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Chapter 5 - Capítulo 3 - O Ritmo do Mundo

As semanas subsequentes desde que Chris conseguiu usar magia pela primeira vez foram intensas e exaustivas.

Os dias seguiam um ritmo previsível: acordar cedo, comer o que havia disponível, dedicar-se a aprender o novo idioma e, quando a casa mergulhava no silêncio da noite, praticar magia de maneira discreta, evitando chamar a atenção.

Com o passar dos dias, Chris começou a entender melhor a dinâmica de sua família e a realidade em que viviam. A pobreza era evidente, a comida era escassa, e a sobrevivência dependia de um equilíbrio frágil.

Seu pai, juntamente com Caliste, o irmão mais velho, passava grande parte do dia na floresta, caçando o que fosse possível para alimentar a família.

Lia, sua mãe, dividia seu tempo entre cuidar da casa, das crianças e de uma pequena horta que mantinha ao lado da casa – uma das poucas fontes de vegetais frescos para eles.

A vila onde viviam era humilde, composta por poucas casas de madeira, espaçadas umas das outras, cercadas por uma vasta floresta. Era um lugar isolado, onde a natureza ditava o ritmo de tudo.

Para Chris, aquele cenário, tão simples e distante da modernidade que ele conhecia na terra, parecia quase primitivo, mas tinha um charme próprio que ele começava a apreciar.

O avanço de Chris na magia foi notável, ainda que modesto. Ele já conseguia criar um pequeno redemoinho, um movimento suave do ar que girava ao redor de sua mão. Não era nada grandioso, mas era um progresso que o enchia de orgulho.

Porém, ele logo percebeu uma limitação: não conseguia manter o redemoinho por muito tempo. Bastavam alguns segundos até que a magia desaparecesse, deixando-o com uma sensação de cansaço profundo, como se algo dentro dele estivesse sendo drenado.

Essa exaustão o fez refletir. Chris começou a juntar as peças do que sabia até então, a sensação peculiar ao conjurar magia, a energia que parecia circular em seu corpo, e a forma como ela se esgotava rapidamente.

A partir disso, ele desenvolveu uma teoria: devia haver uma espécie de núcleo dentro dele, algo que armazenava e regulava essa energia mágica, como uma bateria sendo descarregada durante o uso.

Para ele, essa hipótese fazia sentido. Se o núcleo existisse, era ali que a magia seria acumulada, processada e convertida em poder utilizável.

Compreender isso era crucial para que pudesse continuar avançando. Chris não sabia se sua teoria estava completamente correta, mas era um ponto de partida.

Então, no meio de uma madrugada silenciosa, Chris ficou perdido em pensamentos, observando a escuridão do quarto.

A lua iluminava fracamente o ambiente, e o som do vento entrando pelas arestas da casa, parecia amplificar a tranquilidade ao seu redor.

"Talvez haja alguma forma de reduzir o uso de mana enquanto conjuro magia...", ele ponderou. "Mas como?"

A verdade era que ele ainda estava longe de entender como a magia realmente funcionava. Ele tinha apenas fragmentos de conhecimento – sensações, observações e suas próprias deduções. Era como montar um quebra-cabeça sem ter todas as peças.

Decidiu organizar suas ideias. Se a magia drenava algo dentro dele, era lógico pensar que esse "algo" era finito e precisava ser usado com cuidado. Mas o que era exatamente? Ele formulou duas hipóteses:

A primeira era que as pessoas nasciam com uma aptidão natural para magia. Nesse caso, o núcleo seria uma característica inata, que se desenvolvia com o tempo e podia ser treinado, como um músculo.

A segunda hipótese era mais intrigante. Talvez a magia não dependesse apenas do núcleo. Talvez houvesse uma conexão entre a pessoa e a energia do mundo ao seu redor.

Algo como uma corrente invisível que fluía entre o indivíduo e o ambiente, permitindo que ambos compartilhassem poder.

Ele não sabia qual das hipóteses era a correta – ou se ambas estavam certas, de alguma forma. Mas tinha certeza de que precisaria testar essas ideias.

Então Chris passou as noites seguintes em um ciclo de tentativa e erro, alternando entre a prática de sua magia de vento e suas teorias sobre como ela funcionava.

Cada tentativa trazia uma nova descoberta – às vezes frustrante, às vezes promissora. Ele sabia que precisava avançar, mas estava preso à falta de informações concretas.

Então, em uma madrugada particularmente silenciosa, uma ideia surgiu como um raio: "E se as duas hipóteses estivessem conectadas de alguma forma?"

Ele começou a explorar a ideia de que o núcleo, ao invés de ser apenas um reservatório de mana, também poderia funcionar como uma ponte entre ele e a energia do mundo. Se isso fosse verdade, talvez ele pudesse aprender a "recarregar" sua mana ao se conectar ao ambiente ao redor.

Chris se concentrou profundamente, sentado em seu berço improvisado. Fechou os olhos, controlando sua respiração, e imaginou seu núcleo como uma esfera pulsante de energia dentro de seu corpo.

Ele tentou visualizá-lo como algo maleável, capaz de se expandir e se contrair, como um coração.

"Se há energia no ambiente", pensou, "talvez ela deve estar ao meu alcance.... Preciso tentar absorver de alguma forma."

Ele começou a respirar de maneira mais lenta e controlada, tentando sincronizar o ritmo de sua respiração com o fluxo de energia que imaginava estar ao seu redor.

Com cada inspiração, visualizava a energia sendo puxada para dentro de seu núcleo, como um fio invisível que conectava o mundo a ele.

Nada aconteceu nas primeiras tentativas. Frustrado, ele quase desistiu, até que algo mudou. Um leve formigamento percorreu sua pele, e ele sentiu um calor fraco no centro de seu peito. Não era muito, mas era algo. Ele abriu os olhos, surpreso, mas a sensação desapareceu.

"Puta merda, me sinto um Albert Einstein da vida, ", ele murmurou, com um sorriso triunfante. "Mas ainda é bem ineficiente. É como tentar encher um balde com uma colher. É muito lento."

Então ele passou as noites seguintes refinando a técnica, que decidiu chamar de:

"Ressonância de Fluxo".

Em vez de apenas visualizar o núcleo absorvendo a energia, ele passou a usar pequenos movimentos das mãos, como se estivesse guiando a energia para dentro. Com o tempo, começou a perceber que o processo se tornava mais eficiente.

Durante esses experimentos, ele também confirmou que ambas as hipóteses estavam corretas – e erradas ao mesmo tempo.

O núcleo era de fato inato e determinava a capacidade inicial de alguém para magia, mas o ambiente ao redor também desempenhava um papel crucial. Sozinho não era suficiente; a conexão com o mundo ampliava o potencial mágico.

Depois de dias ajustando e refinando a Ressonância de Fluxo, ele decidiu testá-la novamente enquanto conjurava a magia de ar.

Deitado no berço improvisado, com as mãozinhas estendidas, Chris criou um pequeno redemoinho entre seus dedos.

Desta vez, a diferença foi clara, ele conseguiu manter o feitiço ativo por muito mais tempo, sem aquele cansaço habitual que costumava acompanhar seus esforços.

"Porra! Isso sim é progresso! Albert Einstein que se cuide, porque temos um novo gênio na área!" pensou, sorrindo orgulhoso de si mesmo.

No entanto, à medida que continuava, algo estranho começou a acontecer.

Uma leve coceira surgiu na ponta de seu nariz. Inicialmente, ele tentou ignorar, focando-se totalmente no redemoinho, mas a sensação só aumentava.

Era como se uma alergia tivesse surgido do nada. Ele esfregou o nariz com as mãozinhas, tentando se concentrar, mas o incômodo não parava de crescer.

Antes que pudesse evitar, um espirro gigantesco escapou, tão forte que ele quase caiu do berço. O redemoinho desapareceu instantaneamente, e Chris ficou parado, com uma expressão atônita no rosto.

"Mas que porcaria foi essa?" ele pensou, esfregando os olhos, enquanto tentava entender o que tinha acabado de acontecer.

Com curiosidade, ele tentou novamente. A mesma coisa aconteceu. A coceira no nariz voltava, e, em questão de minutos, um espirro estrondoso o fazia perder a concentração, e a magia se dissipava.

"Que maravilha... efeito colateral... Eu realmente fui com muita sede ao pote, hein, Einstein," ele resmungou, frustrado, mas também rindo da situação. Era inusitado, para dizer o mínimo.

Embora os espirros fossem inconvenientes, ele logo percebeu que eram inofensivos, nada além de uma pequena surpresa.

Mesmo assim, ele sabia que precisava ter mais cuidado ao praticar a técnica. Imaginar sua mãe acordando no meio da noite com um bebê espirrando redemoinhos por toda a casa não parecia muito divertido.

"Bom, pelo menos não tenho que me preocupar com a falta de mana...," pensou, rindo de si mesmo.

O dia seguinte começou agitado. O cheiro de café fresco e o som de passos apressados no corredor indicavam que todos estavam se preparando para mais um dia de trabalho duro.

Lia estava na cozinha, organizando as poucas provisões, enquanto Tomy e Caliste, já prontos para sair para caçar, terminavam de se vestir.

"Amor, não esquece do que a Shelly falou no começo do mês", disse Lia, a voz tensa, sem parar de mexer a panela no fogão.

"Aquela criatura... pode ainda estar pelas redondezas. A floresta tem andado estranha ultimamente, e a última coisa que a gente precisa agora é de mais um problema. Toma cuidado, ok?" Ela lançou um olhar rápido para Tomy, sua expressão carregada de uma preocupação silenciosa, mas firme.

Tomy, sempre tentando acalmá-la, deu um sorriso tranquilo. "Tá tudo bem, xuxuzinho. Vai dar tudo certo, logo estaremos de volta com o que precisamos." Ele se aproximou, deu um beijo rápido em sua testa e se dirigiu à porta. Caliste já estava lá, impaciente, esperando.

"Vamos logo, pai. Quanto mais tempo perdermos aqui, menos chance temos de achar alguma coisa." Caliste parecia um pouco irritado, como se a conversa de Lia fosse uma distração desnecessária.

Lia o observou por um momento, mas não disse mais nada. Sabia que não poderia impedi-los. "Cuidado, então", ela apenas repetiu, vendo-os saírem pela porta. O som das botas batendo no chão e o rangido da porta se fechando atrás deles marcaram a saída.

"Humm... ainda não tinha parado para pensar nisso", Chris pensou consigo mesmo, os olhos se perdendo no vazio enquanto sua mente vagava.

"Mas provavelmente os animais daqui devem ser bem diferentes dos da Terra." Ele tentou imaginar como seriam essas criaturas – talvez mais agressivas, ou quem sabe maiores e mais estranhas. Talvez até com habilidades próprias da magia, algo que ele ainda não tinha entendido completamente.

A ideia de encontrar algo assim no meio da floresta lhe dava um calafrio, mas também despertava um certo desejo de conhecimento.

Lia e Zai foram cuidar da horta, enquanto Lilly ficou arrumando o galpão de mantimentos.

Lia deixou Chris deixou Chris no quarto, deitado em seu berço. Então ele aproveitou o tempo que tinha para tentar praticar outros tipos de magia.

Primeiro ele pensou em começar a treinar a magia de fogo, mas como seu berço e a cama eram de palha, ele não queria ter um fim trágico e morrer carbonizado.

Então ele partiu para magia de água.

Chris fechou os olhos, respirando profundamente enquanto tentava se concentrar na magia de água.

Com as mãos estendidas, ele imaginou uma esfera de água se formando entre elas.

Primeiro, só uma pequena sensação de frescor, como se a água começasse a girar suavemente, respondendo ao seu desejo.

Quando abriu os olhos, uma pequena bolha de água flutuava diante dele, pouco maior que uma laranja.

"Humm, o que temos aqui..." Ele pensou, com um leve sorriso.

Ele manteve a bola estável, sentindo a energia dentro dela, tentando controlá-la. Mas, de repente, a esfera começou a se distorcer. A água se espalhou por suas mãos, molhando seu rosto e fazendo uma leve bagunça no berço.

"Merda, ainda é instável". Ele disse enquanto tentava limpar o rosto molhado.

Ele ficou ali, com a expressão frustrada, mas não pôde evitar de rir um pouco. "Ainda tenho que melhorar meu refinamento de magia."

No entanto, ele sabia que estava no caminho certo. Não era perfeito, mas para um começo, não era tão ruim. E, com o tempo, ele aprenderia a controlar a magia com mais precisão.