mulher, cuja beleza e aparência desafiavam a lógica, afinal por mais que ela já se aproximasse dos 50 anos, ela parecia estar nos seus twenties.

Tal qual a elegante mulher desfilava até a posição central do palco, ela atraia todos os olhares. Seu terno feito sob medida moldava perfeitamente suas curvas e a cada passo firme que dava, suas bundas dançavam com uma sensualidade única.

A diretora então aproximou seus lábios do microfone e iniciou sua fala com uma voz poderosa e envolvente, que capturou imediatamente a atenção de todos no auditório, "Em nome da administração e de todo o corpo docente gostaria de dar as boas vindas a todos os alunos aqui."

Ela começou seu discurso relembrando a todos a importância dos exploradores e como eles eram os protetores da humanidade. Ela, como sempre, contou a história do dia em que o mundo mudou e enormes fendas abriram no céu. 

Naquele dia a humanidade ganhou acesso aos sistemas e a poderes, contudo o preço pago por tamanho poder foi igualmente grande. Dessas mesmas fendas, vieram ceres do inferno que buscavam destruir a humanidade. Para exterminar essas criaturas e manter as fendas sob controle, os exploradores deveriam entrar no lugar e matar os monstros lá.

Além disso, os exploradores tinham outras funções nobres. As fendas tinham muitos mistérios a serem descobertos e desvendá-los era fundamental para expandir os conhecimentos da humanidade. Nesse sentido ela ressaltou a função dos engenheiros mágicos, uma das especialidades que aquele lugar oferecia.

Por fim ela disse que era sim possível ficar rico coletando partes de monstros nas fendas, mas relembrou todos que os tolos que buscavam a vida de exploradores pela ganância e pelo ouro inevitavelmente acabariam mortos.

A diretora deu uma pausa dramática no final de seu discurso, fazendo o auditório mergulhar em um silêncio profundo. O olhar firme e confiante que ela lançou sobre os alunos parecia um lembrete silencioso de que apenas os mais fortes e determinados sobreviveriam naquela instituição.

"Não se esqueçam de que vocês são o escudo da humanidade. Estufem o peito com orgulho e provem o seu valor." Ela levantou a voz pela primeira vez.

O silêncio foi quebrado por um único aplauso tímido que rapidamente foi seguido pelo restante da plateia. A diretora sorriu de canto e virou-se para deixar o palco, mas então, como se algo tivesse a chamado, parou subitamente. Seus olhos então se fixam em Davi, tal qual ela o analisava.

Sem se importar com os professores que foram falar com ela, a mulher desapareceu e surgiu diante do aluno que tinha chamado sua atenção. Seus olhos escuros agora apresentavam uma suave luz roxa, tal qual ela buscava saciar sua dúvida.

Sem entender o que estava acontecendo, o garoto engoliu o seco, tal qual o perfume poderoso daquela mulher que invadia seu corpo. Ela estava a centímetros dele, com seus lábios a centímetros do dele. 

Então ela se inclinou na direção do garoto fazendo seus seios pressionar contra o peito dele, então sussurrou no seu ouvido:

"Você vai vir comigo para minha sala, preciso falar com você."

Sem dar a mínima para a opinião do garoto, ela estalou os dedos, trazendo-o para seu escritório.

O silêncio reinou por alguns segundos tal qual todos tentavam entender a cena diante de si, então o auditório explodiu em murmúrios, tal qual boatos se espalharam. 

Quem era aquele garoto? O que a diretora queria com ele? Rumores sobre favoritismos, problemas e até conspirações começaram a se formar, tal qual aquela história ganhava vida própria.