Olívia corria, furiosa ao longo da extensão do Shopping. Ela encontraria Hayashi, e faria ele pagar. Ele precisava pagar.
-HAYASHI! -Ela gritou. -CADÊ VOCÊ!?
-Esquerda. -A voz de Hikiro ecoou pelos alto-falantes. -Suba a escada.
Olívia continuou correndo, e invocando sapos ao longo do percurso. Ela escutava os pequenos seres pulando e a seguindo. Cáiman vinha correndo, o chão tremia com seus largos passos.
Ela pegou o corredor à esquerda, seguiu uma escada e parou, de frente para uma porta azul. O corredor de pedra de repente pareceu extremamente claustrofóbico. Ao lado da porta, uma placa branca com escrita vermelha denunciava que ela estava finalmente cara a cara com seu inimigo: Segurança.
A porta se abriu para dentro, revelando uma pequena sala com uma mesa branca. As paredes cinzentas a fizeram sentir ainda mais claustrofóbica. Uma cadeira vazia estava posta a um dos lados da mesa, no outro, Hikiro se sentava, com um olhar sério.
Seus cabelos e olhos pretos não mudaram nada desde a última vez em que se viram.
-Já faz tempo. -Ele disse.
Atrás de Hayashi, uma outra porta azul estava fechada. Era onde ele estava observando pelas câmeras e falando nos alto-falantes.
-Você não mudou nada. -Ela disse. A fúria subitamente foi transformada em decepção.
-Sim. E então, o quê você veio fazer aqui? -Hikiro questionou.
-Você... Você me chamou!
-Sim. Mas eu quero saber o quê você está fazendo aqui. Você sabia que eu estaria aqui.
-Claro! Você nem se esforçou. Seus homúnculos até se desfizeram na frente das crianças. Você queria ser descoberto.
-Sim, é verdade. -Hikiro suspirou. -Eu queria te ver.
-Me ver? Você me trouxe para esse inferno!
-Inferno!? A vida real é o verdadeiro inferno!
-Pare de ser idiota. Ah, que merda. Por que você é assim?
-Eu te amava. Eu fiz tudo por você. Te livrei daqueles gângsteres, te ajudei a criar uma nova vida, longe de tudo que aconteceu na sua terra.
-Tudo isso com segundas intenções.
-E você sabia desde o início.
-Eu precisava de ajuda.
-Eu também. Eu precisava de você. Só você me entendia.
-Eu não devia ter vindo aqui.
-Por quê? Acha que eu quero te machucar?
-Se não é vingança, o quê quer?
-Quero... Quero que você volte.
-Vai ficar querendo.
-Eu não entendo. Eu poderia ter te dado tudo. Eu lutei por você. Eu lutei por nós!
-Mesmo sabendo que eu não te amava de volta.
-É. Não me amava. Você me usou.
-Eu sei. E me arrependo dia após dia por isto. -Olívia baixou o olhar. -Você quer que eu te peça desculpas?
-Não. O quê eu quero... -Hikiro parou. -É...
Olívia olhou para ele, ela ainda estava em pé. Seu corpo precisava de algum apoio. Ela se sentou abruptamente.
-Tudo isso... Tudo que aconteceu até agora... -Olívia sentiu um nó se formar na garganta.
-Foi porquê você gosta de ser amada.
-Hayashi...
A porta bateu e abriu.
Erine, Anne, e Karen entraram, prontas para atacar.
-Oli, fica parada! -Anne gritou. -Se ele tentar alguma coisa, eu quebro a cara dele!
-Olívia, você tá bem? -Luci questionou.
Erine se agachou e segurou o rosto de Olívia.
-O quê foi? -Erine ficou séria. -Você está chorando...
-Sim. -Hikiro respondeu. -Ela está encurralada.
-Cala a boca, seu merda! -Anne bradou. -Você vai morrer!
-Espera... -Olívia disse, e chorou.
-Como assim? -Erine se esticou. -O quê... O quê foi?
-Você vai contar? -Hikiro perguntou.
O homem permaneceu sentado, friamente calmo.
-Eu... Eu causei isso... Eu quem enganei o Hayashi...
-Hikiro. -Ele a corrigiu.
-Hikiro? Mas esse nome...
-É quem eu sou. Ou pelo menos, quem sou agora.
-Para com isso, Hayashi. Vamos, deixa essa gente, nós podemos...
-DEIXAR!? ASSIM COMO VOCÊ FEZ COMIGO!?
-Ei, para de gritar! -Anne cerrou os punhos.
-Por quê!? -Hikiro suspirou. Lágrimas escorriam dos seus olhos. -Ela quem me enganou! Me usou e fugiu com aquele velho asqueroso! Eu fiz tudo por ela! Eu escondi ela do mundo e foi assim que ela me agradeceu!
-Escondeu? -Karen perguntou.
-Cara, ela não te deve nada, seu babaca! -Erine gritou.
-Como assim, escondeu? -Karen perguntou novamente.
-Ah, vocês não sabem?
-Elas não... Ninguém sabe. -Olívia se encolheu. -Por favor... Meninas, eu não... Eu não...
Olívia não conseguiu conter as lágrimas.
-Olívia era da máfia. -Hikiro falou.
-O quê? -Karen arregalou os olhos. -Como assim!?
-Meu pai... -Olívia respondeu. -Meu pai era... Vendedor...
-Vendedor. -Erine repetiu. -Você também era?
-Não.
-Então... Qual o problema? -Erine questionou.
-Você não é um monstro, Oli. Não por algo que sua família fez.
-Mas... Mas...
-Mas nada. -Hikiro a interrompeu. -Você disse essas mesmas palavras no passado. Você sabe muito bem disso. Mas é mais fácil se fazer de vítima, de idiota.
-EI, CALA A BOCA! -Anne gritou e avançou contra ele.
Anne ergueu o rapaz pelo colarinho da camisa. Hikiro franziu o rosto.
-Sabe quem escondeu ela da máfia, Anne?
-Como você...? -Anne afrouxou as mãos, e foi empurrada pelo homem. -Quem te disse meu nome?
-Eu vejo tudo. -Hikiro falou. -Eu vejo vocês todos. Eu vi a Olívia e a família dela. Eu tirei ela de lá. Eu salvei ela.
-Salvou? -Anne perguntou. -Você é um maluco!
-Não. Não sou. Se não fosse o maluco aqui, Olívia estaria morta!
-E como você sabe!? -Karen perguntou. -Desembucha!
-Quando Olívia me contou sobre a família, eu fui pesquisar. Eu descobri que o papaizinho dela era um criminoso nojento. Um estuprador, assassino e sequestrador.
-Oli... -Erine a abraçou. -Fica calma.
-Você acha que ela não sabia? Ela me pediu socorro inúmeras vezes! Todos no nosso colégio tratavam ela feito lixo sem nem saber que o pai dela era o verdadeiro lixo!
-E o quê você fez!? -Erine grutou. -Matou ele!?
-Não. -Hikiro olhou para ela. -Eu matei ela. Eu forjei um assassinato, deixei que o mundo me odiasse. E então... Ela foi esquecida.
-Esquecida... -Olívia repetiu.
-Depois de tudo, eu me escondi. Tudo que eu queria era ela. Que ela me amasse, que ela estivesse comigo. E então, quando eu finalmente pude trazer ela para perto de mim...
-Niccolo apareceu. -Erine respondeu. -Era por isso que você era tão apegada a ele. Você via uma figura de proteção. Era como...
-Um pai. -Olívia soluçou.
-UM VELHO TARADO E MALDITO! NÃO SÓ BASTAVA ELE ROUBAR ELA, ELE AMEAÇOU O... -Ele tapou a boca.
-O quê? -Anne franziu as sobrancelhas. -Ele ameaçou o quê?
-Não é da conta de vocês. -Ele olhou para a porta atrás delas. -Fique longe!
Anne caminhou lentamente na direção dele.
-Anne, espera. -Erine chamou.
-Não. Ele vai falar.
-Anne... -Karen falou. -Mira nas bolas dele.
A cadeira de Hikiro estava caída no chão, Karen apontou a mão para ela, fazendo-a flutuar.
-Nem pense, sua puta! -Hikiro tirou do bolso um spray de pimenta e espirrou em Anne.
Karen lançou a cadeira, e Hikiro se abaixou. A cadeira atingiu a porta azul da sala da câmera.
Anne gritou de dor e caiu no chão. A porta explodiu, e Cáiman entrou. O brutamontes bateu na mesa lançando tudo para o chão. Hikiro tentou erguer o spray, mas Erine lançou uma pequena barra de metal que produzira no caminho.
A barra acertou Hikiro no nariz. Ele tentou fugir para a sala das câmeras, mas a porta era de metal. Karen fez um sinal, e a porta ficou imóvel.
-Não! -Hikiro gritou.
Cáiman o pegou e ergueu. O focinho do jacaré se abriu, pronto para matar Hikiro.
-Espera. -Olívia chamou.
-Ah, filho da puta miserável! -Anne grunhia. -Me ajuda!
-Ah, eu... -Karen hesitou. Ela olhou para Erine. -Eu ajudo...
Karen se curvou lentamente e ajudou Anne a se sentar.
-Ah, merda... -Anne grunhia. -Eu vou morrer!
-Calma, Anne. -Karen tentou dar apoio. -Podia ser pior. A Erine sofreu por bem mais tempo.
Anne não respondeu, apenas ficou sentada encolhida com a cabeça entre os joelhos.
-Hayashi... -Olívia secou as lágrimas. Ela respirou fundo. -O quê esses caras vão te dar!?
-Eles me deram confiança... -Ele murmurou. -Me deram valor.
-Você não vê as coisas que eles fazem? Roubos e assassinatos! São uma máfia igual a que você me tirou!
-NÃO COMPARE A GENTE COM ESSES RATOS!
-SIM, EU COMPARO! VOCÊ VAI MORRER!
O exército de sapos que seguiu Olívia adentrou a sala, prontos para um ataque em massa.
-IDIOTAS! VOCÊS NUNCA VÃO NOS VENCER!
-Quem disse? -Erine se aproximou dele. -Vocês tiraram meu namorado de mim. Tiraram de nossos amigos, de nossas famílias. Joe era um homem maravilhoso. E vocês...
Ela começou a arfar.
-Nós te devolveremos ele. -Hikiro falou. -E não vai ser nenhum homúnculo.
-Isso é impossível.
-Para nós, humanos é. Mas não para o receptáculo.
-Receptáculo? -Erine questionou. -O quê é esse receptáculo?
-Ah, é verdade. -Hikiro deu uma risada. -Vocês não sabem.
-Hayashi... -Olívia chegou perto dele. -O quê eles enfiaram na sua cabeça?
Hikiro riu ainda mais.
-O receptáculo é o escolhido. O predestinado. O receptáculo será o salvador desse mundo miserável.
-Pronto, eles são fanáticos religiosos! -Karen debochou. -Acaba com ele de uma vez.
-Espera. -Olívia falou. -O quê é o receptáculo, Hayashi? Quem é o receptáculo?
-É por isso que queremos os Mirai. Nós podemos educar essas crianças para acabar com a miséria e o sofrimento. Podemos criar um mundo próspero. Você não quer, Olívia?
-Eu... Eu quero.