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Chapter 20 - O Abismo da Escolha

Mariane estava paralisada, seus olhos fixos no espelho à sua frente. O mundo ao seu redor parecia girar, as sombras e a luz se entrelaçando como um pesadelo que não tinha fim. Ela queria gritar, queria correr, mas seu corpo estava imobilizado, preso a uma teia invisível. O reflexo de Lúcio havia desaparecido, e agora, diante dela, restava apenas uma versão distorcida de si mesma. Sua imagem no espelho parecia mais velha, marcada pelo peso do tempo, seus olhos carregados de tristeza e arrependimento.

O som das vozes, como ecos distantes, preenchia o vazio. Uma delas, profunda e sibilante, sussurrava palavras incompreensíveis, enquanto outra, mais suave, parecia chamar seu nome com uma urgência quase desesperada.

"Mariane..." A voz da Princesa, vinda de algum lugar além da névoa. "Você está à beira de algo maior. O que você escolher agora definirá tudo."

Mas como escolher? Como decidir entre o que era e o que poderia ser, entre o que ela temia e o que desejava? As imagens nos espelhos estavam mudando a cada segundo, como se o próprio futuro fosse maleável, como se o destino estivesse ao alcance de suas mãos, mas ao mesmo tempo distante e intangível.

O ar ficou mais denso, o calor que antes parecia aliviar os seus ossos agora se transformando em uma pressão insuportável. Cada respiração era difícil, como se o próprio ar estivesse tentando sufocá-la. As sombras ao redor começaram a se mover, deslizando pela superfície dos espelhos, se aproximando lentamente. Não eram mais apenas reflexos, mas criaturas à espera de algo, algo que ela ainda não compreendia totalmente.

"Não podemos ficar aqui", Lúcio disse, sua voz baixa, mas carregada de uma tensão palpável. Ele apareceu ao seu lado, mas algo estava diferente. Sua presença era mais sombria, como se o próprio tempo tivesse se curvado ao redor dele. Seus olhos estavam fixos em um ponto à distância, como se ele pudesse ver algo que Mariane ainda não conseguia perceber. "Este lugar... ele está se tornando mais forte."

Antes que ela pudesse responder, uma nova visão se formou no espelho à sua frente. Desta vez, não era um reflexo dela mesma, mas de um lugar — uma terra desolada, devastada pela guerra. Castelos em ruínas se erguiam sobre um mar de cinzas, e o céu, uma mistura de tons púrpura e preto, parecia rasgado por relâmpagos constantes. O som distante de gritos e o tilintar de espadas cortando o ar eram audíveis, como se o eco de uma batalha antiga ainda reverberasse naquele espaço.

E no centro desse caos, ela viu uma figura. Era ela mesma, mas com os olhos vazios, sem vida, sem esperança. Uma versão dela que havia sucumbido ao peso das escolhas erradas, uma mulher quebrada, perdida em um mundo sem futuro.

Mariane estremeceu, o medo apertando seu peito. "Isso é o que me espera?" Ela pensou, sentindo a escuridão da visão consumir sua alma.

Lúcio deu um passo à frente, seu corpo tenso, como se ele soubesse algo que ela ainda não entendia. "Este lugar tenta manipular suas escolhas", disse ele, sua voz grave. "Ele mostra o que você teme, o que você deseja e, mais ainda, o que você pode perder. Mas o que você vê não é a verdade. É apenas uma possibilidade."

"Mas e se... e se a escolha que estou fazendo for a errada?" Mariane perguntou, a dúvida crescendo dentro dela como uma tempestade. "E se essa visão for o futuro real?"

Lúcio olhou para ela com um olhar intenso, seus olhos como espelhos refletindo a própria luta interna. "O futuro nunca é absoluto. Ele é uma série de caminhos entrelaçados, cada um levando a um destino diferente. Mas, Mariane, não há como voltar atrás agora. O caminho que você escolher, por mais difícil que seja, será o seu. E você terá que arcar com as consequências."

Aquelas palavras a atingiram com a força de um trovão, como se algo dentro dela tivesse se quebrado. O peso da escolha era insuportável, e ainda assim ela sabia que não havia escapatória. Aquele era o momento decisivo, o abismo onde ela se perderia ou se encontraria.

E então, o espelho à sua frente começou a se distorcer mais uma vez, como se uma nova visão estivesse prestes a surgir. Mas desta vez, não eram sombras ou reflexos que se formavam. Era algo muito pior. Uma figura, uma presença sombria, surgiu dentro do vidro. Ela não era humana, mas uma entidade de pura escuridão, seus olhos brilhando com uma intensidade maligna.

*"Você acha que pode escapar?"* a entidade falou com uma voz que parecia rasgar a realidade. *"Você já fez suas escolhas. Agora, pague o preço."*

Antes que Mariane pudesse reagir, a sombra se lançou em sua direção, atravessando o espelho como se fosse feito de fumaça. Lúcio tentou agarrá-la, mas a entidade foi mais rápida, arrastando Mariane para dentro do vidro, para dentro do abismo.

A sensação de queda foi instantânea, um mergulho profundo em um vazio que não tinha fim. Tudo ao seu redor desapareceu — o som, a luz, a realidade. E Mariane sentiu a presença da entidade ao seu lado, seu peso incomensurável apertando seu peito, como uma mão fria e implacável.

"Este é o verdadeiro preço da escolha."* A voz da entidade ecoou em sua mente. *"Agora você sabe o que custa desafiar o destino."

Mas, no momento mais sombrio, quando parecia que tudo estava perdido, uma luz brilhou de dentro de Mariane. Não era uma luz externa, mas algo dentro dela, um poder que ela não sabia que possuía. Era a força de sua própria vontade, a chama da coragem que nunca se apagou, mesmo nos momentos mais difíceis.

A escuridão recuou. As sombras desapareceram.

Mariane sentiu o chão novamente sob seus pés. Ela não estava mais sozinha. Ela sabia o que precisava fazer.

O abismo da escolha ainda estava à sua frente, mas ela não tinha medo. Agora, mais do que nunca, ela entendia que o futuro não era algo a ser temido. Era algo a ser criado.