Naquela manhã, o sol brilhava intensamente sobre o vilarejo de Nargur.
Luke precisou deixar seu carro no estacionamento na noite passada, e quando desceu, caminhou através das ruelas de pedra. As enormes casas de madeira com base sobre pedra daquele lugar pareciam novas, todas brilhantes, limpas, bem cuidadas e preservadas.
A floresta ao redor emanava um ar fresco e úmido. O vilarejo era pequeno, e Luke não precisou caminhar muito para chegar ao Palácio. O Palácio era uma enorme construção que ficava à beira do enorme lago Nargur, que dava nome ao vilarejo.
Um cais de madeira arredondado circundava uma parte da margem do lago, levando de uma ruela à outra, ligadas ao cais por uma escada de tijolos. Algumas barracas estavam montadas à beira do cais, pois era proibida a construção de cabanas ali. Apesar de ser um povo ignorante, o povo de Nargur preservava bem a natureza ao seu redor.
Enormes palmeiras e araucárias cresciam em meio aos pontos principais do vilarejo, rodeadas por plantas e flores belíssimas. As casas ao redor possuíam telhados coloridos, paredes e jardins preservados à frente, e eram ligadas às ruelas com pequenos caminhos pavimentados. Algumas das casas em locais mais baixos possuíam base de tijolos, e todas possuíam janelas com vista para a belíssima floresta que os circundava.
O Palácio possuía sua base feita de tijolos, o piso interior todo de madeira, enquanto algumas das paredes eram de tijolos na parte mais baixa da construída, as de cima eram totalmente feitas de madeira, e as enormes janelas do Palácio permitiam a qualquer um ver a situação do local tanto do lado de fora quanto do lado de dentro.
Luke caminhou lentamente, cumprimentou algumas pessoas, mas não reconheceu ninguém lá. Ele era apenas um fantasma vagando pelo passado.
Ele parou em uma das entradas do Palácio: a principal ficava de frente para o lago, enquanto as outras ficavam nas laterais do Palácio. Luke entrou e caminhou lentamente. Ali dentro era como um shopping, balcões e cozinhas com diversas pessoas rindo e conversando.
Luzes vinham das cozinhas, e um cheiro mortalmente atraente o fazia salivar de fome. A tapeçaria do Palácio era totalmente trabalhada em madeira, com um toque de modernismo, peças e decorações de vidro brilhavam e reluziam pelo local, quadros incríveis e inacreditáveis se espalhavam pelas paredes do lugar, grandes tapetes multicoloridos corriam pelo chão.
Uma enorme escada se erguia, de frente para o lago, ela levava ao andar mais alto do lugar. Lá, a decoração não deixava a desejar. Uma enorme mesa em forma de meia-lua se estendia por uma parte do local, com vários homens trajando vestes nativas dos líderes se sentando. Ao centro, se sentava Ubirajara.
Ubi era o líder do vilarejo, e todos o tratavam como um deus. Apesar de sua posição, Ubi era o representante dos sonhos de qualquer nação: justo, benevolente, calmo, compreensivo, democrático e sabia como resolver qualquer problema. Ainda assim, Ubi acreditava na Maldição de Nargur.
-E então, o grande homem veio. -Ubi sorriu. -Parece que seremos salvos nos próximos dias.
-Não. Não serão. -Luke respondeu de maneira seca.
-Não? -Ubi ergueu a sobrancelha e sorriu. -Por quê?
-Porquê não tem nenhuma maldição. A única coisa que vocês têm é tolice.
-Entendi! -Ubi sorriu. -Senhores, vejam, Luke nos disse a solução da maldição!
Os homens ao redor riram.
-É isso aí! -Um dos homens em um canto riu. -Vamos esquecer que estamos amaldiçoados, assim a maldição vai passar!
-Para debochar vocês são bons... -Luke resmungou.
-Luke, meu amigo, me escute. -Ubi sorriu e entrelaçou os dedos. Sua pele escura era iluminada pela pálida luz que entrava pela grande janela. Seus olhos cor de âmbar se serraram em um olhar provocador. Seus lábios se curvavam em um sorriso frio. Seu cabelo preto e liso estava trançado, a parte lateral da cabeça era raspada e tatuada com desenhos tribais. Os brincos de ouro brilhavam, junto dos ornamentos em suas roupas. -Nós temos um pacto. O clã Northwind foi protegido por nós eras atrás, por uma simples razão. Vocês trariam uma solução e acabariam com a maldição do lago Nargur. É isso. Por acaso isso é pedir demais?
-Sim. Vocês querem que eu faça uma tarefa impossível.
-Impossível? Por quê? Não consegue quebrar? -Ubi olhou com um olhar que fez Luke entender imediatamente. Se ele não fizesse algo, seus filhos iriam ser envolvidos.
-Ubi, me entenda. A morte, as doenças, o clima, tudo isso é natural. Não tem como eu intervir. Se você acha que eu posso, eu vou tentar. Eu preciso que você me acompanhe o tempo todo. Vai ver como tudo o quê eu disse é verdade.
-Sei. Vamos ver então. -Ubi sorriu.
-Se é tudo falso, então por que as crianças morrem com doenças todo ano? -Um dos homens ao redor perguntou.
-A água do lago não é limpa. -Luke percebeu na mesma hora que uma caixa d'água com um sistema de tratamento seria a solução.
Ele teria apenas que convencer Ubi e os aldeões de quê os construtores eram enviados divinos que ajudariam ele em sua tarefa.
-Ah sim. -O homem sorriu. Ele possuía dentes de ouro, olhos castanhos, seu cabelo era menor que da maioria dos homens ao redor, e haviam duas tranças em sua cabeça. As tatuagens em seus braços eram pretas. As de Ubi possuíam mais cores. Ali naquele povo, tatuagens coloridas eram um sinal de hierarquia, enquanto ter apenas uma trança na cabeça era um sinal de quê o dono era um dos líderes. Os lados da cabeça ser raspados eram outro sinal, somente os três membros mais altos podiam ter a cabeça raspada na lateral, e somente Ubi tinha tatuagens na cabeça. -Então as mortes prematuras, as doenças e problemas das pessoas são apenas sujeira.
-Sim. -Luke olhou para ele.
O homem olhou feio para Luke.
-Cara, se eu levantar daqui e te matar, será que a maldição vai embora com você?
-Iabá, pare. -Ubi disse em voz alta. Silêncio se fez. -Luke, essas doenças não são normais.
-Não mesmo. Mas eu posso arrumar uma forma de ajudar a limpar a água do rio para que ninguém mais beba água contaminada.
-Não. Não beberemos água que for tratada por gente de fora. Nem nos banharemos, e nem aceitaremos forasteiros.
-Certo. Então...
-Não venha com ideias de quê não somos civilizados. Se fizer isso...
-Calma, Ubi. Eu vou dar um jeito. Mas eu preciso que você se acalme.
-E então?
-E então eu vou quebrar a maldição.
-É melhor que você quebre. -Iabá bradou. -Se falhar, eu mesmo vou te matar!
'Merda' Luke pensou. Se não fizesse algo convincente, ele seria morto. E no pior dos casos, alguma das crianças seria alvo de Ubi como salvador.
-Ubi, vamos nadar? Se for, a gente pode ver o quê tem no meio do lago e...
-Já fizemos isso muitas vezes. -Ubi interrompeu. -O quê mudaria agora?
Era verdade. Os dois na infância nadavam juntos procurando alguma resposta naquele lago. Por anos, Luke e Ubi mergulharam ali e nada encontraram.
-Agora somos homens adultos. Nossas perspectivas de vida são mais... Experientes. -Ele precisou se segurar para não dizer "Evoluídas". Ubi não gostaria de ouvir aquelas palavras.
-Muito bem. -Ubi suspirou. -Vamos.
-E se ele tentar te afogar? -Um dos homens jovens no canto da mesa indagou.
-Isso não vai acontecer. -Ubi respondeu.
-Eu jamais tentaria machucar o Ubi! -Luke gritou.
-Parem, os dois. -Ubi sorriu. -Não quero brigas aqui em Nargur.
-Mas...
-Por favor. -Ubi sorriu educadamente para o homem.
O homem abaixou o olhar.
-Desculpe.
Ubi sorriu e saiu andando. Luke foi atrás dele, os homens atrás deles começaram a resmungar. Luke se preocupou, pois os dois homens ao lado de Ubi ficaram apenas em silêncio, olhando para ele. Além de Ubi, outros 14 homens se sentavam naquela mesa. "Sete, um a cada lado do líder" era o sistema deles, a crença era de quê sete era um número abençoado, e era necessário equilíbrio dos dois lados do líder.
Luke e Ubi caminharam até o cais, onde ficaram parados olhando para a água. Pessoas ao redor deles davam oi e sorriam para eles. O perigo em Ubi era esse: seu carisma. Ele era amado por ser calmo e tranquilo. Seu bom humor cativava a todos. Qualquer um ouviria uma pessoa dessa, e ele seria capaz de convencer a todos qualquer coisa, mesmo que parecesse coisa de outro mundo.
Ele era como Ninguém.
-Vamos lá, qual a sua ideia? -Ubi olhou para ele.
-Precisamos achar algo. Tem alguma coisa aqui no lago. Só precisamos encontrar. Talvez a maldição esteja em algum buraco, em algum animal, ou em alguma coisa que esteja no fundo.
-Acho que isso é idiotice. Se houvesse algo assim, teríamos visto.
-É. Talvez. Mas o quê custa uma nova olhada?
-Luke, por favor. Vamos ser racionais.
'Falou o cara que acredita em uma maldição imaginária."
-Vamos. Mas vamos tentar. Talvez o problema esteja lá. Precisamos vasculhar cada canto desse lago. E depois cada canto de Nargur.
-E aí?
-Isso vai levar um tempo, mas vamos descobrir a fonte da maldição. E aí...
-Destruímos?
-É.
-E se não funcionar?
-Aí a maldição não vai poder ser quebrada.
-Vamos fazer o possível, velho amigo.
-Vamos. Nós dois vamos quebrar a maldição de Nargur.