Chereads / Assistente do CEO / Chapter 8 - Capítulo 8: Pedido

Chapter 8 - Capítulo 8: Pedido

Sophia estava impecavelmente elegante. O vestido que usava havia consumido quase todas as suas economias, mas ela sabia que não poderia se apresentar de qualquer maneira em um jantar tão importante. Cada detalhe foi cuidadosamente pensado, desde os acessórios até o penteado. Quando se aproximou de Jae Hyun, ele a observou por alguns instantes em silêncio, o olhar avaliativo e talvez até curioso, antes de se virar e seguir em direção ao salão.

Sophia já estava acostumada com esse tipo de evento. Geralmente, esses jantares seguiam um padrão: conversas formais, brindes para celebrar acordos, e depois a assinatura dos contratos. Era raro algo fugir desse roteiro. No entanto, naquela noite, algo a incomodava. O secretário do presidente Hyu não parava de encará-la, lançando olhares discretos, mas insistentes. Mesmo durante as despedidas, quando todos já relaxavam, aquele olhar estranho permanecia, e Sophia sentia um desconforto crescente a cada segundo.

— Senhorita Harper, gostaria de tomar um drink comigo? – perguntou o secretário, um sorriso ensaiado no rosto. Sophia sequer se deu ao trabalho de lembrar o nome dele, já que desde o início sentia uma antipatia inexplicável pelo homem.

Ela levantou os olhos lentamente, encarando o secretário com um olhar afiado, quase gélido. Era como se estivesse esperando que ele captasse a mensagem clara: ela não queria a companhia dele. Todos já haviam se retirado, e aquele era o momento que ela tinha conseguido para si mesma. Um raro instante de liberdade, onde podia finalmente respirar sem as correntes da formalidade que a prendiam o dia todo.

Sophia estava sentada no bar, com um drink em mãos, desfrutando de uma paz momentânea. O ambiente era tranquilo, quase vazio, e isso a ajudava a esquecer, ainda que por alguns minutos, a pressão do trabalho e das expectativas. Ela queria apenas relaxar, aproveitar aquele tempo para si. A última coisa que desejava era uma conversa forçada com alguém que não lhe despertava o menor interesse.

— Agradeço o convite, mas estou bem assim. – disse Sophia, sua voz cortante, mas educada o suficiente para não causar um incidente. Ela voltou o olhar para seu drink, esperando que ele entendesse a indireta e a deixasse em paz.

O secretário hesitou por um momento, claramente surpreso pela recusa. Talvez estivesse acostumado a ter seus convites aceitos sem questionamentos. E agora, com a rejeição de Sophia, parecia que ele se sentia desafiado, como se a negativa dela fosse uma provocação pessoal.

— Eu notei o seu olhar durante todo o jantar. – disse ele, com malícia na voz, ignorando completamente o desconforto que Sophia demonstrava. Sem esperar permissão, ele se sentou no banco à frente dela, os olhos vorazes analisando cada detalhe.

Sophia sentiu o olhar dele queimando em sua pele exposta, especialmente onde a fenda do vestido revelava parte de sua perna. Com uma expressão de nojo, ela colocou a taça de volta no balcão e o encarou diretamente, percebendo que ele estava concentrado em um ponto específico de seu corpo.

— Você não precisa se fazer de difícil para mim. – continuou ele, estendendo a mão e tocando sua perna, como se o contato fosse uma concessão natural.

Um arrepio de repulsa percorreu o corpo de Sophia. Ela bateu com força na mão dele, afastando-a de imediato, seus olhos agora ferozes, emanando raiva.

— Não encoste em mim! – ela falou com firmeza, sua voz carregada de autoridade — Não te dei nenhum tipo de liberdade para isso. Se ponha no seu lugar.

O sorriso pervertido que surgiu nos lábios do homem apenas intensificou o nojo de Sophia. Ele parecia ainda mais excitado pela reação dela.

— Você é bem arisca. – observou ele, claramente gostando do jogo doentio que imaginava estar acontecendo — Exatamente como eu gosto.

Ele se levantou lentamente, avançando na direção dela, ficando próximo demais, o suficiente para que Sophia se sentisse encurralada no assento alto do bar. Sua presença era opressora, e ela percebeu que ele não tinha a intenção de recuar.

— Não precisa fingir. Nossos chefes não estão aqui, estamos só nós dois. – disse ele com um tom insinuante, aproximando sua mão novamente, desta vez subindo pela fenda do vestido dela.

Algo explodiu dentro. Ela agarrou a mão dele com brutalidade, empurrando-o para longe com toda a força que tinha, mas o homem mal se moveu, como se estivesse determinado a impor sua vontade.

— Se afaste de mim agora! – ordenou ela, a voz cortante como gelo — Quem você pensa que é para me tocar dessa maneira?

Sophia estava furiosa. Como ele ousava tratá-la de forma tão desprezível, como se ela fosse qualquer uma? A audácia dele era inaceitável, e a raiva que borbulhava dentro dela só crescia a cada segundo que ele se recusava a desaparecer da frente dela.

O homem não recuou. Pelo contrário, o sorriso perverso em seus lábios apenas se ampliou. Ele deu um passo à frente, aproximando-se mais de Sophia, e, apesar de seu coração bater freneticamente, ela manteve-se firme, não mostrando nenhum sinal de fraqueza.

— Você gosta de fazer jogo duro, não é? – ele sussurrou, inclinando-se sobre ela, o cheiro de álcool impregnando o ar.

Sophia tentou se levantar, mas ele colocou a mão em seu ombro, forçando-a permanecer sentada. A raiva dentro dela crescia com uma intensidade que quase a sufocava. Como ele ousava tratá-la assim? Sentia o sangue fervendo em suas veias, a adrenalina pulsando em seu corpo.

Ela tentou se livrar dele novamente, empurrando-o com força. Desta vez, o golpe o pegou desprevenido, e ele deu um passo para trás, o suficiente para que ela se levantasse do banco.

— Não ouse me tocar de novo, ou vou me arrepender de não ter chamado a segurança mais cedo! – ela ameaçou, mantendo a postura defensiva.

O homem riu, uma risada baixa e desdenhosa. Ele avançou novamente, ignorando completamente as palavras dela.

— Você realmente acha que pode mandar em mim, senhorita Harper? – ele falou com desdém, estendendo a mão novamente para ela — Você não passa de uma mulher como qualquer outra.

Quando ele estava prestes a tocá-la novamente, Sophia, movida pelo desespero, ergueu o braço e deu um tapa na mão dele com força, mas ele não parou. Avançou de novo, e dessa vez a pegou pelo pulso, apertando com força suficiente para machucar.

Sophia tentou se soltar, mas ele a puxou para si, a respiração pesada e o olhar repleto de intenções claras.

— Me solte! – exigiu ela, a voz carregada de fúria e determinação. Ela começou a lutar, tentando se soltar das garras dele. O coração batia tão rápido que ela mal conseguia ouvir seus próprios pensamentos.

O homem sorriu, parecendo gostar da resistência dela. Mas, de repente, ele foi interrompido por uma voz fria e autoritária que cortou o ar como uma lâmina.

— O que você pensa que está fazendo?! Solte-a agora!

A voz ecoou pelo bar, profunda e ameaçadora. O homem imediatamente congelou, seus olhos arregalados de surpresa. Lentamente, ele soltou o pulso de Sophia e se virou para ver quem tinha falado.

Lá, parado à entrada do bar, estava Kim Jae Hyun. Seu olhar era gélido, sua expressão impassível, mas os olhos brilhavam com uma raiva contida. Ele caminhou em direção aos dois com passos rápidos e firmes. Jae Hyun o segurou pelo colarinho com tanta força que os nós dos seus dedos estavam brancos, e o pânico do homem era evidente em seus olhos arregalados. A confiança arrogante que ele exibia momentos antes havia desaparecido, substituída por medo.

— P-presidente Kim? – ele gaguejou, a voz vacilante e trêmula, enquanto sentia o olhar assassino de Jae Hyun perfurar sua alma. O suor escorria pela testa do homem, que parecia encolher a cada segundo que passava.

Jae Hyun o puxou mais para perto, o rosto a centímetros do dele, os olhos brilhando com uma fúria perigosa.

— Como você ousa tocar na minha esposa?! – Jae Hyun rosnou, a voz baixa, mas carregada com um tom de ameaça que fez o secretário estremecer. Sua respiração ficou curta, o coração disparado enquanto ele tentava, inutilmente, se desvencilhar do aperto de Jae Hyun.

— E-eu não sabia... – o homem balbuciou, sua voz mal passando de um sussurro, enquanto olhava para Sophia, que observava a cena com uma mistura de alívio e choque — Eu não sabia que ela... que ela era sua esposa…

Jae Hyun o empurrou bruscamente, fazendo-o cambalear para trás e quase cair. Ele permaneceu parado por um momento, ofegante, enquanto olhava para Jae Hyun com puro terror nos olhos. O presidente não precisava dizer mais nada; sua presença e a ameaça silenciosa em seus olhos diziam tudo.

— Saia daqui antes que eu perca completamente o controle e acabe com você. – a voz de Jae Hyun era fria como gelo, e o homem não precisou de outra palavra. Ele se virou e correu para fora do bar, praticamente fugindo de qualquer vestígio de sua postura anterior.

Ainda com a raiva pulsando em suas veias, Jae Hyun tirou o celular do bolso com movimentos rápidos, quase instintivos. Seus dedos discaram alguns números conhecidos, e sua voz, fria e carregada de fúria, ecoou no aparelho.

— Dong Hyun, cancele imediatamente todos os acordos com o Grupo Haneul Holdings. – ele fez uma breve pausa, deixando a tensão em sua voz evidente — E quando o presidente Hyu perguntar o motivo, apenas diga que o secretário-chefe dele teve a audácia de assediar a minha esposa.

Ele finalizou a ordem com um tom cortante e desligou o telefone, sem dar chance para mais respostas, satisfeito apenas ao ouvir um obediente "Sim, senhor."

Enquanto guardava o celular no bolso do paletó, Jae Hyun permitiu que sua expressão gélida voltasse a dominar seu rosto. Seu instinto de proteger Sophia havia falado mais alto, mas ao olhar para ela, a sensação de triunfo começou a se dissipar. Sophia estava de pé, a poucos passos dele, e em seu rosto não havia gratidão. Havia algo muito mais profundo, uma mistura de emoções que ele não conseguia decifrar completamente — raiva, mágoa, e talvez... decepção.

Sophia apertou os lábios por um momento, o peito pesado com sentimentos conflitantes. Cada vez que Jae Hyun usava a mentira de que ela era sua esposa, uma parte de Sophia se quebrava por dentro. Para ele, aquilo parecia ser apenas uma forma prática de afastar pretendentes indesejadas ou de protegê-la em situações complicadas. Talvez ele sequer tivesse consciência do peso que aquelas palavras carregavam para ela; mas para Sophia, cada vez que ouvia isso, era um lembrete cruel de que, por mais que o sentimento dela por ele tivesse se intensificado, jamais seria correspondido. Aquela mentira era como uma ferida aberta que não conseguia cicatrizar, porque ele usava a palavra "esposa" com tanta facilidade, sem perceber o quanto aquilo a machucava. Ela sabia, com uma dolorosa certeza, que nunca seria alguém que ele amaria de verdade, e esse pensamento a corroía lentamente, transformando cada interação em uma batalha interna para não deixar suas emoções transbordarem.

— Senhorita Harper…

— Senhor Kim, se não se importar, irei sair um pouco. – Sophia disse, sua voz tentando soar firme, mas traindo uma leve tremulação. Ela não se importava mais com a permissão dele, precisava de espaço, precisava respirar.

Ela deu um passo rápido em direção à porta, determinada a sair dali o mais rápido possível, porém sentiu a mão dele segurando seu braço. O toque era firme, quase possessivo, como se ele se recusasse a deixá-la ir.

— Espere, onde você vai? – Jae Hyun perguntou, tentando controlar o tom de raiva em sua voz, mas a preocupação era visível em seus olhos.

Sophia se virou para encará-lo, seus olhos brilhando com emoções que ela não queria deixar transparecer. Ela se desvencilhou do toque dele com um gesto decidido.

— Isso não importa. – ela disse, sua voz firme, apesar do tumulto em seu peito.

Ela se afastou rapidamente, caminhando em passos apressados em direção à saída, sem olhar para trás. Cada passo parecia um esforço para manter a compostura, enquanto o barulho dos saltos ecoava no chão de mármore. Tudo que ela queria naquele momento era distância — distância dele, daquela situação, de tudo que estava pesando sobre seus ombros.

À medida que caminhava em direção à porta, sua mente girava em torno de duas ideias opostas: um desejo quase mortal de bater naquele homem asqueroso, e a vontade de afogar suas mágoas em bebidas até perder os sentidos. Ambas as opções, contudo, pareciam impossíveis de serem realizadas. Ela sabia que a única maneira de lidar com o turbilhão emocional que a consumia era buscar um pouco de paz na tranquilidade da noite.

A escolha de caminhar pela orla da praia parecia ser a única saída possível. A promessa de uma noite serena à beira-mar era um consolo que oferecia algum alívio ao caos interior que Sophia estava experimentando. O céu escuro e o som suave das ondas quebrando na areia criavam uma atmosfera de calma que ela esperava ser suficiente para acalmar seu coração agitado. Com passos firmes e resolutos, ela começou a trilhar o caminho ao longo da praia, determinada a encontrar algum tipo de serenidade antes que o sol surgisse ou seu chefe decidisse interromper sua solidão.

Apesar de sua resolução de não beber, a força da tentação acabou se impondo. Ao passar por uma loja de conveniência, Sophia entrou rapidamente, seus movimentos quase automáticos, e saiu com uma sacola cheia de garrafas de soju. O peso das garrafas em sua mão parecia simbolizar um alívio imediato, uma promessa de esquecer, nem que fosse por um momento, a sensação esmagadora de desconforto e frustração. Com um suspiro profundo, ela se dirigiu de volta para a praia, o som das ondas agora se misturando com a expectativa de um entorpecimento que esperava trazer algum alívio para a tempestade dentro de si.

Sophia tomou um gole da bebida, o líquido queimando suavemente em sua garganta enquanto ela se sentava na areia fria da praia. O contraste entre o luxo do vestido caro e a simplicidade do cenário ao seu redor era gritante, e por um breve instante, a preocupação com o possível estrago do vestido a atingiu. Mas esse pensamento logo se dissipou, substituído pelo desejo de afogar suas frustrações na bebida que havia escolhido como companhia.

Ela inclinou a garrafa para os lábios novamente, permitindo que o álcool a envolvesse, e um pequeno sorriso triste surgiu em seus lábios. Com um gesto quase solene, levantou a garrafa para o vasto mar à sua frente, como se buscasse a aprovação das ondas que se estendiam até o horizonte.

— Um brinde a mim. – murmurou para si mesma, a voz carregada com uma melancolia que ela não tentou esconder. O brilho das estrelas no céu parecia refletir a sua tristeza, e o som das ondas batendo na areia fornecia uma trilha sonora ao seu momento solitário. A garrafa se ergueu novamente em um gesto simbólico, e Sophia se deixou perder na sensação de estar sozinha na noite silenciosa que parecia compreender sua dor.

— O que está comemorando? – a voz de Jae Hyun rompeu a tranquilidade da noite, e Sophia se assustou, virando-se rapidamente para encontrar seu chefe parado logo atrás. O choque a deixou paralisada por um momento, não esperava que a seguisse e nesse momento uma pequena dúvida se instalou em sua mente: deveria permanecer sentada na areia ou se levantar imediatamente para se desculpar?

Não importava a sua escolha a esse ponto tudo já estava perdido. Sophia havia sido rude com o presidente da empresa — o mesmo homem conhecido por demitir funcionários por motivos muito menores do que isso. Nada mais importava agora.

— Presidente...? – sua voz saiu hesitante. Ela o encarou por um momento, tentando processar o que Jae Hyun estava fazendo ali.

Sua presença naquele lugar era completamente inesperada. Ela havia saido justamente por acreditar que estaria longe dele, longe de qualquer lembrança ou pressão. No entanto, lá estava ele, como se o destino insistisse em aproximá-los, mesmo quando ela tentava desesperadamente se distanciar.

— Você ainda não me respondeu. – continuou Jae Hyun, sua voz carregada com um tom de preocupação e curiosidade. Ele se aproximou e sentou-se ao seu lado, a areia fria parecendo não incomodá-lo enquanto ele observava a garrafa que ela segurava.

— Não estou sozinha. – respondeu Sophia, tentando esconder a insegurança em sua voz. Ela levantou a garrafa com um gesto casual, como se ela própria fosse sua única companhia. A leveza da sua resposta parecia uma tentativa de se proteger da vulnerabilidade exposta pelo momento.

— Eu errei com você? – Jae Hyun perguntou, a voz carregada com um tom que deixava claro que esperava uma resposta sincera. Seus olhos fixaram-se em Sophia, demonstrando uma curiosidade profunda.

Sophia desviou o olhar para o mar, sua mente vagando entre os acontecimentos da noite e suas próprias emoções tumultuadas. Com um gesto hesitante, ela pegou outra garrafa da sacola e a ofereceu a ele.

— Se você vai ficar por aqui, presidente, pelo menos beba comigo, ou finja que bebe. – ela fez um esforço para soar descontraída, tentando esconder o desconforto e a vulnerabilidade que sentia. Sua voz tremia ligeiramente, e ela olhou para ele com uma mistura de esperança e nervosismo.

Jae Hyun olhou para a garrafa com uma expressão que oscilava entre surpresa e consideração, antes de aceitá-la e romper o lacre da tampa com um movimento rápido. Ele tomou um gole, e o gesto simples surpreendeu Sophia. Aquele momento de espontaneidade era inesperado e, por um breve instante, Sophia se sentiu mais próxima dele. Seus olhos se encontraram, e ela sentiu seu coração acelerar, desestabilizado pela intensidade do olhar de Jae Hyun.

— E então? – Jae Hyun incentivou, seu tom era suave, quase como se ele estivesse tentando aliviar a tensão entre eles. Ele manteve o olhar fixo em Sophia, um traço de empatia nos olhos.

Sophia respirou fundo, o som do mar preenchendo o espaço ao redor enquanto ela desviava o olhar para a água, buscando um refúgio na imensidão azul diante dela.

— Não estou acostumada a ficar em silêncio. – ela admitiu, a voz carregada com uma sinceridade crua.

— É muito difícil para mim, ter que me calar quando deveria me proteger, baixar a cabeça quando devo bater de frente. Nada disso faz sentido para mim. – as palavras saíam como um desabafo, e ela se permitiu revelar a confusão e frustração que a atormentavam.

Na mente de Sophia, um turbilhão de lembranças desagradáveis rodopiava como um carrossel incontrolável. Cada momento doloroso, cada situação humilhante que enfrentou desde que chegou ao país, voltava à tona, criando um peso em seu peito.

Desde o desconforto inicial em seu trabalho, sendo olhada de forma diferente por não ser coreana, até o choque de ter cruzado acidentalmente o caminho de Jae Hyun naquela noite fatídica. A tentativa de Soo Ji de manipulá-la, o assédio sexual por pessoas em cargo semelhantes ou superiores, e como se tudo não bastante, a constante mentira que ele repetia — uma mentira que a feria profundamente, porque, para ela, cada vez que ele dizia "minha esposa" , era um lembrete cruel do abismo entre o que ela sentia e o que ele jamais sentiria. Não bastava o psicológico, era necessário destruir seu coração no processo. As memórias circulavam em sua mente, como uma montanha-russa emocional, fazendo com que cada uma dessas lembranças a corroesse por dentro.

— Em outras circunstâncias, eu saberia como lidar com pessoas iguais aquele babaca. – ela tomou um gole da bebida, a intensidade do momento refletida em seu olhar cansado — Se um homem me assedia, eu posso quebrá-lo em pedaços diferentes; se alguém tentar me humilhar, irá ouvir até a quinta geração. Essas são coisas que Sophia Harper faria, jamais levaria qualquer desaforo para casa. Mas como profissional, tudo o que faço é engolir o meu orgulho e suportar em silêncio coisas como as de hoje.

Segurando a garrafa com força, Sophia sentiu a raiva queimando dentro de si novamente, seu corpo inteiro tensionado ao lembrar do secretário asqueroso que havia passado dos limites. A imagem do olhar malicioso dele, a forma como ele se aproximou sem qualquer respeito, tudo fazia seu sangue ferver.

— Eu poderia ter acabado com ele na primeira vez que ousou me olhar daquele jeito. – disse ela entre os dentes, a raiva evidente em sua voz. No entanto, aos poucos, a pressão de sua mão sobre a garrafa foi diminuindo, enquanto seu olhar se perdia em pensamentos — Mas, todas as vezes que pensei em reagir, lembrei que não podia. Não devia. O correto era me livrar da situação sem causar complicações... continuar profissional, mesmo quando me sentia invadida. Não importa o que aconteça, preciso ser racional, manter a compostura.

Era uma batalha interna, entre o desejo de explodir e mostrar que ninguém poderia ultrapassar seus limites e a necessidade de seguir as regras do jogo — um jogo injusto, onde ser mulher e estrangeira já complicava tudo.

Jae Hyun a observou por um longo momento, suas emoções um turbilhão silencioso por trás de sua expressão contida. As palavras de Sophia ecoavam em sua mente como um peso insuportável, cada frase uma revelação mais profunda do que ele jamais imaginara.

Sophia tomou um longo gole da bebida, e antes que pudesse ir além, Jae Hyun estendeu a mão, pegando a garrafa firmemente. Seus dedos roçaram os dela por um breve momento, antes dele afastar a bebida, colocando-a do outro lado, longe de seu alcance.

— Você já bebeu o suficiente por hoje. – a voz dele era baixa, controlada, mas com um toque de preocupação que ele tentava esconder.

— E o que isso importa? – Sophia retrucou, com uma risada amarga escapando de seus lábios. Seus olhos, normalmente brilhantes de vivacidade, agora cintilavam com uma intensidade que misturava dor e embriaguez — Eu não trabalho mais para você.

Jae Hyun estreitou os olhos, com uma expressão de surpresa cruzando seu rosto.

— O que está dizendo? – ele a observou com mais atenção, notando o leve balançar de seu corpo, denunciando o efeito do álcool. Havia algo mais por trás daquelas palavras, algo que ele não conseguia decifrar de imediato.

— Qual parte você não entendeu? A que me demito? – provocou ela, com uma risada curta, enquanto tateava ao redor, puxando outra garrafa da sacola ao lado. Seus dedos trêmulos tentaram romper o lacre, e mais uma vez, Jae Hyun foi mais rápido, tirando a garrafa de suas mãos com um movimento firme e determinado.

— Não adianta, eu tenho muitas aqui. – Sophia riu, um som vazio, como se tentasse mascarar algo mais profundo. Apesar de seu estado, ela parecia se sentir vitoriosa, como se desafiar Jae Hyun fosse algum tipo de pequena conquista.

Ele suspirou pesadamente, a exasperação visível em cada traço de seu rosto.

— Senhorita Harper, conversaremos amanhã. Quando você estiver sóbria. – sua voz era controlada, mas o desconforto que sentia em vê-la assim era crescente.

Sophia, porém, não estava disposta a esperar por um amanhã que, para ela, já parecia perdido. Ela se virou de repente, com mais força do que sua condição permitia, e seus olhos se cravaram nos dele com uma mistura de dor e raiva. Antes que ele pudesse reagir, ela ergueu o dedo e o apontou diretamente para o peito dele, cutucando com força.

— Você. – a palavra saiu carregada de ressentimento — Não percebe que não vai ter amanhã para nós dois?

Ela segurou a lapela do terno dele com força, quase como se estivesse se segurando para não cair, ou talvez para não desmoronar completamente. O sorriso que tentou exibir não passou de um reflexo amargo, seus olhos traindo toda a vulnerabilidade que ela lutava para esconder.

— Eu não trabalho mais para você. – repetiu, sua voz agora mais suave, quase um sussurro — Pra mim, é muito difícil ficar ao seu lado.

A confissão parecia ter saído sem que ela tivesse controle, e conforme o peso de suas palavras se assentava, suas mãos começaram a relaxar, soltando lentamente o tecido do terno. O álcool entorpecia seus sentidos, mas não o suficiente para mascarar a dor que ela sentia ao dizer aquilo.

— Não diga mais que sou sua esposa… – sua voz quebrou, e seus olhos, antes brilhantes, agora estavam turvos com a tristeza — Isso me machuca. Toda vez que você diz isso, eu me iludo. Por um breve momento, acho que é real… e depois eu lembro que é só uma mentira.

Ela o empurrou levemente, como se tentasse criar alguma distância, mas mesmo essa distância parecia insuficiente. Sophia queria fugir, mas sabia que a dor a seguiria.

— Mas isso não importa mais. Agora, eu não preciso mais me preocupar com os meus sentimentos. – Sophia se levantou com dificuldade, cambaleando um pouco, e Jae Hyun, em um reflexo, estendeu a mão para ampará-la, mas parou antes de tocá-la.

— Adeus, Presidente Kim Jae Hyun. – disse ela, sua voz carregada de uma melancolia que cortava fundo.

— Foi um prazer... – ela sorriu, um sorriso amargo e bêbado — Dormir com você.

Sua risada embriagada ecoou, e ela fez uma reverência, quase tropeçando no próprio pé.

— Ops, trabalhar com você. – corrigiu, rindo de si mesma enquanto se afastava em direção ao calçadão, seus passos vacilantes denunciando seu estado.

Jae Hyun a olhou com surpresa ao ouvir suas palavras, e por um breve momento, sentiu uma vergonha súbita e inesperada. Mas esse sentimento logo deu lugar a algo muito mais profundo e urgente. Sem hesitar, ele se levantou rapidamente e a seguiu, agarrando-a pelo braço com uma firmeza que demonstrava sua determinação. Não permitiria que ela se afastasse novamente, não queria repetir o erro que cometeu três meses atrás. Seus sentimentos eram um turbilhão de proteção e urgência, uma necessidade imperiosa de não deixá-la escapar, de manter sua presença ao seu lado, como se isso fosse a única forma de corrigir os enganos do passado e construir algo real entre eles.

Sophia, surpresa, se virou, seu olhar bêbado e um sorriso trôpego surgindo em seus lábios.

— O que você pensa que está fazendo? – ela reclamou, tentando se soltar, mas era um esforço inútil — Eu já disse... adeus, Kim Jae Hyun.

— Você não pode ir para lugar nenhum assim. – disse ele firmemente, sua voz fria, mas havia uma nota de preocupação que ele tentava esconder. Ele a puxou gentilmente para perto, sabendo que a qualquer momento ela poderia desmoronar.

— Eu posso ir para onde quiser... – ela resmungou, enquanto seus passos vacilantes ficavam mais pesados, suas pernas falhando sob o peso do álcool.

Jae Hyun suspirou, olhando para os lados e percebendo que a única opção era carregá-la dali. Sem pensar duas vezes, ele se abaixou e colocou-a nas costas, ajustando seus braços ao redor dele. Sophia, surpresa, tentou protestar no início, mas logo relaxou, deixando-se ser carregada.

— O que você está fazendo? – sua voz soou abafada, o rosto pressionado contra o ombro dele, a respiração quente contra sua pele.

— Estou te levando de volta ao hotel. – respondeu Jae Hyun, a voz baixa, mas firme, enquanto caminhava.

Para Jae Hyun, cada gesto de Sophia, mesmo na sua embriaguez, era irresistivelmente adorável. Ele sabia que deveria ficar bravo com o comportamento impulsivo dela, especialmente depois de tudo o que ela disse, mas a raiva simplesmente não encontrava lugar em seu coração. Ao invés disso, ele sentia uma mistura de fascinação e uma crescente ternura. Tudo o que ela havia falado, ainda que sob o efeito do álcool, pesava em sua mente.

Por um momento, Sophia ficou em silêncio, a cabeça levemente encostada no ombro dele, o cheiro familiar de sua colônia a envolvendo. Era um gesto tão inesperado e íntimo, que fez seu coração bater descompassado. Ela não sabia se era o álcool ou algo mais, mas não conseguiu evitar o que veio em seguida.

— Sabe... – murmurou, sua voz quase um sussurro contra o ouvido dele — Ao invés de mentir... por que você não casa logo comigo?

Jae Hyun parou abruptamente, as palavras de Sophia o atingindo com a força de um soco. Ele a sentiu escorregar um pouco em suas costas, e rapidamente reajustou a posição dela, mas sua mente estava fixada no que ela acabara de dizer.

— O que você disse? – perguntou ele, tentando manter o controle, mas o coração disparado em seu peito o traiu.

— Você ouviu. – ela riu, um som meio bêbado, meio triste.

— Por que continuar mentindo? Se é tão fácil me usar como desculpa para não casar com Lee Min Hee, por que não torna isso real? – a voz dela falhou no final, uma mistura de riso e mágoa — Talvez assim... eu não precisasse ir para longe de você.

Ele não sabia o que responder.

— Sophia... – começou Jae Hyun, a voz mais suave do que pretendia, mas ela já estava encostada em seu ombro, a respiração ficando mais pesada, sinal de que o álcool estava cobrando seu preço. Ela murmurou algo ininteligível antes de cair em um sono leve.

Jae Hyun continuou andando, o peso dela em suas costas, mas a verdadeira carga agora estava em seu coração. Aquele simples pedido dela, tão inocente, não sairia de sua mente tão cedo. E, pela primeira vez, ele se perguntou se poderia mesmo continuar fingindo que nada estava mudando entre eles.