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Chapter 5 - Uma proposta única

Belzebu piscou surpreso, sem realmente acreditar no que acabara de ouvir. "O que você disse?"

"Vá à merda! Além de ficar aqui sozinho, agora eu também estou ouvindo vozes," o homem falou em um tom frustrado. "Agora só o que me falta é começar a ver coisas," ele continuou, falando em um tom baixo e ressentido.

Belzebu ficou parado, estupefato, olhando para o humano à sua frente, que murmurava bobagens aleatoriamente.

"Haa..., humano, escute aqui, eu—"

"Blá, blá, blá, eu não ouço nada, eu não ouço nada," o homem voltou a vomitar asneiras como uma criança fazendo birra.

Finalmente, Belzebu pareceu perder a paciência. Ele resolveu liberar um pouco da pressão da sua alma para mostrar que era real. Quando fez isso, o homem parou imediatamente de falar e olhou horrorizado na direção dele. Mas, quando Belzebu estava prestes a falar, o homem vomitou um bocado de sangue junto com seus órgãos no chão e morreu logo em seguida.

"Nossa, eu não imaginei que ele morreria tão facilmente. Bom, ele vai voltar mesmo," Belzebu deu de ombros enquanto esperava aquele processo se repetir.

"Onde eu estou... ah, que maravilha, ainda é aqui," murmurei com uma voz cansada enquanto minha consciência acordava novamente. Eu não precisei abrir os olhos para saber que ainda estava preso; a dor constante nas minhas mãos e pernas era um belo lembrete da minha miséria.

"Humano, alegre-se, eu, Belzebu, estou aqui para te ajudar," uma voz grave e calma me tirou dos meus pensamentos. Abrindo rapidamente os olhos, a primeira coisa que me saudou foi uma luz amarela como o sol. Dando um instante para meus olhos se acostumarem, pude finalmente ver algo diferente da escuridão absoluta que me cercava por tanto tempo. Olhando para a luz, vi que se tratava de uma chama amarelada brilhante que lançava uma luz suave no ambiente.

Olhando ao redor, consegui ver onde estava. Parecia ser uma sala feita de escuridão; não havia nada, só um espaço vazio e escuro. Virando a cabeça em direção ao chão, vi um mar de vermelho. Eu sabia que aquilo era meu sangue derramado. Também pude ver as correntes que me prendiam. Elas eram prateadas e brilhavam por causa da luz, e nelas havia uma espécie de gravuras que eu não conseguia entender.

"Tosse."

Eu me virei em direção ao barulho. Lá, saindo debaixo da luz, estava uma coisa que eu nunca tinha visto na vida. Aquilo parecia um homem, mas era impossivelmente bonito. Usando somente uma saia que cobria até os tornozelos e com o torso exposto, era possível ver seus músculos bem definidos e suaves sobre sua pele branca pálida. Seu rosto era uma mistura de um homem e uma mulher. Mesmo com minhas poucas memórias, eu sabia que homens não deveriam ter esse tipo de rosto. Ele tinha uma pele branca suave com cabelos pretos caindo pelas costas. Seus lábios, que estavam curvados em um leve sorriso, eram levemente avermelhados, e com um nariz pequeno que estava em harmonia com o resto do rosto, ele parecia a personificação da beleza. Mas o grande problema eram seus olhos; eles eram completamente vermelhos, como se fossem feitos de sangue, e estavam grudados em mim.

O que me fazia ter certeza de que aquilo não era humano, junto com a sua aparência, era a pressão horripilante que ele emitia. O ar ao redor dele parecia se distorcer, e a cada passo mais perto de mim, cada respiração que eu dava era difícil e superficial, como se o próprio ar ficasse pesado. Quanto mais eu suportava aquela pressão, mais minha consciência começava a vacilar, e eu sentia como se fosse morrer a qualquer momento. Minha garganta estava seca, e meu corpo estava encharcado de suor. Eu sabia que, frente àquilo, eu não era nada.

"Olá." Então, como se fosse tudo coisa da minha mente, a pressão desapareceu.

"O-o que é você?" perguntei em um tom trêmulo, enquanto tentava controlar minha mente caótica.

"Eu? Eu sou o grande Belzebu!" ele falou em um tom alegre e magnânimo. Então franziu as sobrancelhas e olhou para mim. "Não vai me dizer que você vai morrer de novo. Era interessante no começo, mas agora já está me enchendo o saco," ele falou em um tom insatisfeito enquanto cruzava os braços.

"Eu não vou morrer agora, e não foi isso que perguntei," eu falei em um tom irritado, por algum motivo que eu não conseguia lembrar. Eu só tinha certeza de que, junto com o medo que sentia dele, também havia um ódio insano dentro de mim.

"Vejam só, pelo menos você não é como os outros que se mijam de medo e imploram por suas vidas," ele disse satisfeito. "E, referente à sua pergunta, eu sou um demônio."

"Demônio..." eu sussurrei baixinho enquanto o ódio que eu já sentia aumentava ainda mais. Minha mente parecia queimar com fúria, e minha respiração ficava cada vez mais errática.

"Nós já nos vimos antes?" ele perguntou curioso.

"Eu acho que não. Eu definitivamente me lembraria de alguém como você," eu falei de maneira irregular, mas eu mesmo não tinha certeza das minhas palavras, já que eu não lembrava nem do meu próprio nome.

"Certo, é que pelo ódio que eu sinto em você, parece que já nos conhecemos antes," Belzebu falou enquanto colocava a mão no queixo.

"A propósito, o que é um demônio?" eu perguntei curioso.

"Você não sabe?" ele rebateu com outra pergunta.

"Se eu soubesse, não precisaria perguntar," eu respondi.

"Certo..." ele estreitou os olhos em aborrecimento. "Demônios são almas corrompidas que ganharam carne e consciência. A maioria de nós passa a vida no inferno, como animais irracionais que vagam à procura de algo para saciar o vazio dentro de nós. Mas, em raras ocasiões, nós, demônios, assim como eu, ganhamos desejo e, com ele, a sabedoria de ver que existe algo mais além da fome perpétua."

"Desejo?"

"Sim, o desejo que eu falo é algo como um objetivo." Vendo que eu não estava entendendo, ele continuou: "Pense nisso como uma coisa que você vai fazer pelo resto da vida. Alguns demônios querem espalhar morte, outros gostam de sexo, e tem alguns que adoram lutar e outros que adoram conhecimento. Essa vontade, esse desejo, nos dá uma perspectiva mais ampla sobre nossa própria existência e nos impulsiona a buscar cada vez mais. Quando você tem um desejo, você deixa de apenas sobreviver e passa a viver."

"Entendi," eu falei após um minuto de contemplação. Então, outra dúvida surgiu: "Por curiosidade, qual seria o seu desejo?" eu perguntei.

"O meu?" Ele apontou para si mesmo e logo em seguida deu um sorriso arrepiante. "É espalhar o máximo de desespero e morte de todas as formas possíveis," ele falou alegremente e logo continuou: "Além de consumir almas."

"Certo," eu ignorei a primeira parte e foquei mais na segunda. "O que são almas e o inferno, e por que você as come?"

"Você é bem curioso, não é?" ele provocou levemente.

"Você pode me culpar? Você é a primeira pessoa que apareceu aqui," eu retruquei.

"Certo. Bom, pelo que eu sei, as almas são a forma primária de vida, energia que ganhou consciência e tende a buscar um corpo para tomar forma."

"Então a alma não tem forma, e o que dá forma a ela é o corpo?"

"Sinceramente, eu não sei. Isso que eu acabei de dizer é uma opinião minha. Alguns dizem que a alma ganha consciência quando o corpo nasce e pode experimentar o mundo, e outros dizem que a alma já tem uma forma definida e o corpo se molda no formato da alma para abrigá-la. Mas isso levantaria outra questão: os pais não influenciam no resultado da aparência? Muitos seres debatiam sobre isso por incontáveis milênios e nunca chegaram a uma resposta satisfatória, então ficou só em teoria."

Eu levantei as sobrancelhas em realização com aquela revelação. "Então eu também tenho isso dentro de mim?"

"Sobre o inferno, ele é chamado de muitos nomes: purgatório, abismo, exílio, prisão. Mas, para mim, eu chamo de casa. Lá é o lugar para onde todos os seres com inclinações negativas vão. É um lugar maravilhoso, cheio de fogo, dor e sofrimento," ele falou em um tom nostálgico, como se estivesse lembrando de um lugar querido.

"Entendo," pensei, "que cara maluco."

"E sobre a sua última pergunta, nós demônios consumimos almas para aumentar nosso poder. Isso nos torna mais completos," ele disse sem revelar nada de importante. Notei que, diferente das outras perguntas, essa ele evitou dar qualquer informação relevante.

Eu estava prestes a fazer novas perguntas, mas ele logo me interrompeu. "Eu não vim até aqui só para satisfazer a sua curiosidade e perder meu precioso tempo."

"Certo, o que você quer?" eu falei em um tom cauteloso. Eu ainda podia sentir a fúria em cada canto do meu ser. Eu não sabia o porquê disso, mas sabia que deveria ter uma boa razão. Outra coisa que aumentou minha cautela foi o completo desprezo e indiferença que senti enquanto ele falava sobre tirar a vida dos outros.

"Não precisa ficar tão acanhado. Vai ser uma coisa boa para você. O que eu vou fazer é te libertar desse sofrimento que você está passando."

"E o que você quer em troca?"

"Eu gosto de falar com pessoas inteligentes, mas antes disso, o que você sabe sobre o Armagedom?"

"O que é isso?" eu perguntei, já que nunca tinha ouvido essa palavra.

"Certo, eu deveria ter imaginado," ele disse com um suspiro cansado. "Bom, vamos do princípio."

40 MINUTOS E VÁRIAS MORTES DEPOIS

"Certo, vamos ver se entendi: o anjo mais poderoso do reino do céu chamado Samael se rebelou contra o seu criador e ganhou o título de Satanás."

"Correto."

"Por causa dessa rebeldia, ele foi banido para o inferno, onde se tornou um anjo caído e ganhou o nome de Lúcifer. E graças ao seu imenso poder, ele logo dominou todo o reino infernal onde ele caiu."

"Correto," Belzebu comentou com os dentes cerrados de fúria.

"Então, cheio de fúria e amargura, ele reuniu todos os demônios sob seu comando e travou uma guerra direta contra o céu. Só que ele logo percebeu seu erro: atacar o céu diretamente deixava os demônios em uma desvantagem severa, já que o ambiente era extremamente desvantajoso para eles. Então ele mudou o campo de batalha para o plano mortal, onde estão as criações favoritas do criador, os humanos."

"Correto novamente."

"De alguma forma, Lúcifer conseguiu romper a barreira natural que há entre as dimensões e fazer com que os demônios passassem para esse plano sem perder força. E graças a isso, os humanos estão quase extintos," eu disse enquanto meus olhos se estreitavam ao olhar para o demônio à minha frente.

"Não me olhe assim, eu só estou seguindo ordens," ele disse com um sorriso.

"Certo," eu bufei. "Só que Lúcifer não esperava que isso também desse aos anjos a habilidade de descer ao plano mortal sem muitas restrições. E graças a isso, os humanos conseguiram sobreviver até agora, e essa guerra já dura mil anos, com incontáveis anjos, demônios e humanos morrendo dia após dia."

"Correto novamente. Parece que você entendeu tudo."

"Na verdade, nem tudo. Pode explicar melhor o que é esse negócio de aura, energia espiritual e a coisa que está dentro da minha alma?"

"Bom, vamos começar com os dois primeiros. Primeiramente, eu deveria dar os parabéns à sua raça. Criar uma imitação porca da magia usada por anjos e demônios em menos de mil anos é realmente digno de admiração," ele disse em um tom ligeiramente surpreso enquanto se lembrava do pouco tempo que a raça humana levou para criar isso.

"Você se lembra do que eu disse sobre o inferno e o céu?"

Eu acenei negativamente em resposta à pergunta.

"Ok, no inferno há uma grande concentração de Neher, no céu existe o áster, e no reino mortal existe o éter, que é a junção dos dois anteriores. Neher e áster representam os aspectos da existência, onde Neher representa o lado negativo que é usado por nós, demônios, e o áster o positivo que é usado pelos anjos. Vocês, humanos, por outro lado, só são capazes de usar o éter para gerar aura. O éter misturado com a sua força vital é chamado de energia espiritual, que é quando vocês passam o éter pela sua alma. Isso, se vocês sobreviverem ao procedimento."

"Certo, certo, nós humanos somos fracos e patéticos," eu falei em um tom entediado.

"Que bom que você sabe. Referente à sua alma, eu nunca vi algo como essa gosma preta que te impede de morrer, então eu não sei o que é. Mas os fragmentos dourados são parte do poder do criador. Você lembra o que eu disse sobre os 7 arcanjos?"

"Sim, você disse que eram os soldados perfeitos."

"Exatamente. E com esses fragmentos na sua alma, eu posso criar versões demoníacas deles," ele disse com os olhos brilhantes de expectativa.

"Vê como isso é uma proposta única? Eu posso ganhar esses fragmentos, e eu liberto você dessa prisão" ele falou com uma voz calma e gentil.

"Sério?" eu perguntei estupefato.

"Sim," após um momento de reflexão, ele voltou a falar. "Olha, como eu sou bom, ainda por cima vou te ensinar um método para controlar a aura e a energia espiritual."

"Por que você faria isso?" perguntei cautelosamente, já que oferecer algo assim, sem mais nem menos, era muito suspeito.

"Não me olhe assim, eu sou um cara muito legal. Além disso, comparado aos fragmentos, isso não é muita coisa mesmo."

Eu não acreditei em nenhuma palavra do que ele disse. Parecia muito suspeito, toda essa boa vontade. Mas, por outro lado, qualquer oportunidade de sair daquele lugar era boa demais para deixar passar.

"Você não quer?" ele perguntou quando meu silêncio continuou.

"Não, eu quero. Eu quero aprender," respondi nervosamente.

"Muito bem," ele disse, olhando para uma direção. "Mas vamos fazer um curso intensivo porque eu não tenho muito tempo." Enquanto falava, sua mão começou a brilhar em vermelho.

"Sem tempo?" questionei.

"Sem tempo para perguntas."

O que se seguiu foi uma longa e complexa aula sobre aura e energia espiritual. Ele explicou como a aura mexia com o corpo e o fortalecia, e como a energia espiritual interagia com a natureza ao nosso redor por meio da nossa alma. Também me ensinou como sentir a aura, integrá-la ao corpo e ver a própria alma.

"Então a aura pode ser usada para melhorar a força, os reflexos, a percepção e a regeneração do corpo, aumentando até a expectativa de vida. E a energia espiritual pode ser usada para manifestar os elementos da natureza, como fogo, água, terra, entre outros, dependendo da capacidade do feiticeiro."

"Muito bem, você é bem mais esperto do que eu esperava," ele disse, me olhando satisfeito. "Com o método que lhe dei, é só uma questão de tempo até você poder manifestá-los. Agora você deve—" ele parou abruptamente, olhando na mesma direção de antes. "Ele é mais rápido do que eu previ. Muito bem, humano, até a próxima."

"Espera, o quê—"

Então, como se fosse feito de sombras, ele se dissolveu no chão e a luz que manifestava se apagou logo após sua partida, me deixando novamente na escuridão.