Havia começado a primeira missão do recém-formado esquadrão de exorcistas. Depois de uma noite em uma estalagem discreta no centro de Medellín, que era na verdade um reduto secreto de magos em trânsito entre a Academia e a Terra, o grupo seguiu viagem para o norte.
Ao fim de quase duas horas de estrada, passando pela metrópole e em seguida por áreas rurais montanhosas, era possível ver várias residências espalhadas ao longo de uma grande colina, bem próximo da rodovia.
— Chegamos. Vamos nos encontrar com a polícia local perto da delegacia. Sabe onde fica? — Klaus perguntou para o motorista do carro, um militar da Academia que tinha sido designado para ajudar no transporte equipe.
— Sei sim. — O homem respondeu. Por mais que o idioma espanhol fosse bem próximo ao português, os adolescentes que estavam sentados no banco de trás mal podiam acompanhar o diálogo.
Após saírem da via principal, o veículo entrou pelas ruas de pedra da comunidade local e estacionou ao lado do posto policial. Ao desembarcar, o sub-tenente e seu esquadrão foram recebidos pelo delegado da região, que forneceu detalhes sobre os desaparecimentos que ocorreram nas redondezas.
— Resumindo,o que sabemos até agora é que uma garota de treze anos sumiu semana passada. Parece que ela foi na floresta próxima e não voltou. Algumas pessoas deram relatos estranhos de que viram algumas luzes na mata, mas não encontramos nada. Há outros casos semelhantes nas outras vilas ao redor. — O agente relatou ao líder dos magos, que cruzou os braços e permaneceu em silêncio por alguns instantes.
— Tudo bem. Vou conferir novamente com os familiares dessa menina. Talvez eles tenham alguma informação a mais. Obrigado. — Assim que receberam os relatórios de investigação, os exorcistas foram visitar a residência da jovem perdida. Após uma pequena caminhada,o grupo finalmente fez contato com os parentes da desaparecida.
Todos foram calorosamente recebidos pela família de origem humilde, que tinha que dividir três cômodos do pequeno barraco com cinco pessoas, uma mãe, um pai, dois filhos pequenos e a filha mais velha, que era justamente a pessoa ausente.
Enquanto Klaus questionava os responsáveis da adolescente, o resto de seu time fazia companhia para as crianças. Vivian e Ana eram lidavam melhor com elas do que Ismael e Gabrielle, que assistiam as amigas se divertindo com os pequeninos.
— Nossa. Essas duas são muito boas com esse tipo de coisa. — O mago do ar comentou para a colega do seu lado, que somente assentiu. Entediada, Gabi decidiu dar uma volta ao redor da casa para explorar o local. Depois de andar um pouco próximo das árvores, seu pé pisou em algo escondido na grama.
Ao verificar o que era o objeto, descobriu uma boneca de pano, aparentemente feita a mão. Ela limpou um pouco da sujeira do brinquedo e então voltou para casa. Após entrar, a primeira pessoa que procurou foi Ana, que ainda estava ajudando a cuidar das crianças.
— Ana, olha o que eu achei. Será que é da irmã deles? — A garota disse, depois de tocar no ombro da amiga e a mostrar o que havia encontrado.
— Não sei. Mas imagino que sim. — Assim que recebeu a resposta da companheira, os meninos notaram a boneca nas mãos da soldado, e rapidamente se aglomeraram em volta dela.
— É a boneca da maninha! — Eles falaram, com os olhos brilhando de alegria. — Ela tinha sumido! Foi a mamãe que fez de presente pra irmã! Ela ia ficar tão feliz se tivesse aqui agora! — Mesmo com a barreira linguística, Gabrielle era capaz de entender o suficiente para saber o que os pequeninos diante dela estavam dizendo.
— Vocês vão buscar ela? A irmã vai voltar para casa? — A pergunta do irmão do meio a pegou de surpresa. Sua voz mostrava o quanto sentia falta dela.A maga sorriu, agachou e devolveu o brinquedo para o jovem antes de fazer um cafuné em sua cabeça.
— Sim. Vamos trazer ela de volta. — A exorcista replicou com o pouco de espanhol que podia falar, mas foi o suficiente para as crianças entenderem.
Com as informações novas obtidas pela família, a equipe obteve pistas mais exatas de por onde começar a procurar pelos criminosos. Do outro lado do morro onde estava a comunidade, ficava a mata densa que havia sido relatada mais cedo. Era uma floresta tropical que cobria grande parte da região.
— Não é atoa que não encontraram muita coisa. Aqui é uma selva. — Ismael comentou, enquanto vasculhava o lugar com um par de binóculos. Ele estava sentado numa árvore no topo da colina, e o resto do time se encontrava logo abaixo dele.
— Será que eles ainda sequer estão aqui? Quando foi a última vez que o time de investigação achou alguma coisa? — O garoto perguntou ao seu oficial, que estava lendo alguns relatórios.
— Anteontem de noite. Tinha sinais de presença humana em alguns locais suspeitos. Eles devem estar mais fundo na floresta, e não saem daqui por algum motivo. Por que?— O líder suspirou depois de responder a questão, e guardou seu tablet militar.
— Vamos aguardar o pôr do sol para começarmos nossa operação. Ismael, quando estiver escuro o bastante, voe sobre a selva. Mantenha o máximo de altitude possível e mantenha sua aura suprimida para evitar ser detectado. — Dentre os quatro prodígios, ele era aquele que possuía a melhor percepção e capacidade sensorial mágica. Ser o batedor do esquadrão era o trabalho ideal para o adolescente.
— Positivo. — Todos começaram a se preparar para prosseguir com a missão. Os militares vestiram seus uniformes e se equiparam. No momento em que o sol desapareceu entre as montanhas, o jovem decolou e começou a vasculhar toda a área verde.
Ao mesmo tempo, o resto da equipe se deslocou para o local onde estava o riacho no qual a menina perdida havia sido vista pela última vez. Como não encontraram nada fora do normal, continuaram a caminhar mais fundo na mata.
As luzes do dia deram lugar a sombra da noite, forçando os exorcistas a utilizarem seus óculos de visão noturna. O som de insetos e animais se misturava com o barulho feito pelo movimento dos arbustos pelo qual eles andavam.
— Aquela garotinha e os outros que desapareceram… todos tinham mais ou menos a mesma idade, entre onze e treze anos. — Vivian comentou, enquanto atravessava a grama alta.
— E eles eram magos recém despertados.Se estamos lidando com alquimistas, então pode ser que… — Ana, que estava ao seu lado parou sua fala, hesitando dizer o que havia se passado em sua mente.
— Já foram sacrificados. Provavelmente. — Klaus terminou a frase que fez sua unidade engolir o seco. Gabrielle permaneceu quieta, mas se recusava a acreditar nas palavras que escutou. Ela havia dito para as crianças que iria retornar com a irmã, e estava determinada a cumprir com o que disse.
— Alfa 1, aqui é Alfa 4. Na escuta ? — O comandante captou a comunicação via rádio de Ismael.
— Positivo. Proceda com a mensagem. — Ele respondeu.
— Avistei oito contatos suspeitos à um clique e meio ao noroeste de suas posições. Todos os indivíduos emanam aura mágica. Estão acampados na vegetação densa entre duas pequenas colinas, ao redor do que parece ser a entrada de uma caverna. — O batedor reportou ao subtenente.
— Tudo bem. Vá para o chão e nos aguarde na sua posição. Não entre em combate. — O líder respondeu, dando as próximas instruções.
— Roger. Desligo. — Ao fim da chamada, o homem se virou para o resto do esquadrão.
— Vamos fazer uma emboscada. Se eles não se renderem, atirem para matar. — Era algo difícil para as garotas escutarem. Por mais que agora fossem de fato soldadas, o que menos queriam era ter que puxar o gatilho. Porém sabiam que em algum momento, seria inevitável.
Após se deslocarem pela floresta e se reunirem com Ismael, os exorcistas chegaram no perímetro do acampamento, e enxergaram seis dos oito indivíduos vistos anteriormente. Os outros dois haviam entrado na caverna, que emanava uma sinistra energia mágica, que confirmou as suspeitas da equipe. Aquelas eram as pessoas que estavam procurando.
O esquadrão se preparou, se posicionando na parte alta do terreno e aguardando o sinal de Klaus para atacar.
— Ao final da minha contagem. 3...2...1, Avançar! — No mesmo instante, os cinco surgiram das sombras, caminhando rapidamente com seus rifles de assalto em mãos e apontados em direção ao inimigo.
— Parados! Todos no chão! No chão! — O subtenente bradou aos foras-da-lei, que se surpreenderam com a chegada dos soldados de uniformes negros. Um deles se levantou, e levou a mão à cintura. Era o gesto que indicava que estava prestes a tirar uma arma.
Antes mesmo que pudesse tirá-la, uma bala de 5,56 disparada do fuzil do soldado veterano perfurou seu crânio e o fez desabar no chão sem vida. Mesmo com um supressor, o som do tiro da arma e de um corpo caindo no chão foi o suficiente para aterrorizar os outros alquimistas, que se jogaram no chão, amedrontados.
A rápida reação decisão de acabar com a vida do meliante assim que ele demonstrou ser uma ameaça, era chocante para os novatos das forças especiais. Não houve o menor sinal de hesitação por parte do homem.
— Alfa 2 e Alfa 4, guardem a entrada para a caverna. Vou selar a magia desses aqui e vou acompanhar vocês lá dentro. Alfa 3 e Alfa 5 vigiam aqui fora. — Ele deu a ordem para Gabrielle e Ana, que seguiram até a entrada juntas. Na hora em que estavam prestes a entrar na gruta, um dos hostis emergiu da escada que descia o buraco, e foi imediatamente recebido com um chute na cabeça pela menina de pele escura. O golpe fez sua nuca bater contra a rocha sólida, nocauteando-o e o fazendo cair quase quatro metros de altura.
Depois que Klaus se reuniu com as duas exorcistas, eles continuaram seu caminho, seguindo por um corredor estreito, repleto de pedregulhos e iluminado por tochas, até que chegaram numa grande câmara dentro do morro.
— Meu Deus… — Gabrielle disse, vendo algo aterrador bem em sua frente. No meio daquele lugar, entre as grande estalactites estava uma espécie de estátua, com a forma de um ser demoníaco gigante, cercada por velas vermelhas e ossos humanos.
A imagem estava parcialmente enterrada no subsolo, somente com a parte superior do corpo exposta. O monstro, com um corpo humanóide extremamente musculoso e face masculina, sem cabelos, com chifres pontudos no lugar dos olhos e ouvidos que mais pareciam buracos dos dois lados de sua cabeça, erguia o enorme braço para cima, como se estivesse tentando subir para algum lugar.
E diante dele, estava uma pessoa com longas vestes negras, se virou ao notar na presença das duas soldados que entraram na caverna. Vendo o suspeito, o grupo rapidamente levantou suas armas.
— Parado!! Pro chão, agora!! — A maga de água gritou para o indivíduo misterioso. Na hora entendeu a situação em que se encontrava, ele reagiu, lançando de suas mãos uma enorme torrente de fogo que forçou Ana a erguer uma grossa parede de rochas com sua magia no último instante para não ser fulminada.
Quando o fogo cessou, a jovem desfez suas defesas para responder à altura, e se deparou com o inimigo,virado de costas para ela e com os braços levantados.O corpo dele emanava uma tenebrosa aura negra, que estava sendo absorvida pela estátua. Foi então que a estranha pessoa gritou, revelando sua voz feminina.
— Use minhas energias e desperte, meu lorde!!