Pode um versátil coração humano bater num corpo de metal? Talvez sim... Afinal, não há corpos humanos que abrigam obtusos e saudáveis corações de pedra?
O carro estabilizou e desceu suavemente ao solo. A psicóloga, Dra. Schanny, ainda sonolenta pela longa viagem, coçou os olhos e desceu no extenso e vazio pátio batido pelo sol frio e impessoal. Um vento gelado e rápido corria pelo ar, o que a fez acertar seu vestido e puxar mais para si a blusa. Por um bom tempo ficou parada com os olhos perdidos no céu azul onde não se via nem mesmo um fiapo de nuvem. Então os desviou e pousou-os no ajuntamento de pessoas que observavam a cena do crime, quase à frente da entrada do shopping.
Deitado no chão identificou uma massa desmanchada e imóvel de um homem. Ao seu lado, em pé, tão imóvel quanto ele, um vistoso e brilhante robô metálico.
Suspirou profundamente e avançou para eles, examinando a cada passo, detidamente, tudo em que seus olhos pousavam. Após se identificar na barreira foi se aproximando lentamente, se dando tempo para absorver toda a cena do crime. Algumas árvores no quente e estéril estacionamento de asfalto, o céu azul que prometia ainda mais calor, já anunciado pela nuvem de vapor ao rés do chão negro, e pessoas, muitas.
Assim que chegou à cena do crime um policial se aproximou e a examinou rapidamente, os olhos rápidos e profissionais. Com um olhar profissional conferiu seus documentos.
- Eu já a esperava, doutora. É uma honra poder contar com seu auxílio. Eu sou o tenente Aruã, e estou ao seu dispor. O responsável pela investigação é o detetive Calver, logo ali – informou, apontando para a van da perícia onde um homem gordo e com os cabelos amarrados num rabo de cavalo conversava com outros detetives.
Avisado pelos outros ele se virou e, levantando a mão direita a cumprimentou, fazendo um gesto que logo iria vê-la.
Yanna o cumprimentou e voltou sua atenção para o tenente que, ao que tudo indicava, a acompanharia.
Yanna o olhou rapidamente. O policial era um sujeito alto e forte, de personalidade quieta e impessoal, um profissional frio e eficiente, como se fosse um robô. Talvez fosse assim por causa do departamento especializado em robôs, cismou. Polícia especializada de Novo Horizonte, divisão de controle de robôs, anotou. Aquele era um departamento muito conceituado, e como tal viu que toda a cena estava preservada, e tudo estava sendo analisado detidamente. Sorriu, pois era muito difícil ver tal cuidado quando se lidavam com cenas de crime onde robôs eram peças do quebra-cabeças. O ser humano tinha muitas reservas para com os robôs, principalmente quando eram de versões com alguma capacidade de sentimentos, como era o caso ali.
- Será um prazer trabalhar com sua equipe, tenente – falou com um meio sorriso, enquanto cumprimentava os outros membros da equipe, que após a observarem, continuaram com seus afazeres.
Sem demora se dirigiu para o corpo estirado e para o robô, à frente do qual estacou. Com gestos rápidos e precisos pressionou o transmissor e enviou os seus dados para o andróide.
- Por que o atacou? - questionou sem qualquer inflexão na voz, agachando-se para examinar o corpo inerte do homem, deitado de bruços no chão negro de faixas brancas de estacionamento.
- Atacado por trás... com muita violência - conferiu. - Seu corpo deve ter saído alguns centímetros do chão até se esborrachar de vez aqui, já sem vida - confirmou observando o corpo com as duas pernas quase esticadas.
Adiantou-se alguns poucos centímetros, ainda agachada, para estudar com mais atenção o corte de impacto na base da nuca, que por pouco não lhe arrancara a cabeça. Pelo canto do olho viu o sangue já escuro, do mesmo sangue que dera vida a um homem, secando ao sol sobre o corpo, sobre o pavimento árido, manchando a arma como uma pintura macabra e feia. O desenho na nuca parecia mais com uma caverna risonha, vermelha, no fundo da qual podia ver ossos estilhaçados. Novamente olhou para os dedos da mão direita do robô, manchada de sangue até quase a palma, onde ainda podia ver alguns fiapos de carne penduradas como um líquen que enegrecia.
> O impacto foi potente demais. Os dedos, comprimidos juntos, ficaram como facas na velocidade e na potência que tomaram.
- Dra. Schanny, eu tentei preservar sua existência, mas não tive outra escolha para proteger mais do que uma unidade. Ele ia disparar a arma – disse o robô, mantendo-se imóvel e teso.
- Alguém mexeu na cena do crime? - perguntou ao policial que, em pé, lhe fazia sombra, tornando o ar um pouco mais frio.
- Não senhora. Ninguém mexeu na cena.
- E quanto ao robô? Não têm receio de que ele os ataque? – perguntou a um policial, que estava bem próximo ao robô.
- Ah, não senhora. Nós o encontramos assim mesmo. Ele estava silencioso até agora - relatou com indiferença. - Seu nível de energia está muito baixo. Não é um risco, nem mesmo potencial. Ele está... hum... quase sem energia. É isso, quase sem energia, em estado quase catatônico, em choque - decidiu-se.
Yanna levantou-se e, devagar, passeou pelas redondezas do corpo, observando curiosa o perímetro. Se o policial estava certo quanto a ninguém ter alterado a cena, e tudo indicava que estava, então onde estaria a arma que o robô alegava ter estado ali naquele pátio, se é que ela existiu de fato?
- Por que o destruiu? – perguntou se dirigindo ao robô. – Você poderia tê-lo dominado. Pelo que vi a força que aplicou foi um pouco exagerada, desnecessária - falou observando de forma distante o corpo do homem idoso no chão.
- As diretivas são claras! Não havia outra alternativa dentro daquele espaço de tempo. Não podia correr o risco de que ele não fosse neutralizado. Eu analisei mal a situação, Dra. Schanny? - perguntou ele.
Schanny olhou para o rosto indiferente do detetive, para os dois grupos onde os policiais cochichavam, como que desconhecendo a sua presença e, até mesmo, a do robô. Todos haviam parado com o que faziam e prestavam atenção à conversa do robô com a psicóloga.
Novamente se aproximou do corpo e agachou-se ao seu lado, examinando com bastante atenção a posição do corpo.
Yanna trouxe sua atenção para o alto, para o robô, e se pegou perguntando porque sentia nele uma mágoa, uma dor. Pela experiência em lidar com os robôs bem sabia que a verdade estava ali, mesmo parecendo absurda e conflitante. Os homens estavam dando almas às máquinas. Penalizada pelo robô que aguardava sua opinião e que se debatia em uma dor justificada, silenciosa e fria, ficou a considerar se ele conseguia definir o que estava sentindo.
- O que sente você? - sussurrou como se falasse consigo mesma.
- Eu? Robôs não sentem, Dra. Schanny.
O tenente a encarou, curioso.
- Eu sei, os robôs não sentem. Mas volto a perguntar: o que você sente? - enfatizou levantando-se e encarando a máquina.
- Eu sou um robô, Dra.!
- Essa é uma verdade! Mas o que você, EM-45, está sentindo?
- Sentir? Eu não consigo definir o "sentir"...
- Sente... uma dor? - arriscou.
O robô fez silêncio, mantendo os frios olhos iluminados fixos, aparentemente imóveis.
> Ter destruído esse homem lhe causou algum dano? - voltou a insistir.
- Acho que sim, Dra. É difícil de explicar, mas identifico... um curto fugaz, furtivo como uma neblina, um jogo de luzes dentro do meu cérebro; um desvio de energia que me causa... confusão.
Um dos detetives agora olhava com estranheza para o robô. Com bastante cuidado deu dois passos para trás, aumentando sua distância do robô.
Schanny observou longamente o robô, tentando se decidir sobre o que ouvia. Já lhe haviam alertado sobre essa nova versão dotada de mecanismo de auto ajuste. Teria sido ele capaz de trilhar novos caminhos? Seria essa a realidade de um robô com sentimentos, e ainda por cima poético? É certo que algo diferente ocorrera. Presenciava isto! Tudo levava a crer que seu cérebro rando-positrônico fizera ligações diferentes, abrindo novas possibilidades, equipando-se de caminhos e... de ligações incríveis. Será que essas ligações o confundiram, fazendo-o enxergar uma ameaça onde ela não existia, uma arma onde ela nunca estivera? Com tristeza percebeu, nos olhos do robô, que ele morria. Tinha certeza de que experimentava dor e que ela e a mágoa o estavam destruindo, irreversivelmente corroendo sua alma de fios e de chips.
- Eu não queria matar - ouviu sua voz entrecortada e titubeante, demonstrando que o fim se aproximava rapidamente. - Eu vi o disparo... - A voz foi gradativamente diminuindo, até que por fim silenciou. O robô estava inutilizado.
Yanna viu os olhos do robô ficarem embaçados, sem luz e sem vida. Baixou a cabeça, abatida.
- Bom dia, doutora!
Yanna se virou, e ficou de frente com o investigador chefe. Ele parecia ser um sujeito jovial e um tanto despreocupado, aparentemente. Mas seus olhos denunciavam uma alma perspicaz, os olhos de um cão perdigueiro.
- Você é o investigador designado? - perguntou virando-se para o homem que a observava, intrigado, sob o sol.
- Sou, Sra Schanny. Meu nome é Zendor Calver.
- Prazer, Sr. Zendor Calver. - E esse miserável me chama de Sra. É demais!!! – Há algo que foi retirado da cena, para perícia?
- Não senhora. Nos orientaram para que a aguardássemos. Apenas isolamos o local e fizemos uma perícia superficial, pelas provas contundentes. A cena está preservada.
- Ótimo, então. Por favor, providencie a guarda de nosso amigo aqui. Siga o procedimento. Ninguém deve tocar, ou mesmo chegar perto dele.
- Claro Sra. Providenciaremos isso. Ele está...
- Fique tranquilo, Sr. Zendor. Ele se foi, definitivamente.
- Eu não estava... hã... preocupado. Eu...
- Providencie também a retirada do corpo e a autópsia, sim?
- Considere feito.
- Certo! Ah, só mais uma coisa. Quero que o robô siga para o laboratório da empresa. Encontre uma sala vazia perto de um local de grande movimentação. Tranque-o lá.
- Está certo...
- Imagens de satélites, câmeras e espectrais do local. Consegue?
- Já está sendo providenciado, doutora. Quanto às imagens do robô eu...
- As dele pode deixar comigo, investigador.
- Então está bem. Tendo o material, lhe será encaminhado.
- Ótimo! Leve-o e isole o local. - orientou.
Sem mais palavras se virou e ia saindo, quando parou, pensativa.
- Tiveram contato com alguma arma, que pudesse ter induzido uma atitude do robô? – perguntou encarando o detetive.
- Não senhora. Não localizamos nenhuma arma.
- Nem mesmo uma arma disfarçada?
- Nem... nem mesmo uma disfarçada – confirmou, olhando-a com estranheza.
- Então está bem. Providencie então o que lhe pedi, sim? – pediu enquanto se virava e se retirava da cena.
Alex Schander, chefe de robótica da Novos Robôs SA, levantou os olhos da pequena tela de cristal e encarou a porta. Contrariado, pressionou forte os lábios e, com um resmungo curto e abafado, bateu o dedo sobre o controle da câmera. Ao ver do outro lado da sua porta aquela a quem logo reconheceu como sendo a Dra Yanna, liberou a porta que se abriu abruptamente, entranhando-se na parede. Um demorado sorriso triste desenhou-se em seu rosto enquanto se levantava.
- Sra. Yanna, que prazer conhecê-la pessoalmente. - cumprimentou estendendo a mão por sobre a mesa para a moça que se aproximara.
- Devo estar com aparência muito acabada. Sra. de novo. Acho que terei que me resignar com isso - cismou sem aparentar contrariedade.
- O prazer também é meu, de conhecê-lo, Senhor Alex.
- Já se inteirou do acontecido, pois não?
- Ele só pode estar brincando comigo - reclamou com seus botões, pois era certo que ele bem sabia que ela já lera todos os relatórios e exames sobre o acontecido, como também que já estudara os ambientes onde tudo ocorrera, e revira as imagens variadas muitas e muitas vezes, em diferentes velocidades.
- Nunca se sabe tudo, senhor. Se assim fosse, o que haveria para descobrir? – se vingou dando o semblante mais meigo que conseguiu.
- Você está mais do que certa, Yanna - concordou fazendo sinal para que se sentasse.
- Preferia que continuasse me chamando por Sra.. Até parece que ele está fazendo força para me irritar. Ah se ele soubesse que não será necessário se esforçar muito... - observou mantendo um sorriso bondoso.
- Então doutora? - continuou Alex. - O que nos diz?
- O que lhe digo? Ele está morto! Desativado, se preferir! - proferiu sentando-se com extrema lentidão.
- O que? Como? - assustou-se desabando na cadeira em frente à Yanna, com a estupefação pregada no rosto subitamente envelhecido.
Yanna sorriu compreensiva.
- Zendor o levou para a sala 12; inativo. Não suportou. Uma pena... Duzentos e trinta quilos de sucata imóvel, em pé, silencioso e sem... vida.
- Zendor? Ah, sim, o detetive...
- Ele mesmo - sorriu compassiva.
- Meu Deus!!! Tanto investimento, tanto tempo e dinheiro... Já sabe o que realmente aconteceu, doutora?
- Meu Deus, digo eu, Dr. Será que não sabem da fragilidade do que constroem? – se perguntou. Respirou fundo, exasperada.
- Ele não aguentou saber que era o responsável por uma morte - declarou com a face fria e impassível.
- Eu senti muito pela morte do meu... amigo - a face ficou pesada, olhos mortiços como que escondendo uma dor.
- Todos sentimos a morte de alguém... Nós vamos continuar investigando o cérebro do robô - desconversou. - Talvez o valor da vida humana o tenha deixado doente, coisa que infelizmente, não ocorre com humanos. Eu acredito que ele tenha visto um homem portar um laser de leque, o que o obrigou a agir.
- Nenhum laser de leque foi encontrado no local, segundo me informaram – observou o cientista. – E, pelo que sei, as imagens também não mostraram nada assim. Só o ataque do robô.
- Bem, isso é questionável. O ângulo das filmagens não foram adequadas, e as imagens do robô... Bem, em nenhum momento ele olhou para uma arma.
- Mas ele falou sobre uma arma. Como pode isso? Ele não viu a arma, é isso?
- Ainda estamos investigando, doutor. O que realmente sabemos é que nenhuma arma foi localizada, e talvez nem tenha existido mesmo.
O cientista ficou em silêncio, examinando cuidadosamente a face da psicóloga.
- Está me dizendo que ele foi induzido a atacar?
- Suposições, Sr. Alex. A investigação ainda está em andamento. Há outras suposições, claro... Em todo o caso, ao se dar conta do que acontecera ele se recriminou, se punindo mil vezes, se assim podemos dizer.
- Entendo... Na verdade eu fui o responsável - lamuriou-se. - Fui eu que pedi que Felix o trouxesse de volta... Eu não vi qualquer perigo...
- Os responsáveis, se existirem, irão surgir, Dr. Alex.
Schanny observou com interesse o chefe Alex e seguiu as linhas do rosto. Linhas extremamente duras e determinadas num rosto jovem. Então prestou mais atenção nos olhos negros como contas. Examinando-os mais profundamente notou um brilho estranho, um lampejo rápido. Ficou um pouco mais alerta. Apesar de aparentar estar abatido e fraco, Yanna podia ver uma grande força.
- Uma disfunção... Uma pena! - cismou balançando a cabeça, infeliz. Num abano mais violento afastou o ar triste e a face fria. Então a face que vira na ficha do cientista surgiu, como se nunca tivesse deixado de estar ali.
> Nas visões que o acometeram ele tinha que fazer uma escolha, como fez, e nada mais. Seu programa... Nós estamos simulando as condições do EM-45 num outro robô, o CT-5... Precisamos descobrir se há um risco nas plantas...
- Um erro de programa, algumas linhas de comando, é isso?
- Claro, doutora. As condutas são comandos apreendidos e...
- Me desculpe, doutor, mas eu vejo as coisas de uma forma mais complexa que simples linhas não ajustadas.
- Como vê então, doutora? – perguntou visivelmente interessado.
- Foi o cérebro, o novo cérebro. Você bem que foi alertado de que isso poderia acontecer, Dr. Alex. Eu vi nos relatórios - repreendeu com mais suavidade.
- Está certo que fui alertado de que isso poderia acontecer. Mas,... - os olhos vagaram céleres pela mesa – o erro, Dra. Schanny, é que houve uma falha de segurança: o EM não podia ter saído para o contato; ele ainda não estava totalmente testado...
- O cérebro dele estava sendo monitorado?
- Não, não estava! Era seu primeiro dia de ativação ininterrupta. Ainda estávamos verificando suas reações...
- Você foi temerário ao deixá-lo sem monitoramento, sem vigilância.
- Sabemos que erramos. Só que as coisas fugiram ao controle - mexeu-se incomodado. - Quem poderia supor que ele teria tal grau de independência para sair em busca da experiência do contato humano? Como poderíamos desconfiar, ainda, que ele veria o Dr. Felix[1], que conhecia tão bem, ou até mesmo qualquer outro, como um criminoso?
- Doutor,... - chamou a atenção enquanto tamborilava pensativa com as pontas dos dedos sobre o tampo da mesa - como pode um protótipo tão valioso e revolucionário como esse simplesmente... ir-se?
Yanna viu o rosto do cientista avermelhar-se de súbito.
- Ah, Dra. Yanna... Eu, eu me sinto mortalmente envergonhado por isso, por mim e por minha equipe - remexeu-se desconfortável na cadeira. - É que, quando as coisas vão ocorrendo com tanta naturalidade, num ambiente como o que temos aqui, informal e familiar, eu diria, e ainda mais considerando que os testes estavam no fim... Bem, é que estava tudo tão bem e... Nós relaxamos... E ele sabia de todos os acessos e senhas de segurança, que acessou nos bancos de dados...
- Está certo... Sabe que isto também irá constar do meu relatório, não é mesmo? - Os olhos de Yanna fincaram-se no homem vexado.
- É claro, é claro que sim - gemeu consternado. - Eu só espero que não,...
- O que constará será tal e qual a verdade se apresenta. Fique tranquilo. Não vou fazer uma exposição fria da falha. O relacionamento e grau de confiança de toda a equipe, e o grau de independência do EM-45 serão também relatados.
- Obrigado, doutora! - respirou profundamente.
- Bem! Quanto aos porquês que tenham levado o robô a agir como agiu, isso ainda levará algum tempo. Há alguns pontos ainda não esclarecidos que estamos tentando levantar - revelou.
- E isto é de sua alçada?
- Acho que você já deveria saber a resposta, não senhor Alex? Em todo o caso, tudo que se relacione com a situação que estudo me diz respeito - suspirou. - Assim, todo o caso está aberto para mim. O Senhor sabe como o governo é cioso e sensível nesta área.
- Sim, claro que sim - recuou. - Alguma suposição do que pode ter acontecido com o robô? Psicologicamente falando, é claro?
- Ao que parece o seu cérebro acabou criando novas associações. É como se estivesse tentando se autodesenvolver.
- Me desculpe, doutora, mas isso é loucura. A senhora está querendo dizer que ele... ele criou sentimentos? Ráá!!! - Seu rosto mostrou toda a incredulidade que o envolveu. - Os sentimentos que possuía fomos nós que inserimos; as ligações que esses cérebros podem fazer, somos nós que programamos. Eu lhe digo que essa não foi uma ligação programada.
- Não entende que não existe meia liberdade, meio sentimento? Esse... protótipo foi apenas o primeiro...
- E o último, se isso for verdade. Queremos máquinas, não pessoas - sentenciou mostrando a testa vincada.
- Sei... Não querem outra liberação dos escravos? - sussurrou Yanna.
- O que foi que disse? - o roboticista aproximou um pouco o tronco para o lado da investigadora.
- Disse que é um desenvolvimento natural - desconversou com uma voz aveludada.
O homem a olhou desconfiado, mas logo desistiu de pensar o que poderia ter sido.
- Nós vamos estudá-lo, esmiuçá-lo. O que aconteceu não poderá acontecer novamente.
- Quanto a isso, pode ter certeza - afirmou a Dra. Schanny enigmaticamente.
- É... Que trapalhada ele causou... Minha nossa! Todas as mensagens de confiabilidade e segurança que veiculamos...
- O que lhe dá essa certeza? Ainda não temos certeza dessa... trapalhada. Sabe como são esses cérebros.
- É, está certa. Me diga, doutora: quando poderemos ter a certeza?
- Hoje ainda. Não falta muito. Nós estamos examinando algumas provas.
- Hum, hum... Tão rápido? Esse não parece ser um caso fácil - estranhou.
Yanna deu um sorriso amargo.
- Sim, aparentemente complicado, mas é provável que no cerne seja realmente muito simples e... transparente.
- Então, se me permite, vou ver o robô - decidiu levantando-se abruptamente.
- Infelizmente não vai ser possível, doutor, não por enquanto - informou polidamente levantando-se também. - O robô está isolado. A minha equipe está, neste exato momento, analisando-o. Ah,... também o CT-5 foi requisitado e isolado.
- O que? - explodiu abobado. - Que absurdo! - resmungou contrariado apoiando fortemente as mãos sobre o tampo da mesa.
- Não, não é! Esse é o procedimento. Os dois, o protótipo e o espelho, estão isolados. Quanto ao resto, vamos ter que aguardar.
- Mas... - balbuciou tentando controlar a cólera - esse não é o procedimento. O CT-5 é imprescindível para que possamos continuar nossos estudos. Além disso ele nada a ver com o que...
- Será apenas um dia, doutor - acalmou com um sorriso gentil.
- Só que vocês irão mexer nele. Os riscos de mexerem nele...
- Por mais que o preocupe, doutor, vocês têm as plantas, se algo vier a acontecer. No entanto, eu lhe garanto que ele não corre nenhum risco.
- Sabe que você me surpreende? – falou afundando-se novamente em sua cadeira.
- É mesmo? E por que lhe causo tantas surpresas?
- Por seu espírito de delegada. Sim, eu li sua ficha. Tem certas coisas que não mudam, não é mesmo?
- Sabe que concordo com o Senhor? Eu também li a sua...
- O que está insinuando? - os olhos espreitaram opacos enquanto se remexia levemente, imponente e frio.
- Nada. Apenas disse que também li sua ficha - sorriu condescendente.
- Se fala do incidente quando eu era professor...
- Quando o senhor montou um programa de computador que quase botou a empresa abaixo? Não, não me referia a esse episódio - com vagar examinou a raiva que se estampava no homem à sua frente. Sentiu, suave e distante, a necessidade de esticar um pouquinho mais a alma dele. - O que eu ia dizer é que sei que é reconhecido como um bom chefe de robótica, e muito capacitado. Por isso, sei que o senhor e sua equipe bem sabiam como seria o programa que montaram. Por isto me surpreendo com essa "bela trapalhada" aprontada pelo robô. Ele é uma máquina, como você bem lembrou. E máquinas seguem programas impostos.
- Eu bem sei... - principiou ele com enfastio.
- Sei que sabe, Doutor Alex Schander, como sei também que sabe que esse programa foi um programa assassino, apesar de não ter sido essa a intenção em sua origem. Eu estou apostando todas as minhas fichas de que alguém adulterou o programa, bem como inseriu uma segunda diretiva ou um pequeno conjunto extra de nanoquadros.
- O que? - espantou-se o cientista impaciente. - Nada, nada pode disparar uma resposta dessas num robô... Haveria um conflito monumental que o inutilizaria de imediato...
- Doutor, Doutor... É uma pena, sabe? - cortou com gestos amigáveis afastando-se da mesa em direção à porta, com a mente cismando sobre o que acabara de ouvir. - Eu gostaria muito de ficar debatendo com o senhor nossas visões diferenciadas. Entretanto, como sabe, estamos na reta final na busca das respostas que viemos descobrirr. Se me der licença, preciso ir.
- Como assim? Você faz insinuações e depois simplesmente...
- Por favor. O que acha de se desarmar? - sorriu dominadora. - Não disse que foi o senhor, lembra?
- Mas é óbvio que...
- E quanto às investigações, pode ficar tranquilo. O Senhor será colocado a par de tudo. Agora, se me der licença...
- Você realmente é muito petulante... - o ódio escorreu pelos cantos da boca enquanto se levantava colérico e desafiador. - Que o tempo corra, então. Até mais, Doutora Yanna. Contamos com a senhora para desvendar toda essa trapalhada do robô - frisou confiante e recomposto. - Um dia...
- Veremos se foi mesmo uma trapalhada, senhor. Até mais.
Ao vê-la sair Alex fechou a porta e a travou. Com a desconfiança rondando nos olhos pressionou o botão para rastreamento de escutas e aparelhos estranhos em sua sala. Tudo estava limpo, conferiu pela luz verde que piscou no tampo da mesa. Relaxou um pouco, forçando a cabeça no encosto da cadeira, cruzando as mãos sobre o colo.
- Vá, estranha doutora. Vá procurar...
Yanna afastou-se lentamente da sala. Nunca soube porque seu nível de acerto era tão grande. Talvez tenha sido por isso que tenha se decidido a abraçar o ramo da psico-robótica. Por isso, por essa "intuição", tinha certeza de que o doutor, tão desconfiado das escutas, como vira seus olhos preocupados procurando, estava mais do que envolvido. Mesmo que imprecisa, tinha a intuição de que iria encontrar as digitais de suas ações no próprio robô.
- Vou encontrar, estranho homem - pensou com os olhos brilhando friamente.
- E então, Dra? – o Dr, Alex cumprimentou com descaso ao vê-la entrar e se encaminhar diretamente para sua bancada no laboratório, no dia que se ia. - Então, conseguiu alguma coisa? - perguntou mantendo a voz displicente e vaga sem tirar a atenção do que fazia. Em movimentos estudados girou a câmera para o centro lógico da cabeça robótica que manipulava. Sem que demonstrasse se incomodar com a presença da investigadora do governo ao seu lado, virou-se para estudar a imagem ampliada no holo.
Yanna desconfiou que ele estava apenas encenando uma alienação, como apostava que ele nem mesmo sabia o que a câmera tinha como alvo dentro da cabeça daquele robô. Se acreditava que a iludia, fingindo estudar de forma tão superficial um cérebro robótico com gestos de gênio, devia julgá-la uma completa idiota. Quase riu ao pensar em sugerir-lhe um diagnóstico para a própria cabeça. No entanto achou mais interessante fazer o jogo e desmoronar o castelo. Sempre gostava de ver a face humana trazendo da alma tudo o que escondia com tanto zelo e medo. Com interesse fixou-se em suas mãos. Elas estavam firmes. Não havia nada ali, ainda.
- Alguma coisa, sim. Acho que desvendamos tudo, meu caro doutor.
- Ora, que bom! - desistindo de sua encenação desligou o computador e voltou-se para a investigadora. - Espero seu relatório sobre a minha mesa. Assim que o tiver, tomarei minhas providências contra essas ameaças que...
- Isso mesmo! Mas não será o senhor quem tomará providências contra essas aberrações maléficas de corações frios. Nós faremos isso!
- Ora, ora... Noto raiva em sua voz? Por quê?
- Porque não gosto de ver um programa ser manipulado para um fim escuso e dúbio.
- Hei, hei... Pelo seu tom você não está querendo tirar a culpa do seu amante de metal e atirá-lo sobre um humano, não é? Você não...
- Você não deveria se arriscar tanto, meu bom Doutor.
- Espera aí... Por que parece estar me atacando? Está me acusando? – gritou, a calma esboroando-se.
Schanny ficou um pouco decepcionada. Julgara-o mais controlado.
- Sim, estou! - enfrentou-o, deliciando-se ao ver que o pânico principiava nos olhos daquele homem.
- Por acaso eu posso saber de que me acusa?
- Humm... Olhando ao redor... Busca uma saída?
> Eu o acuso de manipular, pois foi o sr. que manobrou o programa para torná-lo assassino.
- E posso saber como, por todos os santos, me credita essa genialidade?
- Bem, no meu ponto de vista não foi genialidade, e sim idiotice. No princípio até acreditei que havia sido instalada uma outra diretiva, mas tive que reconsiderar. Uma nano reestruturação desmereceria sua arrogância, e seria extremamente cara e visível. Porém, acabamos descobrindo, e sabe por quê? Porque tudo, meu bom doutor, tudo deixa pistas, deixa rastros...
- Ora, ora... Sua louca... Como acha que eu possa ter conseguido isso?
- Simplesmente intensificando um dos nanoquadros, quase o equiparando com a diretiva. Foi isso que o deixou confuso, tão confuso a ponto de usar um golpe com uma potência tão desproporcional contra a carne. A urgência de seguir as diretivas foi tamanha que ele nem mesmo levou em consideração que ninguém poderia lhe ser páreo. Ele poderia ter dominado aquele assassino simulado em qualquer situação que estivesse.
- Ora, você é louca! Como ousa me acusar de um disparate desses, sua gorda? Em que você se baseia??? - Os braços mexeram-se atabalhoados e nervosos, debatendo-se entre o ódio e o medo de se confessar ao atacá-la.
- Como chefe de robótica - continuou ela impiedosa não lhe dando tempo para se articular, ainda mais depois dos insultos que ele insistia em disparar, - ninguém melhor que você para manipular os nanoquadros e obrigá-lo a tomar uma drástica atitude. E isso inclui até mesmo o procedimento de se autodestruir.
- Meu Deus, meu Deus!!! Mas a senhora é realmente louca!!! - desesperou-se. - Por que eu iria querer matar um colega, o Felix? É disto que me acusa, não é? E por que cargas d'água eu iria destruir um robô experimental como aquele? Você está delirando – acusou.
- Sabe, eu fiquei cismando sobre isso... Antes de se desativar ele sussurrou, quase inaudível: "Eu vi o disparo...".
- Eu li o relatório, e devo confessar que não vi lá nada revelador - falou com uma tranquilidade nervosa. - Não posso acreditar que você se deixou levar por um balbuciar, porque parece que foi somente isso, um balbucio. Isso, minha cara psicóloga de araque, é porque ele já estava em processo de falência... Ele já estava confuso, antes do ataque. Pelo amor de Deus! O que vê de estupendo nisso que ele disse? É óbvio que ele pensou ouvir um disparo. Depois se deu conta de que ferira a diretiva e começou um processo rápido de desintegração neurotrônica.
- Como eu ia dizendo, isso ficou rondando a minha cabeça, sabe? Eu ouvi o disparo, seria adequado, e não eu vi um disparo... Isso me embaralhou um pouco, até você dizer uma frase que me chamou a atenção. Você disse que nada poderia disparar uma resposta daquelas num robô, lembra? Tudo, tudo deixa pistas, Alex - sorriu com a suavidade da vitória.
- Está bem, vamos então por essa sua linha torta: o que acha que usei para disparar uma resposta nele?
- Isso foi fácil, doutor. O que quer que tenha disparado a resposta do robô só podia estar em alguma coisa não presente até um determinado momento, e teria que ser levado à cena pelo próprio Felix. Eu, a princípio, pensei em sons e cheiros, mas acabei me decidindo por um quadro, uma figura... Afinal, o tessaract é formado por quadros, não? Como no Dr. Felix não vi nada, pensei no furgão. Então fiquei sabendo que você, assim que surgira no pátio, entrara rapidamente no veículo, de onde desconfiei que devia ter arrancado alguma coisa. Nos exames que fizemos no carro nós descobrimos que havia um decalque no vidro dianteiro, pequeníssimo, de linhas quase indeléveis, que reconstituímos. Imagens, lembra-se? Na verdade, este aqui... - falou atirando sobre a bancada uma imagem em linhas sugeridas de um homem, em atitude de ataque, portando uma arma.
- Um decalque... - abanou a mão furiosamente sobre a foto, que caiu no chão pelo deslocamento de ar.
- Sim, um simples decalque. Um nanoquadro intensificado.
- Então me explique: por que eu queria o Dr. Felix morto? Héim, você ainda não explicou!!! - gritou tomado de ódio.
- Por que o Dr. Felix o estava chantageando pelo desvio de recursos da área de robótica. O desvio já está provado, tanto quanto...
- Como você ousa? - apontou o dedo colérico. - A senhora está delirando. Vou pedir que seja afastada e...
- Fique calmo, por favor - pediu autoritária. - Eu fiz algumas investigações, e devo parabenizá-lo. Você cronometrou tudo muito perfeitamente através do robô, bem como soube controlá-lo quase à perfeição, levando-o a conduzir de forma perfeita o assassinato para o desfecho que visualizara.
- Você é doida de pedra. É óbvio - gritou quase descontrolado, - é óbvio que seu amor pelos amantes de metal a deixa paranoica, querendo incriminar humanos escravocratas, como me chamou, para tirar as culpas de quem as tem. Suas preferências sexuais... Todo mundo sabe que tem robôs programados...
- Minhas preferências sexuais? Ora, Dr., sabe que foi pego, não sabe?
Alex não soube o que o paralisava. Talvez o intenso ódio pelo sorriso de escárnio daquela feia mulher ou talvez o seu sinal discreto e tranquilo que fez entrar dois homens que se postaram decididos ao seu lado. O ódio lhe queimou a alma como fel. Sabia que seus olhos diziam o que o corroía por dentro.
- Como descobri? - Yanna interrompeu a explosão de cólera do cientista. - O Dr. Felix desconfiava de você, de seu projeto. Por isso ele implantou no EM-45 um dispositivo de memória auxiliar.
- Memória auxiliar. Você, você vai se arrepender por tudo isso. Vou processá-la e sugar sua alma. Sua louca... Você insinua, incrimina levianamente. O robô está desativado, as memórias destruídas... Não vê que, mesmo que fosse verdade que eu estivesse envolvido, sua louca, não sabe que a energia para a memória auxiliar já havia sido interrompida mais de duas horas depois do... do acidente, quando se deram conta dela? Sua demente recalcada e solitária - rosnou o cientista sorrindo com escárnio por sua vez. - Eu vou exigir o seu escalpo, vou...
- Vai ficar quietinho! - debochou. - Sabe que até que é bem interessante??? O tempo de memória acumulativa era de duas horas? Acreditou nisso? Tudo bem! Sendo assim, vejo que você não checou o tipo da memória auxiliar que o Félix estivera manipulando. Não, claro que não. Não precisava se arriscar a tanto, não é mesmo? Afinal, mexer em uma memo auxiliar tão entranhada no robô geraria riscos desnecessários. Então resolveu providenciar pequenos bloqueios no exame para que o tempo decorresse. Só se esqueceu de que o choque traumático do robô causou vales de apagão que diminuíram a exigência dessa memória, estendendo seu tempo para seis horas. Seis horas. - repetiu em voz pausada e tranquila. - Não precisávamos de tanto tempo assim, mas... - deixou a sentença suspensa no ar, vitoriosa.
Ante o silêncio do homem que apenas sabia encará-la confuso, continuou: - Assim, temos o período que nos interessa de forma integral. Temos até uma gravação meio borrada, mas ainda inteligível, do CT-5, onde você aparece recebendo uma ameaça do seu colega. Ainda bem que você também foi incompetente ao tentar apagar a memória do espelho - acusou com um sorriso sarcástico. - Se descuidou por acreditar que não chegaríamos até ele? Você não leu muito bem a minha ficha, não é mesmo? Se tivesse lido teria visto que sempre isolo o espelho, também. E saberia, também, que não desisto, de forma alguma.
> Então, depois disso, as peças foram se ajustando - continuou sob o olhar agora apavorado do cientista. – O Dr. Felix estava fuçando, vamos dizer assim, no CT-5 quando você o apanhou instalando um sistema de vigilância. Então vocês discutiram. Como não podia mexer na memória sem a planta modificada que o Dr. Felix te negou, você bolou um plano terrível e perigoso, salvador no seu entender. Você resolveu modificar o EM-45 para que o matasse, o que criaria o álibi de que tanto necessitava para poder inutilizar o CT-5. O mesmo problema estranho nos dois, não? Dois coelhos com um só golpe. Então, apenas fez com que o robô, através de um quadro programado deixado em algum lugar sem que ele o visse, fosse para algum lugar com pessoas, na busca de contato. Aí, foi só mandar o Felix atrás dele, com o furgão...
- Se isso for verdade, o que muito me choca, isso não prova que fui eu!!! - gritou inseguro.
- O Dr. Felix, meu caro senhor, ainda está em todos esses lugares - falou apontando para os lados, com suavidade. - Não há como escapar - estocou.
- Então você se julga muito esperta, não? Esse foi o mesmo erro cometido pelo Felix... - sussurrou ameaçador.
- Você será condenado em qualquer tribunal, Dr. Alex. O CT-5 é uma prova irrefutável, bem como a memória auxiliar do EM-45.
- Sei disso, sei disso... Está bem! Fiz o que fiz, minha cara psicóloga, mas a aconselharia a examinar a conduta do Dr. Felix.
- Sabemos que ele não era um anjo, que ele o estava chantageando e que ele era responsável por muitas irregularidades. Sabe, eu não gosto de corruptos: eles matam silenciosamente, ao desviarem recursos. No entanto, o que está em julgamento aqui, meu caro doutor, são os seus atos, e de mais ninguém. Vida, a sagrada vida,... lembra?
> Você não deveria ter judiado dos robôs. Eu o perdoaria por qualquer outra coisa, mas não de ter feito o que fez com eles. – sorriu, vendo o cientista ser escoltado para fora da sala.
> Que seja vida criada, que seja vida fabricada, mas essa vida se foi, por ter sido obrigada a destruir uma outra. Criamos uma vida nobre, e a desperdiçamos em nossas armadilhas. Será que ficamos menos dignos, por inserir neles tanta dignidade? Que façam bom uso da melhor parte de nossas almas, e nos protejam de nós mesmos.
Em passos lentos saiu para o dia e para o sol.
O vento frio do inverno ainda continuava ali fora, mas agora sentia um pouco mais de calor no coração. Afinal, os homens estavam construindo vidas, e colocando nelas o que de melhor suas almas podiam ter.
Afinal, parecia haver um futuro.
fim volume 01
[1] O caso Felix consta nos anais como a primeira aparição de um robô sentimental, equipado com o revolucionário cérebro rando-positrônico, ou rantrônico, como passou a ser chamado. Ainda em fase de testes, aparentemente ele tomou uma decisão isolada e rumou para a cidade. Um dos colaboradores da equipe de Alex Schander, o Dr. Felix Nohah, saiu em seu encalço, encontrando-o no estacionamento de um Shopping. Ao ser abordado pelo pesquisador o robô mostrou-se dócil e submisso. Ele o seguia em direção ao furgão, momento em que teria ocorrido uma disfunção que o fez ver o Dr. Felix portando uma arma laser de alto leque de exploração, que tencionava utilizar contra todos que lhe passassem pela frente. O robô, ao perceber o que poderia ocorrer, usou a única arma que possuía no momento para deter os acontecimentos. A força com que os dedos penetraram na base da nuca quase decepou a cabeça homem.