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Chapter 69 - Lágrimas na Neve, Parte Final: O Herói

Robert acordou. Ele não estava mais em um lugar que conhecia.

-O quê...? -Ele olhou em volta. O lugar parecia um hospital. -Onde eu...

-Olá. -Uma mulher disse a ele. Era uma enfermeira. -Encontraram você na beira de um rio congelado. Está bem.

-Estou. Quer dizer, quem me encontrou?

-A polícia. -Ela sorriu. -Robert Greyman, certo? Você vai ficar bem. Já é famoso. As autoridades não quiseram divulgar nada.

-Famoso? O quê? -Robert estava totalmente confuso. O quê faria dele famoso?

-Todo mundo conheceu a sua história. A emocionante história de um pai que fez tudo pela filha. Metade do país te ama, e uma parte te odeia. Eu pessoalmente sou sua fã.

Ela sorriu, e deu uma piscadinha para ele.

-Eu... Eu quero sair daqui.

-Desculpe, mas você ainda não recebeu alta. E a polícia não vai aceitar que você vá assim.

-Merda... -Ele suspirou. -Eu só quero morrer em paz.

-Pobrezinho, não fica assim. -A mulher entrou na sala e o abraço. Qualquer homem naquela época sonhava em receber atenção daquela forma de mulheres. Mas Robert queria morrer. -Você vai ficar bem. E livre.

-Pode me deixar sozinho um pouco?

-Claro. -Ela se virou e saiu. Ela fechou a cortina que estava em volta da cama. Parecia estar em uma sala lotada.

Robert suspirou. Agora ele teria que sumir dali o mais rápido o possível. Mas para onde? Ele deixou suas coisas para trás. E se voltasse buscar, seria visto. Famoso.

A angústia consumia Robert. Ele pensou em levantar e fugir. Mas e aí, o quê ele faria depois? Ele merecia, pois ele quem levou Linda para aquele lugar. Mesmo que todos tenham apoiado ele.

O quê é que ele faria a partir de agora? Ele morreria, viveria com quem ele tinha se tornado? Ele sentiu algo. Era uma mão rastejando por ele. Ele se levantou da cama rapidamente. A mão que se rastejava era uma sua, parte de seu poder.

A pequena mão caiu no chão. Ele se abaixou e olhou embaixo da cama. Não dava para se esconder ali. Ele saiu dali. Estava mesmo em uma ala enorme. Seu cabelo havia sido raspado em algum momento. Ele olhou em volta.

-Olá. -A enfermeira estava ali de volta. -Onde vai?

-Banheiro. Onde é? -Robert coçou a cabeça.

-Ali. -Ela apontou para uma direção.

Robert viu a porta com o sinal de toalete. Haviam três portas: Banheiro Masculino, Banheiro Feminino e um Banheiro PNE.

Robert foi até lá e entrou no PNE. Lá dentro havia uma janela pequena, e só cabia uma pessoa, diferente do feminino e masculino. A janela estava coberta por uma tela de proteção anti-mosquitos.

Uma das mãos se esticou e atravessou a janela, levando a tela junto. Outra surgiu, e limpou os cacos de vidro que ficaram no lugar da janela. Robert se segurou ali e saiu. Ele se viu pendurado na lateral de uma parede, e abaixo dele, uma descida que iria para o estacionamento subterrâneo. Uma mão surgiu, e Robert usou como corda para descer.

Ele chegou no estacionamento e correu para fora. Algumas pessoas estranharam aquilo, outras só desviaram.

-Mais um drogado fugindo. -Disse uma mulher que passava por ele.

Robert correu, correu e correu.

Ele se localizou, ainda estava em sua cidade natal, Torima. Ele continuou correndo, e se guiou por entre algumas ruelas e becos. Quando anoiteceu, ele chegou em casa. Lá dentro estava vazio. Ele pulou o muro e entrou.

Lá, ele comeu como um animal raivoso. Ele tomou banho, pegou algumas roupas, uma mochila de mudança, e saiu de casa, para nunca mais voltar. Ele pegou um ônibus para longe, e quando amanheceu, desceu em algum lugar que nem ele mesmo sabia onde era.

Ele dormiu em uma pousada, e continuou procurando um lugar ao longo do dia.

Enquanto andava, ele viu no jornal que um mutante estava atacando um lugar ali perto. Ele procurou por algum tempo, e encontrou. Ele viu uma cobra enorme, a parte de cima de seu corpo parecia uma mulher, com o rosto esticado e deformado.

Algumas pessoas corriam desesperadas. A rua estava interditada. Policiais tiravam as pessoas de lá. Robert se aproximou, e ouviu gritos de advertência de um policial. Robert estendeu a mão, e suas pequenas mãos atacaram a Cobra.

Ela se voltou contra ele, e investiu. Uma mão maior surgiu perto dele, e abaixou a cobra, a forçando contra o chão. A mão espremeu, junta de várias que foram surgindo. E logo, a Cobra morreu.

-Caralho! -Um policial gritou.

Robert se virou e foi embora enquanto as pessoas tentavam investigar. Os policiais tentaram alcançar ele, mas ele se misturou à multidão. Ele virou em um beco, e entrou. Do outro lado, ele percebeu que estava sendo seguido. Ele se virou, e encarou o enorme homem que o seguia.

-O quê você quer? -Robert perguntou.

-Quero te ajudar. -O homem sorriu. -Provável que aquele policial tenha te reconhecido. Você é bem famoso, Robert Greyman.

-Eu... Não sou o Robert.

-Ah, não? -O homem deu um alegre e caloroso sorriso. -Que bom. Isso mostra que você é como nós.

-Nós?

-É. Desculpe, não me apresentei. Meu nome é Ninguém. Eu deixei minha vida para trás, assim como você. Venha, vamos comer alguma coisa.

Ninguém carregava uma bolsa ao lado do corpo, assim como Robert. Os dois pararam em um café, e Ninguém pagou uma refeição completa para ambos.

-Você deixou sua vida? O quê quer dizer?

-Bem, acho que você sabe que a vida continua enquanto você está vivo. E você precisa seguir em frente.

-É. Pela minha filha, eu farei isso.

-O amor mais singelo que existe. -Ninguém sorriu. -Mesmo depois de tudo o quê aconteceu, você está pronto para se erguer de novo. Admirável.

-Agradeço. Mas o quê é que você quer?

-Quero aliados. Eu faço parte de uma organização maluca, que tem um objetivo mais maluco ainda.

-Ah, lá vem. Quê objetivo é esse?

-Bem, nós nos chamamos Gyazom, e lutamos para poder refazer o mundo.

-O quê!?

-É. Maluco, não acha? -Ele deu uma risada.

-Muito. Quem é o idiota que tentaria uma coisa dessas? Ninguém pode fazer isso!

Ninguém riu.

-Muito obrigado.

-Espera... Não, quero dizer... -Robert deu uma risada. -Mas que porra...

-Relaxa, cara. Sorri um pouco. A vida é um inferno mesmo.

-É. -Robert tomou um gole do café.

-Bem, nós temos sim um plano para colocar esse ideal maluco em prática. É meio extenso, mas eu posso resumir. Tudo isso começa com antigas profecias. Muitos e muitos videntes ao longo da história tiveram uma visão parecida. Nessa visão, um homem se erguia do horizonte, e ele era tão grande e tão poderoso que nada mais aconteceria quando ele se erguesse.

-Ah, um conto de fadas. E aí, o quê acontece? Você vai é esse homem?

-Não. Esse homem é uma ideia. Ele pode existir, mas é algo totalmente diferente, se for segundo a ideia da organização. Existe no mundo alguns objetos chamados de "Remanescentes". São pouquíssimos, mas eles possuem uma energia esquisita, uma energia única. Essa energia pode ser extraída e usada para despertar uma bênção única.

-Espera, como assim? De onde vem esses objetos?

-Dizem que eles vieram do início dos tempos. Mas a organização acredita que eles vieram do fim dos tempos, como um paradoxo. Nós temos alguns cientistas trabalhando nisso.

-Mas o quê é essa bênção?

-Bem, essa é a parte interessante. Ela seria um "Poder Supremo", capaz de reescrever o tempo e o espaço. Nós chamamos isso de "Fragmento da Onipotência". É um poder incrível, mas nós precisamos de aliados para ajudar a atingir esse poder.

-Sei, sei. Mas como eu sei que você está falando a verdade? Me parece só balela de um maluco.

-Sim, eu sei. Conhece o Projeto Saturno?

-Conhecer eu não conheço. Mas sei o quê é.

-Então, foi usado um catalisador assim para ativar a Máquina do Tempo deles.

-Espera, como você sabe disso?

-Eu disse, muitos cientistas na Gyazom. Alguns deles trabalharam no Projeto. Sabe que Saturno era o deus do Tempo, né? Bem, acreditaram que daria certo porquê o projeto Saturno era tão ambicioso que ele poderia ser criado diversas vezes no tempo.

-E aí...

-E aí deu errado. E o grande vazamento aconteceu logo enquanto tentavam uma segunda vez. Bem, eu conheço um cientista que está empenhado em refazer o projeto sozinho.

-Vocês sai malucos. É isso.

-É. Mas podemos pagar muito bem.

-O quê...? -Robert olhou para ele.

-Faça como eu. Deixe seu nome e sua vida. Você vai ser bem pago, vai poder viver sua vida sem acreditar no nosso ideal, só ajudando financeiramente a gente.

-Como vou ajudar e ser pago ao mesmo tempo?

-Comissões, amigo. Você vai ser mandado a uma equipe de mercenários, e vão fazer trabalhos que serão requisitados. Ou só matar mutantes e ser pago. É simples.

-Entendi. E aí vocês me matam quando eu decidir sair?

-Jamais. -Ninguém sorriu. -Temos um código de honra. Não matamos pessoas inocentes. Não roubamos, e jamais faremos mal para crianças. Te parece bom?

-Bom demais para ser verdade.

-É. Temos membros meio problemáticos, mas nós lidamos com eles de várias maneiras. Quando terminar, vamos dar uma volta.

-Pode ser...

Robert terminou de comer, e os dois saíram. Enquanto andavam na rua, Ninguém olhava em volta. Eles chegaram em uma praça. A luz da manhã iluminava a praça. Construir um novo Projeto Saturno...

-E aí, o quê me diz?

-Só tem uma coisa que não entendi. Como essa máquina vai funcionar? -Era idiota demais, mas era curioso.

-É complexo. Primeiro, precisamos de pessoas que sejam "sensitivas" porquê alguns videntes podem transformar pessoas em gente mais... Especial. Eles chamam isso de "Abrir os Canais do Tempo". É um encantamento que custa a vida do usuário e abençoa outras pessoas.

-E você quer ser abençoado. Certo?

-Não precisamos disso. Só precisamos de alguém que seja.

-Mas pra quê?

-Essa pessoa vai ser o receptáculo do projeto Saturno. Ela vai reescrever o tempo e desfazer a dor, o sofrimento e a angústia. Nós queremos um mundo livre.

-Ah. É bem...

-Utópico.

-Isso.

-Se encontrar essa pessoa, então pode fazer coisas incríveis. Mas também podem abusar do poder dela.

-Sim. Por isso, vamos reiniciar nossas vidas para que nunca saibamos disso na próxima realidade.

-Espera... Cara você é louco. Se fizer isso...

-Podemos criar um mundo melhor. Um mundo onde doenças e desgraça não exista. Um mundo onde sua filha está com você. Se não acreditar, tudo bem.

-Eu... Eu acredito...

Ele não acreditava. Mas queria. Talvez houvesse alguma esperança. Talvez houvesse algo que ele poderia fazer.

-Que bom. Sofrer nos faz crescer e aprender. Mas nós não estamos aqui para sofrer. As coisas pelas quais passamos nos fazem mais fortes, mas ainda assim, doem. E é entre sonhos e tragédias que arrastamos nossas vidas. Por isso acreditamos em uma nova vida, em uma nova jornada. Vamos lá, Robert. Deixe de ser quem você é agora, e escolha um nome para sua nova jornada.

-Eu... -Ele parou. -Quero ver minha filha outra vez. -Ele olhou para Ninguém. -Quero ser o herói dela uma outra vez. -O herói dela. Ele se lembrou dela no hospital. -Então eu quero ser como ele... Como o herói que ela lia nos quadrinhos.

"Olha, papai, esse é meu herói favorito! Ele salva muitas pessoas!"

Robert pegou e olhou a revista. O nome do herói estava estampado na capa, demonstrando sua grandeza e bondade. O herói que Linda tanto amava e admirava também estava ali demonstrando sua face de pureza, bondade e braveza. Aquele era o herói de Linda, aquele era Crash.