— Não vai dar certo.
— Cala a boca, Ethan. — Resmungou Simon, não pela primeira vez.
— Como pode ter certeza que conseguiu desvendar todo o comportamento de uma espécie em quatro dias?
Simon deu de ombros, quase dando de cara com uma parede rochosa ao andar sem olhar para frente, mas David impediu, o segurando pelos ombros.
— Palpite de sorte. E os parasitas dessa caverna são uma versão artificial dos verdadeiros Parasitas, então não foi muito difícil.
Diante do olhar cético de Ethan, Angel acrescentou, enquanto atirava em uma cobra gelatinosa e brilhante. Outro parasita.
— Ele também teve ajuda. Não é, garoto? — Como se para provar seu ponto, um corvo tão brilhante quanto uma constelação pousou em seu ombro com um grasnado amigável.
Angel sorriu e acariciou seu pelo. O corvo se transformou em um gato rapidamente e correu para os corredores da caverna com uma precisão impressionante. Quando o animal voltou, era um corvo novamente e pousou no braço de David.
O Príncipe o parabenizou com um petisco e um sorriso orgulhoso, que logo se desmanchou ao ler o bilhete agarrado em sua pata.
— Seguro. — Grasnou o animal em uma tonalidade tranquila, numa tentativa de imitar a voz de Mike, o que acalmou David. Ao menos um pouco.
— Ainda não encontraram ele? — Angel perguntou, atrás de si, Ethan e Simon ainda discutiam.
— Não. E não consigo me decidir se isso é bom ou ruim.
Com a insistência de David ao voltar para a caverna, eles foram divididos em dois grupos. David e o Trio Do Caos em um, Mike, Jin, Aled e poucos guardas em outro.
Mike mapeou essa caverna pelos últimos quatro dias, sem a consciência de David, que estava trancado no quarto, de castigo. Nessas viagens, ele também coletou amostras dos parasitas que infestaram a caverna.
Simon os estudou, mais por curiosidade do que qualquer outra coisa. Nisso, foi feita a descoberta que os monstrinhos gelatinosos eram criaturas feitas por magia negra, o que não era uma surpresa.
Acontece que os verdadeiros Parasitas eram uma espécie completamente desconhecida, tanto por seu paradeiro, quanto pela falta de interesse dos próprios acadêmicos.
Quase não tinham parasitas em Arbor, além de um lugar pequeno e remoto no norte. Mas em Elfhaim, o Império dos Elfos, havia uma infestação difícil de lidar e ainda assim, eram poucas as informações.
David era o que os elfos chamavam de Hospedeiro, já que tinha um Parasita vinculado a si.
Alguns hospedeiros utilizavam os parasitas para seu próprio benefício, embora não não fosse um método seguro. Quando o poder de alguém era tão potente que o consumia por dentro (algo como, a escuridão de Jin Yang se habitasse em um humano comum), os parasitas se alimentavam desse poder e o hospedeiro evitava sequelas deixadas pelos seus Dons.
Quando David se tornou um hospedeiro, no entanto, fora sem o seu consentimento. Uma de muitas torturas que o antigo imperador dos elfos o fez passar. Ainda assim, Frey ensinou David a se tornar um guerreiro poderoso. Sanguinário e assassino? Talvez, mas poderoso.
— Relaxa, vai dar tudo certo. — Angel deu um soco amigável no ombro de David, o tirando de seus desvaneios.
Ela era forte, muito forte. O que não combinava muito com sua estatura delicada e o rosto pequeno e bonito.
— Tenho certeza que Mike sabe o que está fazendo.
David fez uma careta.
— Espero que esteja certa.
O Príncipe não era um idiota, ele sabe que Mike levou os outros para os lugares mais perigosos. Além disso, estavam fazendo muito barulho, provavelmente para chamar a atenção de Caron.
Aled tinha uma teoria, muito boa inclusive. Como ele esteve ao lado de Simon enquanto o garotinho fazia sua pesquisa, chegaram à conclusão que esses parasitas da caverna se alimentam das relíquias sagradas.
As chances de outras relíquias além da Armadura De Aled e a Espada de Rhion estarem intactas é pequena, mas não nula, o arco e flecha dourado nas costas de Angel é a prova disso. Estava danificado, mas não era um grande problema.
Roberto não estava em lugar nenhum para confirmar, mas os experimentos que Simon fez com as amostras que Mike pegou para ele eram certeiros.
A Armadura de Aled e A Espada de Rhion eram relíquias seculares, o que tornava a probabilidade de terem sido devoradas muito baixa, além de terem uma certa autonomia. O que explicava o fato do Rei não saber o local exato onde elas estavam.
— Vocês estão fazendo muito barulho. — Reclamou David, enquanto caminhava um pouco mais à frente, parando em uma esquina para analisar os arredores.
— Eu só disse que poder falar e ver os Espíritos era uma vantagem injusta.
— Não é!
— Simon está certo, Ethan. Os Espíritos são egoistas e incapazes de sentir empatia. Só se preocupam com alguém se for o seu campeão, e o motivo de o escolherem são os mais comodistas possíveis! — Angel resmungou, as palavras sempre saiam mais rápidas quando estava irritada.
Ethan lançou para ela um olhar sarcástico.
— Como sabe disso, exatamente? Se você não pode ver e nem falar com Espíritos?
Ela estava certa de fato, mas antes que pudesse explicar o motivo de saber isso tudo, David levantou a mão, pedindo silêncio.
— Ela já se conheceu um, seu bobã…
— Shhh…
Simon, que estava tentando defender sua irmã, teve sua boca tampada por uma das mãos de David. A outra mão do príncipe repetiu o movimento, e Angel espelhou o Príncipe, colocando ambas as mãos na boca de Ethan, mesmo que não fosse necessário.
Algo rápido e brilhante, passou pelo corredor à frente, deixando um rastro de vento forte para trás. O corvo que estava no braço de David se contorceu sobre seu corpo e se tornou uma espada presa a uma bainha na cintura do Príncipe.
O Trio do Caos trocou olhares chocados enquanto Simon sorria de orelha a orelha.
— O que foi isso?
Ao invés das crianças responderem, uma voz grossa e profunda o fez.
— Foi a Espada de Rhion, tentando encontrar seu par.
— Não acredito! Mike conseguiu? — David se virou, animado, encontrando o Rei olhando de volta para ele.
O Príncipe percebeu, um pouco tarde, que não era Ethan quem ele mantinha calado junto com Simon. Não havia carne onde ele tocava, sua mão parecia segurar uma lâmpada acesa.
— Tinha me esquecido que os O'Niells podiam tocar em Espíritos… — Comentou o Rei, com um bom humor.
— Ah… é você…
★☆★☆
— Que os céus nos ajudem, ele é um lunatico! — Aled choramingava. Mais e mais morcegos voavam em sua direção enquanto ele os destruía um a um.
A escuridão de Jin quase cobria o topo da caverna aonde eles estavam, que por mais incrível que fosse, era alto demais para o tamanho da Caverna Sagrada vista do lado de fora.
E, é claro, havia diversos tipos de esqueletos, não é a primeira sala que isso acontecia. No topo da pilha, Mike se pendurava em um cristal, a escuridão de Jin o rodeava, cortando tudo que se aproximava.
Os guardas que Aled trouxe não eram muitos, por isso estavam tendo dificuldades para cortar, queimar ou matar os parasitas. Jin os ignorava, quanto aos parasitas, alguns ele matava, porque tinham um gosto ruim. Afinal, ele podia se alimentar de magia negra, mas não era sua refeição favorita.
Mike se cortava vez ou outra, seja pelos morcegos gelatinosos, que brilhavam como as estrelas ou pela escuridão de Jin, que o feria quando Mike se movia, mas ele não perdia o foco.
Não demorou muito e a ponta de uma capa saiu de um cristal, mas não o suficiente para puxar, portanto Mike continuou quebrando o cristal com a precisão de um escultor.
Quando ele agarrou a capa vermelha e girou em seu pulso, sentiu a armadura vacilar, como se deslizasse por dentro do cristal e Mike conseguir tirá-la de uma única vez.
— Peguei!!!
A Armadura de Aled brilhou em suas mãos, chamando atenção de todos os parasitas que voaram em sua direção em um único impulso.