Fabio Narrando
As luzes estavam baixas, e o som de risadas preenchia o quarto abafado, que cheirava a perfume barato e uma pitada de vodka no ar. Sentados em círculo no chão, eu e meus amigos nos preparávamos para o jogo mais antigo e revelador de todos: verdade ou consequência. Com uma risada, ergui a garrafa de Vodka Russa, a consequência definitiva da noite.
"As regras são as mesmas," comecei, lançando um olhar brincalhão ao grupo. "Só que a consequência agora é uma dose dupla dessa belezinha aqui." Balancei a garrafa, e eles riram. "A pergunta vai pra todo mundo, e, assim que cada um responder ou beber, a gente passa pra próxima."
Laura, que já parecia animada com a ideia, exclamou: "Okay! Mas quem começa?"
Soltei um sorriso travesso. "Que tal você, já que foi a primeira a concordar?" Ela sorriu, já meio empolgada. "Me conta aí: você teve alguma paixonite inesquecível?"
Laura franziu o cenho, pensando. "Deixa eu ver…" Ela balançou a cabeça como se buscasse a resposta lá no fundo. "Tive, sim. O primo do Joseph… aquele que tirou meu primeiro beijo."
Joseph deu uma gargalhada. "Eu lembro dessa história! Foi hilário."
Richelly, com um brilho no olhar, entrou na conversa. "Ela nem queria beijar o cara. A gente praticamente arrastou ela pra isso!"
"Boa lembrança!" falei, apontando para Richelly. "Agora é sua vez."
Ela sorriu, a garota mais magra do grupo, sempre com um ar misterioso. "Claro!" disse, com um olhar travesso. "E assim como a Laura, ele também foi o meu primeiro… só que o que eu perdi com ele foi a minha virgindade."
"Porra! Todo mundo já teve uma paixonite assim?" exclamei, rindo com eles.
"Já que falou, agora é sua vez, Fábio," Joseph me cutucou.
Eu respirei fundo, meus olhos vagando pelo teto, deixando as lembranças me invadirem. "Como todo mundo até agora, eu também tive uma," comecei, sentindo o peso da nostalgia. "O nome dela era Áurea. Foi no segundo ano. Mas, ao contrário de vocês, eu não perdi nada com ela… nada rolou."
Richelly soltou um riso irônico. "Mentira, Fábio! Como assim nada?"
"Juro!" eu disse, rindo junto.
"Só você mesmo…" Laura brincou, revirando os olhos.
Layane, com um sorriso solidário, estendeu a mão para mim. "Toca aqui, Fábio!" Eu a cumprimentei com um high-five.
"Minha paixonite também não deu em nada."
Joseph, sempre curioso, arqueou uma sobrancelha. "Mas por quê, Layane?"
Ela deu de ombros e sorriu sem jeito. "Ah, Joe… nem sei se era paixonite mesmo ou se era só confusão minha."
Fiz uma careta brincalhona. "Nesse caso, você devia tomar metade da consequência, pelo menos." Ela riu e, com um aceno, virou o copo, engolindo o líquido rapidamente.
"Agora falta você, Joe!" Laura provocou, os olhos brilhando de expectativa.
Joseph Narrando
Eu senti os olhares de todos em mim enquanto enchia o copo e, sem pensar muito, bebi o líquido de uma vez. Aquela queimação descia pela garganta, mas eu não queria demonstrar. Assim que terminei, ouvi Fábio soltar uma risadinha provocativa.
"É mesmo?" ele falou, os olhos me desafiando. "Vai me dizer que nunca teve nenhuma paixonite?"
Dei de ombros, tentando manter a expressão neutra. "Ao contrário, meu caro. Não só tive como foi a paixonite." Eu sabia que isso chamaria a atenção deles.
"Então por que bebeu?" Richelly perguntou, me encarando com um olhar curioso.
"Pra ter coragem de contar, né?" Enchi outro copo e virei novamente, sentindo o gosto amargo da vodka. Todos estavam atentos, seus olhares fixos em mim enquanto eu começava a contar. "Conheci minha paixonite no primeiro ano, e, pra ser sincero, foi paixão à primeira vista." Sorri ao lembrar da sensação daquela primeira vez que vi ela. "Na nossa primeira conversa… eu tentei cantar a menina."
Laura, do outro lado do círculo, se inclinou um pouco, visivelmente interessada. "E aí?" ela perguntou, seus olhos brilhando de curiosidade.
Ri da animação dela, balançando a cabeça. "Bom, Laura, ela me deu um toco. Assim, na lata." Todos riram junto comigo, lembrando de como eram os tocos na escola. "Mas, teimoso como sou, eu não desisti. A gente foi se conhecendo, ficando mais próximos e, na festa junina, apareceu outra oportunidade." Fiz uma pausa dramática, e pude ver Richelly mordendo o lábio, já querendo saber o resto. "E pimba, tentei de novo."
Richelly riu, como se já soubesse a resposta. "E aí? Você conseguiu pegar ela, né?"
"Erradíssimo, minha cara," falei, balançando a cabeça enquanto enchia mais um copo e virava. "Tomei outro toco. Mas vocês sabem que eu tenho um padrão. Eu sempre tento três vezes antes de desistir." Soltei um riso amargo, lembrando de como era difícil desistir daquilo que eu realmente queria. "Então, na feira de ciências, lá estava ela de novo. Dessa vez, o clima tava rolando, tava tudo perfeito. Mas, na hora H…" suspirei, olhando para o copo vazio. "Outro toco."
Fábio balançou a cabeça, parecendo incrédulo. "Na moral, essa garota aí devia se achar a última bolacha do pacote." Layane o deu um tapa leve no braço. "Cala a boca, Fábio," ela riu. "Deixa o Joe terminar."
Fábio fez uma cara de inocente. "Mas o que eu fiz?" Isso fez todos rirem de novo, e eu aproveitei a deixa para continuar.
"Enfim, depois da feira de ciências… eu desisti," disse, sentindo o peso daquela palavra enquanto olhava pro meu copo vazio.
"Mas por quê?" Richelly me perguntou, o olhar dela se suavizando, como se ela entendesse que essa história era mais do que só um conto engraçado.
Soltei um suspiro. "Por dois motivos. Primeiro porque eu só tento três vezes, e segundo… porque, com o tempo, fomos ficando cada vez mais próximos, até que viramos amigos."
Laura soltou um suspiro longo, me observando com um novo olhar. "Nossa, nunca ouvi você falar de uma garota por quem insistiu mais de uma vez."
"Eu também não," Richelly concordou, me lançando um olhar que eu não soube interpretar bem.
"Mas ele mesmo disse que foi a paixonite," Fábio destacou, com um sorriso meio zombeteiro.
O clima no quarto parecia diferente agora, mais pesado, como se minha história tivesse tocado alguma coisa em cada um deles. Para quebrar o silêncio, enchi o copo mais uma vez e levantei como se brindasse. "Ao jogo," eu disse, tentando disfarçar o peso da lembrança com um sorriso.
Todos ergueram os copos comigo, e brindamos, deixando a nostalgia e as histórias mal resolvidas para trás… ao menos por mais um gole.