Theodore não comparecera na aula. Fora o suficiente para que um certo alfa, levantador do time de vôlei, ficasse preocupado. Algo lhe dizia que as coisas não estavam bem. Seus instintos pediam desesperadamente para que procurasse o seu ômega, pois precisavam estar perto um do outro.
Mas não poderia simplesmente se levantar da carteira e abandonar a aula para ir atrás de Theodore. Precisava confiar nele.
Fora difícil se concentrar no treino. Até mesmo Milles notara a sua preocupação, o questionando sobre o que poderia estar acontecendo. Limitou-se em dizer que sua intuição o incomodava. Até mesmo Nicolas escutara suas palavras sem retrucar como costumava fazer. Seu silêncio fora considerado mais uma bandeira para o desesperado alfa.
Chegara um momento que os exercícios de Gabriel ficaram mais fortes e agressivos. Como se estivesse com raiva de si mesmo por ficar frustrado. Controlar a si mesmo era difícil, só imaginando que ter o ômega do seu lado poderia acalmá-lo. Sentir seu calor e seu cheiro.
— Vá pro vestiário. — Dizia Nicolas para Milles e Gabriel, enquanto os dois descansavam estatelados no chão.
— Por quê?
— Já falei com o treinador, vou te levar pra casa do Theo. — Estendendo a mão para os dois rapazes se levantarem, ajudou-os mesmo que tivessem surpresos com sua postura. — Também estou preocupado, já que você está uma merda. E de praxe pedir pra ele analisar algumas técnicas que o professor pediu.
— Mas eu posso ir sozinho...
— Theo sempre me ajuda, então eu vou fazer o mesmo por ele. Não reclama, vai ter que me aturar. E se reclamar chuto seu traseiro até você virar do avesso.
Gabriel soltara um riso baixo. Não teria como contra argumentar um baixinho daqueles que estava preocupado também. E assim os três rapazes foram para o vestiário tomar uma ducha rápida, vestirem o uniforme e pegarem suas mochilas para deixarem a escola.
No percurso o alfa até se acalmara um pouco com as discussões corriqueiras de Milles e Nicolas. Impossível não rir com a química deles, mesmo trocando xingamentos e quase trocando tapas eles ficavam perto um do outro. Será que algum dia eles iriam andar de mãos dadas? Gabriel queria estar vivo pra ver isso acontecer.
— Pra quê comprar bolo? É sério, desse jeito a gente vai chegar tarde.
— Theo gosta de doces, então eu quero levar. Anda, passa o dinheiro.
— Quer que eu pague? Baixinho maldito...
— Deixa que eu compro. — Dizia Gabriel entrando logo na padaria.
Comprado um pequeno bolo de chocolate, doce favorito de certo ômega, os três voltaram a caminhar. Sem nenhuma surpresa Nicolas ficara cansado no meio do caminho, precisando ser carregado pelo alfa que o xingava.
Será que Theodore iria rir junto com ele quando visse seus amigos daquele jeito? Então consideraria uma boa ideia ter vindo com eles.
Chegada na casa dos Moss, Nicolas estava prestes a bater na porta quando Pete abrira ela de repente, surpreendendo-se com os três jovens parados. Segurando seu jaleco e sua bolsa, o ruivo abria um sorriso ao reconhecer Nicolas e Gabriel.
— Olá meninos! Vieram visitar o Theo?
— Eaí tio! Tá saindo pra trabalhar?
— Recebi um chamado e preciso atender. Você está bem Nico?
— Ignore ele, é meu escravo pessoal. — Dizia o ômega sobre Milles.
— Escravo o meu rabo. — Virando-se para o médico beta, Milles abria um sorriso carismático — Sou Milles, amigo do Theodore. Viemos escoltar o bonitão ali, já que ele ficou todo amargurado o dia inteiro.
— É mesmo? — Pete virou-se surpreso para Gabriel. — Parece pálido, comeu alguma coisa, Gabriel?
— Ahn..
— Merda nenhuma tio, tá com essa cara feia o dia todo dizendo que precisava ver Theo por sentir alguma coisa estranha.
— É sério, por que eu sou amigo de vocês dois? Alguém me explica?
Pete soltava um riso aliviado, deixando tapinhas no ombro de Gabriel.
— É ótimo que tenham vindo. Vão ajudar o nosso garoto a dar um sorriso. Entrem, peço desculpas por não poder ficar mais tempo. Mas fiquem à vontade.
Saindo às pressas, o médico entrava em seu carro prateado e logo deixava a casa. Os três entreolhavam-se antes de entrar na casa. Nicolas descera das costas de Milles olhando em volta encontrando a Aline na cozinha esticando o pescoço para ver a entrada da casa. Assim que notara Gabriel, ela puxara o guardanapo para secar as mãos e correr até o alfa, segurando suas mãos.
— Ah, Gabriel fico tão feliz em te ver de novo!
— Já era a época que eu bem recebido por aqui — Reclamava Nicolas fazendo careta para Gabriel. — Aliás... Quando se conheceram?
— Você é mal, Nico! Conheci meu genro ontem à noite, coisa que você e o Theo deveriam ter feito à muito tempo.
Nicolas e Milles entreolhavam-se surpresos, espreitando os olhos para Gabriel em grande suspeita.
— Seu genro?
— Pedi o Theo em namoro ontem. — Dizia Gabriel com um sorriso orgulhoso, mas logo desfazendo ao olhar em volta. — Falando nisso, onde ele está?
O sorriso da mulher desaparecera gradualmente. Apontando para cima, ela logo dissera.
— Seria bom você conversar com ele. Não saiu do quarto depois que voltamos do hospital.
— Hospital? — Desesperou-se Gabriel, jogando a mochila no chão antes de sair correndo escada acima.
Deixados para trás, Nicolas e Milles olhavam Gabriel subir as escadas e sumir de vista como um jato. Pegando a câmera fotográfica do bolso e a olhando, o ômega suspirava.
— Lá se foi a minha diversão de registrar aquele cara passando por maus bocados ao conhecer os sogros. Tava contando com isso pra alegrar meu dia. — Erguendo os olhos cansados para a mulher loira, Nicolas cruzava os braços. — O que tá rolando, tia?
Ela se intrometera entre o alfa e o ômega, agarrando seus braços e abrindo um sorriso largo ao puxá-los para a cozinha.
— Que tal um chá? Logo terei de sair um momento pra buscar Lisa. Ah que tal ficarem para jantar? Nosso Theo poderia animar...
No andar superior, Gabriel deixava batidas na porta do quarto de Theodore. Aguardou ouvir alguma resposta, mas não tivera.
— Theo, sou eu, Gabriel. Tudo bem se eu entrar?
Esperou mais um pouco e sem respostas. O que poderia ter acontecido para deixar seu ômega esquisito? Ontem à noite as coisas estavam tão bem, vira ele sorrir tão belamente demonstrando o quão feliz estava.
Girando a maçaneta da porta, surpreendera-se em notar que a porta estava destrancada. Colocando apenas a cabeça para dentro do quarto, notara o ambiente parcialmente escuro devido as cortinas fechadas, conseguindo reconhecer a cabeleira loira ao lado da cama.
Gabriel entrara no quarto fechando a porta atrás de si, caminhando até dar a volta pela cama onde encontrara Theodore sentado ao chão abraçado ao travesseiro com o rosto enterrado nele. Agachando-se na sua frente, não soubera o que dizer.
Quer dizer, era a primeira vez que o via daquela maneira. E o vínculo recém criado entre eles era muito confuso de compreender ainda. Só conseguia entender, ou interpretar, que Theodore não estava bem.
Tocando-lhe o joelho suavemente, percebera que o ômega não lhe daria atenção. Subindo a mão por sua cabeça onde acariciou os fios dourados, o ouvira soluçar.
— Theo, eu estou aqui. Pode me contar o que aconteceu?
O ômega se remexera e então erguera o rosto. Seus olhos estavam inchados e ainda havia lágrimas escorrendo por suas bochechas. Apesar do coração se apertar de pura preocupação, o alfa abrira um sorriso ao deslizar o polegar pelo seu rosto limpando as lágrimas.
Sentando-se ao seu lado, passara o braço por seus ombros e imediatamente Theodore o abraçara apertado soltando o travesseiro. Só pelo aperto que recebia poderia dizer o quanto seu ômega estava sofrendo. Levaria o tempo que fosse para ele se acalmar e contar o ocorrido.
Depois de alguns minutos mergulhados no silêncio, Theodore finalmente sussurrara.
— Estamos arruinados, Gabriel. — Sua voz soara trêmula e baixa, tendo instinto do alfa em apertá-lo em seus braços. — O que devemos fazer?
— Depende do que aconteceu, Theo. Eu preciso entender a situação primeiro.
Tendo novamente aqueles olhos avermelhados e inchados voltados para o alfa, Theodore se arrumara soltando do abraço de Gabriel passando a fitar as suas próprias mãos.
— Ontem, depois que você foi embora, Lisa começou a falar sobre ovos. — Ria Theodore, apesar de ainda chorar. — Tipo, ela me abraçava e dizia que tinha ovos dentro de mim. Estranho não é?
— Bem, ela é uma criança...
— Só que Lisa ficou me farejando e dizendo que eu ia botar um ovo. Minha mãe achou estranho e ficou me cheirando dizendo que meu cheiro mudou. A gente tinha falado sobre isso outro dia, não é?
— Sim, já que o meu também mudou desde o seu cio. Então você contou pra sua mãe sobre isso?
— Eu contei e então a gente conversou. De qualquer forma eles começaram a suspeitar que eu estivesse esperando um filhote. É a única coisa que fazia sentido pra minha irmã ficar sempre com a cara grudada na minha barriga ultimamente e ainda dizer que vou botar um ovo... Ah céus falar isso é tão ridículo, que só consigo rir.
A mera menção fora o suficiente para que Gabriel ficasse surpreso e gelado. Sem tirar os olhos daquele ômega, o alfa segurou suas mãos apertando seus dedos.
— Como assim? Eu lembro muito de ter usado camisinha. Quer dizer... Menos naquela vez no vestiário... Mas...
— Eu disse que a gente tinha se cuidado, mesmo assim eles me levaram pro hospital hoje de manhã pra fazer um exame de sangue. — Enxugando o rosto com o dorso da mão, Theodore mantinha os olhos baixos ao continuar a contar. — Disseram que era de rotina, que por ter um parceiro fixo eu deveria fazer esses exames. Mas a maior suspeita era de que se eu estivesse... Merda, é inacreditável.
Impaciente com o desenrolar da história, Gabriel acariciou o rosto de Theodore o fazendo lhe olhar. Mais lágrimas rolavam por seu rosto quando o ômega logo dissera.
— Deu positivo, Gabriel.
— O quê? O quê deu positivo? — Questionara o alfa aturdido. — Espera... Isso quer dizer que você... E eu...
Theodore concordara com a cabeça, voltando a fechar os olhos e a derramar mais lágrimas. Agora era claro como água a angustia que sentira o dia todo. Seus instintos sabiam muito bem que o ômega estava esperando um filhote...
Um filhote...
Um filho...
Ele... Iria...ser...pai...
Com dezesseis anos.
— Tem certeza desse resultado Theo? Quer dizer... Esses exames podem dar errados. Um falso positivo, não é assim que chamam?
— Pete pensou nisso também e por isso pediu pra um colega me examinar. — Ria Theodore na mais pura incredulidade ao se esticar no chão para pegar um envelope de sua cama e tirar dela um pequeno pedaço de papel onde havia a imagem preto e branco. — Quer dizer, olha o tamanho disso, é pequenininho demais. Mas está lá... Quer dizer, aqui.... Ah sei lá.
Pegando a folha em mãos, Gabriel olhava aquela imagem tão confusa. Se não fosse a caneta vermelha circulando aquela minúscula bolinha branca em meio à escuridão, jamais imaginaria que seria um embrião. Passando as pontas dos dedos pela imagem, um sentimento nascia naquele mesmo momento.
Para aquele adolescente de dezesseis anos, era a notícia mais pavorosa que poderia receber. Muitas coisas passavam em sua cabeça, pensando que sua vida estaria mais difícil por causa daquele mísero pontinho.
Só que existia um instinto alfa berrando na mais pura euforia dentro de si. Um alfa que parecia celebrar de sua vitória. Afinal, conseguira engravidar um ômega. Ainda mais, seu ômega. Sua alma gêmea. Os instintos eram mais fortes, ignorando por completo a razão e a racionalidade, que insistiam em analisar os pontos negativos de aquilo acontecer.
Resultado disso fora um sorriso enigmático de Gabriel ainda fitando aquela imagem.
— Tem noção do que isso vai trazer pra nós? Quer dizer, nem terminamos a escola. E... Eu nem tenho dinheiro, como que vou cuidar de uma criança? Não vou conseguir arranjar um emprego, e nem... Ah, estamos ferrados. Muito ferrado.
— Será que vai ter os seus olhos?
Theodore fitara aquele alfa com surpresa, dando-se conta do sorriso que o alfa entregava. Confuso, o ômega enxugara as lágrimas apressadamente.
— Do que está falando?
— Do bebê, é claro. Espero que ele tenha seus olhos, e suas presinhas. Adoro quando você sorri e as mostra.
— Gabriel!
O alfa finalmente desviara os olhos do papel para mirá-los ao ômega. Do que estavam falando mesmo?
Ah sim...
Theodore estava preocupado com coisas mais sérias e ele ali dando espaço pro seus instintos. Ele tinha razão em ficar desesperado só de imaginar que suas vidas mudariam por completo com a chegada de novo ser humano. Entretanto, precisavam esclarecer um ponto primeiro. Respirando fundo, o alfa então olhara para o ômega.
— O que quer fazer? Quer tirar?
— O quê?
— O bebê, é claro.
Horrorizado Theodore negara com a cabeça, abraçando a própria barriga.
— É uma vida, Gabriel. Não pense besteiras.
— Apenas quero saber o quanto você quer essa criança. — Dissera o alfa segurando o rosto do ômega. — Eu não vou mentir, a ficha ainda não caiu e provavelmente vai demorar para entender o que vai acontecer daqui pra frente. Eu só posso te garantir uma coisa, que jamais irei sair do seu lado. Independente da decisão que tome.
— Você não fica assustado? O que irão pensar de nós? Nossas famílias, irão pensar que somos irresponsáveis. E ainda nem somos adultos, como iremos sobreviver?
— É claro que estou assustado. Não é como se eu quisesse ser pai agora. Além disso, nem contei pro meu pai sobre você, e já prevejo dor de cabeça sobre esse assunto. Mas, agora está feito. Ele já está aqui. — Gabriel repousara a mão sobre a barriga de Theodore. — Só preciso saber da sua resposta. Você quer ter ou não essa criança comigo?
Baixando os olhos para sua barriga e a mão de Gabriel pousada nela, o ômega sentira aquele calor que o deixava confortável. Mordendo os lábios ele voltara a olhar para o namorado, ele balançara a cabeça.
— Eu adoraria, é claro. Mas, não me sinto seguro. Estou com medo, Gabriel.
Abraçando o seu ômega, Gabriel abria um singelo sorriso.
— É a partir do medo que vem a coragem. Vou te proteger, custe o que custar. Iremos dar um jeito de superar qualquer obstáculo. Sempre juntos.
Theodore agarrou-se em Gabriel, tornando a chorar. Dessa vez aliviado. Talvez fosse pelo cheiro do seu alfa, ou pelo vínculo criado que transpassava a tranquilidade que ele precisava sentir... Não importava. Apenas que naquele abraço, os dois sentiam serem capazes de enfrentar todos os obstáculos que o mundo ousasse colocar diante deles.