O corredor atrás da Segunda Porta parecia infinito, uma extensão de escuridão que engolia tudo. O ar estava gelado, carregado com uma tensão opressiva. Rafael, Letícia, Diego e Marcos andavam lado a lado, mas o peso da ausência de Clara era insuportável. Cada um estava preso em seus próprios pensamentos, perguntando-se se a escolha dela realmente tinha sido necessária.
— Isso não está certo — murmurou Diego, quebrando o silêncio. — Ela se sacrificou, e ainda assim, estamos presos nisso. Por que a porta não nos libertou?
— Porque a escuridão nunca quis libertar ninguém — respondeu Letícia, com a voz dura. — Esse "jogo" nunca teve regras claras. Só nos mantém andando em círculos.
— Precisamos seguir em frente — disse Rafael, com determinação forçada. — Não podemos deixar o sacrifício de Clara ser em vão. A Segunda Porta abriu, e o que quer que esteja no final desse corredor… é onde tudo termina.
O grupo continuou, mas o corredor começou a mudar. Sussurros ecoavam ao redor, cada vez mais altos, até que formavam palavras que cortavam como lâminas.
— Você não merece…
— Todos vão morrer por sua culpa…
— Volte para trás…
As vozes vinham de todos os lados, mas também de dentro deles, alimentadas pelos próprios medos. Quando finalmente chegaram ao final do corredor, encontraram uma grande sala circular, onde o chão era um espelho negro que refletia suas imagens distorcidas. No centro da sala, um trono grotesco feito de ossos e sombras se erguia. Sobre ele, uma figura indistinta os aguardava.
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A Face da Escuridão
A figura no trono era impossível de definir. Ela parecia mudar constantemente, assumindo formas humanas e monstruosas. Às vezes, lembrava pessoas conhecidas — Clara, a mãe de Rafael, rostos familiares que se desmanchavam e voltavam a surgir.
— Bem-vindos ao fim — disse a figura, com uma voz que era uma mistura de muitas. — Vocês chegaram até aqui porque ousaram abrir a porta. Mas não entenderam o que significa ser marcado.
Rafael deu um passo à frente, encarando a figura. — Quem é você? Por que nos trouxe aqui?
— Eu sou a escuridão que vocês tentam esconder. Sou a soma de suas falhas, dos segredos que enterraram, das escolhas que evitam. Vocês me alimentaram durante toda a vida, e agora, sou forte o suficiente para me libertar.
Letícia apertou o punho. — Você só existe porque deixamos você existir. Não somos mais as mesmas pessoas que começaram isso. Enfrentamos nossos medos. Não temos mais nada a temer de você!
A figura riu, um som que reverberou pela sala, estremecendo o chão. — Vocês acham que enfrentar suas memórias é suficiente? Ainda não entendem. Vocês precisam cair. Não há luz sem sacrifício completo.
A sala começou a se contorcer, as sombras crescendo ao redor. De repente, Clara apareceu no centro, seus olhos vazios, a pele pálida como cera.
— Clara! — gritou Diego, correndo em sua direção, mas foi detido por uma parede invisível.
A figura riu novamente. — Ela é minha agora. Ela pagou o preço, e vocês não podem recuperá-la. A pergunta é: quem será o próximo?
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A Revelação
Rafael olhou para Clara, o coração pesado de culpa. Mas algo na expressão dela parecia… errado. Ele se concentrou no símbolo em seu pulso, que começou a brilhar levemente, e então viu: não era Clara. Era uma ilusão criada pela escuridão.
— Você não pode nos enganar — gritou ele, erguendo o punho. — Não somos mais seus brinquedos!
O símbolo no pulso dele brilhou intensamente, e os outros seguiram seu exemplo. As marcas irradiaram uma luz intensa, banhando a sala e forçando a escuridão a recuar. A figura rugiu, sua forma distorcida tremendo.
— Vocês acham que podem me derrotar? Eu sou eterno! Eu sou parte de vocês!
Mas Rafael percebeu algo. A luz das marcas não estava machucando apenas a figura; estava também afetando o espelho no chão. Ele entendeu que o verdadeiro inimigo não era a figura diante deles, mas o reflexo — uma manifestação da escuridão que habitava em cada um.
— A escuridão só tem poder se deixarmos! — gritou Rafael. — Quebrem o reflexo!
Sem hesitar, o grupo ergueu as mãos, focando toda a energia de suas marcas no espelho. A luz cresceu em intensidade, até que uma rachadura apareceu no chão. A figura no trono gritou, tentando resistir, mas era tarde demais. Com um som ensurdecedor, o espelho se despedaçou, e tudo ao redor desapareceu.
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A Libertação
Quando abriram os olhos, estavam de volta à casa de Rafael. O livro estava fechado sobre a mesa, e as marcas em seus pulsos haviam desaparecido. Por um momento, o silêncio foi absoluto, e ninguém sabia se o que haviam vivido era real.
— Acabou? — perguntou Diego, olhando ao redor.
Rafael assentiu, embora ainda sentisse um peso em seu peito. — Acho que sim. A escuridão… ela se foi.
Letícia pegou o livro, hesitante. — O que fazemos com isso? Não podemos deixá-lo aqui.
— Vamos queimá-lo — disse Rafael, com firmeza. — Não vamos dar a chance para que isso aconteça de novo.
Eles saíram juntos, jogando o livro em uma fogueira improvisada no quintal. As chamas o consumiram rapidamente, e por um breve momento, pareciam ouvir sussurros vindos das páginas, antes de desaparecerem para sempre.
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Ecos do Passado
Enquanto observavam o livro queimar, cada um deles sabia que nunca seria o mesmo. A escuridão que haviam enfrentado era uma parte deles, e talvez sempre seria. Mas agora, conheciam a força que tinham para enfrentá-la.
Rafael olhou para o céu, onde as primeiras luzes do amanhecer começavam a aparecer. — A escolha foi feita. Não somos os mesmos, mas estamos vivos. Isso é o que importa.
O grupo ficou em silêncio, unidos pela experiência que compartilhavam e pela memória de Clara, que sempre viveria dentro deles. A noite havia terminado, mas a escuridão… essa nunca desapareceria completamente.