A chuva caía incessante, batendo contra as janelas de vidro do pequeno apartamento de Darius. O som suave e monótono da água escorrendo pela vidraça parecia emular o ritmo dos seus pensamentos, vagos e descompassados. Ele estava sentado à mesa, os olhos fixos no computador, mas sem realmente ver nada na tela. Era mais uma daquelas manhãs de segunda-feira em que a sensação de estar preso no mesmo lugar era quase palpável.
O café esfriava ao seu lado, mas ele não parecia se importar. Não importava mais nada. A vida havia se tornado uma rotina sem fim, uma sucessão de dias iguais, com poucas diferenças entre ontem e o hoje. Ele já não sabia mais o que o motivava a levantar da cama, a enfrentar mais um dia de trabalho em um escritório que ele odiava. As tarefas se acumulavam, os prazos surgiam, e ele se arrastava de um compromisso ao outro, como um espectro de si mesmo.
Na parede do apartamento, um quadro antigo de um pôr do sol em um lugar distante lhe parecia um reflexo da sua própria existência — belo, mas distante. Aquela vida parecia cada vez mais inatingível, como se ele estivesse sempre à margem, observando o mundo à sua volta, mas nunca realmente fazendo parte dele.
-Será que algum dia vou conseguir algo de verdade?" ele pensou, os dedos batendo levemente sobre a superfície da mesa. "Ou sempre vou ser esse... nada?"
Darius respirou fundo e olhou para o relógio. Já estava atrasado. Mas o que ele estava fazendo ali? Havia alguma razão real para estar se esforçando? Ao menos, o trabalho pagava as contas, certo? Ele se levantou com um suspiro, pegando sua jaqueta e colocando-a por cima da camisa amassada.
Enquanto se preparava para sair, o som de uma buzina ecoou na rua abaixo. Ele virou a cabeça em direção à janela, mas antes que pudesse fazer mais qualquer coisa, o vidro tremeluziu. O barulho de um carro acelerando, o som estridente dos pneus rasgando o asfalto molhado... E, em um instante,tudo ficou turvo, e a última coisa que Darius viu foi o céu cinza, ainda coberto de nuvens pesadas, antes de tudo se apagar.
...
Quando ele abriu os olhos, a primeira coisa que sentiu foi uma leveza. Como se estivesse flutuando. Ele piscou algumas vezes, confuso, tentando compreender o que estava acontecendo. Não estava mais em seu apartamento, nem na rua. Não havia mais o som da chuva ou o cheiro do asfalto molhado. Em vez disso, um campo dourado se estendia à sua frente, com uma luz suave envolvendo tudo ao redor, como se o próprio ar fosse preenchido por uma energia estranha.
"Não... Isso não pode ser real," Darius murmurou, tocando seu rosto. .
Ele olhou ao redor, tentando entender o que estava acontecendo. O horizonte parecia distante, com uma luz que não era do sol, mas de algo diferente, algo que ele não podia descrever. Mas o mais estranho de tudo era o fato de ele estar ali, e não em algum hospital, como imaginaria após um acidente.
"Você finalmente acordou."
Darius virou a cabeça rapidamente, a voz suave, mas firme, fazendo-o se sobressaltar. À sua frente, uma mulher apareceu. Não era uma mulher comum. Ela tinha longos cabelos dourados que pareciam flutuar como se a gravidade não tivesse poder sobre eles, e seus olhos eram imensos e profundos, com uma cor que Darius nunca tinha visto. Ela vestia uma túnica dourada que emanava uma luz suave, quase etérea.
"Quem... quem é você?", Darius perguntou, sua voz ainda embargada. Ele não sabia se estava sonhando ou se tudo aquilo era real. "Onde estou? O que está acontecendo?"
A mulher sorriu, um sorriso que parecia capaz de acalmar qualquer medo. "Eu sou Kaira. A Deusa do Destino. E você está onde poucos chegam: diante de uma nova chance."
"Chance?" Darius não conseguiu esconder o ceticismo em sua voz. "O que você quer dizer com isso? Eu... eu morri, não foi?"
"Sim", Kaira respondeu com tranquilidade. "Você morreu. Mas isso não é o fim. Pelo contrário, é apenas o começo. Eu estou oferecendo a você a oportunidade de recomeçar, de viver em outro mundo, uma nova vida, cheia de possibilidades."
Darius piscou várias vezes, tentando processar aquelas palavras. Ele estava morto, e agora estava sendo... convidado para viver de novo? Nada disso fazia sentido.
"Recomeçar?" ele perguntou, sentindo-se atordoado. "Eu... posso viver de novo? Em outro lugar? Mas por que eu? O que você quer de mim?"
Kaira olhou para ele com um olhar que parecia ver além do que seus olhos podiam captar. "Você viveu uma vida cheia de arrependimentos, Darius. Tantas oportunidades que você não aproveitou, tantos sonhos que você deixou escapar... Eu te dei a chance de mudar isso. De fazer as coisas de maneira diferente. De conquistar o que você deseja, se estiver disposto a tentar novamente."
Darius ficou em silêncio. Sua mente estava em um turbilhão de pensamentos. O que ele mais queria era mudar sua vida, mas será que era possível? Será que ele estava pronto para isso? O medo de falhar mais uma vez o paralisava, mas, ao mesmo tempo, ele sentia algo em seu interior começar a despertar. Era como se o que restava de seus sonhos — aqueles que ele quase havia esquecido — agora estivesse ali, diante dele, ao alcance da mão.
"Eu... aceito," disse Darius, com uma voz firme, sem saber ao certo o que o aguardava, mas sentindo que finalmente estava pronto para tentar.
Kaira sorriu, um sorriso que iluminava todo o campo ao redor.
"Excelente. Então, prepare-se."
Com um movimento de sua mão, o campo dourado se iluminou ainda mais intensamente, e Darius sentiu-se sendo envolvido por uma força desconhecida, puxado para um vórtice de luz e energia.
E, em um piscar de olhos, ele desapareceu, deixando para trás o fim de uma vida e começando uma nova jornada, em um mundo completamente diferente.
Desta vez, ele faria tudo o que fosse necessário para conquistar seus sonhos.