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Morte Negra

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Chapter 1 - CAPÍTULO 1 - O CASTELO

                            PRÓLOGO

Novembro de 1996.

No horizonte, atrás da casa da família Montgomery, o céu tornava-se azul. O sol saia por entre as nuvens carregadas (que anunciavam uma tempestade). Nas escadas que davam acesso à varanda da residência, uma moça de cabelos castanhos claros estava sentada, com um olhar vago, e com suas vestes e pele cobertos por sangue seco. Mais ao longe, na rodovia que saia por entre árvores que cercavam a propriedade Montgomery, viaturas e ambulâncias chegavam, com suas sirenes soando.

— Srta. Carlson? Perguntou o oficial, ao aproximar-se da moça, que fitava o horizonte, paralisada. — Srta. Carlson, a senhora me escuta? Ele segurava uma lanterna em seus olhos.

Ela os moveu rapidamente. Como um predador que havia acabado de achar sua presa.

Novembro de 2021

Alice Jones, uma jovem de cabelos castanhos claros, beirando o loiro, e pele alva e olhos castanhos, acordou com o solavanco do avião quando este pousou no Aeroporto de Coanda, um dos mais importantes da Romênia. Ela se espreguiçou no assento. Ao seu lado, Eleanor — sua melhor amiga — ainda dormia, com o protetor de olhos de gatinhos. A jovem, que minutos antes estava sonhando com algo importante e do qual gostaria de se lembrar, puxou a persiana da janela ao seu lado, curiosa para ver o que lhe aguardava.

Mas tudo o que viu foi um grande prédio aos fundos (o aeroporto, ela pensou) e operários do local limpando a neve da pista, que se acumulava a cada instante. O céu estava cinza, nenhuma ave voava. Ela se virou para despertar Eleanor, mas a garota fora acordada pela voz que saia dos altos-falantes. Em inglês, o piloto informava que em minutos o desembarque iria acontecer, e também falava da temperatura gélida da cidade naquele dia. As duas se entreolharam. Estavam acostumadas com o inverno estadunidense, não com o inverno do extremo leste-europeu.

— Espero que Danna tenha se lembrado de trazer um casaco ao invés dos tops que ela chama de blusa. Disse Eleanor, sussurrando. Alice riu.

    Naquele momento, uma cabeça surgiu acima dos assentos da frente, era Danna, uma garota de pele negra, cabelos escuros e lisos, e que vestia um suéter que ia até à altura da cintura.

— Sim, Eleanor, para sua informação eu trouxe roupas de inverno. Acha que eu sou tapada ou algo do tipo só porque sou líder de torcida? Falou ela, jogando os cabelos para trás.

–  Não, eu não acho, eu tenho certeza. Você só foi escolhida para essa viagem porque a Chrystal mexeu uns pauzinhos e conseguiu te trazer! Respondeu a ruiva, amiga de Alice, com uma cara de deboche.

    Danna ia responder, mas foi impedida por sua amiga Chrystal, que ao ouvir a voz do piloto — anunciando que eles podiam retirar suas bagagens — levantou-se e mirou os olhos azuis na direção das duas outras. Ela tinha um olhar feroz, os lábios avermelhados, e uma pele alva, que estava corada pelo frio. Seus cabelos loiros estavam trançados naquele dia, e ela usava um suéter verde de linho juntamente de uma calça elegante, destacando o bom gosto que tinha para moda e também o poder aquisitivo.

– Eu sei que é frustrante, El, que eu e meus amigos estejam nessa viagem e você não tenha conseguido trazer a besta do seu ficante, ou ficantes, não sei. Mas não se preocupe, querida, nada disso foi manipulado, todos estamos aqui graças ao nosso mérito e é claro… à mãe de Alice. Falou Chrystal, fitando com certo asno a garota do lado de Eleanor. — Então, que tal passarmos um feriado agradável? Como se fossemos uma grande família feliz?

Sarah Jones havia sido a responsável por organizar a grande excursão dos estudantes da escola Long Island High, onde sua filha estudava, para o castelo na Romênia. A mulher era responsável por cuidar do castelo, fora contratada para exercer aquela função.

A Sra. Jones nunca havia sido uma mãe presente na vida de Alice. Quando a jovem tinha dez anos, a mulher arrumara um emprego em outro país, e então deixou a garota sob a tutela da irmã. Desde então, Sarah havia trabalhado em muitos locais do mundo, mas nunca havia voltado para casa. Presentes, dinheiros, cartões portais sempre eram enviados. Mas Alice nunca recebeu a presença de sua mãe. Ela cresceu com um vazio, mesmo que sua tia a desse todo o amor do mundo.

Até que em uma manhã, sua mãe a pegou de surpresa, havia ligado para ela. A jovem foi informada sobre a excursão que ela iria arcar — para os melhores alunos da turma de história global — da escola. Ao mesmo tempo, em que ficou feliz, ela preencheu-se de raiva. Porque só agora? Porque só quase dez anos depois? Mas ela não perguntou aquilo. Aceitou com gratidão o presente.

Os transmites foram feitos, os dez melhores alunos escolhidos, e em meados de novembro, eles entraram em um voo para a Romênia, para conhecer as paisagens paradisíacas e pitorescas do inverno dos Montes Carpatos. Porém, Alice estava mais interessada em conhecer uma pessoa que lhe abandonara anos atrás do que apreciar pinheiros cobertos por neve.

A turma de 10 alunos caminhava entre a multidão que transitava pelo aeroporto naquela manhã. Todos se mantinham juntos, guiados pelo diretor Prescott, que ficara responsável pelos cuidados da turma de jovens. Alice olhava ao redor, com ansiedade, à procura do rosto da mulher. Eleanor vinha caminhando com Claire, uma amiga de Eleanor e Alice, de aparência asiática e de cabelos lisos.

— Céus, eu não tô acreditando que tô aqui! Você tem noção que estamos nas terras do Drácula? Falou Austin Hicks, um jovem magro, de olhos verdes e cabelos escuros. Era um entusiasta nato de filmes e livros de terror. Era uma enciclopédia ambulante.

— Esse cara não existiu, Austin, você acredita em cada coisa. Disse Liv, melhor amiga do rapaz, tirando os fones de ouvido e guardando na jaqueta jeans. A moça tirou um cigarro e quando estava prestes a acender, um dos seguranças do aeroporto bateu no fumo, derrubando-o no chão e pisando nele com sua bota. A garota ficou boquiaberta enquanto o homem falava uma língua incompreensível e apontava para uma placa, onde um símbolo dizia ser proibido fumar.

— Mal pisou na Romênia e já tá arrumando confusão, irmã da morte? Resmungou um rapaz musculoso, ao passar por Liv e Austin, vestindo uma camiseta do time da escola — Ficar atenta, não quero perder minhas férias por causa de você, drogada problemática.

— Vai se foder, Sean! Respondeu ela, mostrando o dedo do meio para ele.  Austin e ela voltaram a caminhar. Mais na frente, Sean Kingston foi parado por seu irmão Luke que o puxou pela jaqueta.

— Acho mais provável você estragar nossas férias, então veja se se controla. Disse o rapaz, completamente oposto ao irmão. Tinha olhos azuis, cabelos castanhos e usava uma jaqueta acolchoada. Tinha um corpo musculoso, como o do irmão. Eram do mesmo time de futebol da escola.

— O que você vai fazer, hein? Ligar para o papai e mamãe e me dedurar? Sean soltou-se do irmão e se aproximou de Danna e Chrystal, sua namorada.

  Alice continuava a buscar, entre a multidão, o rosto da mulher que já estava quase desaparecendo de sua memória. Até que ouviu o grito do diretor Prescott, dizendo "Oh! ali está ela". Ao direcionar sua atenção para onde o homem grisalho apontava, Jones congelou. Sua mãe estava ali, a poucos metros, com um sorriso contido, segurando uma placa que dizia "Bem vindos, turma de 2021". Elas trocaram olhares profundos em meio a multidão que se cruzava no aeroporto naquele dia frio.

Alice sempre ouviu dizer ser impossível esquecer de algo. Seja uma memória boa, ou uma ruim. Mas a sua mente contrariava aquilo. Ao olhar para o rosto alvo da mãe, com os cabelos cortados na altura dos ombros e de coloração entre castanho e vermelho, ela não a reconheceu. Não era a mulher que tinha visto dez anos atrás, entrando na área de embarque do Aeroporto, deixando uma Alice de oito anos para trás, chorando nos braços da tia.

Mas havia algo que não mudara. Os olhos. Ainda havia dor nos olhos da mãe. A mesma dor que Jones havia visto no dia que ela partiu.

— Sra. Jones! Falou o diretor Prescott, apertando a mão da mulher. Ela retribuiu, com um sorriso, mas sem tirar os olhos de Alice. — Não posso expressar minha gratidão por seu convite.

— Não há de quê, Sr. Prescott. É um prazer receber uma turma tão esforçada e dá-los a chance de conhecer aquilo que eles só viram nos livros de história. Falou a mulher, gentilmente.

— O diretor está mais animado que o Josh, sendo mais novo. Falou Danna, que estava atrás de Alice, cutucando Chrystal.

O rapaz, filho do diretor e de personalidade associal, mexia no celular, com grandes headsets cobrindo os ouvidos e uma grande jaqueta acolchoada negra.  Ele era um rapaz negro, de olho castanhos escuro e de cabelos crespos. Seu porte atlético e sua beleza singular chamavam a atenção das garotas, mas ele não estava interessado naquilo. Ele havia ido para Long Island High para um motivo: recomeçar.

— É o jeito esquisito dele de ser. Você sabe… sabia que ninguém nunca descobriu o porquê dele ter sido transferido no último ano de uma escola para outra? Indagou a loira, baixinho.

— Bom, turma, essa é a Srta. Jones! Ela será nossa anfitriã e também nossa guia enquanto estivermos aqui, na linda Romênia. Ela foi a alma caridosa a conseguir essa excursão totalmente gratuita! Falou o diretor, apresentando a mulher aos outros.

Sarah Jones acenou e explicou que eles precisavam ir, pois, o trajeto até o castelo era demorado, principalmente pelo acúmulo de neve nas estradas. Enquanto a turma movia-se para fora do aeroporto, Sarah fitava Alice, que sentia o olhar da mãe, mas a ignorava, pois, ainda não havia achado a coragem para enfrentá-la ainda.

No ônibus, enquanto se organizavam em seus assentos, Eleanor e Alice direcionaram-se para o fundo do veículo. A primeira puxou a loira em um canto mais reservado.

— Você não vai falar com ela? Perguntou Williamson, enquanto se sentava com a colega.

—  Estou tentando arrumar coragem…

— Alice? Disse uma voz, atrás das duas garotas. A garota cujo nome foi chamado arrepiou-se e sentiu uma pontada no coração. Era ela. Após dez anos. Ela ouviu sua voz novamente. A jovem virou e se deparou com Sarah, parada a sua frente, com um semblante nervoso.

Ao perceber que se tratava de um momento íntimo, Eleanor retirou-se, dando tapinhas nas costas da amiga, e se sentou com Claire, que lia um livro. Alice passou alguns segundos encarando sua mãe, até que o motorista gritou algo e a mulher disse "Está pedindo para sentarmos".

Estavam uma ao lado da outra, mesmo com o passar do tempo, ainda havia uma certa similaridade entre as duas. Sarah parecia querer falar algo, mas as palavras não saiam, e Alice desejava ouvir qualquer coisa.

— Como foi o voo? Perguntou a mulher, finalmente, quando o ônibus começou a se movimentar. Alice pigarreou, nervosa, antes de falar.

— Foi bom, um pouco cansativo. Respondeu a jovem, sem conseguir olhar nos olhos da mãe.

— Seus colegas estão animados? Você está? Questionou, com o veículo ganhando movimento na estrada.

— Sim, estão. Obrigado, aliás… não sei como você conseguiu algo tão grande. Custou caro? Perguntou à filha.

— Não. Os antigos donos do local, professores de uma universidade em Bucareste, não estavam conseguindo dar conta do local, então me contrataram. Eles me pagam uma quantidade boa, mensalmente, por cuidar do local. Eu perguntei para os donos se haveria problema em receber uma turma de estudantes… mas eles insistiram que não, ficaram entusiasmados, eu acho.

—  Foi generoso da parte deles…

— Sim, o Ajungeți în Munții Carpați é um lugar legal. Cercado de mitos, histórias e haverá um jantar especial. Acredito que a turma vá gostar de passar essa semana aqui.

Alice assentiu e voltou sua visão para a estrada lá fora. O ônibus começava a se afastar da cidade grande, e a cada quilômetro que rodava, menos prédios e mais árvores surgiam. Pinheiros escuros se erguiam, sumindo no aglomerado de névoa e nuvens. A jovem observava tudo, encantada com toda a beleza do local. Aos poucos, quanto mais o ônibus movia-se para o norte, montanhas elevadíssimas surgiam. Seus cumes eram cobertos por camadas de neve, enquanto as nuvens dançavam em volta dos grandes rochedos. A vegetação densa e verde-escura se estendia por toda encosta da montanha. E essa foi a visão que Alice, e todos tiveram por horas, até chegarem no Ajungeți în Munții Carpați.

   Situado nos Montes Cárpatos, a estrutura imponente do castelo Ajungeți în Munții Carpați irradiava uma aura misteriosa, como se seu interior fosse a jaula que guardava um grande monstro, esperando apenas o momento correto para escapar.

  Sua estrutura gótica se elevava altiva, testemunha do tempo e da história que permeavam cada pedra envelhecida pela passagem dos séculos. As torres robustas e as muralhas, cobertas por musgo e parcialmente envoltas por uma leve neblina, retratavam a grandiosidade do castelo. A vegetação,  ao redor exibia cores outonais, em tons de laranja e vermelho, contrastando com a imensidão cinza dos Montes Cárpatos ao fundo.

Os arredores do castelo estavam adornados por pinheiros e árvores que começavam a se entregar ao frio do mês, exibindo uma delicada camada de neve sobre suas copas. No fim da encosta do monte onde o castelo se localizava,  um lago, quase congelado pelo frio incipiente, que refletia a solidez e a serenidade do local. O ambiente ao redor parece imbuído de um silêncio respeitoso, interrompido apenas pelo farfalhar suave das folhas secas e pelo ocasional grasnar dos corvos que pairam nos céus.

    Quando o ônibus estacionou, em frente aos portões imensos que davam acesso aos terrenos do castelo, os jovens estavam encostados nas janelas do ônibus, encantados com toda a beleza do local. Sarah desceu do ônibus indo até o interfone instalado no muro, e apertou um botão, que fez um barulho estridente. Uma voz que falava um idioma desconhecido (provavelmente romeno) saiu pelo alto-falante, Sarah respondeu na mesma língua. Em segundos, o portão se abriu.

— Diretor, vamos ter que continuar o caminho a pé. A encosta é muito íngreme, o ônibus não conseguirá subir. Informou a mulher, com um casaco grosso para se proteger do frio.

— Vamos ter que subir… essa montanha… com nossas malas? Perguntou Chrystal, com uma cara feia e claramente insatisfeita com a notícia.

— É, mas são apenas alguns metros. Iremos dividir o peso das malas… somos 12, alguns de vocês podem ter trazido mais bagagens, outras pessoas trouxeram menos… não há o que problematizar. Explicou Sarah, apaziguando.

— Isso é inaceitável! Escalar com malas em um frio dos infernos! Praguejou a loira, saindo.

— Do que você tá reclamando, Chrystal? Você não pagou nadinha por estar aqui. Queria que houvesse um chofer para levar suas malas? Me poupe! Disse Liv, revirando os olhos, pegando suas duas malas e começando a subir, adentrando nos terrenos do castelo. Os outros se entreolharam e fizeram o mesmo.

— Você quer que eu leve sua bagagem, amor? Perguntou Luke, colocando sua mochila nas costas e pegando a maleta com uma das mãos.

— Não precisa, querido… respondeu Alice, pegando as bolsas. — Acho que está tudo sob controle. Ele deu um beijo no rosto dela e seguiu com os outros. Jones os observou, Sarah apareceu repentinamente atrás dela.

— É seu namorado? Perguntou ela, ficando tão vermelha quanto Alice com a pergunta. Elas trocaram um olhar rápido e a mais nova deu uma risada tímida.

— Sim, é o Luke. Estamos juntos faz algum tempo. Ele é cuidado, presente, sempre está comigo. Temos os mesmos gostos. Estamos planejando ir para a costa leste no próximo ano, vamos tentar a CUNY. Explicou ela, enquanto caminhava com a mulher, pela trilha que os levava para o castelo.

— Você… hum… já se inscreveu? Perguntou Sarah, envergonhada.

— Sim, em setembro. Provavelmente vamos receber os resultados em fevereiro.

— O tempo passa rápido… Falou a mais velha, contemplando os pinheiros com os cumes cobertos por neve. Alice assentiu, queria perguntar algo, mas ainda não tinha coragem. — E no que você se inscreveu?

— Psicologia. Falou a moça, dando um sorriso e colocando uma mexa do cabelo para trás.

— É uma boa profissão… acredito que você vá ajudar bastante as pessoas… será boa no que faz. Falou a mãe da menina, ainda acanhada com a comunicação com sua filha.

O grupo caminhou por alguns minutos, além do farfalhar de folhas, tudo o que se escutava era o barulho dos corvos, que sobrevoavam a área, pairando nos cumes das árvores, vez ou outra, para observar a passagem dos jovens, como se aqueles olhos negros fossem uma câmera, registrando cada passo daqueles forasteiros em terras desconhecidas. Após quinze minutos de uma caminhada exaurida, os doze chegaram a Ajungeți în Munții Carpați. Lá, eles ficaram encantados com a imensidão do castelo, logo puxaram seus aparelhos celulares e começaram a bater inúmeras fotos. Chrystall e Danna faziam inúmeras poses, enquanto Claire e Eleanor julgavam as duas colegas de classe de longe. Austin, deslumbrado, explicava para a melhor amiga Liv o significado de inúmeras coisas dos Montes Cárpatos, a moça fingia escutar. Luke estava encostado em uma muralha, que permitia uma visão exuberante da base do monte de onde estavam, a estrada por onde haviam passado, as árvores cobertas por uma névoa mística. Alice encostou em seu ombro.

— E então, vocês conversaram? Perguntou ele, ainda olhando, junto da namorada, para a vista deslumbrante.

— Ainda não. Apenas sobre coisas bestas… tipo, faculdade, clima, sobre como foi o voo… Eu ainda não tive coragem. Explicou a loira, para o namorado, e olhando para os seus olhos profundos. — Luke, a verdade é que nem eu sei se quero saber a verdade. Não sei se quero saber o porquê dela ter me deixado. Não quero porque eu tenho você, e quando estou com você, me sinto completa, acompanhada, amparada. Tudo que ela poderia me dar como mãe, eu já encontrei em você. Seu amor basta para mim.

Ele deu um sorriso, e então se beijaram. O diretor Prescott anunciou que iriam adentrar no castelo, e quando se viraram, Alice se deparou com sua mãe, parada estática atrás dela, seus olhos ameaçando despencar lágrimas a qualquer minuto, ela havia escutado as palavras ditas pela filha. As duas finalmente se encararam, e um silêncio absorto pairou na atmosfera, mas logo foi interrompido quando Sarah convidou os dois para entrar no recinto, como se não tivesse escutado as palavras ditas pela filha.

Ao adentrarem no castelo, foram imersos em um tempo antigo, era como se tivessem voltado no tempo, onde cada passo ecoasse séculos de história. As portas de madeira maciça se abriram para revelar um interior repleto de detalhes ornamentados e corredores iluminados por tochas antigas.

Os corredores de pedra desgastada por inúmeras gerações exalavam o aroma de tempos passados, enquanto a luz tênue das tochas lançava sombras dançantes nas paredes adornadas por tapeçarias centenárias. Os móveis de época enfeitavam as salas, indicando eras de realezas e intrigas. Cada sala era uma esplêndida cápsula do tempo, onde os afrescos delicados retratavam contos épicos, lendas perdidas no tempo e mitos. Os tetos altos de alguns cômodos abrigavam lustres de cristais que brilhavam e lançavam reflexos brilhantes, iluminando os corredores de pedra.

As escadas de carvalho polido levava aos andares superiores, onde os aposentos privados revelavam uma atmosfera acolhedora, com camas esculpidas e móveis ornamentados. Janelas góticas permitiam a entrada de um feixe de luz suave, oferecendo vistas deslumbrantes das paisagens circundantes. A atmosfera no castelo era, em simultâneo, de tranquilidade e calmaria, mas também de um certo mistério e sombrio, como se de um canto mal iluminado fosse surgir algo demoníaco.

— Crianças… ou devo chamá-los de jovens? Falou Sarah, parada no patamar da escadaria, olhando para o grupo aos pés dos degraus. — Agora vou apresentar a vocês onde vocês irão dormir. Apesar de o castelo ter muitos aposentos, e quando digo muito, eu digo muitos, a maioria não é limpo a décadas, ou séculos, e alguns estão com danos estruturais. Então, para a vossa segurança, eu escolhi os melhores quartos.

— Todo o castelo não deveria estar em perfeito estado já que você não é paga para isso, srta. Jones? Pelo menos é o que Alice fala na escola. Que a mãe é dona de um super castelo, como se você fosse rica, algo do tipo. Implicou Chrystal, com os braços cruzados e as sobrancelhas arqueadas.

Alice olhou para a jovem, com os olhos flamejando de ódio, ela nunca comentou nada daquilo, naquele momento sentiu uma vontade imensa de dar uma bofetada naquela garota, mas Luke a segurou. Sarah deu uma risadinha e olhou para a jovem.

— Qual é seu nome querida? Perguntou a mais velha.

— Chrystal, sou a líder da turma, junto de sua filha… Eu quem falei com você por telefone algumas vezes, lembra? Falou ela, com superioridade na voz.

— Escute, Chrystal. Esse Castelo tem cerca de cem cômodos, cinco andares. Eu acredito, já que você se mostrou bem relutante a subir uma encosta de 500 metros, que você sabe bem o quanto é cansativo fazer bastante esforço físico, certo? Então, imagine-se agora limpando todos os cômodos desse local… pode fazer isso?

A garota ficou vermelha e com o rosto contorcido de raiva por ser contrariada. Alice sorriu e olhou para a mãe, que tornou a falar após dar uma piscadela para a filha.

— Continuando nossos comunicados… Não há sinal de celular no castelo, e nem em áreas ao redor. O único meio de contato é por um telefone que fica em meu escritório, e vocês não podem acessá-lo sem minha permissão. A nossa biblioteca, com inúmeros livros, o salão de pinturas e músicas, todos esses locais são permitidos, mas há áreas do castelo que vocês não podem acessar sem minha companhia, certo? Sob nenhuma circunstância. Salientou a mulher, olhando nos olhos de cada um. — Bom, e como já são quase 18 horas, vou levá-los aos seus aposentos, e darei tempo para vocês se prepararem para o nosso tour pelo local, e depois disso, faremos o nosso jantar.

Os jovens bateram palmas. Em seguida, subiram as escadas, ficando encantados com cada detalhe daquele local pitoresco.

   As portas duplas de madeira se abriram, revelando um quarto espaçoso e decorado com requinte, onde a atmosfera de nobreza e conforto se mesclava de forma encantadora. A luz do sol entrava suavemente pelas janelas de vitrais, destacando os móveis de madeira escura e as tapeçarias que adornavam as paredes.

Encostadas nas paredes do quarto, duas majestosas camas com dossel, cada uma com seus cortinados de tecido ricamente bordado e pilastras esculpidas, proporcionando uma sensação de privacidade e elegância. Os lençóis finamente bordados e os cobertores de veludo conferem uma sensação de aconchego ao ambiente. Entre elas, uma mesa de madeira polida, ornada com candelabros dourados, repousava sobre um tapete persa que adicionava um toque de cor ao chão de pedra fria. Sobre a mesa, um buquê de flores frescas em um vaso de porcelana.

Ao longo das paredes, dois armários de madeira maciça exibiam artesanatos finos e ofereciam espaço para roupas e pertences pessoais. Um espelho emoldurado em ouro adornava uma das paredes, ampliando o espaço e refletindo a luz que preenchia o quarto.

As janelas ofereciam uma vista deslumbrante dos Montes Cárpatos, permitindo os ocupantes desfrutarem da beleza natural enquanto relaxavam em sua privacidade. O ambiente era tranquilo e convidativo, um refúgio de calma e elegância no imponente e misterioso castelo.

— Bom, meninas, último quarto. O de vocês! Disse Sarah, entrando com Eleanor e Alice, que carregavam suas bagagens.

— Meu Deus? Parece um conto de fadas! Exclamou Eleanor, jogando-se com tudo na cama de lençóis confortáveis. — Ali, eu quero ficar aqui para sempre!

— Ela é assim, animada… não está sob o efeito de nenhuma droga, juro. Disse Jones, colocando as bagagens no chão.

— Não se preocupe, é bom ter alguém tão alegre assim por perto. Ficar aqui sozinha é um pouco… solitário. Explicou Sarah, olhando ao redor. — Mas, fiquem livres para se acomodar, me encontrem daqui à meia hora nas escadarias para a nossa tour.

A mulher saiu do quarto. Alice caminhou até os armários antigos e começou a pôr seus pertences lá dentro. Enquanto fazia isso, pensava em explicar à mãe o comentário que havia feito mais cedo. Pensava numa forma de dizer isso, mas nada lhe vinha em mente.

— Josh não para de olhar para você. Falou Eleanor, despertando a garota de seus pensamentos. A ruiva rodopiava encantada pelo quarto, enrolando-se nos tecidos dos dorsais das camas.

— O quê?! Exclamou Alice, voltando-se para a amiga. — O Prescott?

— Sim,… ele mesmo. Respondeu Eleanor, sentando-se no batente da janela.

— Provavelmente é impressão sua. Josh não olha para ninguém a não ser para o celular dele, não faz sentido. Contra-argumentou a outra, encostando-se nas paredes de pedras.

— Todas às vezes que a Chrystal fala algo contra você, ele olha para ti, e depois para ela, fuzilando-a com o olhar. Justificou Williamson, olhando para o sol que começava a se pôr atrás dos montes no horizonte.

—  Bom, eu continuo achando que seja uma impressão sua. Disse para a amiga. — Agora eu vou me trocar e acho que você deveria fazer o mesmo. Lá fora está congelante, mas aqui dentro é quente…

— Bom, impressão ou não, eu acho melhor o Luke não perceber isso. Ou a nossa excursão pode terminar em confusão.

As duas riram e foram se trocar. A excursão começava em breve.

   Durante toda aquela hora, a turma composta por (Alice, Eleanor, Luke, Liv, Claire, Austin, Chrystal, Sean, Danna, e Josh) foi guiada por Sarah, juntamente do diretor Prescott, pelo imenso castelo. Eles visitaram toda aquela imensidão atemporal, os cômodos que a anos não eram visitados, tocaram em livros e manuscritos a tempos não abertos. Caminharam pelo grande salão com o seu teto e piso de mármore, onde há séculos, príncipes e princesas, reis e rainhas dançaram em festas. Visitaram cada canto explorável do Ajungeți în Munții Carpați, que expressava a áurea mágica do local, só vista por eles em livros e fotos na internet.

Mas, ao descerem pelas escadas de pedregulho, com musgo descendo por suas laterais, entraram em um canto obscuro do castelo. Nas paredes, as tochas estavam apagadas, com teias de aranha. Sarah, que desde o começo da tour pelo local explicava cada local e seu significado, entregou lanternas para o grupo à medida que estes desciam as escadarias.

— Para onde estamos indo? Perguntou Claire, para Eleanor, que deu de ombros sem saber a resposta.

    Após mais alguns lances de escada, eles chegaram a um andar escuro, onde a única iluminação provinha das lanternas. Ao olharem ao redor, depararam-se com uma sala cavernosa e escura se revelava. Um espaço cavernoso e úmido, com tetos baixos e uma atmosfera pesada, onde fileiras de estruturas rudimentares de descanso, agora vazias, eram testemunhas mudas de um tempo distante. O ambiente era permeado por um ar de abandono e silêncio, as sombras dançavam timidamente pelas paredes frias e desgastadas. Algumas marcas e indícios do passado permaneciam, vestígios de uma dor esquecida e histórias antigas que sussurravam sobre tempos de sofrimento e isolamento. Pelos cantos, vestígios de umidade e deterioração se faziam presentes, criando uma atmosfera de desolação e esquecimento. Era ali, nas profundezas esquecidas deste cárcere subterrâneo, que as vítimas da Peste Negra enfrentavam o desconhecido, aprisionadas nas garras do isolamento e da incerteza. O lugar não guardava mais os vestígios físicos do horror vivido, apenas o eco de um passado assombrado pela dor e pela insondável escuridão do tempo.

— Na época da peste-negra, a Romênia foi extremamente afetada pela doença. Na época, aqui consistia no reino de Moldávia, e mais específico, no feudo de Moldau. Sendo um dos maiores feudos, foi uma região extremamente afetada pela peste. O nobre, Radu Ionescu, responsável pelo feudo, foi convencido a estabelecer aqui uma espécie de local para o isolamento de doentes. Os médicos vinham, tentavam o melhor, mas tinham poucos resultados. Muitos morreram, médicos e doentes. Então, depois que o último paciente morreu e a peste dissipou-se, Radu ordenou que essa ala fosse fechada para sempre. Desde então, há mitos de que o castelo é assombrado. Que os espíritos rondam por aqui durante a noite, e que é possível ouvir seus lamentos e choros. Mas, não passam de histórias…

Há séculos ninguém entra aqui.

Um silêncio irrompeu  no ambiente escuro e macabro. Os jovens completavam o local, mas não com admiração, mas com um certo horror em seus olhos.

— Srta. Jones… Eu tenho uma pergunta. Falou Austin, com a voz trêmula. — Corremos o risco de ser contaminados?

A mulher deu uma risada, o diretor Prescott (que também estava tenso) riu aliviado.

— Claro que não. O local é seguro agora. Mas, como eu disse no começo, não podem vir aqui desacompanhados. E acreditem, não há nada aqui que queiram ver, há partes mais interessantes para serem vistas.

O grupo então assentiu em conjunto e voltaram a subir as escadarias. Alice, que ficara por último, ao pôr o pé no degrau, ouviu um barulho nos fundos daquela sala escura. Ela virou sua lanterna para o local do ruído, mas nada viu a não ser o fundo do recinto abandonado. Os outros já se encontravam a alguns degraus acima. Jones continuou encarando os fundos do espaço, algo ali — nos fundos da escuridão — fazia com que ela tivesse a sensação de que não estava sozinha ali.

Sentiu o arrepio percorrer a coluna até a nuca. Ela paralisou. Havia uma sensação. Um cheiro. Algo no ar. Uma podridão que anunciava que algo não estava certo ali. Porém, ela foi desperta de seus pensamentos quando Sarah apareceu no patamar das escadas (o resto do bando já alcançará a saída do calabouço)

— Alice? Está tudo bem?

—  Ahn… Sim, claro!

—  Você não vem? O Banquete será servido às 22 horas. Acho que você vai querer se arrumar antes disso.

A garota assentiu e subiu os degraus que faltavam, ainda sentindo algo errado ali.