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Chapter 3 - Andarilho do Abismo

Barão Horácio Sterf

Detesto esse Rei com todas minhas forças, porém ele não está completamente incorreto... Eu poderia ter feito mais por minha filha, poderia ter tentado ao menos esconder ela comigo, já que não sou um bom combatente.

Estou com a melhor carruagem e com a maior escolta que o dinheiro pode pagar, eu falhei como humano e como pai, tenho que fazer tudo ao meu alcance para tentar me redimir, sempre fui um covarde, estou surpreso pelo fato de pela primeira vez eu estar determinado.

Claro que contratarei diversos mercenários, pois acredito que aquele Rei cretino não vai honrar sua promessa, passando por uma estrada que fica entre um pequeno riacho eu consigo ver meu reflexo na água, um grande choque de realidade, não importa quanto dinheiro eu tenha, sempre serei um covarde velho e gordo.

A carruagem continua fazendo seu caminho para o norte de Suralda, por ser o reino que fica quase completamente no sul do continente, é uma bela paisagem plana com leves relevos, além de ser o que mais tem rios, lagos, riachos em geral, sendo um paraíso fluvial.

Já está anoitecendo, estamos horas cavalgando, e ainda falta uma semana para chegarmos no local, o pôr do sol está belo e está com uma leve brisa agradável, às folhas das árvores da floresta que nos cerca estão se movendo de acordo com o vento, estou quase pegando no sono quando a carruagem para repentinamente.

Consigo ouvir vários murmúrios, alguns dos mercenários mais a frente começam sacar suas espadas, os mais atrás estando próximos a mim começam a acender tochas para ao menos conseguir ver qual é a ameaça que causou tanta comoção.

Seguro com minha mão esquerda um punhal, com a mão direita seguro o grande saco de moedas de ouro que recebi do Rei, estou com medo, no fim das contas sou apenas um covarde, isso nunca vai mudar... Porém preciso de informações, falo em um tom baixo, quase susurrando:

— Estamos sendo atacados por quem? Qual é a ameaça? São selvagens? — pergunto, já visivelmente desesperado.

— Você certamente estaria mais seguro se fosse selvagens — uma voz feminina me respondeu de uma forma calma, certamente não foi nenhum dos mercenários, e aparentemente apenas eu escutei, e como se tivesse ecoado diretamente na minha mente.

Fico perdido pensando no que acabou de ocorrer, até que algo é arremessado contra a porta da carruagem, me causa um grande susto por ter feito um barulho estrondoso. Passando o susto inicial eu me aproximo para ver o que era... O estranho objeto arremessado era um dos mercenários, ou melhor ao menos um pedaço dele.

Ele foi partido ao meio em um corte irregular, acredito que tal ferimento só poderia ser feito por uma mandíbula extremamente grande de algum predador ou algo do tipo. Na carruagem só chegou parte superior corpo, já sem vida e toda ensanguentada, simplesmente a olhar tal cena fico com uma vontade imensa de vomitar, realmente sou fraco para qualquer coisa relacionada a sangue.

— Vamos recuar em formação, protejam a retaguarda um do outro, se um fraquejar todos morreremos! — gritou Faros, o líder dos mercenários, o homem que um dia já foi cavaleiro do reino Oestázio.

Ainda temos esperança, Faros é muito experiente em todos tipos de combate, além de um ótimo estrategista, certamente ele vai conseguir um plano para imobilizar ou derrotar a criatura que nos rodeia.

Minhas esperanças não duram muito, em menos de um segundo após às ordens do líder dos mercenários, não é possível ouvir mais nada, a única coisa presente é um silêncio terrível. Tento olhar para o Faros e vejo uma mão grotesca e monstruosa atravessando seu abdômen.

Essa mão é completamente escura com uma leve coloração roxa, facilmente iria se camuflar na noite, Faros tenta reagir, apunhalando a mão da estranha criatura loucamente enquanto é puxado para o escuro aos gritos.

Rapidamente com a perca de seu líder, a moral dos mercenários é rapidamente reduzida a zero, todos rapidamente desistem do combate e jogam suas lâminas no chão. Começam a correr em direções opostas gritando.

Os gritos dos mercenários são silenciados um por um, até que mais uma vez os únicos presentes são eu e o silêncio... Se os mercenários não conseguiram fazer nada, eu certamente também não, porém mesmo assim eu saio da carruagem empunhando um pequeno punhal enquanto olho para todos os lados e procura de qualquer tipo de movimento.

Em um mísero segundo aparecem duas mãos próximas ao meu pescoço, não consigo me mover ou ao menos falar, entretanto o estranho ser ainda não me matou, tento procurar uma justificativa ao meu redor, vejo uma figura feminina parecendo uma freira, porém certamente não tem nada de sagrado em suas vestes ou semblante.

Ela está levantando a mão direita, então isso é um sinal para a criatura não atacar? Tanto faz, preciso descobrir um jeito de sair dessa situação. A estranha mulher começa a sorrir pra mim enquanto a criatura se aproxima.

Agora eu consigo o ver com clareza, um estranho ser humanoide, grotesco com cerca de cinco metros de altura, tem um aspecto frágil com membros finos, porém nem mesmo lâminas de aço afiadas conseguiram fazer um ferimento relevante no mesmo. É, eu estou morto.

— Eu consigo ver seu objetivo em seus olhos, não irei te matar, eu juro, pode ir atrás de sua filha — disse a estranha mulher.

Isso é sério? Não vou perder tempo pensando nisso, essa é minha única chance, Corro em direção a um cavalo próximo e subo rapidamente, e realmente nenhum daqueles indivíduos se moveram. Começo a cavalgar continuando na estrada.

Escuto um barulho do que parece ser ossos quebrando, tento entender porém não faz sentido, o que está acontecendo....? Meu cavalo continuou cavalgando sem mim? Como isso é possível, é como se eu tivesse flutuando. Fico estático na situação até que começo a vomitar sangue, olho para baixo e vejo que tem uma atravessando meu coração, certamente quebrou todas minhas costelas.

Estou incrédulo, não era esse o combinado, passando o choque inicial começo a sentir uma dor indescritível e minha consciência começa a se esvair, a estranha mulher continua falando, porém já não consigo escutar ou pensar.

— eu consegui cumprir minha promessa, não te matei. Porém meu amigo aqui, o Nocturnus é um pouco impaciente, e também não te prometeu nada. Agradecemos o dinheiro e a refeição.