O sol matinal infiltrava-se pela janela, aquecendo o quarto e me arrancando do sono. O despertador ainda não tinha tocado, mas o brilho era suficiente para me acordar. Bocejei, espreguicei-me e olhei para o relógio. Faltavam dez minutos para o alarme disparar. Decidi aproveitar esse tempo extra para me levantar e começar o dia com calma.
— Bom dia, Shin! — saudou minha mãe com um sorriso caloroso, virando-se rapidamente para mim. — Dormiu bem?
— Dormi, sim. E você? — perguntei, pegando uma torrada da pilha já pronta. Meu olhar pousou em Hana, cuja concentração parecia impenetrável. — E você, Hana? O que tá lendo com tanta atenção?
Ela ergueu os olhos, visivelmente animada.
— É um livro sobre aventuras no espaço! Tem astronautas e até alienígenas engraçados! — disse ela, apontando para a capa colorida.
Sorri, bagunçando de leve o cabelo dela.
— Parece incrível. Continue assim, quem sabe um dia você não escreve as suas próprias aventuras no espaço?
O rosto dela se iluminou, e ela voltou rapidamente ao livro, como se tivesse acabado de ganhar mais motivos para mergulhar na leitura.
Minha mãe colocou uma xícara de café na minha frente, lançando-me um olhar cúmplice.
— Não esquece de comer direito antes de sair, tá? Dia longo pela frente.
Assenti, mordendo a torrada apressadamente, e me levantei para pegar minha mochila.
Na esquina, como sempre, Seiji e Rintarou já me esperavam. Seiji, com sua energia de quem parecia ter corrido uma maratona antes das seis da manhã, acenava vigorosamente.
— Shin! Finalmente! Tava achando que você tinha decidido dormir até amanhã.
— Nem todo mundo nasce com a sua disposição, Seiji — retruquei, rindo, enquanto ajustava a alça da mochila.
Rintarou, sempre mais tranquilo, olhou para nós com aquele meio sorriso característico.
— Disposição é uma forma gentil de dizer "não consegue ficar quieto nem por um minuto" — comentou ele, cruzando os braços.
Seiji fingiu indignação.
— Ei, isso é determinação! Vamos lá, Shin. Preparado pra mais um dia épico de glória escolar?
Revirei os olhos, rindo de leve.
— Mais um dia normal, isso sim. Mas bora lá.
O caminho para a escola foi preenchido pelas nossas conversas habituais. Seiji falava animadamente sobre um jogo novo que tinha testado na noite anterior, enquanto Rintarou, mais reservado, fazia alguns comentários ocasionais que sempre soavam precisos, como se ele tivesse a última palavra sobre tudo. Eu apenas ouvia, rindo dos exageros de Seiji e pensando no que o dia traria.
Quando chegamos à sala, o clima estava diferente. Algo na postura dos colegas, ou talvez o silêncio antes da chegada do professor, fazia o ambiente parecer mais pesado. Não demorou muito para entendermos o motivo.
O professor entrou com um semblante sério, carregando uma pilha de papéis que parecia ameaçadora.
— Atenção, classe — disse ele, após terminar a chamada. — As provas finais do semestre estão chegando. Sei que muitos de vocês já estão pensando nas férias de verão, mas quero lembrar que essas provas terão peso significativo para suas notas finais.
Um murmúrio percorreu a sala, cheio de suspiros e reclamações abafadas. Era como se todos estivessem esperando por essa notícia, mas ainda assim, ninguém queria ouvi-la.
Seiji, sentado ao meu lado, jogou a cabeça para trás com um suspiro dramático.
— Eu tô ferrado! Minhas notas já são um desastre — sussurrou ele, sem qualquer tentativa de disfarçar.
— Bem-vindo ao clube — murmurei de volta, sentindo o peso das palavras do professor começar a se instalar em mim. — Rintarou, por favor, diga que podemos contar com você.
Rintarou, sempre o mais centrado do grupo, apenas ajustou os óculos com calma antes de responder.
— Claro. Podemos estudar juntos depois das aulas. Se vocês seguirem as minhas dicas, dá pra melhorar bastante.
Seiji soltou uma risada curta, como se a ideia de estudar fosse tão assustadora quanto as próprias provas.
— Cara, você faz parecer tão simples... Mas tudo bem, vou aceitar sua ajuda. Meu destino tá nas suas mãos, Rin.
O sinal para o intervalo finalmente tocou, e a sala ganhou vida com o som das cadeiras arrastando e os alunos começando a conversar. Mas, diferente dos outros dias, havia uma sensação de urgência no ar. As provas eram uma sombra que pairava sobre todos, e a ideia de "correr atrás do tempo perdido" parecia ser uma unanimidade silenciosa.
Decidi ir até a biblioteca, esperando que o silêncio e a companhia dos livros me ajudassem a organizar os estudos. Ao passar pelos corredores, meus olhos se detiveram em uma mesa ao canto, onde Yuki estava sentada sozinha, rodeada por pilhas de livros e cadernos.
Ela estava tão concentrada que nem percebeu quando me aproximei. Sentei-me algumas cadeiras afastado, tentando não chamar a atenção enquanto observava sua postura: os olhos fixos nas páginas, o jeito metódico com que fazia anotações rápidas. A intensidade com que ela estudava era quase inspiradora.
Mas logo enfrentei uma questão de matemática que, por mais que eu tentasse, parecia impossível de resolver. Suspirei, e depois de hesitar por muito tempo, decidi pedir ajuda.
— Yuki — murmurei, baixando a voz para não atrapalhar os outros. — Será que você poderia me ajudar com essa questão?
Ela ergueu o olhar com uma expressão tranquila e, para minha surpresa, sorriu levemente.
— Claro, Shin. — Ela ajeitou o caderno para ver minha anotação, e puxou meu livro para perto, já observando o problema. — Olha, a ideia aqui é que você precisa isolar o x primeiro, antes de seguir para o próximo passo. Veja aqui... — Yuki falava calmamente, suas explicações tão claras e meticulosas que, de repente, tudo parecia simples.
Observei seu rosto enquanto ela explicava, fascinando-me com a facilidade com que abordava o problema. Ela me passou a caneta, encorajando-me a tentar sozinho, e ao terminar a conta, eu a olhei, surpreso por ter compreendido.
— Entendi! Obrigado, Yuki. Parece fácil agora, mas... eu realmente estava perdido antes — admiti, rindo sem jeito.
Ela riu também, e seus olhos brilhavam com um toque de orgulho.
— Você só estava tentando pular algumas etapas. Às vezes, tudo o que precisamos é olhar com mais calma. — Ela fez uma pausa e, com um sorriso gentil, acrescentou: — E, bem, estou feliz em ajudar.
Por um momento, ficamos em silêncio, e voltei ao meu caderno, sentindo um pouco da serenidade dela contagiar o ambiente. Eu ainda a observava de vez em quando, tentando entender a seriedade com que ela se dedicava. O silêncio era reconfortante, quase como se nossa companhia mútua fosse o suficiente.
Quando o sinal do fim do intervalo tocou, ela fechou o livro e me lançou outro sorriso discreto.
— Boa sorte com o resto do estudo, Shin. — E, com um aceno leve, ela se afastou, deixando o leve aroma de papel flutuar pelo ar.
Após o fim das aulas, reuni-me com Seiji, Rintarou e alguns outros colegas que também precisavam de uma força nos estudos.
Entre os que se juntaram estavam Akira, que sempre mantinha o grupo animado; Mai, que era mais tímida, mas incrivelmente inteligente; e Takeshi, que tinha uma batalha pessoal com a matemática.
— Vamos todos para minha casa — sugeriu Rintarou, lançando-nos um olhar seguro. — Vai ser mais fácil estudar juntos e tirar dúvidas.
Aceitamos, e ao chegarmos à casa de Rintarou, a sensação de acolhimento já nos relaxava. Sua mãe nos recebeu com um sorriso gentil, deixando uma bandeja de biscoitos e um jarro de suco na sala. Nos sentamos ao redor da mesa e abrimos nossos livros e cadernos, prontos para enfrentar os desafios do estudo.
Rintarou, paciente e detalhista, guiava as explicações com uma facilidade impressionante. Sempre que um de nós se perdia, ele fazia uma pausa, ajustando o ritmo da explicação para garantir que todos compreendessem. Sua calma era contagiante, e até Seiji, que normalmente era mais inquieto, estava atento.
— Rintarou, você devia mesmo ser professor — elogiou Mai, lançando-lhe um olhar de admiração.
Ele riu, balançando a cabeça enquanto ajustava os óculos.
— Quem sabe, né? Só espero que nenhum de vocês desista de estudar por minha causa — brincou ele, arrancando risadas de todos.
Conforme as horas passavam, o clima entre nós ficou mais leve, e as conversas fluiam entre cálculos e fórmulas. Akira fazia piadas ocasionais, conseguindo aliviar a pressão, enquanto Takeshi, que parecia mais confortável com o apoio de todos, finalmente conseguiu resolver uma questão que o atormentava.
— Se eu soubesse que estudar em grupo era assim, já tinha pedido ajuda antes — confessou ele, sorrindo de leve.
— Somos um time agora, Takeshi! — disse Seiji, erguendo o punho como se estivesse comemorando uma vitória.
Ao fim do dia, olhei ao redor e percebi o quanto essa rotina de estudos nos havia unido. Estávamos exaustos, mas também com uma satisfação tranquila, cientes de que, independentemente do resultado, estávamos fazendo o possível juntos.
A noite estava caindo quando nos despedimos na porta da casa de Rintarou, cada um levando na mochila não apenas os livros, mas também a motivação compartilhada e o apoio mútuo.
Os dias seguintes foram uma rotina de estudos intensos. Durante os intervalos, voltei à biblioteca sempre que podia, tentando colocar a matéria em dia. Em várias dessas vezes, encontrava Yuki na mesma mesa, mergulhada em anotações e livros. Aos poucos, nossas trocas se tornaram mais frequentes, cada vez mais confortáveis.
Em uma dessas tardes, depois de uma hora de silêncio concentrado, não pude evitar o comentário que estava preso em minha mente.
— Yuki... você leva os estudos a sério mesmo, né? — arrisquei, tentando não parecer intrusivo.
Ela ergueu o olhar, surpresa, mas logo abriu um sorriso discreto, como se já esperasse por essa observação.
— Não é uma questão de querer, sabe? — respondeu, a voz suave, mas carregada de algo que parecia pesar dentro dela. — É mais como uma… obrigação.
Houve uma pausa, e seu sorriso desvaneceu, dando lugar a um olhar pensativo. Curioso, arrisquei um pouco mais.
— Poderia ser por conta... da pressão familiar? — perguntei, escolhendo cuidadosamente as palavras.
Ela hesitou, e, por um momento, pensei que talvez tivesse me intrometido demais. Mas então ela assentiu, suspirando, como se estivesse aliviada por finalmente dividir um pouco daquele peso.
— Sim. Meus pais e irmãos estudaram na Universidade de Tóquio. Eles… têm expectativas. — Ela deu um sorriso forçado, quase para si mesma, antes de prosseguir. — E essas expectativas são muito grandes.
A honestidade de Yuki me pegou desprevenido. Ver aquele lado vulnerável dela, que geralmente escondia tão bem, me fez perceber que havia muito mais por trás de sua dedicação intensa. Ela carregava um fardo invisível, que só agora eu conseguia ver com mais clareza.
— Deve ser pesado... essa expectativa toda — murmurei, sentindo uma empatia genuína por ela. — Você realmente é muito dedicada, mas... nunca tinha pensado em como isso poderia ser tão difícil.
— Às vezes é, sim. Mas faz parte, né? — disse ela, com um sorriso no rosto.
Um silêncio reconfortante se seguiu. Estávamos mergulhados em pensamentos, cada um focando em seus livros, mas agora com uma nova camada de entendimento entre nós. Era como se aquele espaço silencioso e pacífico nos permitisse compartilhar mais do que apenas o ambiente; era uma troca de apoio mútuo, mesmo que não dita em palavras.
Finalmente, o dia das provas tinha chegado. A atmosfera na escola estava carregada de tensão; todos estavam focados, alguns murmurando nervosamente entre si, outros em silêncio absoluto. A pressão era palpável.
Entrei na sala sentindo o peso de semanas de preparação. Respirei fundo, e os rostos de Rintarou, sempre paciente nos estudos, e de Yuki, focada e determinada na biblioteca, passaram pela minha mente como um lembrete silencioso de que eu não estava sozinho.
À medida que cada prova passava, eu me forçava a lembrar das sessões de estudo, das explicações detalhadas de Rintarou, e do incentivo indireto de Yuki. Com cada pergunta que respondia, era como se estivesse retribuindo, de alguma forma, o apoio que eles haviam me dado.
Quando a última prova terminou, um suspiro de alívio escapou, profundo e libertador. Olhei ao redor e vi que todos compartilhavam a mesma sensação: as férias de verão estavam, finalmente, ao nosso alcance.
Saí da sala ainda sentindo o cansaço das provas, mas com uma leveza que há tempos não experimentava. Foi então que encontrei Seiji e Rintarou me esperando no corredor.
— E aí, como foi? — perguntou Seiji, ansioso, o sorriso esperançoso em seu rosto refletindo o que todos ali queríamos sentir.
— Acho que me saí bem. E tudo graças ao nosso "professor" — respondi, sorrindo e dando um leve empurrão em Rintarou.
Ele revirou os olhos, mas acabou sorrindo, parecendo aliviado também.
— Que tal uma comemoração? — sugeriu ele, agora mais descontraído.
— Claro! — respondemos, em uníssono.
Enquanto caminhávamos pelo corredor em direção ao refeitório, minhas emoções iam se misturando, entre o alívio e a persistente pergunta sobre o futuro. "O que eu quero para o meu futuro?" — a pergunta rondava minha mente, mas pela primeira vez não parecia tão assustadora.
Era como uma página em branco, esperando para ser preenchida, mas que agora não precisava de respostas imediatas.
Olhei para Seiji e Rintarou ao meu lado, e depois para a escola que deixávamos temporariamente para trás. Senti uma gratidão silenciosa, percebendo que, por mais que não soubesse ainda o que queria para o futuro, eu sabia o que importava agora: os momentos como aqueles, a amizade e o apoio que tínhamos uns com os outros.
E talvez, pensei, com o tempo e a ajuda dos amigos, eu acabaria encontrando as respostas que procurava.