Chereads / O Menino e o Poço / Chapter 4 - Capítulo 5 - Final

Chapter 4 - Capítulo 5 - Final

Naquela manhã gelada de sábado, o coração de Ramiro e Jéssica pesava com o peso do sofrimento. O fogo voraz havia devorado a casa da vizinha, levando consigo não apenas as estruturas físicas, mas também todas as memórias capturadas pelas câmeras de segurança. Os bombeiros, com sua bravura costumeira, haviam chegado a tempo de conter as chamas, mas o medo persistia. Enquanto isso, na densa floresta que circundava o local, os policiais se aventuravam com seus cães farejadores, em busca de sinais de vida.

— Eu só quero que esse pesadelo termine —, murmurou Jéssica, segurando uma foto do filho. — Por que eu não fui uma mãe mais presente para ele?

— Não diga isso —, respondeu Ramiro, colocando a mão em seu ombro com carinho. — Você sempre foi uma mãe maravilhosa, mais do que você imagina.

— Se algo acontecer com meu filho... eu não sei se conseguirei me perdoar. Não sei se consigo continuar vivendo esta vida sem ele —, desabafou Jéssica, com os olhos marejados de lágrimas.

— Nós o encontraremos. Eu o encontrarei para você, eu prometo —, afirmou Ramiro, tentando confortá-la com suas palavras de esperança.

Enquanto isso, os policiais continuavam sua busca incansável pela floresta, guiados pelos latidos dos cães treinados. Enquanto observava a casa da vizinha reduzida a cinzas, Jéssica sentiu um calafrio percorrer sua espinha.

— O que terá acontecido naquela casa? —, questionou ela, dirigindo-se a Ramiro.

— Bem, realmente não sei. Apenas a perícia poderá revelar a causa desse incêndio —, respondeu ele, com um tom sombrio de preocupação.

Com o coração pesado, Ramiro e Jéssica continuaram a caminhar pela densa floresta, chamando pelo nome de seu filho perdido. A ansiedade os envolvia enquanto procuravam, sem perceber que, em seu próprio quintal, um terrível drama estava se desenrolando. No poço esquecido, Vicky se agarrava desesperadamente à borda, uma chave de fenda cravada em sua mão e lágrimas silenciosas escorrendo por seu rosto.

A agonia da situação se intensificou quando Vicky percebeu algo alarmante: sua mão estava começando a se partir ao meio devido ao seu peso. O medo de cair no abismo negro abaixo o consumia, enquanto ele lutava para se manter seguro. Cada segundo era uma batalha contra a inevitável queda, seu corpo tremendo de pavor. Seus dedos sangravam e a dor se intensificava, Vicky lançou um olhar desesperado para cima, vendo apenas o céu frio daquela manhã e sentindo a brisa cortante em seu rosto.

Com determinação, ele agarrou a borda do poço com sua outra mão, suas forças quase se esgotando, mas sua vontade de sobreviver mais forte do que nunca. A luta pela vida continuava em meio ao silêncio assombroso da floresta. Ramiro estava cercado por policiais e bombeiros, discutindo os eventos que acabaram de ocorrer. Enquanto ele tentava processar a enxurrada de informações, Jéssica se aproximou silenciosamente e ficou ao seu lado.

— Então não encontraram nada do meu filho —, perguntou Jéssica, sua voz carregada de preocupação.

— Não se preocupe, senhora. Estamos fazendo o impossível para encontrar seu filho —, respondeu um dos policiais. — No entanto, temos muito trabalho a fazer na casa dessa mulher e com o corpo que encontramos no porão, que provavelmente é o da dona da casa.

— Meu Deus! — exclamou Ramiro, sua mente tentando processar a tragédia.

— Então a dona da casa queimou até a morte? Algo parecido assim? — questionou Jéssica, sua curiosidade misturada com horror.

— Não. Quando o fogo começou, a dona da casa já estava morta. Depois de examinar seu corpo, descobrimos que ela estava morta há mais de dois dias —, explicou o policial, acrescentando um novo nível de complexidade ao mistério.

Ramiro e Jéssica ficaram chocados com essa revelação terrível.

— Meu Deus, o que será que aconteceu por aqui? — murmurou Jéssica, levando a mão à boca em choque.

— É, muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo. Tomara que eu não encontre meu filho morto —, murmurou Ramiro, olhando para sua esposa com uma mistura de medo e determinação.

Após alguns momentos de silêncio tenso, Ramiro decidiu deixar o local e voltar para casa. Enquanto ele se afastava, uma névoa sinistra começou a se infiltrar pela estrada deserta, envolvendo-o em um abraço frio e sombrio.

Na estrada, Scott e Evan ainda estavam presentes, envolvidos em uma discussão acalorada que parecia prestes a atingir seu ápice. Scott olhou para Evan com uma mistura de raiva e incredulidade. Seu amigo de longa data, seu cúmplice em travessuras e confidências, agora o encarava com olhos cheios de desapontamento e determinação. Evan, com sua postura decidida, deixou claro que não estava disposto a se deixar arrastar para baixo pelo peso de seus erros passados. O vento soprou frio entre os dois, enquanto as palavras de Evan ecoavam no ar. Scott sentiu uma pontada de remorso se infiltrar em seu coração, mas sua teimosia o manteve firme.

— Você não vai voltar lá —, disse ele com uma frieza que surpreendeu até a si mesmo.

Mas Evan não recuou. Ele estava determinado a fazer as pazes com seu passado e seguir em frente, mesmo que isso significasse se distanciar de Scott. Então, num instante de impulso, Scott agarrou o braço de Evan, tentando impedi-lo de seguir em frente. Mas a reação de Evan foi rápida e certeira. Com uma cotovelada no estômago, ele se libertou do aperto de Scott, deixando-o sem fôlego e atordoado.

— Eu quero ficar longe de você a partir de agora, seu monstro —, disse Evan, seus olhos transbordando de determinação.

Scott assistiu em silêncio enquanto Evan se afastava, percebendo que as escolhas do passado haviam finalmente os separado. A solidão pesava sobre eles enquanto o vento uivava. A neblina densa envolvia a estrada, reduzindo a visibilidade a poucos metros à frente. O ronco do motor do caminhão carregado com toras de árvores ecoava no silêncio da manhã, enquanto o caminhoneiro, perdido em seus pensamentos, buscava desajeitadamente uma estação de rádio.

Contudo, Scott e Evan, imersos em sua discussão acalorada, não perceberam a aproximação do veículo monstruoso em alta velocidade. Palavras amargas eram trocadas entre os dois amigos, suas vozes se misturando ao ruído do vento.

— Você é um monstro e uma pessoa horrível. Não quero mais ser seu amigo —, gritou Evan, empurrando Scott com força.

Scott, não se deixando abalar, respondeu com um sorriso sarcástico: — Aí, tô com medinho. O monstro do mal. Você sempre gostou de brincar de papai e mamãe comigo e agora está me dando esse papo furado. Acha que eu sou um babaca, seu "Zé Ruela".

A tensão entre eles crescia a cada insulto lançado, até que Evan, exasperado, gritou: — Vá para o inferno!.

Scott não perdeu a oportunidade de provocar: — Só se você for comigo!.

Enquanto as palavras finais ecoavam na estrada vazia, o caminhão se aproximava rapidamente, sua buzina estridente cortando o ar. Mas seria tarde demais para os amigos perceberem o perigo iminente?

Com um empurrão repentino, Scott derruba Evan ao chão, justo quando um caminhão emerge da densa neblina, sua buzina ecoando enquanto o motorista avista os dois garotos à sua frente.

— Meu Deus, saiam da frente, corram! —, grita o motorista enquanto pisa no freio. Evan, ainda no chão, encara o caminhão, enquanto Scott permanece ao seu lado, ambos petrificados diante da iminente colisão.

Em um ato heróico para salvar as vidas dos meninos, o motorista lança o caminhão para o lado, mas as árvores estão lá para interromper sua trajetória. A caçamba do caminhão, desprendida pelo impacto, tomba para o lado, liberando as toras de madeira que rolam perigosamente para fora. O ar é preenchido pelo som de madeira contra metal, enquanto o caminhão se debate entre as árvores, lutando contra a força do impacto.

O vento sussurrava entre as árvores, as suas bicicletas velhas. As toras de madeira, escaparam de seu confinamento e rolaram descontroladamente pela estrada. Evan tentou se levantar, mas seus pés escorregaram no chão úmido. Scott, que tentava ajudar, acabou tropeçando na bicicleta e caindo ao lado dele. No momento em que se encararam, o som ensurdecedor das toras se aproximando os fez perceber a terrível realidade que os aguardava. As toras avançavam como uma avalanche implacável, sem piedade ou consideração.

O caminhoneiro, impotente dentro de seu veículo, assistiu horrorizado à tragédia se desenrolar diante de seus olhos. Não houve tempo para escapar, apenas para aceitar o destino iminente. As toras de madeira passaram por cima deles com uma força devastadora, esmagando e dilacerando seus corpos num instante. O sangue manchou a estrada, misturando-se com os pedaços de carne e os destroços das bicicletas.

A morte veio rápida e implacável para Scott e Evan, deixando para trás apenas um rastro de horror e desespero. O caminhoneiro, incapaz de fazer qualquer coisa para evitar a tragédia, ficou paralisado pelo choque e pela culpa. À medida que a névoa da morte engolia a cena macabra, a estrada silenciava-se, como se a própria natureza lamentasse a perda dessas crianças. E assim, os corpos desapareceram na escuridão, deixando para trás apenas uma lembrança horrível da fragilidade da existência humana.

Depois de horas de agonia, Ramiro finalmente saiu para a sacada do quintal, deparando-se com uma densa neblina que se espalhava pelo local. Seus pensamentos ecoavam em meio ao silêncio enquanto ele murmurava para si mesmo, buscando desesperadamente por seu filho.

Do outro lado, Jéssica observava com lágrimas nos olhos enquanto a polícia vasculhava a mata e os bombeiros trabalhavam para conter o fogo. Ela se aproximou lentamente da grama diante de sua casa, caindo de joelhos enquanto implorava ao vazio pela volta de seu filho.

Enquanto isso, no quintal, Ramiro também se ajoelhou, incapaz de conter as lágrimas que finalmente começavam a cair. Seus soluços ecoaram no ar, carregados de desespero e amor incondicional.

— Volta para mim, meu filho. Volta! —, murmurava Ramiro entre soluços, suas palavras carregadas de angústia e anseio. — Papai te ama.

De repente, um nome escapou de seus lábios: "Vicky". E então, diante de seus olhos embaçados pelas lágrimas, ele avistou o poço. Sem saber o que o esperava, Ramiro aproximou-se, chamando pelo nome do filho.

E ali, à beira do poço, Vicky estava pendurado, seus olhos arregalados de surpresa ao ouvir a voz do pai novamente. Um lampejo de memória atravessou sua mente quando ele se lembrou do tijolo que retirara da parede do poço, enquanto uma sensação de esperança começava a surgir em seu coração.

Rapidamente, ele começou a passar a mão pela parede do Poço, buscando desesperadamente por um tijolo solto. Com um esforço supremo, conseguiu arrancar um pedaço da parede e, com todas as suas forças, lançou-o para longe. O tijolo voou pelo ar e atingiu a cabeça de Ramiro, que caiu atordoado no chão, sem entender de onde viera o golpe. Ao olhar à frente, percebeu uma névoa se dissipando, revelando o poço à sua frente. Seu coração disparou ao ver a mão do filho agarrada à borda.

— Finalmente, encontrei-o. Encontrei nosso filho, Jéssica —, disse Ramiro, transbordando de felicidade.

Com um impulso renovado, ele se levantou e se aproximou do poço. Ao ver a condição do filho, uma onda de emoção tomou conta dele ao segurar o filho e retirar a chave de fenda de sua mão. Jéssica irrompeu no quintal, gritando e se aproximando rapidamente deles.

— Meu filho... você o encontrou —, disse Jéssica, emocionada.

— Calma! Ele ainda está vivo, mas precisa urgentemente de um hospital —, disse Ramiro, com voz firme, enquanto buscava ajuda para salvar o filho.

Jéssica e Ramiro não hesitaram e partiram imediatamente para levar Vicky ao hospital. Nos braços do pai, Vicky, completamente debilitado, lançou um último olhar ao poço. À medida que o poço diminuía à distância, a presença reconfortante de seus pais era o único fio de esperança que o mantinha vivo. Enquanto avançavam, uma névoa misteriosa envolveu todo o quintal. Jéssica, transbordando de felicidade, beijou e abraçou seu filho, enquanto Ramiro, emocionado, segurava-o nos braços novamente. Com um sorriso encantador, Vicky quebrou o silêncio.

— Estou bem, mamãe e papai. Agora estou bem —, disse ele pela primeira vez para os pais.

— Você pode desistir dos seus sonhos, mas nunca da sua fé —, diz Vicky, enquanto era levado pelos pais.

Dois dias se passaram desde a terrível experiência junto ao poço, e agora Ramiro, Jéssica e Vicky estavam juntos em um boliche, celebrando o nono aniversário de Vicky. O som das bolas de boliche batendo nos pinos ecoava pelo salão, enquanto risos e gritos de alegria preenchiam o ambiente. Vicky se divertia jogando boliche com seus novos amigos, Ramiro aproveitou o momento para se desculpar com Jéssica. Sentados em uma mesa, longe da agitação do jogo, Ramiro olhou nos olhos de Jéssica e falou com sinceridade.

— Jéssica, eu sei que cometi muitos erros no passado. Eu não estava presente quando você mais precisava, e por isso, peço desculpas. Percebi que sem vocês, minha vida perdeu o sentido. Eu quero consertar as coisas e reconstruir nossa família. Você pode me perdoar?

Jéssica olhou para Ramiro, vendo a sinceridade em seus olhos. Ela sabia que não seria fácil, mas também reconhecia que todos merecem uma segunda chance. Com um suspiro, ela sorriu para Ramiro.

— Ramiro, não foi fácil para mim também. Mas eu amo você, e quero tentar de novo. Vamos recomeçar juntos, pelo bem de Vicky e de nossa família.

Os dois se abraçaram, sentindo um peso sendo levantado de seus ombros. O boliche continuava animado ao redor deles, mas naquele momento, o mais importante era o renascimento do amor e da confiança entre Ramiro e Jéssica. Enquanto o ambiente vibrava com a alegria do boliche, uma mulher entrou carregando um bolo enorme, entoando os versos de "Parabéns pra Você". Com a vela de número 9 brilhando no topo, Ramiro e Jéssica chamaram Vicky, que se juntou a eles em frente ao bolo. 

Os olhos de Vicky brilhavam de felicidade ao ver o bolo, enquanto todos ao redor cantavam em uníssono. Ao final da música, Jéssica olhou para seu filho com ternura e alegria, pedindo-lhe que fizesse um pedido antes de soprar a vela. Com um sorriso suave, Vicky olhou para a vela, fechou os olhos por um momento e assoprou suavemente. Assim que a chama se extinguiu, um silêncio momentâneo tomou conta do ambiente, como se todos segurassem a respiração. E assim, no momento em que a vela se apagou, a história chegou ao seu Fim...