A chuva caía incessante sobre Yokohama, fina e fria, cobrindo a cidade com um manto sombrio. A neblina densa se arrastava pelas ruas como dedos espectrais, ocultando figuras nas esquinas e sussurros nos becos. Para os cidadãos comuns, era apenas mais uma noite melancólica. Para aqueles que entendiam o submundo, era o prenúncio de algo muito maior.
No coração do domínio da Máfia do Porto, Mori Ougai estava furioso.
Seu escritório, no topo de um edifício imponente, estava mergulhado em sombras. A iluminação era baixa, projetando longas silhuetas nas paredes de madeira escura. Livros antigos, mapas detalhados da cidade e registros de operações secretas estavam espalhados por uma enorme mesa de carvalho. Atrás dela, sentado como um imperador em seu trono, estava Mori Ougai.
Seus olhos frios estavam fixos no vidro da janela, observando a cidade abaixo. Seu reflexo distorcido pela chuva era o único que o encarava de volta.
A derrota de Iori ainda era um gosto amargo em sua boca.
Não era apenas o fato de um de seus homens mais letais ter sido humilhado publicamente. Não era apenas o fato de os Narradores Eternos terem se tornado uma ameaça real à sua autoridade.
Era o fato de que Kenshiro recusou sua proposta.
Mori não oferecia alianças levianamente. Ele era um estrategista nato, um manipulador de mentes e destinos. Quando viu o potencial de Kenshiro e seu grupo, decidiu que tê-los ao seu lado seria um investimento valioso. Ele enviou uma oferta generosa, cheia de promessas e garantias.
E Kenshiro recusou.
Ele não apenas recusou — ele ignorou a oferta com a mesma facilidade com que reescrevia a realidade com seu maldito livro. Como se a Máfia do Porto não fosse digna de sua atenção.
Esse insulto não podia ser tolerado.
Mori respirou fundo, seus dedos tamborilando levemente na madeira da mesa. Ele não era um homem impulsivo. Suas ações eram medidas, precisas, cada passo planejado com antecedência.
Ele sabia que Kenshiro era perigoso. Sabia que seu poder de reescrever a realidade não era algo que podia ser enfrentado de maneira convencional.
Por isso, ele não usaria métodos convencionais.
Uma batida suave na porta tirou Mori de seus pensamentos.
"Entre."
A porta se abriu sem ruído, e uma figura esguia entrou. Seu terno preto era impecável, o cabelo cuidadosamente alinhado, e os óculos redondos refletiam a luz fraca do ambiente. Era Elise, a presença silenciosa e mortal ao lado de Mori.
Ela inclinou ligeiramente a cabeça, um sorriso delicado brincando nos lábios. "Os preparativos estão prontos, chefe. Como esperado, Kenshiro subestimou nossa capacidade de adaptação."
Mori sorriu suavemente, um brilho frio nos olhos.
"Perfeito."
Ele se levantou, ajustando seu casaco com movimentos meticulosos. Elise observou-o com curiosidade, já sabendo o que viria a seguir.
"Onde eles estão agora?"
"Os Narradores Eternos se dispersaram pela cidade depois do ataque ao mercado negro. Kenshiro e alguns membros-chave estão em sua base principal, enquanto outros estão em missões menores. Aika e Hajime permanecem próximos a ele, como sempre."
Mori assentiu lentamente. "E quanto ao terreno?"
"Já tomamos as precauções necessárias. O prédio onde Kenshiro se esconde está completamente cercado. Cortamos todas as rotas de fuga, e temos franco-atiradores posicionados. Selamos qualquer saída subterrânea e garantimos que qualquer tentativa de reescrever a realidade terá um custo alto."
"Explique."
Elise sorriu de maneira quase infantil. "Usamos um campo de interferência especial, baseado nos registros que temos sobre habilidades de manipulação de espaço e tempo. O Livro do Infinito é poderoso, mas Kenshiro ainda precisa escrevê-lo, e isso requer tempo. Se garantirmos que ele não possa se concentrar o suficiente para escrever, ele não poderá alterar a realidade como deseja."
Mori ficou em silêncio por um momento, analisando cada detalhe.
"Além disso," Elise continuou, "trouxemos reforços... especiais. Guerreiros que não podem ser influenciados por simples reescritas de história. Você sabe do que estou falando."
O sorriso de Mori se alargou. "Maravilhoso."
Ele olhou para a cidade novamente, seus olhos ardendo com um brilho letal.
"Kenshiro pode escrever histórias... Mas esta noite, eu serei o autor do seu fim."
A noite estava estranhamente silenciosa.
Kenshiro estava sentado à mesa central da base, seu livro fechado ao lado. Aika recostava-se contra a parede, afiando uma adaga, enquanto Hajime, sentado no sofá, bebia calmamente uma xícara de chá.
Havia uma estranha sensação no ar.
Kenshiro não era um homem paranóico. Seu poder lhe dava uma confiança que poucos possuíam. Mas algo estava errado.
Ele sentia uma pressão invisível ao seu redor.
Como se algo estivesse tentando se fechar sobre ele.
Ele pegou seu livro e abriu, deslizando os dedos sobre as páginas em branco. Seu instinto gritava que ele precisava estar pronto.
Mas antes que pudesse escrever algo—
BOOM!
A explosão sacudiu o prédio como um terremoto, lançando poeira e estilhaços por todos os lados. As janelas estouraram, e a sala mergulhou no caos. Aika foi jogada para o lado, e Hajime derrubou sua xícara enquanto rolava para se proteger.
Antes que pudessem reagir, a porta principal foi arrombada.
Silhuetas emergiram da fumaça — homens da Máfia do Porto, vestidos de preto, armados até os dentes.
E no meio deles, caminhando com a calma de um predador, estava Mori Ougai.
"Boa noite, Kenshiro."
Seus olhos brilhavam com uma satisfação cruel.
"Espero que esteja confortável... porque esta será sua última história."