Na estrada, aproximando-se da próxima cidade a ser visitada e averiguada, a cidade de Campo Verde, Koji, Saik e Spherea estavam em um veículo militar de rápida locomoção.
— Apesar de não fazerem nada, os militares possuem muitos carros bons — disse Koji, sentado no bando do carona e mexendo no porta-luvas do veículo.
— Isso se chama dinheiro! O que os militares da Torre amam trabalhar com o poder bélico que possuem não tá escrito… pra eles, isso é um paraíso — Saik dirigia o automóvel.
— O teu demonião sumiu de novo, Koji?
— É… Esse desgraçado aparece e some sempre! — levemente entretido com o mapa da região, respondeu Koji, quando o Spherea se materializou no banco de trás e disse num tom de deboche — Sinto uma ausência dolorosa de gratidão. Eu deveria ser homenageado todos os dias por ter te salvado tantas vezes.
— Não é pra tanto, Spherea…
Aproveitando que tinha um posto de gasolina no caminho da rodovia, Saik resolveu virar o volante e entrar para abastecer — Tem dinheiro aí? — perguntou ele para o Koji, que respondeu descontraído — A Torre ainda não pagou nossos salários e o dia do pagamento não tá nada perto.
Saik estacionou o veículo no lugar para reabastecer e, tanto ele quanto o Koji, viram que a movimentação no posto era quase deserta. Havia um outro carro sendo abastecido, além de uma moto parada no pequeno estacionamento frente a loja de conveniência.
— A gente tá sem grana. Como vamos encher o tanque? — comentou Koji, antes de olhar atentamente para os poucos frentistas que andavam para lá e pra cá, meio que de forma aleatória — Por que eles não vem aqui? Eles são cegos?
— Talvez viram a escrita no carro… "Forças Especiais da Torre"... depois de Dynami, as pessoas devem odiar a Torre. Esse é o meu palpite.
De repente, o aparelho de comunicação do veículo emitiu um ruído de contato sincronizado. Bbrrzz! Com alguém inicialmente falando — Koji! Saik! Estão ok? Estão ouvindo? — e os dois jovens portadores reconheceram a voz da pessoa, era a Comandante Ava.
Koji pegou o rádio de fala do aparelho e respondeu o contato com um entusiasmo contido — Estamos! Estamos sim!
— Localizamos vocês graças ao rastreador do veículo. Estamos acompanhando a partida de vocês até a próxima cidade, mas quero avisá-los que os agentes, Nahome e Tovah, estarão partindo para a capital do estado, e isso depende do avanço de vocês.
— Então, eles vão avançar somente se nós dois avançarmos? — Koji se mostrou curioso.
— Exatamente. Não sabemos especificamente o número de portadores têm o Conclave, muito menos o objetivo deles. Mas consideramos que muito provavelmente, eles estejam ligados a Fundação, essa foi a visão que recebemos da Central de Inteligência.
— A Fundação… É o mesmo grupo que devastou Dynami, não é?
— Sim. A Fundação é uma organização formada pelos portadores mais temidos e perigosos do mundo. Eles são superiores a grande maioria dos demais portadores, e por isso, são tão temidos.
— Foi exatamente isso que o Alaric disse, não foi? — Koji perguntou para o Saik, que respondeu serenamente — Sim… Ele disse que as pessoas que estão acima dele, estão muito acima de nós.
— Então vocês precisam ser rápidos. Se o Conclave realmente estiver ligado à Fundação, o nosso problema será expandido. Não será mais uma missão contra um grupo qualquer, mas contra o grupo mais perigoso do planeta. Avancem com o máximo de cuidado e tentem neutralizar o adversário que for, se não virem possibilidade, então executem, ok?
A comandante desligou o contato, e logo um dos frentistas encostou no vidro do carro, no lado do Koji, que olhou e ficou surpreso — Opa! Olá?! — Koji aproximou-se bastante do vidro e acenou com a mão esquerda para que o homem visse.
Mas o homem não viu, ele apenas olhava para frente com a cabeça erguida.
— Qual o problema desses caras? Eles são cegos e surdos?
— Eles devem tá esperando o Koji perder a virgindade, né não? — zombou Spherea, rindo e dando uns tapas no ombro esquerdo do seu querido portador.
— Cala a boca, Spherea! — gritou Koji, virando-se e tirando os tapas do Spherea, enquanto o Saik, genuinamente e espontaneamente, perguntou olhando para o Koji — Calma… Tu é virgem?
— Claro que não! Vai acreditar num bicho desse, é?
— Abre a porta então! Se não fizermos nada, vamos ficar aqui até o anoitecer — Saik comentou enquanto abria a embalagem de um bombom que estava guardado no painel do veículo.
Seguindo o que Saik disse, Koji abriu lentamente a porta do seu lado com cuidado, pois o frentista estava bem perto. O homem se afastou e, Koji finalmente abriu inteiramente a porta e saiu.
— Opa! Boa tarde…. "Será que já é meio dia ou ainda é manhã?" Precisamos dar uma abastecida no carro, mas eu e o meu colega estamos sem grana… Tem como? — disse ele, tentando ser amigável com um sorrisinho levemente forçado e nervoso.
— Ah não! — reagiu Saik, levando a mão à cabeça.
O frentista tirou seu olhar para o horizonte e direcionou seriamente para o Koji, e disse num tom tanto quanto ameaçador.
— Quer gasolina de graça? De graça?
Entre olhares rápidos para o Saik e para o homem, Koji respondeu, tentando esfriar o clima que ele percebeu que estava esquentando.
— Não é exatamente de graça…
— Pega logo a merda dessa gasolina, Koji! — exclamou Saik com uma certa impaciência, gesticulando com a mão direita que Koji devia partir para cima.
— O que quer eu faça? — respondeu-lhe Koji, aproximando-se novamente da porta do veículo.
— Somos portadores da Torre! Se ele não quer nos dar a gasolina, então pega!
Quando Koji virou-se para o homem, ligeiramente um soco direito surgiu em seu rosto. O frentista havia acabado de acertar um soco bem no meio da cara do Koji, que não sofreu nada, seu rosto não virou e ele nem sentiu dor.
Koji e Saik, ao invés de reagirem com hostilidade ao soco, começaram a rir. Koji esfregou o rosto como se estivesse limpando uma mancha invisível.
— Sei que não faz ideia, mas eu sou um portador. Nunca viu no jornal falando que portadores não são feridos por humanos?
— Esse cara deve tá bêbado. Pega logo a bomba pra encher o tanque — Saik mastigava o bombom e sorria com a cena, enquanto esticava os braços preguiçosamente.
Portadores, como Koji e Saik, não sofriam danos de ataques comuns. Seus corpos eram adaptados para suportar impactos físicos de origem humana ou de objetos feitos por humanos, já que a única coisa que realmente os feria eram outros portadores, artefatos especiais e Gyakus. Tudo o que fosse de origem mundana não tinha impacto sobre eles.
Koji deu um passo para frente e agarrou o frentista pelo colarinho com facilidade. Com um movimento rápido e sem esforço, o levantou no ar e o arremessou contra uma pilastra de concreto do posto.
O impacto fez o homem desmaiar instantaneamente, caindo ao chão como um saco de batatas.
Quando finalmente, Koji estava prestes a pegar a bomba, dois outros frentistas e um homem que estava abastecendo o carro correram na direção dele — Gente, não vai adiantar vocês tentarem me bater, entendeu? — ele tentou apaziguar.
O primeiro frentista avançou com um soco, mas Koji desviou com agilidade sobre-humana, afinal a velocidade normal de um portador é extremamente maior que a velocidade humana. Com um cruzado direito preciso, ele derrubou o homem instantaneamente.
O segundo frentista tentou atacá-lo pela lateral, mas Koji o neutralizou com um golpe rápido no pescoço, que foi meio instintivo, fazendo-o desmaiar — Ah não… Merda! Não acredito que matei ele.
O homem que estava abastecendo o carro também não teve sorte; Koji nem esperou ser atacado, quando o rapaz se aproximou o suficiente, ele acertou com um chute no peito, tão forte que o lançou contra seu próprio carro, amassando a lataria.
Saik saiu do veículo militar e se aproximou calmamente de um dos frentistas que estavam desacordados e notou algo estranho. Ele se abaixou, puxando o colarinho do homem para o lado e viu uma marca estranha no pescoço dele.
— Koji, olha isso aqui — chamou Saik, apontando para a marca.
Koji caminhou até os outros dois que estavam no chão e verificou seus pescoços — Eles também têm essa marca. Todos os três.
Os dois portadores se entreolharam por um instante, antes de começarem a especular.
— Essas marcas… Será que têm algo a ver com aquela falsa portadora que tinha uma técnica emprestada que vimos antes? — sugeriu Saik, ligando o ocorrido ao que Spherea havia mencionado sobre a falsa portadora, Lyanna.
Koji franziu a testa, pensando sobre — Talvez, mas esses caras são humanos comuns. Não têm técnicas.
Sentado no banco de trás, Spherea abriu a porta e explicou o que podia ser.
— A marca geralmente significa duas coisas: ou é um falso portador usando uma técnica emprestada de um portador verdadeiro, ou... é um humano sob o controle de uma técnica que induz um estado de transe.
Koji coçou a cabeça, olhando para os frentistas desmaiados — Um transe controlador… Isso explicaria o comportamento esquisito deles.
— Se for isso, então temos outro problema. Alguém por aqui está manipulando essas pessoas — concluiu Saik, encarando a placa verde na estrada que informa a proximidade da cidade de Campo Verde, apenas 10km.