O relógio de parede no hospital girava lentamente, preenchendo o silêncio com seu tique-taque ritmado.
Tic. Tic. Tic. Tic... Tac.
O som insistente ecoava pela sala de descanso dos médicos, enquanto Mabel ajustava os cabelos castanhos no espelho do armário metálico. O cansaço marcava seu rosto, com as olheiras suavemente arroxeadas denunciando as longas horas de plantão.
— Respire... só respire... — murmurou para si mesma, prendendo o cabelo em um rabo de cavalo firme.
Seus olhos vagaram até o calendário pendurado ao lado. Um círculo vermelho destacava o dia atual: 25 de dezembro.
"Mais um Natal sozinha."
Há anos, essa data perdera o significado para Mabel. Desde a morte dos pais em um acidente de carro na véspera de Natal, a magia dessa época se desfez, dando lugar a uma rotina de trabalho incessante e solidão disfarçada de dedicação profissional.
— Apenas um dia comum... — repetiu, com a voz trêmula.
Fechou a porta do armário com mais força do que pretendia e saiu da sala. Pelos corredores do hospital, o ar carregava um leve aroma de pinheiro artificial e chocolate quente, uma tentativa da equipe de tornar o ambiente mais acolhedor. Pequenas guirlandas pendiam das portas, mas Mabel desviou o olhar, fingindo não perceber.
Ao passar pela recepção da ala pediátrica, ouviu risadas infantis vindas do corredor e sentiu um aperto no peito. Crianças internadas ainda encontravam motivos para sorrir.
— Dra. Mabel! — chamou uma voz familiar.
Ela se virou e encontrou Molly, uma enfermeira de cabelos grisalhos e olhar gentil.
— Vai passar o Natal aqui de novo? — perguntou Molly, com um semblante misto de compaixão e reprovação.
— Alguém precisa trabalhar, não é? — Mabel tentou sorrir, mas a expressão não alcançou os olhos.
— Querida, Natal não é só uma data... é esperança. — Molly suspirou. — Venha à pediatria mais tarde. As crianças escreveram cartas para o Papai Noel. Uma delas vai tocar o seu coração.
— Vou pensar — respondeu, antes de seguir adiante.
O som do relógio voltou a ressoar no corredor silencioso.
Tic. Tic. Tic. Tic... Tac.
No Quarto 304.
Sofia segurava uma caneta roxa com firmeza, os pequenos dedos contornando as palavras no papel. Tinha apenas sete anos, mas a maturidade em seu olhar castanho revelava que conhecia a fragilidade da própria vida.
O ursinho Cheese, com sua pelagem já desgastada, descansava ao seu lado na cama do hospital.
— Pronto, Cheese! — exclamou com um sorriso cansado. — Acho que o Papai Noel vai entender.
A carta estava assim:
"Querido Papai Noel.
Eu sei que fui uma boa menina este ano. Tomei todos os meus remédios, mesmo os amargos, e não chorei quando precisei tomar injeção. A tia Molly disse que sou muito corajosa!
Este ano, não quero brinquedos ou doces. Meu pedido é sobre meu pai.
Ele é o melhor pai do mundo, mas está muito triste. Eu sei que ele finge sorrir, mas, no fundo, está com medo de me perder. Então, Papai Noel, eu gostaria que o senhor mandasse um anjinho para cuidar dele depois que eu for embora. Alguém que o faça sorrir e que o ame tanto quanto eu amo.
Eu sei que o senhor pode fazer isso. O Natal é mágico, não é?
Obrigada, com amor,
Sofia."
Sofia suspirou, dobrando cuidadosamente a folha.
Nesse momento, Molly entrou no quarto com um pequeno gorro vermelho nas mãos.
— Olá, princesa! — saudou a enfermeira. — Posso ver sua cartinha?
— Claro! — Sofia estendeu o papel. — O que acha, tia Molly?
Molly leu cada linha com o coração apertado. As lágrimas ameaçaram escapar, mas ela respirou fundo.
— É o pedido mais lindo que já vi.
— Papai Noel vai atender, né? — perguntou Sofia, com esperança.
— Tenho certeza que sim, querida. Os pedidos feitos com o coração são os que ele mais gosta.
Sofia sorriu, abraçando seu ursinho.
— Obrigada, tia Molly. Agora posso dormir tranquila.
Molly acariciou os cabelos da menina, depositando um beijo suave na testa dela. Quando saiu do quarto, encostou-se à porta, permitindo que as lágrimas finalmente caíssem.
— Por favor, Papai Noel... atenda esse pedido... — sussurrou.
Mabel caminhava pelo corredor, checando os prontuários pendurados nas portas. Quando chegou ao quarto 304, viu a enfermeira Molly enxugando os olhos.
— Está tudo bem? — perguntou.
Molly endireitou-se rapidamente.
— Sim... é que... Sofia acabou de escrever uma carta que você precisa ler.
Mabel ergueu as sobrancelhas, intrigada.
— Posso entrar?
— Claro.
Mabel empurrou a porta devagar. No centro do quarto, Sofia dormia abraçada ao ursinho. O rosto angelical descansava sobre o travesseiro com estampas de flocos de neve. Sobre a mesa de cabeceira, estava a carta dobrada.
A médica pegou o papel e leu cada palavra.
Seu coração acelerou. Os olhos arderam.
Aquelas linhas não eram um pedido qualquer. Era um chamado. Uma súplica inocente.
Quando terminou a leitura, Mabel olhou para Sofia e, pela primeira vez em anos, sentiu o Natal reacender uma centelha em seu peito.
E, do lado de fora, a neve começou a cair suavemente, como se o destino conspirasse a favor daquele desejo.
Tic. Tic. Tic. Tic... Tac.
A magia estava apenas começando.
Continua.