Capítulo 1: O Exílio de um Bruxo
Acordou com a boca seca e um frio que penetrava até os ossos. O céu estava acinzentado, carregado de nuvens que bloqueavam o sol, e uma leve brisa cortante soprava através da vasta extensão de colinas esparsas à sua volta. A última coisa que lembrava era a fúria da Caçada Selvagem, o brilho das espadas élficas, a dor das correntes de magia, e então o vazio. A escuridão total.
William Black Turner, outrora bruxo da Escola do Grifo, agora se encontrava deitado em um terreno acidentado e úmido. Seus sentidos aguçados detectaram o cheiro metálico de sal e ferro no ar. Levantando-se com um esforço doloroso, ele verificou seu corpo. Ainda era o mesmo: alto, musculoso, cabelos negros com fios grisalhos, a pele marcada por cicatrizes de combates passados. Vestia a armadura de couro reforçada com placas de aço — o traje clássico dos bruxos de sua escola. Sua espada de prata, ainda embainhada, estava à sua cintura, e a espada de aço pendia em suas costas.
Ao longe, ele vislumbrou o brilho do que parecia ser o mar. O horizonte estava coberto por picos montanhosos: as Montanhas de Veludo. Um território desconhecido para ele, mas a brisa salgada indicava que estava em algum lugar próximo ao mar. O que, em Essos, poderia significar muitos lugares, mas uma ideia começou a se formar em sua mente.
Ele se lembrava de ter lido sobre Braavos, uma cidade isolada por suas próprias nevoas e mares, e a presença das Montanhas de Veludo confirmava sua suspeita. Ele estava nas Terras Disputadas, provavelmente ao norte, perto do Mar Estreito. Mas como havia chegado ali? A última vez, havia sido jogado em Kaedwen, no mundo de The Witcher, depois de uma luta brutal. Agora, era outra terra, outro mundo. Ele teria de se adaptar. De novo.
Concentrando-se nos arredores, seus sentidos sobrenaturais detectaram a presença de vida humana não muito longe. Aproximando-se com cautela, desceu uma encosta íngreme, onde os sons de rodas de carroça e o tinido de metais lhe chamaram a atenção.
Era uma caravana.
Cerca de uma dúzia de mercadores e seus guardas estavam acampados, carregando mercadorias diversas — especiarias, tecidos e algum tipo de metal bruto. Estavam prontos para partir, provavelmente em direção a uma cidade próxima, e William viu nisso uma oportunidade.
Ele se aproximou devagar, o olhar sempre atento a qualquer movimento suspeito. Um dos guardas, um homem atarracado e de cabelos encaracolados, o notou primeiro. Sua mão foi direto ao cabo da espada.
— Quem vem lá? — gritou o guarda, os olhos estreitados em desconfiança.
William levantou as mãos, em um gesto de paz, mas seus olhos frios e a cicatriz que cortava sua sobrancelha esquerda não o tornavam menos ameaçador.
— Um viajante perdido — respondeu, sua voz rouca pela falta de uso. — Estou tentando chegar a Braavos. Poderia me juntar a vocês?
Os mercadores se entreolharam. Alguns cochicharam entre si, outros pareciam medir o recém-chegado. O líder, um homem robusto com uma barba negra bem cuidada e um olhar de quem já havia visto muito do mundo, se adiantou.
— Braavos, é? Não é lugar para qualquer homem — disse ele, avaliando William com cuidado. — E que garantias temos de que não nos trairá no meio do caminho?
William olhou ao redor. Ele não estava em posição de barganhar. Seus olhos, no entanto, fitaram o grupo com uma confiança que poucos homens possuíam.
— Não sou um homem comum — disse, tirando a espada de aço das costas com um movimento fluido, mas sem ameaçar diretamente. — Sei lutar, e minha espada estará ao serviço de vocês enquanto precisarem. E sou bom em manter monstros à distância, caso encontrem algum no caminho.
Um riso seco veio de um dos mercadores, um homem magro com nariz adunco.
— Monstros? Por acaso acha que estamos nos campos de Ghis? O que há de monstros por aqui, a não ser piratas?
O líder, no entanto, ergueu a mão, silenciando os demais.
— E o que faz um homem como você, um que parece tão... viajado, sozinho nas Montanhas de Veludo?
William hesitou por um momento. Não podia simplesmente dizer a verdade; as pessoas de Westeros e Essos dificilmente acreditariam em transmigração de almas ou bruxos vindos de outros mundos.
— Sou um guerreiro que perdeu sua companhia no caminho. Fui contratado para proteger uma embarcação que afundou. Agora, estou buscando uma nova causa.
A história era verossímil o suficiente. Mercenários eram comuns, e a narrativa explicava sua armadura e habilidades de combate.
O líder da caravana, depois de alguns instantes de ponderação, deu de ombros.
— Braavos é nosso destino também. Se o que diz é verdade, sua espada pode nos ser útil. Se mentir... — Seus olhos brilharam com uma ameaça não dita, mas clara. — Não sobreviverá para contar outra história.
William apenas assentiu. O trato estava feito.
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A viagem seguiu por dias. O caminho pelas montanhas era árduo, mas não sem recompensas. As Terras Disputadas eram conhecidas por sua riqueza mineral e vastos recursos naturais, e mesmo nas trilhas de montanha havia sinais disso — rochas brilhando com veios de metais preciosos, e ocasionalmente, o som distante de martelos ecoava de minas próximas. O terreno, apesar de traiçoeiro, oferecia uma beleza áspera, com picos cobertos de neblina e vales profundos onde riachos serpenteavam entre árvores antigas.
William mantinha-se em silêncio na maior parte do tempo, observando os mercadores e guardas. Era um grupo variado. A maioria dos guardas eram mercenários de Essos, homens endurecidos pela vida, sempre desconfiados e com o olhar afiado. Os mercadores, por outro lado, eram mais relaxados, embora a desconfiança inicial por ele nunca tivesse se dissipado completamente.
Uma noite, enquanto o grupo fazia uma pausa para descansar ao redor de uma fogueira, o líder da caravana, chamado Garrik, se aproximou de William.
— Então, homem perdido, de onde vem de verdade? — perguntou Garrik, sentando-se ao lado dele. O crepitar do fogo refletia no olhar curioso do mercador.
William respirou fundo, tentando formular uma resposta que fosse plausível, mas sem revelar demais.
— De um lugar longe. Muito longe. Um lugar de muitas guerras, e onde os homens aprendem cedo a sobreviver.
— Isso posso acreditar. — Garrik riu baixinho. — Já vi homens como você. Soldados que viram demais e falam de menos. Mas Braavos é uma cidade que engole guerreiros solitários. O que espera encontrar lá?
William olhou para o fogo, as chamas dançando em seus olhos.
— Algo que perdi. Talvez eu mesmo. Talvez um propósito.
Garrik ficou em silêncio por um tempo, como se ponderasse a resposta. Ele olhou para William com uma expressão mais suave.
— Braavos é um lugar de mistérios e oportunidades. Talvez você encontre o que procura. Mas cuidado. Nem sempre o que buscamos é o que encontramos.
A conversa morreu ali, e ambos ficaram em silêncio, observando as chamas consumirem a madeira até restarem apenas brasas. William sabia que o que procurava era mais complexo do que palavras poderiam descrever. Ele tinha sido arrancado de um mundo para outro, um exilado eterno. Mas algo em Braavos, talvez nas sombras de seus canais e em suas guildas secretas, poderia lhe oferecer um caminho de volta — ou ao menos um novo começo.
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Finalmente, após vários dias de viagem árdua, as Montanhas de Veludo começaram a se suavizar. O cheiro de sal no ar se intensificou, e, ao longe, o perfil escuro da cidade de Braavos emergiu na névoa. As torres e cúpulas da cidade reluziam sob o céu nublado, e o vasto Titã de Braavos vigiava a entrada do porto, como uma sentinela eterna.
William ficou parado por um momento, observando a cidade. Braavos. Um lugar de liberdade, mas também de segredos sombrios. Ele não sabia o que o esperava ali, mas sabia que aquele era apenas o começo de uma nova jornada.
Uma jornada onde ele, um bruxo sem lar, teria de se adaptar ou perecer.
E William Black Turner não era homem de perecer.