Kael voltou para o quarto e passou a noite tranquilamente. Ninguém o incomodou; apenas as servas apareceram para entregar seus mantimentos. Comparado à época em que chegou naquele lugar, o jantar que forneciam a ele poderia ser considerado um banquete.
Sentado com as pernas cruzadas e absorto no cultivo, Kael ouviu uma batida na porta. Ele abriu os olhos lentamente. "Eles vieram bem cedo", pensou.
Depois de resolver as questões mais urgentes do pós-guerra e aguardar a noite passar, Polei provavelmente não aguentava mais esperar e devia estar convocando-o para esclarecer as coisas. Após presenciar o poder que Kael demonstrou, qualquer força ficaria cautelosa em relação a ele.
Kael abriu a porta, mas ficou surpreso com o que viu.
"Líder da tribo!?" disse ele.
Polei estava parado diante de Kael. Atrás dele, estavam dois cultivadores do Reino da Condensação: Ba Lo e o homem que havia guiado Kael até a tribo.
"Espero não estar incomodando", falou Polei com um sorriso, mas seus olhos mostravam um pouco de nervosismo.
Kael balançou a cabeça. "De forma alguma. O líder da tribo poderia ter me convocado."
Ouvindo as palavras de Kael, Polei estremeceu e respondeu rapidamente: "Eu não ousaria."
Ele não estava brincando ou sendo modesto. Kael era muito mais forte do que ele e, dependendo de seu humor, poderia destruir sua tribo, assim como fez com a tribo Ki. Diante de Kael, Polei não tinha coragem de agir como superior. A última vez que o convocou foi porque não sabia de nada disso.
Kael ficou um pouco desamparado. Apesar de não se importar com essas formalidades, sabia que Polei não conseguiria agir de outra forma. Ele também percebeu que os dois homens atrás de Polei estavam nervosos e o olhavam com um pouco de cautela.
Kael só pôde suspirar. ''Por acaso eles acham que irei mordê-los?''
"Entrem!"
Terminando de falar, Kael virou-se e caminhou até a cama, onde se sentou. Polei ficou na porta por um instante, hesitante, mas, no final, cerrou os punhos e entrou. Os outros o seguiram.
Ao entrarem, seus olhares foram imediatamente atraídos para a cama, e eles congelaram por um instante. Seus corações aceleraram. Yan Xi estava deitada calmamente atrás de Kael. Seu rosto não estava coberto, e seus lindos olhos castanhos pareciam perfurar suas almas.
Rapidamente, saíram do estupor, desviaram o olhar e se voltaram para Kael, tomados pelo medo. Ao perceberem que a expressão dele não havia mudado, suspiraram aliviados.
No quarto não havia cadeiras, e Kael obviamente não pediria que se sentassem na cama. Os três permaneceram em pé enquanto Kael foi direto ao ponto.
"Líder da tribo, não tenho intenção de atacar a tribo Blue. Além disso, tudo que te disse da última vez era verdade: não faço ideia de onde estou."
Ao ouvir a declaração de Kael, Polei ficou visivelmente aliviado. Seu sorriso tornou-se mais natural. "Claro que acredito em suas palavras. Já lidamos com a tribo Ki e gostaríamos de saber se você tem alguma opinião sobre isso."
Antes que Kael perguntasse o que fizeram, Polei explicou: "Matamos os especialistas mais poderosos e aqueles mais degenerados, que cometeram as piores atrocidades. Além disso, enviamos homens para a base deles, para podermos reivindicar seus recursos e mulheres."
Polei manteve os olhos em Kael, tentando identificar alguma mudança em sua expressão, mas sem sucesso. "Se tiver algo que não lhe agrade, pode falar. Mesmo que queira que eliminemos todos eles, afinal, essa vitória foi graças a você."
Kael não hesitou e balançou a cabeça. "Não tenho nada a dizer. Acho que o líder fez um bom trabalho."
Os ombros de Polei relaxaram um pouco. A verdade era que ele ficou tentado a eliminar todas aquelas pessoas, assim como a tribo Ki fazia. Afinal, era isso que mereciam e que a maioria de sua tribo desejava. No entanto, lembrando-se da atitude de Kael para com a tribo Ki, Polei concluiu que Kael os desprezava justamente por esse comportamento. Então, ousaria agir da mesma forma? Claro que não.
Por isso, decidiu adotar uma abordagem mais comum nessas situações. Olhando para a expressão satisfeita de Kael, parecia que sua decisão havia sido acertada.
"Então, o que você pretende fazer a partir de agora?" Polei esforçava-se para não chamar Kael de "senhor" ou algum outro título respeitoso. Como Kael era tão jovem e educado, ele conseguia se conter nesse aspecto.
Kael respondeu calmamente: "Nós vamos embora hoje."
"O quê?" Os três ficaram surpresos. Não imaginavam que Kael partiria tão de repente.
"Não tenho mais nada para fazer aqui. Agora que estou quase recuperado, será muito mais fácil sair dessa floresta", esclareceu Kael.
"Quase... recuperado?" murmurou Ba Lo.
Ao ouvir a afirmação de Kael, os três homens quase desmaiaram. Ele tinha todo aquele poder e ainda não estava completamente recuperado?
"Na verdade, estamos indo agora!", declarou Kael, despertando-os.
Polei falou nervoso: "Amigo, você não pode simplesmente partir assim. Somos muito gratos por sua ajuda. Deixe-nos ao menos dar uma festa de agradecimento."
Apesar das boas intenções de Polei, Kael não tinha interesse em algo assim. "Não é necessário. Preciso deixar este lugar o mais rápido possível."
Ele parou por um momento e acrescentou: "Mas, se querem agradecer, consigam mais alguns conjuntos de roupas para nós dois e mantimentos para a viagem."
A maioria das roupas que Kael tinha guardado fora danificada em batalha, e Yan Xi já tinha poucas desde o início. Conseguir mais algumas seria útil.
Vendo que Kael tinha um pedido, Polei ficou mais tranquilo. Não era bom dever favores. Claro, isso não podia se comparar ao que Kael fez por eles, mas pelo menos era algo.
"Não se preocupe, será providenciado imediatamente", disse ele.
Polei não perdeu tempo. Os três se despediram de Kael e saíram do quarto. Do começo ao fim, nunca lançaram um segundo olhar para Yan Xi, temendo perderem-se em sua beleza e irritarem Kael.
Quando partiram, Lia emergiu da alma de Kael, exibindo um sorriso travesso. "Olhe só como você aterrorizou essas pessoas!"
Kael parou por um instante, sua expressão mostrando certa hesitação antes de perguntar: "Você acha que exagerei?"
Lia arqueou uma sobrancelha, surpresa pela pergunta inesperada. Após pensar por alguns segundos, retrucou: "Você está falando sobre zombar e humilhar os oponentes?"
Kael confirmou com um leve aceno. Normalmente, ele não agia assim, preferindo derrotar seus inimigos com eficiência e seriedade. Mas, dessa vez, ele havia se divertido ao humilhá-los e zombar de suas fraquezas. A dúvida sobre sua atitude o incomodava.
Lia ponderou cuidadosamente antes de responder, consciente de como suas palavras poderiam impactá-lo. Sabia que o caráter de Kael era algo que ele prezava, e qualquer incerteza ou arrependimento poderia prejudicá-lo no futuro.
"Kael," começou ela, num tom firme, "são poucos os oponentes que realmente merecem respeito. E estou falando de oponentes, não de inimigos. Em uma competição, desde que você não seja provocado, não há razão para humilhar quem está do outro lado. Mas, quando se trata de inimigos que querem tirar sua vida, por que deveria se preocupar com isso? E no caso dessas pessoas desprezíveis da tribo Ki... ao meu ver, você ainda foi muito brando. Deu uma morte rápida para eles, principalmente para o líder. Deveria tê-lo ferido, pisoteado seu rosto e deixado agonizando até que morresse em completa agonia. Só assim ele começaria a pagar pelos pecados que cometeu."
As palavras de Lia fizeram Kael estremecer ligeiramente, e até Yan Xi reagiu com um leve tremor. Era difícil para ela imaginar que aquela mulher, cuja aparência doce e inocente parecia contradizer tudo o que acabara de dizer, possuía um coração tão frio e implacável. Contudo, após o choque inicial, Yan Xi percebeu que, se fosse ela no lugar de Kael, também não teria dado uma morte tão fácil ao líder da tribo Ki.
Kael olhou para o chão, enquanto contemplava as palavras de Lia.
"Entendo... parece que ainda sou muito ingênuo," Kael finalmente murmurou, após refletir por alguns instantes.
O alívio era evidente em seu semblante. Ele havia se preocupado, achando que tinha sido cruel demais, mas, na visão de Lia, sua ação foi quase infantil. Aquela nova perspectiva o fez perceber que não havia necessidade de poupar os sentimentos dos inimigos, especialmente os que não agiam sequer como humanos. Eles seriam punidos pelos céus, mas, se possível, alguém deveria responsabilizá-los ainda em vida. Seus olhos brilharam com uma determinação renovada.
Lia, observando a transformação de Kael, assentiu, satisfeita. Desde o início, ela tentava ensinar que aquele mundo era cruel e que ele precisava agir com a frieza necessária quando fosse preciso, para não hesitar em momentos críticos. Não queria torná-lo um assassino sem coração, mas sim um cultivador que entendesse quando ser implacável para proteger a si mesmo e aos outros.
Yan Xi, que assistiu à interação em silêncio, soltou um suspiro. "Parece que essa mulher o entende muito bem, e ele confia completamente em suas palavras..."
Ela refletiu sobre como Kael aceitou as palavras de Lia de imediato, sem hesitar ou duvidar. A maioria das pessoas precisaria de tempo para processar algo assim, mas Kael simplesmente aceitou as palavras dela como verdade e reconheceu seus erros. Olhando para Lia, querendo ou não, Yan Xi sentiu uma pontada de admiração