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Chapter 3 - UM FINAL INFELIZ

Uma existência considerada comum e desprovida de grandes surpresas, pelo menos era assim que fui forçado a acreditar devido a todas as circunstâncias de minha vida. No entanto, tudo mudou há poucos minutos. Neste exato momento, sinto intensamente uma dor nas costas, mas o sofrimento vai além, afinal, não é todo dia que se tem uma surpresa desagradável, além de estar caído em um chão duro e frio de uma lojinha de conveniência. Até pouco tempo atrás, desfrutava de plena saúde em pé. Lembro de cada detalhe, e isso tudo foi um encontro inesperado. As lembranças se acendiam por toda minha memória. No entanto, nunca imaginaria que nosso reencontro ocorreria nessas circunstâncias. Pensei que minha vida não poderia ficar pior do que já estava indo, mas aqui está a resposta.

Minhas costas estão crivadas de buracos, feitos pelos tiros de um revólver calibre .38, as balas estão provavelmente alojadas lá dentro. O surpreendente é que continuo respirando, apesar de vários tiros atingirem minha medula espinhal e pulmão. Logicamente falando, uma pessoa deveria simplesmente morrer rapidamente com algo assim, ou ao menos perder a consciência. Mas aqui estou, agonizando feito um porco degolado com essa dor tremenda.

Contudo, o mais intrigante disso tudo é perceber que, além dos danos à minha medula espinhal, consigo sentir que alguns tiros perfuraram o meu pulmão. E também o sangue vazando rapidamente e formando uma poça nas minhas costas. Certamente, isso é uma hemorragia interna.

Mas isso ainda é bem infeliz e agonizante, será que não seria possível simplesmente morrer mais rápido? Esta situação é bem dolorosa e desconfortável. Será que minha sorte é tão ruim assim? Chego a sentir pena de mim mesmo... Eu já planejava morrer, só não imaginei que seria tão lentamente e agonizante assim, "WEEEEooowEEEooo". Por que diabos a polícia resolveu aparecer agora? É sério isso? Eu já estou praticamente morto!

Ah, como isso dói... Dói muito. Se eu pudesse descrever, diria que é como se tivesse sido perfurado por bolas de ferro incandescente, e também como se meus nervos ciáticos estivessem sendo puxados e arrancados do meu corpo. Na verdade, é um pouco mais agudo, como ter os tendões completamente rompidos.

Droga, minha visão está começando a ficar borrada... O que é aquele negócio preto no teto? Fuligem? Não... está parecendo mais com poeira? Isso é estranho... espera aí, a sujeira está se transformando em tentáculos? Que diabos é isso? Estou alucinando já?

Isso só pode estar acontecendo porque estou prestes a morrer, certo? Sim. . . Sim, com toda certeza deve ser isso mesmo. . . enfim, não há mais nada que eu possa fazer quanto a isso. Acho que não vou poder voltar para casa hoje... Mas isso me deixa um pouco triste, não coloquei comida nova para o meu cachorro, espero que alguém adote ele e cuide bem dele; no final, ele era minha única companhia, mas também não me arrependo de nada. Pelo menos poderei ter o descanso que tanto procurava.

Naquele breve intervalo, o ar parecia congelado, o tempo estagnado, como se tivesse desacelerado. O ambiente se comportava como se cada segundo equivalesse há horas. Com aquela estranha fuligem crescendo no teto e lentamente se aproximando. Os tentáculos daquilo se expandiam. . . Enquanto a chuva formava uma melodia dramática no telhado. Surpreendentemente, a sinfonia formada, apesar de tudo, acalmava meus músculos e me confortava. Mesmo envolto em dor, era quase como ser abraçado com ternura por algo.

À medida que o pouco brilho restante em meus olhos se desvanecia, eles se tornavam opacos. Meus lábios, agora completamente brancos e feridos, não respondiam mais aos sinais do meu cérebro, já privado de oxigênio.

Meus batimentos cardíacos desaceleraram até se tornarem insuficientes. Minha mente divagava em um turbilhão de memórias e momentos. Prestes a fechar os olhos, aquela criatura com tentáculos que se aproximava de meu corpo se abriu, pronta para engolir tudo.

Enquanto ela se estendia para envolver completamente meu corpo, os pensamentos antes confusos começaram a formar uma linha contínua com as lembranças que passavam pela minha cabeça.

Formando um filme da minha vida, desde o nascimento até este momento, eu vi e revi minha própria vida várias e várias vezes, assim pude claramente identificar os principais responsáveis por todas as desgraças que me assolaram. . . Foram eles que me conduziram a essa condição detestável. Isso seria o tal do Carma, não é? Hahahahah, chega a ser meio patético. Se isso for o tal do carma, talvez alguma ação passada minha tenha enfurecido a Deus, ou seja, lá o que for.

A ideia de morrer de forma tão patética chega a soar como uma piada sem graça. Essas pessoas que um dia se declararam como meus companheiros... Fui ingênuo, deveria ter percebido desde o início que não havia companheirismo. Ainda assim, me pergunto como nunca percebi isso antes? Fui completamente idiota, jamais imaginei naquela época que isso poderia acontecer.

Hahahahaha! Não bastou me trair, não é? Vocês precisavam de mais, seus desgraçados! No final, até minha morte, vocês me tiraram. Nada disso importou vocês, covardes de merda, como puderam me matar sem permitir que ao menos pudesse expressar meu repúdio e nojo por vocês. Eu já esperava acabar assim em algum momento... Mas, por quê? Por quê? tinha que ser vocês a me darem esse fim.

Mesmo agora, sendo o meu fim, não consigo me libertar disso. Por quê? Por que isso dói tanto, mesmo agora sendo uma casca vazia? Por que essas coisas aconteceram comigo? Por que estou perturbado com isso? Só quero que acabe de uma vez por todas! Mas ainda sinto medo, agonia e dor, lembrando-me da vida que já tive um dia. Isso não me permite encontrar paz de forma alguma. . . Mas acho que sei o que é isso; eu não queria morrer, na verdade, queria ser feliz novamente.

"Maldição! Como queria poder acabar com vocês! Droga! Desgraçada, maldita! Confiei em você... e é assim que você me retribuiu?"

"Acreditei no seu amor. Você era a única pessoa em quem confiava. Mesmo assim, você destruiu minha vida. O que fiz para você me detestar tanto?"

Foi tudo que consegui murchar em meu consciente; se eu tivesse voz, talvez fosse o que teria gritado até minha garganta se desfazer em pedaços.

Ah, droga! Agora é tarde... Se tivesse entendido tudo antes, talvez pudesse ter feito algo para alterar esse destino de merda.

Não, se parar para analisar, tudo acontece porque tinha que acontecer, é aquele ditado: "cada um colhe o que planta, não é? deve ser algo desse tipo"

Bom, se as coisas são realmente assim, não teria o direito de querer mudar nada. Eu queria me aprofundar nessa doutrina, pois assim eu poderia ao menos possuir uma resposta para tudo isso que ela fez comigo. No fim, não importava como visse tudo aquilo, tudo que conseguia raciocinar era "qual foi o meu pecado?" Isso me corroía interiormente, como se eu fosse o errado da história toda ainda.

No fim, já sabia que não era isso. Coisas desse gênero acontecem com frequência em todos os lugares por aí, constantemente. Esse tipo de situação é fruto do sentimento de poder, algo que infelizmente reside em nós humanos. E não algo que fiz para cair sobre mim mesmo. Com isso em mente, só podia cogitar as piores coisas e nelas podia ter orgulho... E me vangloriar de toda minha alma por lutar contra isso.

Lamentando-me por tudo o que aconteceu nesse dia chuvoso, fui perdendo lentamente minha vida conforme a morte vinha me dar o beijo de boa noite. Não demorou muito para que meus batimentos cessassem, testemunhando assim o fim da pequena e modesta vida que tive, arruinada por aquela pessoa que um dia amei.

Assim, me lamentando tanto pela traição e pela forma como morri, tive meu fim como um pobre miserável.

Logo após minha morte, não conseguia ver nada. Só escutava um ritmo que me guiava para um lugar desconhecido. Minha mente estava confusa, afinal, eu estava morto. Cheguei a pensar:

"Isso é bem esquisito. Não sinto meu corpo, mas algo está me guiando. Hum! Para onde isso vai me levar?"

"Sempre tive curiosidade de saber como era o pós-vida, mas não parecia ser muito agradável... Parece mais com o inferno, embora não esperasse chegar a um céu. Cheguei a um ponto onde o pior para mim seria somente uma base!"

Pensando sobre minha localização, uma sensação de leveza atingiu meus olhos e então consegui abri-los um pouco mais, avaliando uma fração do lugar em que estava. Contudo, minha visão ainda parecia turva.

O cenário era de uma ruína estranha, era semelhante a um coliseu romano antigo, e nele havia estátuas enormes, nem palavras teria para descrever o quão grandioso era tudo aquilo, em específico havia uma estátua que me fisgou toda atenção era a estatua de uma mulher ainda maior que as outras que por si só já eram enormes, ela segurava um livro em suas mãos, aparentemente lembrava uma espécie de grimório ou algo parecido.

Tendo isso em vista, pude deduzir que se tratavam de algo relacionado à feitiçaria.

Observei por um curto período, mas não compreendia qual era o sentido daquilo estar em um lugar tão vazio e tenebroso como aquele. Então andei pelo coliseu e um tempo se passou, outra questão me impedia de permanecer em silêncio. . . Eu estava me perguntando.

"Como diabos vim parar aqui? e também achava que o inferno fosse algo mais selvagem, tipo uma torrente de magma incandescente, estruturas grandes e complexas feitas com carne podre e musgo, cheirando a enxofre e tudo de ruim que se pode imaginar."

Resmungando em meus pensamentos, percebi uma garota de fisionomia bem franzina, com belos cabelos loiros e olhos verdes, aparecer à minha frente e se aproximar. Ela usava uma cartola e vestia um vestido no estilo da moda vitoriana, ela tinha um estranho habito de cutucar os dentes com um palito comprido que carregava. Pelos traços de seu rosto, eu diria que ela definitivamente era bonita a ponto de ser surreal. A garota que havia acabado de aparecer estalou os dedos e toda a paisagem enevoada desapareceu, restando somente um escuro como se ali fosse um vazio completo.

Fiquei hesitante por um momento, mas tomei coragem e perguntei à garota:

- Ei, garota, você sabe onde estamos? Estou meio perdido, pode me ajudar aqui? - A garota me olhou de cima a baixo, aproximando-se sem expressar nada.

Instintivamente, dei um passo para trás, não por medo, mas por impulso. . . acho que muitos nessa situação teriam ficado completamente chocados, era incrível que ainda tivesse tanta calma.

Na verdade, penso que tanto eu quanto essa garota estamos mortos. Tomei dezenas de tiros; duvido que ainda esteja vivo após isso, mas é sempre bom ser cauteloso.

- Oh, garota, você pode me dizer onde estamos? Não faço ideia do que está acontecendo ou como vim parar aqui. - Questionei novamente.

A garota se aproximou mais ainda até estar frente a frente comigo, e então olhou fixamente em meus olhos. Ela então passou as mãos em meu rosto com muita ternura e carinho, logo depois cutucando minhas bochechas e dando pequenos tapinhas, mas ela retornou seu olhar para meus olhos e então disse:

- Hum, seu rosto é bem atraente, garoto. Sinto até vontade de cortá-lo todinho para guardar comigo... Mas me diz então, você é o que chamam de humano, certo? Como veio parar aqui? Humanos normalmente nunca aparecem por aqui, afinal é totalmente impossível que criaturas da Subesfera consigam vir a este plano. - Ela especulou, mantendo seu olhar nos meus.

Respondi imediatamente:

- Acho que não seria muito agradável para mim se você cortasse o meu rosto, tipo, não faça isso com ninguém, na verdade... Mas vou relevar e te perdoar! Olha, garota, sendo bem sincero, não faço ideia do porquê vim parar aqui. Minha mente está uma desordem total. As únicas coisas de que me recordo com transparência é que, de alguma forma, meio que fui assassinado. Fui baleado pelas costas e morri! - Expliquei para a garotinha, que com um estalar de dedo fez aparecer duas xícaras de chá e um bolo.

- Humm... entendo. Você tem muita sorte, devo dizer. Esse lugar em que estamos é outro plano de existência, bem diferente da subesfera. Este lugar é o próprio vazio. Para você ter chegado aqui, você teria que ter passado por todas as camadas de existência da subesfera, sabe por que isso soa tão absurdo assim para uma criatura como você? a subesfera é dividida em camadas, e elas são em ordem crescente, as mais altas são completamente inacessíveis para as criaturas que residem em camadas inferiores e assim por diante. Acontece que as camadas de existência da subesfera são infinitas. . . entendeu? para você chegar aqui, você teve que se tornar externo à própria subesfera e isso deveria ser impossível para você e qualquer ser da subesfera. ! - Ela disse, servindo chá para mim e para ela.

- Quanto ao "como", não vou saber dizer. Mas você quebrou um tabu total. Isso permitiu que você viesse a este plano, algo que não era para você ter feito! De certa forma, de maneira mais leve, você fez uma trapalhada atemporal. Você fez algo inviável, totalmente impossível, totalmente irreal. No entanto, foi graças a essa trapalhada que seu espírito saiu inteiro. Agora, nesse momento, se você não tivesse tido tanta sorte, era para seu espírito ter deixado de existir. Não sei como, mas você conseguiu. mas isso levanta muitas questões... como falei, é simplesmente impossível, mesmo sorte não teria feito isso, alguma força externa está agindo sobre você e provavelmente é algo absurdamente descomunal. pois nem posso identificar o que de fato é isso. - Ela disse, parecendo espantada e um pouco desconcertada.

- Tecnicamente, seu espírito deveria ter sido desfragmentado completamente quando você tentasse acender a uma camada superior. No termo mais correto, sua alma iria virar partículas espirituais e seria absorvida pela força maior do mundo. Seria quase como se você fosse triturado até virar pó... Pois, para passar de uma única camada para a outra superior, é impossível, pois o valor de existência seria zerado completamente se você pudesse subir para uma camada acima e você iria ser apagado da realidade ao nível do que a própria ideia que lhe representa deixaria de existir. Não consigo acreditar, mas é surpreendente como você está inteiro. Isso tudo não é brincadeira, e você ainda assim atravessou sem sofrer nenhuma deterioração no seu espírito! - Ela continuou, coçando a extremidade da cabeça, como se quisesse contestar algo.

A garota, antes que eu pudesse argumentar algo, tomou a frente e voltou a exclamar:

- Sabe, estou aqui há um tempo indefinido já. Em todo o tempo que estive aqui, nunca vi nada semelhante ao que aconteceu com você. Eu sinceramente tenho grande curiosidade em estudar você! - Exclamou a garota com um sorriso meio macabro, visivelmente inquieta.

Ao olhar para o rosto da garota, que parecia muito estranha, pensei:

"Será que ela está falando sério sobre aquilo de dissecar? Espero que seja só uma brincadeirinha!"

- Desculpe, mas só permito moças mais velhas e bonitas mexerem em meu corpinho. Mesmo estando morto, não gosto muito da ideia de uma garotinha mexendo no meu espírito. Além disso, você ainda tem mais coisas a me explicar. O que de fato é um guardião espiritual? - Indaguei.

- Nossa, é realmente uma pena. Só pretendia ver se encontraria algo que explicasse você ter atravessado a dimensão da destruição além da suposição de uma força externa. Mas está certo, responderei sua pergunta! - Alegou a garota.

- Guardiões são uma forma de vida semi espiritual. Somos basicamente espíritos encarregados de inibir ameaças espirituais e administrar a parte espiritual de tudo. Por isso, os espíritos ancestrais nos transformaram em uma existência diretamente interligada com o ciclo espiritual. Nossa função é estabilizar as partículas espirituais e manter ordem.

- Ah, e sobre a dissecção, era só uma piada! Não leve a sério, ainda não estou entediada o suficiente para começar uma carreira de açougueira do além! - Acrescentou, tentando dar um toque de humor.

- Sobre esse lugar em específico, esse coliseu e tudo, essa é minha dimensão... Não há abundantemente o que se dizer! ela foi criada por um dos guardiães ancestrais, chamado Cronosartus. Essa dimensão é um lugar apelidado de espaço da autoridade retrava. Segundo as regras que temos que acatar, diz que se uma criatura fugisse à ordem, deveria ser enviada de volta à mesma camada da subesfera da qual a mesma saiu. Como você já morreu, só poderia te reencarnar em algum dos mundos na camada de onde você veio! - Exclamou a garota, que fazia movimentos estranhos enquanto sentava em uma espécie de nuvem que a pouco havia aparecido perto dela.

- Bom, é literalmente como dar um tiro no escuro, você pode acabar reencarnando em um mundo muito hostil ou em um mundo muito legal, não há como definir. de mesmo modo, as próprias leis da física seriam diferentes, seria como jogar um dado para ver a sorte, até porque existem infinitos mundos na camada de onde você partiu! - explicou a garota, sentada sobre a nuvem.

- Hahahaha... Olha, isso tudo parece loucura, absurdo... e completamente irreal, mas é evidente que não é, afinal estou morto, se fosse uma pessoa normal aqui, a essa altura já teria surtado com todas essas informações, você deveria pegar mais leve afinal sou só um homem de 25 anos com um cérebro limitado... - afirmei rindo.

foi então que voltei minha atenção à garota e perguntei:

- Pensando bem, você disse algo sobre me dissecar? Certo? - questionei a garota.

- Realmente, né? Mas, ora, você disse preferir mulheres mais velhas e bonitas, né? Veja bem, posso deixar meu corpo tão perfeito quanto você imagina, e até sou mais velha que você, tenho muito mais do que 20.000 anos. Que tal somente uma checagem no seu "corpinho" sem cortes, prometo! hahahahah! Mas sendo franca, seria bom conversar com você um pouco... estou só aqui há tanto tempo - replicou a garota, rindo bastante enquanto zombava de mim, mas com seriedade em suas últimas palavras.

Vendo a cena chocante de como ela havia saído de uma garotinha comum para uma piadista, pensei:

"Caramba, ela acha que sou tão superficial assim... bom, o humor dela não é tão ruim, acho que mereci essa provocação!"

- Tá bom, aceito, vou conversar com você um pouco! após conversar com você, vou ser reencarnado, não é? - transmiti olhando para a garota.

- Sim, sim, sim! - respondeu à garota com os olhos brilhando, como se ela tivesse ganhado algo preciso com isso.

Após isso, ela me levou a uma espécie de plataforma flutuante.

A garota me serviu biscoitos para acompanhar o chá... E então a contei sobre minha vida passada.

Conversamos por um grande tempo, mas havia chegado a hora de reencarnar. A garota parecia grandemente triste com a despedida, eu também de certa forma me senti desconfortável, era como se tivéssemos formado uma amizade de boteco e outra coisa me chamava bastante atenção.

Não importava como a olhasse, era impossível acreditar que aquela garota era uma guardiã com mais de 20.000 anos. Recusava-me a aceitar essa ideia absurda; para mim, ela parecia ter apenas os seus 16 a 17 anos em termos de aparência e porte físico, exceto por uma mentalidade um pouco mais madura em alguns pontos.

Hesitante, me preparei para reencarnar. A garota estendeu as mãos para o alto e uma tempestade colossal surgiu, com tons de carmesim e purpura, abrindo rachaduras no chão e balançando toda a plataforma. Era possível ver todo aquele espaço vazio, estava repleto de das duas cores que se juntavam em um único ponto.

Um portal nebuloso imenso apareceu no alto da nossa frente, a pressão daquilo era enorme.

A garota, então com a outra mão, me fez levitar e me levou adiante do portal. Visivelmente, ela estava ficando enfraquecida, quando olhou para mim e exclamou:

- Vai rápido! Abrir uma fenda nesta dimensão consome muito de mim. Se demorar, vou ficar exausta e a fenda fechará. Você terá que esperar pelo menos 500.000 anos até recuperar minha energia novamente! - gritou ela, sustentando o portal aberto.

Me apressei em direção ao portal, mas antes de entrar, virei-me e perguntei:

- Ei, garota, qual é o seu nome? Você pode dizer para mim? mesmo que eu não vá lembrá-lo, deixe-me guardá-lo em meu espírito! -

A garota dirigiu seu olhar para mim, e em seu rosto surgiu um sorriso esplêndido, repleto de uma alegria genuína. Ela então compartilhou:

- Guardiões não possuem nomes, mas antes de me tornar uma guardiã e ser enviada para cá, costumavam me chamar de Mary Bell! -

Curiosa, ela perguntou:

- E você, qual é o seu nome? -

Respondi com um sorriso caloroso em troca:

- Bem, pelo que me lembro, meu nome é Kendrick. Mas, já que nos conhecemos, agora você pode me chamar de Kendri, e, aliás, você pode ter mais de 20.000 anos, mas para mim você ainda parece exatamente como uma pirralha hahahaha!

Concentrando-me no portal, entrei nele e exclamei:

- Então, seu nome é Mary Bell, né, pirralha... Se nos encontrarmos novamente algum dia, espero poder tomar outro chá contigo e trocar mais conversas como essa. Até mais, Mary Bell! -

Antes de desaparecer completamente no portal, olhei nos olhos dela e adicionei com sinceridade:

- E obrigado por compartilhar um pedaço do seu tempo comigo. Isso significou mais do que você imagina. Nunca me senti tão bem como me senti ao seu lado, Mary Bell. Até mais, e espero que nossos caminhos se cruzem novamente.

Então, contemplando o portal, adentrei nele em um salto. Logo após, fui teletransportado para uma espécie de espaço, repleto de falhas dimensionais, e abaixo, um gigantesco buraco que me sugou imediatamente. Após esse evento, fiquei momentaneamente desacordado. Contudo, contando minuto a minuto em minha consciência, percebi que vários meses haviam se passado. Senti uma pulsação quente e úmida, seguida por um grande frio e desconforto. Quando recuperei a consciência, estava em uma sala peculiar, totalmente medieval, com uma janela iluminando intensamente.

Ao meu redor, identifiquei três pessoas, embora minha visão estivesse prejudicada e meus membros imóveis. Diante disso, recordei-me da minha reencarnação neste mundo. Mesmo com a visão turva, deduzi que dois dos três que me cercavam eram provavelmente meus pais nesta nova vida.

"Realmente ganhei uma segunda chance, não é? Sou sortudo, devo dizer? Posso viver uma vida digna aqui, talvez? Posso ter uma família aqui? Posso ser feliz aqui?" questionava-me interiormente.

No fundo, eu estava confuso; mesmo após tudo, não conseguia acreditar. No meio dessa confusão de pensamentos, algo aconteceu.

Minha cabeça começou a latejar, minhas memórias foram se desfragmentando, até que não consegui me lembrar quase nada sobre minha vida passada. As únicas memórias que restaram foram sobre alguns aspectos básicos e também sobre Mary Bell e minha reencarnação.

Motivado a ser uma pessoa bem-sucedida, iniciei minha jornada nesse outro mundo, determinado a pisar na vida da mesma forma como ela pisou em mim, e alcançar felicidade mais uma vez.