Miguel começou a pensar se era só uma coincidência, mas dificilmente seria. Ele estava pensando, mas atento a qualquer coisa. "Elias é o traidor? Não pode ser, não quero acreditar nisso. Preciso focar em capturar o atirador, mas e se for uma armadilha? Já seria tarde para voltar? Ficaria evidente demais a minha suspeita."
Enquanto os carros corriam, Miguel usava o tempo para traçar algumas pequenas ordens.
— Mauro, use seu lobo e tente rastrear o atirador assim que chegarmos. Não precisa se envolver em combate até segundas ordens. Elias, você vai ficar com ele e protegê-lo, caso seja necessário. Vamos interceptar o suspeito e fazê-lo falar, reportar à base e agir até eles chegarem.
— Ouviu, né, Mauro? Babá Elias, se comporta, senão vai ficar de castigo. — brincou Elias, rindo.
— Não enche, idiota! — respondeu Mauro, de forma fria.
— Que isso, cara? Se nos atacarem, vou te...
— Cala a boca, Elias! — disse Mauro, interrompendo Elias.
"O ânimo não anda bem pelo visto, seriam os muitos casos que eles estão tendo? Talvez..."
Faltando alguns minutos para chegar ao local, Elias exclamou, apontando em uma direção onde havia uma figura encapuzada correndo em uma moto.
— Alcancem-no, rápido! — ordenou Miguel, se pondo parcialmente para fora do carro.
Elias e Mauro pisaram fundo. O suspeito estava começando a ter sua distância encurtada até que, olhando pelo retrovisor, viu o carro de Elias com Miguel do lado de fora e os reconheceu. Então ele acelerou e começou a aumentar a distância.
— Mauro, tenta cortar pelas transversais e fechar na frente dele. — ordenou Miguel. — Elias, pisa fundo e fica pronto para frear forte. Vou tentar fazer uma loucura.
Miguel se inclinou e, balançando, subiu no carro. Mesmo com a mente pensando no traidor, naquele momento o que precisava pensar era em alcançar aquele cara. "Se chegarmos a uns 200 e tiver uma distância boa, vou usar o impulso do freio para pular para frente e vou alcançar ele. Vai doer, mas quanto mais rápido pegar esse cara, melhor."
Elias encurtava a distância e todos na rua viam a perseguição acontecendo, com Miguel chamando muita atenção pela posição em que estava no carro. "Por que estou tão hesitante? O que está rolando? Foco, Miguel!"
— AGORA! — gritou Miguel.
Com uma pisada forte, Elias freou o carro bruscamente, e Miguel fez como planejou. Usou o impulso para se arremessar para frente. No ar, com seu braço direito esticado para agarrar o suspeito, Miguel estava perto de alcançá-lo, mas o suspeito percebeu e desviou de Miguel, que agora estava a cair sem atingir seu alvo. Por instinto, Miguel aflorou sua foice e a usou como uma extensão do corpo para fazer um movimento de ricochete no chão e pegar força de giro para arremessar sua foice na roda traseira da moto, que foi estourada.
Miguel e o suspeito rolaram pela rua. Elias alcançou-os e pulou para fora do carro parado. O suspeito se levantou e entrou em uma rua estreita à direita. Enquanto Elias partia atrás do suspeito, Miguel se levantava, dolorido no ombro direito e na panturrilha direita pelo impacto causado.
"Não vou mentir, essa doeu..."
Miguel se pôs a correr. A rua estreita tinha feirantes e comerciantes se queixando de suas barracas danificadas. Miguel se desculpou com alguns, mas rapidamente voltou à sua corrida, pois ao fundo vira Elias saraivando flechas.
— Droga! — praguejou Miguel. — Mauro ou Pedro, alguém na escuta?
— Estamos rastreando em tempo real o Elias, senhor, para traçar uma interceptação daquelas bem brutas: freia e ele dá de cara na lataria! — respondeu Mauro, empolgado.
Miguel alcançou Elias, que corria de novo atrás do atirador.
— Que saco! — resmungou Elias, correndo ao lado de Miguel. — Esse cara é ágil, desviou da maioria dos golpes, inclusive das flechas.
— Ele mostrou a sombra dele?
— Não, mas usou uns equipamentos doidos, parece até coisa de ninja.
Miguel estranhou o comentário, mas prosseguiu correndo quando viu um reflexo fosco e fino à sua frente e avisou rapidamente para Elias abaixar. Era uma linha que poderia decapitá-los.
— Eu avisei que eram uns equipamentos estranhos!
— Ele não quer nos matar com armadilhas. — disse Miguel, olhando ao redor. — Ele quer nos atrair para uma emboscada. Elias, corra mais!
Miguel ainda parecia ter fôlego para correr. Estavam quase numa rua principal quando surgiu um lobo no final da rua e correu em direção ao suspeito, que, fazendo algumas acrobacias usando as paredes como apoio para suas manobras, cortou o lobo que se dissipou. Mas ele não esperava o carro de Mauro e Pedro parando bem na frente.
— Oso sugiru! — disse baixinho quando estava começando a bater no carro.
"Pegamos..."
Miguel não concluiu seu pensamento, pois o suspeito usou do impacto para rodopiar e ultrapassar o carro, mas Pedro aflorou sua sombra, colocando uma barreira na frente do fugitivo. Usando as mãos, o suspeito escalou pela barreira, mas Pedro foi aflorando mais vezes. No entanto, o fugitivo se movia muito bem. Quando ele estava quase alcançando um telhado, uma flecha disparada por Elias o acertou na cintura, fazendo o sujeito despencar e ser cercado por Elias e Pedro.
— Anata wa osoito sudeni iimashita. — falou o sujeito.
Quando o sujeito aterrizou no chão, Miguel logo encurtou a distância, deixando sua foice na altura da garganta do sujeito, que riu, mas Miguel não entendeu.
— Tira o capuz desse idiota! — ordenou Miguel.
Quando Elias ia tocar no tecido do sujeito, um tipo de alarme soou por toda a localidade, deixando o esquadrão assustado. "Sabia que era uma armadilha!"
Miguel ordenou Elias e Pedro a pegarem o suspeito, mas foram impedidos por um dardo tranquilizante que derrubou ambos. Então Miguel olhou para trás e viu Mauro com seu lobo aflorado o encarando.
— Mauro, que merda é essa? — perguntou Miguel.
— Apenas me aliando aos mais fortes! — disse Mauro no momento em que Miguel ia tomar um dardo tranquilizante. "Direita!"
Miguel desviou, pulando em direção a Mauro, que fez seu lobo avançar contra Miguel, mas ele facilmente fatiou a sombra em duas.
O sujeito se levantou e Miguel olhou para trás, começando a ver homens de terno o cercando.
— Mauro, era você o sétimo sujeito que o Rubens viu conversando com Lúcio e os capangas?
Mauro gargalhou, movendo-se rapidamente para perto do sujeito e ajudando-o a levantar.
— Claro que sim, por quê? — questionou Mauro. — Eu apenas estou me aliando a um ideal que faça sentido, mas isso não importa agora...
Miguel tinha sido acertado por um dardo e começou a cambalear. Mesmo assim, não desistiu. Aflorando sua sombra, começou a lutar com o encapuzado ali e com mais dois capangas que afloraram suas sombras. Mas logo ao derrubar um deles, Miguel foi acertado pelo outro no joelho, tomou um corte no rosto, e o dardo era forte. Miguel caiu no chão e perdeu a consciência.
23:00 horas daquela noite
Miguel sentia muita dor de cabeça ao recobrar a consciência. Ainda com a visão meio turva, percebeu estar em um tipo de cela. "Aonde diabos eu estou?"
— Senhor, senhor! — uma voz gritava.
Era Elias, que estava em uma cela em frente à de Miguel. Elias estava machucado e suas roupas eram um maltrapilho. Havia outras celas, mas a maioria estava vazia.
— Elias, onde estamos? — perguntou Miguel, ficando em pé, mas com os pés cambaleantes como um bêbado.
— Dentro de um prédio de luxo que opera como um tipo de casa de apostas. — respondeu Elias.
— O que aconteceu com você, cara?
— Tem uma arena aqui onde aparentemente pessoas apostam e fazem uns embates não muito equilibrados...
— Como assim? — questionou Miguel, ainda confuso.
— Zeks vs. humanos, senhor.
Miguel mostrou medo, pois lembrara que faltava Pedro.
— Cadê o Pedro, Elias? — perguntou Miguel, nervoso.
Nesse instante, adentraram na sala duas silhuetas masculinas. Miguel só conseguiu ver quem eram quando se aproximaram. Era Mauro com um saco e outro rapaz com um casaco cinza.
— Ora, ora, Mauro, a bela adormecida acordou bem na hora do presentinho.
— Seu traidor desgraçado! — praguejou Elias.
Mauro o encarou e, fazendo uma cara coberta do mais puro desdém, falou:
— Vê se cala o focinho, cãozinho do Miguel...
— Ah, seu merda! — reclamou Elias, se agarrando às grades. — Deixa eu sair daqui para ver se não vou quebrar cada osso dessa tua cara de bosta!
— Meninas, meninas, parem por favor! — disse o homem de casaco.
— Qual é, Rodrigo... — resmungou Mauro.
Miguel lembrou que Rodrigo era um ex-NF de ranque S. Sua sombra era uma Kusarigama.
— Senhor Miguel, queria dizer que é um prazer conhecer a pessoa que é o "Prodígio" da NF.
Miguel encarava firmemente Rodrigo, que pegava da mão de Mauro o saco e se aproximava lentamente da cela de Miguel.
— Tenho um presente de boas-vindas para o nosso mais ilustre visitante. — Pondo a mão dentro do saco e começando a retirar algo redondo de lá. — Imagino que esse crânio é do seu amigo... Qual é o nome mesmo? Pedro.
Miguel estava horrorizado com o que estava à sua frente. Era a cabeça de seu amigo Pedro.
— SEU DESGRAÇADO! O QUE VOCÊ FEZ? — gritou Miguel, se enchendo de ira.
— Ei, cuidado com a língua oficial da lei! — zombou Rodrigo.
— Digamos que... Ele perdeu a cabeça! — disse Mauro.
Miguel estava rangendo os dentes de raiva enquanto Mauro e Rodrigo riam.
— Viu só a cara que ele fez? — zombava Mauro.
— Foi exatamente como você disse! — respondeu Rodrigo. — Uma cara tão patética.
Miguel estava irritado pelo falecimento do seu amigo, mas precisava recobrar o equilíbrio.
— O que vocês querem com a gente? — questionou Miguel, se afastando da grade.
— Simplesmente, entretenimento. — respondeu Rodrigo enquanto mexia em seu bolso e jogava a cabeça de Pedro no chão. — Rapazes!
Seis homens de terno surgiram da porta e cercaram a saída da cela onde Rodrigo estava aparentemente para abrir a cela onde estavam Miguel e Elias.
— Sem fazer nenhuma gracinha, saia agora de sua cela, senhor Prodígio. — disse Rodrigo.
Miguel, desconfiado, foi lentamente caminhando até a entrada da cela, onde foi puxado e imobilizado pelos seguranças.
— Você hoje vai entreter nossos apostadores que estão ansiosos para o Grand Finale da noite. — falou Rodrigo, levantando a cabeça de Miguel pelos seus cabelos laranjas relaxados. — É bom não os decepcionar, "Prodígio", pois eles estão esperando sua pool abrir para apostar, e meu amigo... Que apostas, que apostas!
Alguns minutos depois, Miguel estava numa espécie de elevador e os capangas ainda o seguravam e conversavam entre si.
— Será que ele dura mais que o outro?
— Se ele for pelo menos decente, pode ser que ele realmente consiga.
— Moleque... Não viaja! Os monstros de hoje têm uma disparidade de força muito grande dos demais e, sem falar que, para um candidato a Classe S, teremos surpresas.
Quanto mais o elevador se aproximava de seu destino, uma voz no alto-falante anunciava:
"Caros convidados, chegou a hora da atração principal da noite. Enquanto na primeira rodada entre Humanos e Zeks o soldado Elias garantiu um ponto para os humanos, na segunda, Pedro, o soldadinho que fugia amedrontado, foi degolado facilmente, trazendo um ponto para os Zeks e empatando o embate. Com isso, teremos a rodada final. Então façam suas apostas! De um lado, um Tezek de Classe A e, do outro, mais um soldado fiel ao sistema da Nova Força. Alguns o chamam de Prodígio, um candidato a Classe S. Com vocês, Mi-Gueeeeeeeeeel!"
De forma brusca, os seguranças chutaram Miguel para fora do elevador.
"Uma arena de luta, como o Elias falou mais cedo, mas como faço para me livrar dessas algemas?"
Um barulho de grade se ouviu. Os burburinhos da plateia paravam perante o Zek ali presente, que avançava em direção a Miguel.
"Um Tezek Tatu, mas que merda!"
Miguel ainda estava com sua sombra inibida pelas algemas, mas ainda possuía sua alta mobilidade e saltou para a esquerda, rapidamente desviando da criatura que soltou um rugido, fazendo a plateia ficar entretida com o evento. Enquanto isso, a voz fazia comentários para incentivar as apostas:
"Será que esse oficial da lei vai conseguir? Com aquelas algemas ele ainda é um civil em apuros, fugindo da inevitável morte para um Zek faminto!"
— Vai se ferrar, seu merda! — bravejou Miguel, enquanto olhava rapidamente ao redor, em busca de uma maneira de se livrar daquela coisa em seus pulsos.
Em um rápido movimento, o Zek virou um tipo de bola devido à sua natureza e agora rolava com ferocidade para cima do desarmado Miguel. Ele tentou correr, mas o impacto o arremessou contra uma das paredes da arena.
"Assim não dá, esses inibidores são um porre. Pensa, Miguel... PENSA!"
Miguel avançou correndo em direção ao Zek à sua frente e a plateia foi à loucura com a corrida do rapaz, que, frente ao Tezek, pulou em direção à boca da criatura, que abria a boca para desferir uma mordida fatal.
"Será que Miguel desistiu da luta e já vai se entregar?"
"Se entregar é uma ova..."
Com um rápido rodopio aéreo, Miguel bateu forte as correntes no dente da criatura e assim viu suas algemas serem partidas em pedaços.
Em guarda e no chão, Miguel aflora sua Foice negra, tirando suspiros da plateia.
- Em quantas fatias quer que eu te parta, seu bicho feio? – Perguntou Miguel com sua foice erguida na direção do Tezek que rugiu de forma estridente para ele.