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Chapter 4 - O Sussurrar da Magia

O som ritmado da chuva tamborilava contra os vitrais antigos, cada gota escorrendo como se desenhasse caminhos secretos pela superfície colorida do vidro. No interior da sala iluminada pelo brilho trêmulo da lareira, o cheiro amadeirado das toras queimando misturava-se ao aroma levemente adocicado dos incensos que dançavam no ar. O estalar das chamas criava uma melodia íntima, mas nada disso conseguia acalmar o turbilhão dentro de Lya.

Embora Aerya tenha uma aparência de paz e harmonia, uma nação sem fome ou pobreza, suas relações internas são complexas. O território de Aerya é marcado por vastas florestas, montanhas isoladas e cidades fortificadas. Cada cidade é protegida por uma aura mágica, mantendo a nação segura, mas também desconfiada das influências externas.

Ela sentia-se deslocada, como uma peça fora do tabuleiro, uma sombra tentando se ajustar a um cenário que não lhe pertencia, sempre se sentira assim, era uma das razões de viajar tanto, como estivesse a procura do seu lar.

Desde que chegara àquela cidade envolta em mistérios, uma vibração quase imperceptível, como um arrepio constante na pele, sussurrava-lhe segredos que ela não conseguia decifrar, uma energia inquietante parecia chamá-la, algo sutil e invisível, mas que percorria sua pele como um sussurro indecifravél. As ruas de paralelepípedos, os edifícios ancestrais de pedra escura, as lanternas mágicas que pairavam no ar... tudo carregava um magnetismo inexplicável, como se a cidade falasse uma língua antiga que apenas parte dela entendia, — "Mas como consigo compreender?" — se questionou em pensamento, uma de vários mistérios que lhe assombravam a mente.

A porta rangeu ao se abrir e Eren entrou, trazendo consigo um vestido cuidadosamente dobrado sobre o braço. Os seus olhos cinzentos brilharam com um divertimento contido enquanto se encostava ao umbral.

— O Conselho quer ver-te. Mas não te podem receber assim, vestida como uma viajante perdida.

Ele aproximou-se e estendeu-lhe o traje. O tecido era de um azul profundo, bordado com fios prateados que pareciam captar e refletir a luz do fogo. Era leve como a brisa da noite e macio ao toque, deslizando entre os seus dedos como seda encantada. As mangas longas esvoaçavam suavemente, e um cinto trancado com pequenas pedras brilhantes ajustava-se ao redor da cintura. Lya passou a mão pela textura delicada e sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha. Aquilo fora feito para ela.

Vestiu-se em silêncio, o tecido assentando sobre a sua pele como se sempre lhe tivesse pertencido. Ao olhar-se no espelho de moldura prateada, reconheceu-se, mas ao mesmo tempo, viu uma nova versão de si mesma. Alguém que pertencia a esse mundo.

— Nada mal, hã? — comentou Eren, inclinando-se para observá-la com um sorriso malandro. — Vais impressioná-los.

Lya hesitou, mas a verdade era que as perguntas cresciam dentro dela, sufocando qualquer relutância.

Eren observou-a com um brilho divertido nos olhos.

— Acho que nunca te vi tão bem vestida.

Lya revirou os olhos, mas sentiu um calor inesperado no rosto. O vestido não era apenas bonito; era perfeito no corpo dela, realçava lhe a beleza de forma elegante e sensual, fez lhe sentir bonita e confiante, como se acabara de vestir um escudo, por mais irracional que poça parecer, mas os sentimentos são de facto irracionais.

Seguindo ao lado de Eren, atravessaram as ruas empedradas até a imponente Torre do Éter, um monumento de pedra negra que se erguia como um guardião silencioso no coração da cidade. Estátuas de antigos feiticeiros flanqueavam a entrada, figuras esculpidas com expressões de sabedoria e severidade, seus olhos de pedra parecendo seguir cada passo dos visitantes.

Lá dentro, o ar era denso e solene, impregnado por uma magia antiga que se entrelaçava ao próprio ambiente. O salão do Conselho era vasto, de teto abobadado, onde constelações mágicas brilhavam fracamente como se fossem pedaços de céu aprisionados. O murmúrio baixo das tochas encantadas e o roçar das vestes longas dos feiticeiros preenchiam o espaço.

Sentados em cadeiras de madeira entalhada, os membros do Conselho observavam a recém-chegada. Seus olhares eram frios e inquisitivos, como se tentassem enxergar além da superfície. Entre eles, Arwen mantinha a postura rígida de sempre, os traços impassíveis, mas seus olhos brilhavam com um interesse cauteloso.

— Eis a estrangeira de quem falamos, — anunciou Eren, sua voz ecoando com uma solenidade incomum no vasto salão. — Queremos saber se há… algo nela.

Um dos anciãos, uma figura de barba prateada e manto azul-escuro, aproximou-se lentamente. Em suas mãos, repousava um objeto peculiar: um orbe cristalino, cercado por runas douradas que pulsavam como se tivessem vida própria.

— Este é o Olho de Ithar, — disse ele, a voz grave ressoando no salão. — Ele revela a verdadeira essência de quem o toca.

O cristal foi estendido a Lya. Seu coração martelava no peito enquanto suas mãos trêmulas se fechavam ao redor do objeto frio e liso. No início, nada aconteceu. Mas, então, um clarão de luz irrompeu do orbe, projetando símbolos arcanos pelo ar. O salão se encheu de murmúrios surpresos enquanto as runas brilhavam ao redor de Lya, girando numa espiral dourada que a envolvia completamente.

Arwen estreitou os olhos.

— Ela... é uma feiticeira. — Arwen fingiu estar surpreendida, pois não deseja revelar tudo o que sabe. Nem todos do concelho são confiáveis e Arwen não pode por Lya em mais perigo.

O chão pareceu desaparecer sob os pés de Lya. O que aquilo significava? Como podia ser? Sua mente fervilhava com perguntas, mas a verdade se impunha diante dela com uma clareza assustadora: a energia que sentia desde que chegara não vinha de algo externo, de um artefato encantado ou de um feitiço alheio. Ela vinha dela mesma.

Eren deu um passo à frente, a surpresa ainda estampada em seu rosto.

— Lya... tu és uma de nós.

O impacto das palavras reverberou dentro dela, como uma peça de um quebra-cabeça encaixando-se no lugar certo. O sentimento de deslocamento, a sensação de ser uma estrangeira... tudo isso começou a se dissolver. Ela não era uma estranha naquele mundo.

Ela era parte dele.