Após escolherem seu local de descanso, eles aproveitaram o som da água caindo, apesar de não ser uma queda muito grande, o barulho estava um pouco mais alto do que o normal.
"Não é incrível como eles conseguiram transformar aquele complexo de apartamentos em um parque desses em tão pouco tempo?" Pontuou Emi ainda animada com a beleza do local.
"Então.. várias pessoas foram deslocadas, mas parece que aquela tecnologia nova que faz árvores crescerem em menos de 3 dias realmente está funcionando bem"
Apesar dos conflitos e da poluição crescente, algumas descobertas realmente faziam a diferença em meio a esse caos, tecnologias como essa, apesar de contraditórias, estavam ajudando a mitigar, se não reverter, os danos que foram causados ao mundo.
Foi o caso da BoneMeal, um produto que revolucionou o crescimento de árvores e plantações, sendo de extrema importância para a crescente população que agora tentava sugar os últimos recursos de seu planeta.
Artur que ainda estava um pouco receoso com tudo isso acrescentou: "Eles estão tentando brincar de Deuses, todas as vezes na nossa história que isso aconteceu foi tragédia na certa.. Mas se eles criarem mais espaços assim, posso até me convencer de que não é tão ruim"
Após um singelo momento de silêncio Emi fechou levemente sua expressão e disse: "Você sempre fica com esse pessimismo idiota em, seja um pouco mais animado, tudo bem que há várias coisas artificiais aqui, mas ainda assim é melhor do que aquele monte de prédios velhos"
"Eu sei, mas ainda acho que ir contra o curso natural das coisas assim é um pouco..."
Emi o interrompeu e com uma expressão um pouco mais carrancuda disse: "Pare de falar essas besteiras, pode até ser um pouco estranho, mas ainda sim é muitooo melhor!"
Art sabendo que poderia arranjar problemas depois, assentiu com uma expressão descontente e ficou quieto 'Não posso nem questionar essa idiota'
Se ele tivesse dito isso em voz alta certamente iria levar outro chute na canela e, para seu bem, Emi ainda não sabia ler mentes, então ele poderia descansar por enquanto.
Após alguns longos segundos, Emi quebrou o silêncio: "Vamos deixar esse assunto de lado, a gente vai brigar de verdade se continuarmos falando disso" soltando um suspiro e questionou Art: "Então, como anda a sua faculdade, era esse curso que você queria mesmo?"
Ele demorou alguns momentos e enquanto olhava para a cachoeira que tinha um leve brilho azul respondeu: "Realmente? Não tenho certeza, o primeiro semestre está tendo um monte de matérias introdutórias, então está bem chato, mas acho que vou continuar.. tem uma grande quantidade de vagas e os salários estão bem generosos ultimamente"
"Sério que você pensa só em dinheiro? Você não tem mais nada que você queira fazer?" Perguntou Emi com uma cara azeda.
Ele esperou por alguns segundos e disse em um tom levemente entristecido: "Sei que não parece grande coisa para você, mas minha mãe está lutando para manter a casa em pé desde que o papai se foi.. Então sim, eu realmente estou pensando só em dinheiro!" Esta ultima parte foi dita com um tom um pouco mais irritado, fazendo-a ficar levemente chocada e desviar o olhar
Após quase um minuto de um longo silêncio constrangedor, o som da água que já estava alto, começou a tremular ocasionalmente e Artur quebrando o silêncio disse com uma voz apreensiva: "Escutou isso?"
Emi respondeu apontando para a água: "Deve ser algum peixe que eles colocaram ali, dizem que aquelas espécies novas são meio bizarras"
"Não é isso, o som da água, está.. diferente"
Para pessoas com ouvidos desatentos, essa sutil mudança seria apenas um motivo de desconforto, mas Artur tinha um ouvido um pouco mais aguçado que a média devido a um de seus hobbies, então ele conseguiu notar que havia algo errado: "Sim, tem algo errado, você não falou que a cachoeira tinha um tom azulado diferente?"
"Eu falei isso brincando, não é como se eu tivesse olhos mágicos para saber disso" falou Emi um pouco assustada
"Qual é, vamos ver se tem alguma coisa ali hehe"
"NÃO, a ultima vez que a gente foi ver alguma coisa assim você ficou com muletas por 2 meses"
Ambos tinham se deparado com alguns problemas no passado, em grande parte pela curiosidade excessiva de Art, que não sabia medir até aonde ele poderia espiar os segredos dos outros, lhe rendendo uma boa visita ao hospital após escutar alguns segredos um tanto íntimos demais.
"Ok, eu vou sozinho então, mas se eu encontrar algum tesouro e ficar rico não me venha chorando depois". Logo após dizer isso Artur fez uma expressão levemente maligna e esfregou suas mãos, qualquer um que olhasse para isso nesse momento acharia que ele estava planejando algum plano maligno.
"Eu... vou junto então, não vou deixar você ficar rico sozinho". Apesar de sua fala parecer indiferente, Emi já estava com sua mão completamente suada e morrendo de medo desse tipo de exploração.
"Ok, acho que tem um caminho pelo outro lado, vamos por ali.."
Ambos se levantaram, pegaram suas coisas e se dirigiram a uma pequena trilha lateral que levava mais perto da cachoeira.
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"Ei Art, a gente não deveria voltar? Já está quase escurecendo, vamos ver isso outro dia"
Eles estavam dentro de uma caverna situada logo atrás da cachoeira, apesar de parecer natural, ela foi feita com muito empenho pelo departamento de infraestrutura da cidade, então não deveria haver nenhum risco muito grande a possíveis exploradores
"Só vamos mais um pouco Emi, se a gente deixar pra vir amanhã é bem provável que algum mendigo desocupado ache esse lugar e acabe morando aqui"
"Ok, mas se a gente ver qualquer coisa estranha nós voltamos na mesma hora" Disse Emi logo depois de começar a segurar na ponta da camisa de Art.
"Relaxa, você não disse que tudo aqui era artificial? Então não deve ter nenhum problema em explorar por aqui"
Após mais alguns passos eles começaram a ver uma luz fracamente roxa, que estava vindo de um lugar mais ao fundo na caverna, e junto com essa luz, um barulho que se assemelhava a um chamado começou a ficar mais alto e aparente. "Art, vamos embora, estou com um mal pressentimento..."
Após alguns segundos de silêncio e mais alguns metros de passos descuidados, eles encontraram a fonte da luz roxa. "Emi, só tira uma foto disso e vamos voltar!"
Eles haviam encontrado uma espécie de portal totalmente roxo, haviam algumas escritas em uma linguagem estranha ao seu redor e o local da caverna onde ele estava situado estava com um brilho azul realmente bonito que vinha de algumas partículas flutuantes de luz, transmitindo uma pureza e até mesmo um pouco de paz, que eram totalmente arruinados pelo sentimento de estranheza que emanava daquele portal, se eles fossem um pouco mais atentos, teriam notado que o caminho atrás deles tinha desaparecido e nenhuma luz mais vinha de lá.
"Meu celular parece estar com problema, tenta usar o seu"
Nesse momento, Art havia desviado seu olhar do portal para procurar seu celular quando a luz azul começou a brilhar mais intensamente "Emi, vamos sair daqui agora". Eles olharam para trás, apenas para notar única e exclusivamente que seu caminho havia desaparecido e seu destino já estava selado, após alguns segundos, uma luz branca extremamente forte preencheu o ambiente e Artur soltou um grito curto de desespero antes de um zumbido agudo preencher totalmente seus ouvidos.
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Art ainda desorientado tentou olhar em volta apenas para perceber que ele não tinha a mínima ideia de onde ele estava, haviam árvores totalmente estranhas a seu redor, junto com cantos e barulhos de alguns animais voadores que ele não lembrava o nome. Ainda desorientado e confuso, ele olhou a seu redor e viu que Emi estava deitada não muito longe de onde ele se encontrava. Artur até poderia pensar o pior, se não fosse possível ver claramente que seu peito ainda subia e descia com sua respiração.
Um pouco aliviado, mas ainda confuso, Art olhou para o lado, notando que a vegetação parecia estar um pouco mais aberta do que em outros locais. Apesar da fadiga, ele conseguiu pegar Emi e a levar até esta clareira, onde logo após deixar ela no chão novamente, olhou para o céu, onde viu uma vista que não poderia ser explicada por nenhuma lógica convencional.
Era um gigantesco dragão de cor carmesim, seu tamanho estava na casa de dezenas de quilômetros, mas a grande distância o fazia parecer um pouco menor, porém imensamente opressivo, se qualquer ser humano o avistasse mais de perto, poderia sentir o calor que emanava de seu corpo, apenas para notar que seu ser havia começado a queimar e sua morte era apenas uma questão de tempo. Seus chifres negros estavam brilhando em sua ponta com o reflexo do sol, os transformando temporariamente em uma fonte de luz que rivalizava com a lua durante a noite.
"Emi! Acorda agora mesmo e me diz que eu não estou ficando maluco!" Gritou Art apesar de não ter ideia de que suas palavras poderiam causar sua morte naquele momento.
Quando Art terminou de falar, alguns míseros segundos se passaram e ele começou a sentir algo estranho, seus batimentos começaram a acelerar em um ritmo que não era possível para uma pessoa que não havia corrido uma maratona inteira, ele caiu no chão tentando respirar com todas as suas forças para apenas perceber que nada que ele fizesse poderia parar o que estava acontecendo. Seus ossos começaram a ranger e sua pele começou a se tornar extremamente vermelha apenas com o sangue que circulava por ela, seus órgãos estavam se contorcendo e se espremendo dentro de seu corpo apenas para repetir o processo mais uma vez.
Sua vista estava começando a escurecer, mas antes que ele sequer pudesse raciocinar minimamente, um evento extremamente único aconteceu, aquele ser mitológico soltou uma escama, isso havia acontecido a algumas horas na verdade, mas apenas agora ela se tornou visível aos olhos desse ser minúsculo.
Artur observou a queda daquele objeto lendário lentamente antes de fechar seus olhos e desmaiar com aquela dor excruciante, repleto de dúvidas, medo e desespero...
Quem saberia se ele conseguiria acordar para ver o dia de amanhã? Somente os Deuses saberiam o que o aguarda, mas esse mundo, infelizmente, foi esquecido por eles...