Algumas semana havia se passado desde que o caos tomara conta do mundo de Octávio. Durante esse período, ele não teve nenhum vislumbre de outras pessoas. Nenhuma notícia, nenhum sinal de vida. Ele começava a acreditar que todos estavam mortos ou, quem sabe, haviam sido levados pelo misterioso "anjo" para o outro lado daquela espiral enigmática.
Se perguntassem a Octávio se ele se arrependia de não ter seguido os outros para a espiral, ele provavelmente hesitaria antes de responder. Mas ainda, diria que não, não se arrependia de sua escolha. Afinal, a ideia daquele misterioso "anjo" sempre lhe causava calafrios. Mesmo diante de toda a solidão e os perigos que agora enfrentava, a alternativa parecia muito mais sinistra e incerta. Algo sobre aquele "anjo" e o outro lado da espiral o deixava com uma sensação profunda de mal-estar, como se tivesse escapado de algo muito pior.
Mas isso agora é coisa do passado, algo que não pode ser mudado. Octávio tem outras prioridades com as quais se preocupar, e, falando nelas, uma delas estava a caminho.
[Goblin]
[Nível: 1]
[Status: Raiva/Hostil]
Essas criaturinhas, do tamanho de crianças, não paravam de assediá-lo, sempre surgindo onde quer que ele fosse. Já fazia mais de duas semanas que os goblins o atacavam incessantemente. Antes, quando ele não tinha um abrigo fixo, Octávio enfrentava lutas constantes apenas para sobreviver. Foram dias de exaustão, onde cada encontro com esses monstros se tornava uma batalha pela vida.
Agora, porém, as coisas haviam mudado. Depois de tantas lutas e desafios, ele finalmente encontrara um local para se abrigar. Irônico, ele pensou, que as pessoas costumam brincar sobre delegacias serem os lugares mais seguros do mundo. E agora, ali estava ele, protegido entre as paredes de uma, com as grades servindo de escudo contra as ameaças lá fora.
"Quem diria... eles estavam certos", pensou, enquanto escutava o som de goblins do lado de fora, sem conseguir atravessar as portas de metal da Delegacia. Atrás das grades, ele finalmente podia respirar um pouco mais aliviado, sabendo que, pelo menos por enquanto, estava seguro da perseguição implacável dessas criaturas.
Octávio sabia que não podia deixar o goblin ali por muito tempo. Os gritos e barulhos incessantes da criatura poderiam facilmente atrair outros goblins ou, pior ainda, algo muito mais perigoso. Seu instinto de sobrevivência lhe dizia que a melhor opção era lidar rapidamente com o problema antes que a situação saísse do controle.
Respirando fundo, ele saiu da delegacia com os punhos cerrados, pronto para enfrentar a criatura. Não era o ideal, mas naquele momento, era o que tinha. Ele havia vasculhado a delegacia em busca de armas úteis, mas tudo o que encontrou foram armas de fogo — e, na situação atual, disparar um tiro seria como gritar para todos os monstros da cidade sua localização. O barulho atrairia perigos muito maiores do que ele poderia enfrentar.
Enquanto se aproximava do goblin, sentiu o peso da decisão em seus ombros. Não tinha escolha. Era ele ou a criatura. Mantendo o silêncio e se movendo de maneira calculada, Octávio se preparava para eliminar o goblin o mais rápido e discretamente possível.
O goblin, correu rapidamente em direção a Octávio, balançando suas garras afiadas, tentando cortá-lo. O ataque era impetuoso, mas previsível. Octávio, que já havia enfrentado esses seres inúmeras vezes nas últimas semanas, sabia exatamente o que esperar. Ele podia ler os movimentos da criatura antes mesmo que eles acontecessem.
Com uma precisão calculada, Octávio esquivou-se com facilidade, desviando-se para o lado no último segundo, evitando as garras afiadas que passaram raspando pelo ar. Em um movimento fluido, ele aproveitou a brecha e desferiu um contra-ataque. Seu punho direito se fechou, e, com toda a força que conseguia reunir, ele acertou o goblin diretamente no rosto. O impacto foi forte, fazendo a criatura recuar cambaleando.
O grito agudo do goblin reverberava pelas paredes, enquanto ele tropeçava, atordoado pelo soco de Octávio. Aproveitando a brecha, Octávio se preparou para desferir mais um golpe, mas, antes que pudesse atingir o goblin novamente, sentiu uma presença atrás dele.
De repente, outro goblin surgiu das sombras, desferindo cortes rápidos e ferozes com suas garras. Pegando Octávio de surpresa, as garras afiadas rasgaram suas costas, abrindo uma ferida dolorosa. O choque do ataque o fez dar um passo vacilante para frente, seu corpo se enrijecendo de dor.
Reagindo rapidamente, mesmo com o latejar em suas costas, Octávio girou e se afastou dos dois goblins, evitando um ataque coordenado. Seu coração disparava, e a respiração acelerada denunciava a urgência da situação. Ele já sabia que lutar contra dois goblins ao mesmo tempo não seria fácil, ainda mais sem armas adequadas. A ferida queimava, mas ele não tinha tempo para pensar nisso agora — a prioridade como sempre, era sobreviver.
Octávio sentia a dor em suas costas queimando, mas apertou os dentes e ignorou o incômodo, canalizando sua raiva e sua força no próximo ataque. Correndo em direção ao goblin que havia enfrentado anteriormente, ele concentrou toda a sua força em um golpe pesado, desferindo seu punho contra a criatura. O goblin, sem ter tempo para reagir, foi atingido em cheio, sendo arremessado violentamente contra a parede. O impacto fez com que sua cabeça batesse com força, deixando-o inconsciente no chão.
Octávio, sem dar espaço para ser atacado novamente pelas costas, imediatamente se virou e lançou uma investida contra o segundo goblin, que ainda permanecia de pé. A colisão foi brutal, levantando o goblin do chão e arremessando-o pelo ar. O grito de dor da criatura ecoou enquanto caía, o som agudo ressoando pela rua deserta. A dor era visível nos olhos da criatura enquanto despencava no chão. Mas Octávio também sentiu o impacto reverberar por seu próprio corpo, a colisão forçando seus músculos e agravando sua ferida.
Sem hesitar, mesmo com a dor se espalhando por suas costas e braços, Octávio se aproximou rapidamente do goblin caído. A criatura o encarava, os olhos grandes e furiosos refletindo sua figura enquanto ele erguia o punho cerrado. O momento de hesitação veio, mas foi logo superado pela necessidade de sobreviver.
O golpe desferido foi brutal. Sangue e dentes se espalharam pelo chão, os gritos da criatura cessando abruptamente após um som de estalo horrível. Octávio, tremendo, se levantou. Seus olhos encararam o punho ensanguentado e, depois, o corpo do goblin, agora imóvel no chão. A imagem da criatura em um estado tão deplorável era perturbadora. Uma sensação de nojo crescia dentro dele, revirando seu estômago. Lágrimas começaram a se acumular em seus olhos, a respiração ficando pesada e irregular.
Ele não conseguia entender totalmente o que estava sentindo. Mas o que estava claro em sua mente era o fato de que, pela primeira vez em sua vida, ele havia matado — tirado a vida de algo que parecia tão humano. A culpa o consumia, a ideia de ter se tornado um assassino de alguma forma mexia com ele de maneiras que ele não estava preparado para lidar.
Mas, antes que pudesse afundar mais em sua culpa, um som o trouxe de volta à realidade. O primeiro goblin, aquele que ele havia arremessado contra a parede, estava se levantando, seus olhos fervendo de ódio. Octávio olhou nos olhos da criatura, depois olhou para suas próprias mãos, ainda tremendo. Com uma determinação renovada para sobreviver, ele cerrou os punhos novamente, decidido a enfrentar o que viesse a seguir.
Não havia tempo para remorso — não se ele quisesse continuar vivo.
....
Octávio, ainda ofegante pela luta, inspecionou os hematomas e cortes espalhados por seu corpo. Felizmente, as feridas não eram profundas, nada que não pudesse ser tratado com as poucas ataduras e band aids que ele tinha. Apesar de seu cansaço, o alívio momentâneo veio quando ele percebeu que poderia cuidar de si mesmo, sem a necessidade de procurar algo mais sofisticado.
Olhando para os corpos inertes dos goblins em frente à porta da delegacia, ele hesitou. Sabia que precisava se livrar deles, mas não poderia deixá-los à vista, atraindo a atenção de criaturas piores. Os coiotes velozes eram sempre uma ameaça presente; rápidos e astutos, caçavam em grupos, e uma trilha de corpos seria um convite perfeito para que eles aparecessem. Com esse pensamento, ele os arrastou para dentro da delegacia, empilhando-os em um velho armário sem ventilação, selando o odor o melhor que podia.
Depois de lidar com os corpos, Octávio se reclinou contra a parede e começou a enfaixar suas feridas. Seus pensamentos estavam dispersos entre o alívio por ter sobrevivido e a crescente exaustão. O som abafado da cidade, agora quieta demais, o fazia sentir uma inquietação nas entranhas, mas ele se forçou a concentrar na tarefa de se curar.
Enquanto Octávio se ocupava dentro da delegacia, do lado de fora, a névoa vermelha envolvia cada canto da cidade. A atmosfera opressiva e sombria se tornava ainda mais intensa à medida que seres humanoides, de várias raças e formas, emergiam das sombras e das frestas entre os edifícios. Eles não mostravam sinais de hostilidade ou destruição.
Em vez disso, carregavam consigo bolsas e sacolas cheias de itens estranhos, objetos exóticos e artefatos poderosos, prontos para negociar. Pareciam mais mercadores do que guerreiros, e seus olhos brilhavam com a expectativa de fazer negócios. Eles se moviam pelas ruas da cidade com calma, abordando qualquer criatura ou ser vivo que encontrassem, oferecendo produtos únicos para aqueles que tivessem coragem e desejo de comprar.