Astracar parou diante da porta dourada da sala do rei. Os guardas, firmes em suas posições, estenderam as mãos para barrar Sekiro. Um deles falou com reverência: "Senhor Sekiro, vossa santidade gostaria de falar a sós com Astracar. Vossa Realeza, Apollo, fique aqui por ordem de sua santidade."
Astracar, de forma sutil, acenou para Sekiro, que, em resposta, chamou Apollo para uma conversa à parte. Assim, o imenso portão dourado foi aberto.
Ao entrar, Astracar foi imediatamente envolvido pela beleza da sala do trono. Tapetes vermelhos se estendiam pelo chão, e a luz branca suave preenchia o espaço, refletida por uma imponente vidraça. Nos vitrais, desenhos de anjos narravam histórias sagradas, e atrás do trono, uma majestosa escultura homenageava Yarandira, a Deusa da Energia Sagrada. Ao ver a estátua, Astracar se lembrou de um livro que havia lido na biblioteca do Imperador, intitulado A Odisseia dos Primordiais. O texto descrevia a hierarquia divina e falava dos deuses e deusas que moldaram o início do mundo.
Sem perceber, ele murmurou para si mesmo: "Yarandira, Deusa da Energia Sagrada."
De repente, uma voz rouca e antiga ecoou pela sala. O tom era cansado, carregado de arrependimento. "Isso mesmo," a voz disse, antes de o dono tossir levemente. "Aproxime-se, jovem."
Com cuidado e respeito, Astracar avançou. Ao se aproximar do trono, ele viu, sentado ali, um homem envelhecido pelo tempo. Seu rosto marcado por uma cicatriz no olho esquerdo, com uma longa barba onde fios brancos e dourados se misturavam. Seu cabelo, embora curto, seguia a mesma tonalidade. Ele vestia roupas simples, feitas de tecido branco, nada excessivamente luxuoso, semelhante ao traje de um clérigo.
Com um gesto lento, o imperador se levantou do trono e caminhou em direção a Astracar, seus passos calmos.
Diante de Astracar, o homem no trono olhou para ele com olhos carregados de tristeza e arrependimento. "Me desculpe," começou ele, sua voz baixa, mas cheia de pesar. "Se eu soubesse... Se eu tivesse a sabedoria que carrego hoje, ela não teria sofrido por minha ignorância. Ela sofreu..."
Astracar, pego de surpresa pelas palavras do Imperador, respondeu de forma hesitante: "Se o senhor está falando de Maria Bonita, minha mãe... ela nunca o culpou, senhor."
Ao ouvir o nome de Maria Bonita, vossa santidade, o Imperador, não conseguiu segurar suas emoções. Lágrimas escorreram por seu rosto marcado pelo tempo, revelando o peso de anos de arrependimento e dor acumulada. A sala do trono, por um momento, pareceu se encher de silêncio profundo, enquanto os dois homens, cada um com seu próprio fardo, compartilhavam uma conexão inesperada e dolorosa.
Vossa santidade, ainda com lágrimas nos olhos, se recompôs lentamente. Ele respirou fundo, enxugando as lágrimas que desciam por seu rosto envelhecido, e olhou para Astracar com uma expressão de profunda seriedade.
"Eu sou Tiberius Light, o último soberano da linhagem solar e... o responsável por muitas decisões que marcaram o destino deste Imperador," ele começou, sua voz ainda trêmula, mas firme. "Sua mãe, Maria Bonita, foi a passe com quem mais errei, e o peso dessa culpa tem me seguido desde então."
Ele fez uma pausa, como se refletindo sobre o passado, e depois continuou: "Na época, eu não tinha a sabedoria para entender o que estava realmente acontecendo. Agora, com o tempo, vejo o quanto ela sofreu por causa da minha ignorância e arrogância. E é isso que me atormenta."
Tiberius olhou nos olhos de Astracar, esperando algum tipo de julgamento, mas também buscando uma chance de redenção. "Eu a amava, e falhei com ela."
Tiberius, ainda visivelmente emocionado, continuou, sua voz carregada com o peso da história.
"No Imperio Sagrado, por gerações, uma cultura sombria se infiltrou em nossos costumes. Muitos dos imperadores anteriores, incluindo minha própria linhagem, julgavam aqueles com cabelos de tons escuros como propensos ao crime e à corrupção. Era uma crença infundada, mas profundamente enraizada. Sua mãe, Maria Bonita, nasceu com esses cabelos escuros e, por isso, sofreu discriminação desde jovem."
Ele olhou para Astracar com pesar, como se tentasse explicar algo impossível de justificar. "Apollo, seu tio, sempre esteve ao lado dela, tentando protegê-la dessa crueldade. Ele fez o que pôde para amenizar seu sofrimento, mas eu, cegado por outras ambições, estava tentando me tornar vossa santidade na época... e nunca percebi a dor que ela carregava."
Tiberius respirou fundo, como se preparando para revelar a parte mais dolorosa de sua confissão. "Foi apenas quando ela completou 18 anos que me dei conta de meu erro. Ela deixou uma carta para mim, uma despedida silenciosa e dolorosa. As palavras que escreveu nunca saíram da minha mente."
Ele então recitou as palavras da carta de Maria Bonita, a voz embargada: "'Obrigado, por tudo, pai... que faça um imperio belo.'"
Tiberius pausou o silêncio pesando na sala do trono. "Ela partiu naquele dia, e eu nunca mais a vi. Nunca tive a chance de me desculpar... de fazer as pazes com ela."
Após escutar tudo aquilo, Astracar respirou fundo, organizando os pensamentos antes de responder. Sua voz era firme, mas carregava uma certa suavidade ao falar:
"Queria que você não se arrependesse tanto, nem se deixasse consumir pelo remorso. Ela... Ela te considerava um grande homem, e sempre gostou de você, apesar de tudo. Ela dizia que eu deveria te conhecer, se algum dia tivesse a oportunidade."
Astracar fez uma breve pausa, olhando diretamente nos olhos de Tiberius, permitindo que suas palavras ressoassem na mente do homem. "Minha mãe... ela sempre te admirou. E foi por essa força que se tornou uma heroína no sertão, a rainha Maria Bonita. Ela trilhou seu próprio caminho, mas sempre carregou uma parte de você em seu coração, mesmo que nunca tenha demonstrado isso abertamente."
O silêncio se instalou por um momento, enquanto Astracar tentava processar a magnitude da conversa, e Tiberius parecia mergulhar em suas próprias emoções e memórias.