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Memórias de um Diabo Sertanejo.

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Synopsis
Um Cangaceiro está fadado a definhar até seus últimos dias, numa penitenciária, agonizando por causa de uma doença misteriosa. como última ação, ele concede uma entrevista a uma jornalista português, contando sua história.
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Chapter 1 - Tragédia ou Comédia

15 de fevereiro de 19XX, sim, foi esse o ano e a data daquele fatídico encontro, na tolice jovial que impregna os jovens ambiciosos, quis eu, conversar com o diabo, não sei porque quiseram-me, mas sei porque aceitei. Entenda-me, era o primeiro da família a ter um diploma universitário, e logo depois, um caso incrível que me angaria diversas oportunidades? Como poderia recusar? Mas creio eu, que isso não importa mais, o que haveria de ser, já foi, o que não haveria de ser, já não é.

Bom, caro leitor, como supracitado, havia eu recém saído da universidade, de mera noviça, era eu agora a abadessa, formado nas artes do jornalismo e escrita, usar de movimentos das mãos para criar símbolos que possuem significados ocultos, para apenas uma elite de iniciados nos segredos da linguagem, era eu um domador de técnicas esotéricas numa terra de Bárbaros iletrados. Cheguei na penitenciária cerca de dez horas da manhã, era apenas um bloco de concreto rude, que fazia uma enorme sombra opressiva em sua volta. Guardas salpicadas, incrivelmente, de bom humor, foi um desse que recebeu-me, havia ido de cavalo, dispensou minha égua, e guiou-me pelos corredores de pedra quentes, e apertadas.

Passei a reparar nas celas, em meio ao corredor, eram em média, dez ou treze homens num espaço que cabia, no máximo, seis, que já estariam apertados. Um sobre o outro, num espaço imundo, e caindo aos pedaços, o guarda que guiava-me não deixou de notar minha surpresa, não posso negar, parecia que havia visto algo etéreo, encarou-me, e disse:

" Na Europa, tem pena de vagabundo? "-Falou, estupidamente.

" Não temos penitenciárias como essas, meu caro. "

" Pois não tem homens como esses, rapaz. "

O respondi novamente, mas sem sucesso, não provocou nenhuma reação, a não ser vontade de rir daquele obeso miserável. Assim permanecemos, até que ele abriu a boca novamente:

" Você é jornalista? "

" Sim, senhor. " respondi, orgulhosamente de prontidão, mas sem deixar transbordar, confiante é diferente de arrogante.

" Sabe usar? " Falou isso, mostrando-me uma pistola.

Tomei um susto pela proposta tão repentina, mas dissimulei tranquilidade, e falei:

" Sim, senhor, meu pai ensinou-me. mas recuso recuso sua oferta, não gosta de armas. "

" Nesse caso, não vai ficar sozinho com o seu cliente "

" A confiança é essencial para uma boa conversa, ele não vai falar nada com uma arma apontada para cabeça dele. "-Insisti, tolamente.

Não saiu-me dá cabeça a imagem daquele velho decrépito de meia idade, gordo como um porco, e com aquela terrível calva, rindo de mim, seus risos eram como o relinchar de um cavalo obeso.

" Senhor, hei de fazer o meu trabalho, vou entrevistar o cangaceiro, pretendo abrir sua mente, mas não com balas de um fuzil, mas com a qualidade humana mais velha, a antiga e boa Lábia. Se a sua gente apenas consegue resolver as coisas com balas e tiros, saiba que existe uma população civilizada fora de seu deserto árido. "

O velho calou-se, encarou-me seriamente, ficou uns 3 segundos até abrir a boca novamente,

" Que seja "-Falou jogando a pistola no chão, colerizado-"mas, pelo contrato, deixar que você seja morto está fora de questão…não pega bem. Meus homens estarão a postos, qualquer coisa, grite, que então, eles entrarão, atirando primeiro, perguntando depois. "

Por um momento, confesso que temi, na minha mente, o orgulho e a prudência discutiram, mas, o ego foi tão poderoso, que desprezei e senti nojo da ideia de lá entrar armado, iria entrar com apenas minhas mãos, e a arma mais antiga da humanidade. Assim, o porco guiou-me por um corredor sujo e úmido, a qual a luz do sol há anos não tocava. Diferente dos outros presos, estava ele num cubículo, guardado por dois homens fortemente armados, antes de entrar, o bigodudo mais uma vez falou:

" Saiba, ele é altamente manipulador, cuidado com o que vai falar. "

Respondi com silêncio, como um desdém. Assim, abriram a porta, que finalmente havia reparado, era grande e densa, além das inúmeras trancas, foi necessário os três militares para abri-lá, e ainda tiveram dificuldade. A porta abriu lentamente, rangendo, dando luz a terrível escuridão do cubículo onde aquele homem estava encarcerado, tão imenso era o negrume, que não pude vê-lo a princípio, apenas uma figura esguia no meio da penumbra, encarando o vazio, sem nada falar, e quando percebi, nem mesmo piscava. Depois de tomar coragem, entrei, com passos lentos, a porta permaneceu entreaberta, podendo da privacidade, e dando tempo de reação para os homens de armas.

Quando percebeu minha presença, mudou a forma de agir, começou a agir de forma cordial, e foi que percebi, ele estava sozinho naquela sala, quase como um zumbi, morto, mas vivo. Seu corpo era doente, extremamente magro, com as marcas da odiosa velhice em seu corpo, que agia como um carrasco, deixando cicatrizes irreversíveis.

Logo percebi, e mentalmente comecei a pensar que doença ele poderia possuir, cogitei tuberculose, uma DST, ou até câncer, mas, bem isso não importava, agora. Nossos olhos se cruzaram pela primeira vez, foram cinco segundos para que meu cérebro interpretasse seu rosto, mas especificamente, as duas grande bolas que eram seus olhos, que pareciam em chamas, brilhando com um Vigor que nem mesmo um jovem, no auge da aptidão física possuía, bruxuleando como uma chama imperecível, tal era o fragor de seu olhos. Fui hipnotizado, por uns segundos não falei nada.

" Tragédia, ou comédia?"

" O que? "

" O que prefere? Tragédias, ou comédias? "

Falou isso, sentando-se, mas, ele não se sentou de pernas abertas, ou cruzadas, era algo mais específico, era uma pose, a forma correta de se sentar à mesa, então reparei que ele possuía um sotaque francês muito forte em sua fala.

" Teatro, meu caro! Teatro!"

" Sabe o porquê estou aqui? O porquê estou te perguntando isso?"

" Isso não importa, me diga, Comédia ou tragédia? "

Irritado com aquela pergunta, falei:

" Estou aqui para uma entrevista, alguns estrangeiros estão interessados, e chocados, com você. "

Após falar isso, ele parou, e riu sozinho, como se tivesse escutado uma piada, ou lembrado de alguma careta carrancuda.

" Acaso é engraçado o interesse dos estrangeiros nessa terrinha abandonadas por Deus? É, me vejo obrigado a concordar, ontem, somente o rio, e às vezes a Amazônia, era objeto de discussão, agora, o meio do nada tem interesse de italianos, franceses e principalmente, Portugal. ."

" Portugal sempre teve interesse nessa terra. "-Retrucou o velho, com a resposta na ponta da língua.

" Quase esqueço-me, mas também houve tempo que os holandeses demonstraram interesse nessa terra… pobres protestantes, voltaram lambendo as lambidas depois de ver a cólera dos Negros e índios conversos. Mas insisto, comédia ou tragédia? "

Suspirei, derrotado, já aborrecido com tanta insistência, e em certo sentido, humilhado.

" Tragédias. "

" Bom, perfeito. "

Por um momento, ele pareceu feliz, e ficou quieto, funebremente.

"Dar-lhe-ei sua entrevista. "-falou,enfim.

"Perfeito, então, podemos começar?"

"Porém, escreva uma peça, sobre o que hei de contar. Uma tragédia. Transcreva meu relato. "

Tal relato, no momento, me pareceu inocente, mas mal sabia que havia malícia em suas palavras. Mas estava contente demais com a ideia para falar algo, pois, diabos, aquilo era perfeito! Não sabia escrever peças, é verdade, e porém, sejamos francos, romances são mais acessíveis e facilmente degustaveis, para o meu público alvo.

" Esse cabloco nem deve saber o que é uma peça, nem se vi uma andando na rua. " iria escrever um romance, e como está vendo, realmente o fiz, não por malícia, mas por cólera.