Ouvindo alguns barulhos estranhos, o alfa erguera a cabeça prestando atenção. Virando-se para a janela, percebia ser barulho de pedras batendo contra o vidro. Arqueando a sobrancelha, Milles levantara da cama indo até a janela afastando as cortinas para observar a rua.
Parado com um punhado de pedras em mãos, Nicolas acenava preguiçosamente.
— Mas o que...
Sendo avistado pelo alfa, Nicolas largara as pedras no chão e fora até o muro da casa a escalando habilmente. Milles arregalava os olhos abrindo a janela olhando pra baixo e verificando se alguém da família estaria na área externa da casa. O muro deles era mediano, mas nunca imaginara que alguém a escalaria. Nem mesmo os ladrões.
E lá estava ele vendo o maldito ômega marrento escalando o muro sem ser visto.
— Que merda esse baixinho está fazendo? — Rosnava Milles abaixando-se procurando Nicolas em meio ao seu jardim.
A casa dos Mckenzie era grande com um jardim bem cuidado por sua mãe. Os arbustos e vasos posicionados no paisagismo sempre foram elogiados pelas visitas, servindo agora para camuflar a presença de um ômega.
Nunca alguém tentara entrar na sua casa. Milles é quem sempre entrava escondido para ficar com suas paqueras, compreendendo por completo a excitação de receber visitas secretas. Apesar de que Nicolas sabia se esconder nas sombras e quando piscava já havia passado a piscina e aproximado da árvore que tinha por perto.
Ficara boquiaberto quando Nicolas escalara sem problema algum aquela árvore alcançando a distância ideal para pisar no telhado e chegar até a janela do quarto do alfa. Imediatamente Milles estendera a mão segurando o braço fino do ômega e puxá-lo para dentro do quarto, fechando a janela e as cortinas assim que Nicolas pisara em seu tapete.
— Missão de infiltração completa com sucesso.
— Tá maluco? O que tá fazendo aqui? — Sussurrava o alfa arregalando os olhos.
— Visitando o um alfa fujão. — Respondia Nicolas sem muito ânimo, tirando a mochila de suas costas e a deixando em um canto do quarto. — Não te vejo faz dias.
— Aí bateu a saudade e resolveu invadir o meu quarto?
— Fique agradecido, é a primeira vez que tenho que escalar pra entrar em algum quarto.
Uma veia saltara na testa de Milles, que espreitava os olhos para o ômega bisbilhoteiro. Quer dizer que já havia entrado no quarto de outras pessoas? Nicolas andava pelo cômodo olhando em volta antes de se sentar na cama e cruzar as pernas fitando o alfa com aqueles olhos cansados e escuros de sempre.
— Então, o que tá rolando?
— Um ômega invadiu meu quarto. O que raios veio fazer aqui?
— A mordida está me incomodando — Dissera Nicolas suspirando cansado. — Eu sinto que você precisa de mim, então eu vim.
Precisar dele? Nem pensara em Nicolas o dia todo. Na verdade, faziam dias que nem lembrara de sua sombra de tão focado que estava em estudar novas técnicas e treiná-las junto com Gabriel. Certamente visitara a casa de Nicolas nos primeiros dias de suspensão, chegando a dormir com ele. No entanto, o ômega logo o expulsara dizendo não ser necessário fazer aquilo todos os dias, então pudera se comprometer com o time.
Esquecia-se por completo a maldita mordida. Nicolas seria sensível a ela, sempre descobrindo seus segredos. Ficando parado na sua frente, Milles coçava a nuca.
— Só estou sobrecarregado com o time, e agora tive uma discussão com meus pais. Não é nada preocupante.
— Entendo. Muito bem, onde vou dormir?
Piscando aturdido o alfa desacreditava que Nicolas aparecera de supetão em seu quarto pra passar a noite.
— Vai dormir aqui? Sem chance!
— Não acho justo que você passe a noite na minha casa, que é um muquifo, e eu não possa fazer o mesmo em uma casa melhor.
— A diferença é que na sua casa só tinha a gente e a sua mãe sabe sobre nós. Aqui não!
— Foda-se, eles não podem fazer nada já que eu te mordi. — Murmurava o ômega retirando os sapatos e os ajeitando ao lado da mochila. — Além disso, você está deplorável e eu não posso perder essa visão.
O sorriso malicioso de Nicolas mostrava o quão monstruoso ele era, lembrava-se Milles. Poderiam estar em uma relação estranha, onde estavam juntos apesar de não se gostarem, mas jamais deveria se esquecer de que Nicolas iria adorar vê-lo detonado. Assim como ele mesmo gostara de ouvi-lo reclamar sobre estar afastado do time.
— Vou te jogar pela janela, to falando sério.
Nicolas fora até Milles o empurrando para o banheiro, sem nenhum problema com o peso do alfa.
— Não se preocupe, o seu ômega veio te fazer companhia pela noite. Irei preparar uma boa música de ninar pra você, grandalhão.
— Vou ter pesadelos, isso sim.
— De mim você não escapa. Anda logo.
Para a descrença de Milles, ele não seria capaz de fugir do ômega. Tomara o seu banho e vestira a calça de moletom sem se preocupar com camisa, e quando saíra Nicolas já havia feito amizade com seu cobertor se enrolado nele como um filhote de gato.
Nem se surpreendera com aquela visão, das noites que passara na casa de Nicolas aprendera sobre ele ser preguiçoso demais e sempre buscando lugares quentes. Cobertas e travesseiros o acompanhariam até no banheiro, se fosse possível.
Sentando-se na cama encarando desconfiado aqueles olhos escuros, que eram a única parte do corpo de Nicolas não coberta, Milles se ajeitava confortavelmente. Finalmente parando quieto pode ver Nicolas engatinhar por entre suas pernas trazendo as cobertas junto consigo, sentando-se enquanto o encarava.
— Não dormiu, tá com fome e seu alfa implora pelo seu ômega.
— A mordida diz tudo isso?
— Se fosse você a me morder, saberia o quão insuportável são os seus instintos passando informações desnecessárias sobre a outra pessoa. — Murmurava Nicolas passando a ponta do indicador pela mordida exposta no ombro direito do alfa. — Quando você fica longe, só consigo ter sensações estranhas de que está incomodado. Mas hoje quase bati minha cabeça na parede de tanto que doía.
— Me estressei, normal.
— Desembucha estrupício, o que tá rolando?
A que ponto da vida havia chego para precisar desabafar com Nicolas? Ou então de tê-lo sentado no meio de suas pernas, dentro do seu quarto, exalando um cheiro para acalmá-lo propositalmente? O fundo do poço era daquele jeito? Por acaso a Samara do chamado também se deparava com situação insuportáveis como aquelas?
— O time está uma bosta, é só isso. — Suspirava o alfa depois de refletir sobre contar ou não a verdade para Nicolas. E para seu espanto, percebia o quão cansado estava se sentindo só de libertar aquelas poucas palavras. — Não sirvo pra ser capitão.
— Descobriu isso só agora? — Sorria Nicolas, deitando-se sobre Milles sem deixar de olhá-lo.
— Joga na minha cara. Não sirvo mesmo. Ninguém me escuta, estão pouco se importando por estarmos na final das eliminatórias. Querem sair pra festejar sendo que não conseguem jogar em sincronia com os reservas.
— Porque iriam escutar alguém que não leva a si mesmo à sério? Onde está o seu brilho? Por acaso ele se apagou só por eu não estar lá?
Milles revirara os olhos impacientemente, ainda ouvindo o ômega rir deliciosamente da sua cara. Nicolas não o confortaria, nem adiantava esperar algo dele. Ainda assim... Ainda assim se sentia bem.
— Não fique me sacaneando seu metido. Com ou sem você eu ficaria pressionado de qualquer jeito.
— Por que você foi colocado na posição de capitão, Milles?
— Porque você foi suspenso, isso é óbvio.
Nicolas abria um sorriso ladino, apontando o indicador para o alfa.
— É porque só existe uma pessoa que é melhor que você no vôlei. E sou eu. O máximo de talento que encontramos no nosso time é o Gabriel, o resto é lixo.
— Não precisa falar mal deles...
— Você lembra do primeiro dia das eliminatórias, quando encontrou aquele perdedor do Maicon? — Intercedia o ômega, apoiando o cotovelo em Milles só para apoiar a cabeça independente se doeria no alfa ou não.
— Ele disse alguma coisa sobre você deixar nosso time. Mas tu disse que não e daí? Isso dói, caralho! — Reclamara o alfa empurrando o cotovelo de Nicolas o fazendo deitar a cabeça em seu abdômen.
— Esqueceu o que eu respondi?
— Não devo ter prestado atenção. Por quê?
— Como capitão eu manipulo vocês para serem máquinas dentro da quadra — Dissera Nicolas com tamanha seriedade, que Milles sentira um arrepio em toda sua pele. — Pode usar essas merdas de espírito esportivo ou o caralho que for pra florear a verdade, mas eu entro em quadra pra ganhar.
— Você está fora da quadra por mais alguns dias ainda. E eu não vou manipular a galera, quero colaboração deles.
— Pelo jeito tá conseguindo, né grandalhão? — Ria Nicolas, ganhando um peteleco na testa. — Vou fazer tu enfiar esses dedos em outro lugar, sua peste.
Rindo abafado tentando deixar outro peteleco na testa de Nicolas, o alfa se divertia em vê-lo fugir pra debaixo das cobertas novamente.
— Saia daí, toupeira. Não ia me fazer enfiar os dedos em outro lugar? Cai dentro, então.
Para o horror de Milles, Nicolas o mordera na perna. O alfa segurou Nicolas em meio às cobertas e tentou tirá-lo de seu esconderijo, mas o ômega se emaranhava ainda mais. Pulando na cama, os dois se chutavam, se mordiam e brincavam esquecendo do cansaço de outrora.
Cansados de ficarem pulando de um lado para outro feito crianças, os dois estavam estirados na cama ofegando. Nicolas rolara pelo colchão puxando a coberta, engatinhando até se deitar sobre Milles. O alfa arqueava a sobrancelha assistindo o outro se encaixar em seu corpo e ainda se cobrir.
— Tu é grudento. Aguenta ficar longe de mim, não?
— Por causa de um poste que ficou uns pares de dias sem ir me ver, estou precisando sentir teu cheiro pra ficar bem.
— Precisa?
Nicolas o olhara concordando com a cabeça, sem vergonha alguma. Milles ficara desconcertado com aquela revelação. Se estivesse em seu lugar, não seria capaz de admitir com tanta facilidade. Apesar de que... Bem, era óbvio o quanto se desejavam. A questão era que nunca disseram tão abertamente.
— Já que é assim, então não tem problema... — Murmurava o alfa corando, quando Nicolas puxara seus braços para envolvê-lo.
— Relaxa, Milles. Você é um bom jogador e um bom alfa. Você só perde pra mim.
— Está me elogiando, na real? Ou se vangloriando?
Nicolas segurara o rosto do alfa mantendo uma distância mínima entre eles. Estando tão perto, Milles pudera ver o próprio reflexo naqueles olhos escuros e sonolentos.
— Por acaso você perde pra qualquer um? Se deixa ficar pilhado por um bando de perdedores que são menores que você? É mais fraco do que eu pensava...
— Eu não me deixo ficar pilhado, só estou tentando fazer o melhor pro time.
— Só está querendo a aprovação do time. Não é hora de provar alguma coisa, é hora de comandar. — Abrindo um sorriso ladino, Nicolas apertava os dedos nas bochechas de Milles até que sua boca formasse um biquinho. — Milles Mckenzie, você só tem permissão pra cair de joelhos pra uma única pessoa. E sou eu.
Aquele maldito sabia muito bem cutucar as suas feridas, e ainda rir delas. Era como se Nicolas soubesse que aquilo acenderiam as chamas mais competitivas que havia em si. Um estalo em mente o fizera perceber que talvez aquele fosse o seu jeito de animá-lo e confortá-lo.
Abrindo um sorriso malicioso, Milles segurara as mãos de Nicolas com força e o jogara contra a cama podendo ficar sobre si. Arqueando a sobrancelha, o alfa deixara o seu cheiro escapar fortemente pelo cômodo, tendo o corpo do ômega estremecer abaixo de si.
O sorriso de Nicolas se alargara debilmente.
— Olha só como este pedaço de fezes estava se contendo. Vem com tudo, capitão Mckenzie.