"Não sabia ao certo quantas horas haviam se passado e meu celular havia descarregado, mas com toda a certeza não tinha muito tempo.
O local onde estava parecia distante. Enquanto consultava o mapa fechando os meus olhos, busquei algum atalho.
"Beleza! Talvez passando por esse riacho devo gastar uns quinze minutos."
Caminhando e pegando fôlego, devo ter subestimado esse percurso.
O riacho tinha águas cristalinas, mas com uma cor diferente que lembrava gasolina. Tinha um odor adocicado que queimava as narinas, como se alguém tivesse derretido balas de caramelo em ácido. Sua tonalidade meio que me alertava de que não seria uma boa ideia cair ali.
As árvores formavam um arco por cima, impossibilitando de enxergar o céu vermelho por completo. Mantive o foco e segui o fluxo, sempre olhando se estava na direção correta.
Logo à frente, as coisas pareciam estranhas. Reparei que nas pedras havia aquele mesmo sangue preto semelhante da criatura que vi no deserto junto com a Sam.
"Cacete! Será que aquela bizarrice está por aqui?"
Diminuí um pouco o ritmo, o que não era algo muito difícil visto que já estava com o corpo dolorido e as pernas doendo do dia anterior.
Cada passo, uma olhada para ambos os lados, buscando qualquer coisa suspeita o suficiente para me esconder. Estava sendo um percurso tenso.
Minhas pernas doendo, minha mente martelando perigo conforme andava e tudo estava mandando uma mensagem clara de que não deveria ficar ali por muito tempo.
"Tomar no cu. Só quero achar aquela coleira e sair desta merda."
Calafrios, minha mão começou a tremer e uma sensação de medo descontrolada tomava todo o meu corpo. Meus músculos estavam rígidos e tensos, respirava com mais dificuldade e o meu coração parecia que iria saltar pela boca.
Uma síndrome do pânico, mas o que estava ocasionando isso? Próximo à minha direita, um som forte de ossos quebrando tornava aquela sensação ainda pior. Com cuidado e bem devagar, tentei me distanciar o máximo possível daquele som.
Depois de alguns minutos que pareciam uma eternidade, consegui me afastar o suficiente, só que agora tinha saído totalmente do atalho que a princípio estava seguindo.
"Cacete! Que porra era aquilo?"
"Merda! Faltava pouco."
Não sabia ao certo o que havia causado tamanho terror em mim e nem que tipo de criatura seria aquela, mas foi a motivação mais que necessária para acelerar o passo e dar um jeito de sair daquele lugar o mais rápido possível.
Tinha me afastado do rio gasolina e agora estava mais no meio da floresta. Consultei o mapa mais uma vez e percebi que a minha coleira estava se movimentando.
"Mas que porra é essa?"
Cada vez que fechava meus olhos, mais próximo ficava. A coleira não apenas se movia no mapa mental, ela pulsava como uma luz âmbar, como um farol em meio à névoa. Alguma coisa estava trazendo-a em minha direção, mas o que poderia ser?
Peguei a terra do chão, passei no meu corpo, imitando aqueles filmes de guerra que via na televisão. Joguei algumas folhas, galhos e fiquei escondido perto de alguns arbustos, tentei me camuflar e, a cada cinco minutos, fechava os meus olhos e via que ficava cada vez mais...
Perto...
Mais perto...
Mais perto...
Estava angustiante ficar ali. Não tinha nenhum objeto que eu pudesse usar como arma, a não ser o meu celular descarregado.
Nada, absolutamente nada... estava totalmente indefeso.
"Que merda!", fechando meus punhos na terra...
Agarrei uma pedra pontiaguda que parecia uma faca primitiva e tornei ela um de meus objetos de ataque. Estava pronto para morrer lutando.
Mesmo já estando morto, a rainha tem um senso de humor perverso. Me tornou seu escravo e ainda manteve todas as sensações de uma pessoa viva...
Em uma mão um celular descarregado e na outra uma pedra, no aguardo de um ser desconhecido que teria a chave para a minha liberdade.
Fechei meus olhos mais uma vez e havia desaparecido sem deixar nenhum rastro.
"Como assim? Será que foi embora?" Enquanto lentamente me levantava e limpava meu rosto.
Mas antes mesmo de conseguir me levantar, senti minhas pernas pesadas, parecia que havia uma força gravitacional impedindo meu corpo...
Tentei olhar para o lado, ou até mesmo para cima para tentar entender de onde estava vindo isso.
Foi quando fechei os meus olhos em um ato de reflexo e quando abri, havia uma criatura ao meu lado com a coleira do Azzy em suas garras.
Possuía um corpo totalmente coberto por uma armadura negra que lembrava até um escaravelho, com braços longos e um chifre grande saindo do topo do seu crânio.
Não era algo que me orgulhava, mas sempre tive um certo pavor de insetos, ainda mais esses com uma espécie de carapaça dura, o que aumentou ainda mais o meu medo fazendo todo meu corpo ficar arrepiado.
"Puta merda! Essa pedra não vai servir pra nada.... já era."
Meu corpo todo tremendo, mal conseguia me levantar, as pernas pesadas, cansando e com medo demais até para tentar algo.
Foi quando a criatura ergueu a coleira, e sua voz ecoou como o zumbido de um enxame:
"Você procura por ela... mas ela já é minha há eras."
Seus maxilares se abriram em um ângulo impossível, revelando filas de dentes espiralados que brilhavam com o mesmo negro das pedras.
Antes que pudesse gritar, a criatura inclinou o chifre para frente, e um líquido negro escorreu sobre a coleira.
"'Você não a merece", sussurrou.
Após ouvir isso, senti uma pancada em meu tórax, o que me fez ser lançado contra uma árvore. O impacto e o golpe foram tão fortes que todo o ar que tinha em meus pulmões saiu em um grito de dor inimaginável.
Enquanto todo aquele sangue saía pela minha boca, meus olhos embaciados, tentei mantê-los abertos, mas era impossível... meus ossos estavam quebrados, minha garganta estava totalmente destruída.
Antes de desmaiar, minha cabeça lentamente foi abaixando e foi aí que, em um último ato antes de meus olhos se fecharem, eu vi...
O meu coração já não fazia parte do meu corpo