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Senti o cheiro deles muito antes de vê-los. Três lobos e um coelho.
Revirei os olhos enquanto passava pela porta dos funcionários na lanchonete onde trabalhava nos últimos anos. Meu nariz se enrugou, realmente não gostando do cheiro dos predadores. Meu animal interior queria correr e se esconder, mas eu não ia deixar o mais novo 'casal' (grupo? harém?) estragar meu dia.
Não era como se eu estivesse tentando ser sarcástica ou algo assim ao chamar os quatro de um 'casal' da moda; eu só estava cansada disso. Acasalamentos entre predadores e presas estavam na moda agora, e os coelhos tinham se tornado a sensação do momento na comunidade das presas.
Eu estava cansada de ver novos livros surgindo na minha biblioteca sobre o pobre coelho maltratado que nunca encontrava um lar até o grande e mau lobo perceber que ela é sua parceira e prometer protegê-la de tudo e de todos que a machucassem.
Sabe qual é a espécie de presa que não precisa de proteção?
Coelhos.
Eu sei, eu sei, estou parecendo amarga e cínica, mas estou dizendo a verdade. Os coelhos são criaturas viscerais; não se deixe enganar pelos seus grandes olhos e rabos fofinhos. Poderiam acabar com você num piscar de olhos se você os irritasse. E nunca havia apenas um deles.
O sino na porta da frente me alertou para a chegada de mais clientes, e forcei um sorriso no rosto. Uma jodida matilha de coelhas entrou saltitando na lanchonete, rindo. Seus machos lobos entraram atrás delas, procurando por qualquer forma de ameaça.
Como se.
Se os lobos costumavam ser o transmorfo de escolha para os humanos comuns, esse título agora tinha caído direitinho nos coelhos... e eles estavam aproveitando ao máximo.
No espaço de talvez cinco minutos, a lanchonete foi de vazia para completamente cheia, e eu era a única trabalhando no momento.
Foda-se a minha vida.
-Oi! - Eu disse animada, me aproximando do grupo que chegou primeiro. Tirei um bloco de anotações do meu avental de garçonete e cliquei na caneta. - O que posso pegar para vocês?
O líder da alcateia se vira para me olhar, farejando o ar discretamente como se tentasse identificar meu cheiro. Tentei segurar meu sorriso de ironia, optando por manter meu sorriso profissional no rosto. Pode acreditar, garoto, mesmo que você pudesse sentir algo além do cheiro de gordura da fritura, café e quaisquer outros odores de comida ao meu redor, não teria como pegar o cheiro da minha espécie.
Eu tinha total certeza disso.
Observo seu lábio superior se curvar em desdém enquanto ele me classificava como nada mais do que humano. Anotando o pedido para a mesa, balancei a cabeça enquanto escrevia tudo. Precisava fazer isso? De jeito nenhum. Mas isso dava algo para as minhas mãos fazerem em vez de mostrar o dedo do meio para ele.
Não me dei o trabalho de perguntar o que a coelha queria; ela estava tão enterrada no abraço de um dos caras que eu não achava que ela iria aparecer para respirar tão cedo. Coelhos eram muito bons em se esconder, afinal.
Pena que ela não tinha nada em mim.
Depois de anotar tudo e confirmar o pedido, caminhei até o sistema de computador antigo e registrei os pedidos. Teria que fazer algo a respeito de atualizar essa coisa sem que ninguém notasse. Isso estava realmente me irritando.
Depois de enviar tudo para a cozinha, fui até a próxima mesa e repeti a mesma conversa com o mesmo sorriso até que todas as sete mesas estivessem atendidas.
Poucos minutos depois de servir as bebidas, os pedidos estavam prontos, e fui até a passagem para pegar os pratos.
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-Isso não é o que eu pedi, - disse a coelha, emergindo do abraço de seu parceiro enquanto eu colocava o prato de panquecas e xarope na frente dela.
-Não, não é, - concordei com um aceno. Nem uma vez o meu sorriso desapareceu desde que eles invadiram o meu trabalho, e nada do que ela dissesse agora mudaria isso. - É o que o seu namorado pediu para você.
Em outras palavras, se você não gosta, problema seu. Não coloque a culpa em mim quando é culpa do seu alfa.
-É só carboidrato; eu não vou comer isso, - ela continuou como se eu não tivesse dito nada. Ah, nada mais pretensioso do que uma coelha cercada por predadores.
-Eu entendo, - eu respondi com um aceno. Girei enquanto o sino me avisando que outro pedido estava pronto no balcão ecoava pelo restaurante.
Eu acho que minha conversa com a primeira mesa foi suficiente para fazer o lugar ficar em silêncio.
Ignorando tudo, peguei a comida e fui para a mesa dois para entregá-la.
-Isso não é o que eu pedi, - disse uma segunda coelha na exata mesma posição que a primeira. Sério mesmo. Eu pensei que lobos tinham mais cérebro que isso, mas aparentemente não. Aparentemente, eles gostam de cópias carbono das coisas.
-Eu entendo, - repeti a exata mesma frase que disse para a outra garota. - Se você tem algum problema com isso, sugiro que fale quando alguém estiver pedindo por você ou escolha um namorado que te conheça melhor.
A melhor parte de tudo isso era que eles não percebiam que eu também era um transmorfo. Eu parecia humano, estava coberto de cheiros humanos e trabalhava em um estabelecimento humano. Isso significava que eles precisavam manter seu temperamento sob controle para não revelar quem e o que eram para o mundo exterior.
Eu poderia ser uma presa... mas isso não significava que eu não gostava de apertar os botões quando sabia que era seguro fazê-lo.
Assistia ela engasgar enquanto ia para a mesa quatro ao lado deles. - Antes de trazer o seu pedido, gostaria de mudá-lo? - perguntei, erguendo uma sobrancelha para a mulher sentada na cabine de couro vermelho desgastada.
ela não disse uma palavra; simplesmente me olhava com olhos que teriam me arrancado os membros com satisfação se ela não tivesse uma imagem a manter.
-Eu gostaria de falar com seu gerente, - rosnou uma voz de uma das outras mesas.
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