Christian agora esperava fora da tenda do velho erudito, acompanhado por dois lutadores, enquanto William entrava para relatar ao líder sobre o que haviam conversado até então. Após um tempo de espera, William sai novamente da tenda chamando por Christian em um tom profundo:
-Venha criança.
Mais uma vez entrando naquele luxuoso espaço, Christian viu o velho erudito sentado à mesa de madeira, porém, desta vez, o jovem não lia ao canto, mas estava próximo da mesa voltando seus olhos cheios de interesse para o garoto que entrava. Assim que se aproximaram da mesa, William ao seu lado falou:
-Aqui está ele, meu senhor!
O erudito acenou levemente a cabeça, e William se retirou do caminho. Logo o velho falou:
-Aproxime-se, garoto.
Christian aproximou-se calmamente, sem medo em seu coração. O velho então continuou:
-Você parece ter dado respostas bem criativas não é mesmo? Aprendendo com um tigre, um vale no meio da floresta da desolação, o tal tio smoke…
Christian interrompeu dizendo:
-É a verdade, as coisas aconteceram como eu disse, só não entendo o porque vocês parecerem desconhecer o tio smoke, já que foram vocês que o apresentaram a mim! É quase como… se tudo tivesse acontecido, mas ao mesmo tempo não… como se… fosse outra realidade! De forma paralela...
Os eruditos começaram a olhá-lo como um louco, afinal, de sua boca, coisas cada vez mais loucas saíam. O erudito então, em um tom irritado questionou:
-Pare de mentir, criança. O que foi aquele poder que usastes? Onde conseguistes aprender a usar uma luz tão forte?
Em seus olhos, Christian podia ver um toque de ansiedade e ganância, mas o garoto, calmamente respondeu:
-Eu já vos falei, quem fez aquilo não foi eu, foi o tio smoke!
O velho fixando os olhos em Christian falou:
-Tragam ele aqui!
Logo, de fora da tenda, entrou um homem. O mapeador que deu ao tio smoke o mapa das rotas. O erudito ainda fixando os olhos em Christian perguntou ao homem:
-Ontem, um certo tio smoke veio até você com esse garoto para pegar o mapa das rotas?
O homem confuso respondeu:
-Não senhor, ontem, quem trouxe o garoto ontem até mim foi William, e eu dei o mapa em suas mãos! Depois disso voltei para minha posição me preparando para a nossa partida.
Então, rosnando para Christian, o erudito questionou:
-E então?
Christian ainda calmo, mas um pouco confuso respondeu:
-Eu não sei o que está acontecendo, eu realmente fui até lá com o tio smoke. Esse tio também parecia conhecer tio smoke, já que eles falavam de forma tão familiar um com o outro!
O erudito rangendo os dentes continuou:
-Se tu vais continuar mentindo, vamos resolver isso de uma vez por todas.
Olhando para o jovem erudito ao seu lado ele disse:
-Faça!
O jovem erudito respondeu:
-Sim mestre!
E logo começou a entoar:
-Veritatem in manibus meis accepi; et ego de eo plenam notitiam habeo; illic 'nullo modo mentiri me; cum verum sciam. Si verum scio, Etiam Scio mendacium; si mihi mentiantur, scion. Mendacium detector!
Assim que ele falou, uma luz começou a brilhar em seus próprios olhos e envolver seus ouvidos. Então o velho erudito questionou a Christian mais uma vez:
-Agora me conte! Como usastes aquele poder da luz? Eu só vi os canhões criados pelos armeiros eruditos de 4 estrelas conseguirem usar uma luz forte o suficiente para transformar em pó os mortos. E creio que somente um erudito de 3 estrelas ou superior poderia transformar em pó os mortos sem o uso de canhões de luz, quanto mais as bestias! Diga-me, como conseguistes?
Christian mais uma vez, calmamente respondeu:
-Não fui eu quem o fez, foi o tio smoke, eu estou falando a verdade!
O velho virou-se para seu discípulo, mas o mesmo acenou com a cabeça em confirmação, dizendo que Christian falava a verdade. O velho erudito ficou confuso, e ouvindo aquilo, questionou:
-Tudo o que dissestes antes para William era verdade?
Christian acenou com a cabeça em concordância respondendo:
-Sim!
O jovem mais uma vez confirmou que ele falava a verdade. O velho erudito como se sofresse uma grande perda, questionou mais uma vez em frustração:
-Impossivel! Então, onde está este tio smoke?
Christian respondeu:
-Não sei! A última vez ele me disse que iria voltar para onde o tempo não reina e depois disso se transformou em luz e foi para o Céu. Eu senti sua presença mais uma vez quando andava no caminho de vidro. Mas agora não o sinto, porém acredito que ele esteja aqui! Ele disse que mesmo que eu não o visse, ele ainda estaria aqui.
O jovem acenou a cabeça confirmando aquelas loucuras, e o velho, em sua última tentativa questionou:
-Onde está esse vale? Esse tigre, e seus outros amigos que falastes?
Christian mais uma vez respondeu, agora até um pouco entristecido por não saber a resposta:
-Não sei! Eles disseram que estariam me observando…
O velho desistiu já que as respostas do garoto passavam pelo detector e ainda eram umas mais loucas do que as outras. O erudito, sentindo dores de cabeça, rosnou para o garoto:
-Está dispensado! Deixe-nos a sós! William te levará para alguma tenda.
Christian acenou com a cabeça, enquanto William respondeu:
-Sim senhor!
Levando Christian para fora. Assim que saíram, o jovem erudito voltou-se para seu mestre perguntando:
-O que você acha?
O velho voltando-se para ele respondeu:
-Não sei o que achar. A possibilidade é que ele seja louco, ao ponto de acreditar tão cegamente em suas loucuras, que se tornaram verdade para ele!
O jovem respondeu:
-Eu pensei o mesmo…
Mas o velho continuou:
-Porém… há algo com este garoto! Por isso avise a alguns membros do grupo para o vigiarem, até mesmo quando chegarmos a Maschera, devemos descobrir a verdade por trás dele!
Acenando em concordância o jovem respondeu:
-Certo! Mas devo eu também pedir àquelas crianças carregadoras? Creio tê-lo visto tentando protegê-las durante a batalha.
O velho respondeu ponderando:
-É melhor não, se eles já forem próximos, podem acabar revelando nossas intenções. É melhor falarmos com o William antes, já que são seus irmãos, ele pode nos dizer se eles podem fazer essa tarefa ou não.
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Em uma sala escura, Nuntio contava ao ceifador das sombras as coisas que havia feito até então. O adolescente com olhos âmbar com uma risada cheia de zombaria então falou:
-Você está me dizendo, que quando o idiota marcou você, ocultastes tuas intenções por detrás de intenções leais, e o guiastes para um beco sem saída? Somente aquele idiota mesmo pra permitir que um servo, ainda mais um marcado, faça isso consigo.
Então, com um sorriso zombeteiro, o adolescente continuou:
-Deixa eu te contar um segredinho pequeno ratinho, as informações que recebemos com a marca, não são tão vagas quanto pensas, mas isso depende do quão familiarizados com o uso das marca estamos! Nós espalhamos essa informação, para ver se havia algum servo marcado, tolo o suficiente para nos trair. As informações que recebemos não são vagas, mas sim obscuras, porém, com a prática, podemos habituar nossos olhos à escuridão. Sabe, o idiota nunca havia marcado ninguém, por que não queria outros perto de suas coisas, por isso não estava familiarizado com a marca. Quem diria, que isso voltaria como um tiro no próprio pé.
Após uma longa gargalhada, com um sorriso largo e malicioso o rei sanguinário continuou:
-Sabe, mas com tudo, ainda és bem astuto! Tu se darias muito melhor na facção do De Mendax! Além disso, soubesses usar sabiamente as fraquezas de De Avarum, de forma que ele não ousasse se levantar contra ti! Ainda és muito perspicaz por terdes notado que o espião havia implantado em ti um venato! O fato de saberdes que Proditor era um espião na facção a um certo tempo, e não o denunciardes, o jeito que escapastes de toda essa situação, mostrou que sabes usar com muita astúcia as peças que tem em mãos, inclusive as peças inimigas.
Com um sorriso brincalhão ele prosseguiu:
-Um grande estrategista. É extremamente flexível no uso das palavras, mentindo sem mentir, usastes a zombaria no tempo certo para que o idiota não vos questionasse e não viesse a saber a verdade, usastes a chantagem e a ameaça nos tempo certos para faze-lo recuar. Muito bom em dedução, já que no momento em que Proditor, um espião, colocou um venato em suas roupas, tu conseguiu deduzir que uma facção já estava de olho em ti, e se queriam vos rastrear, provavelmente também vos sequestrariam, ou ao menos entrariam em contato contigo para persuadir-lhe e extrair informações.
Então, com um olhar sério e mortal, De Sicarium disse:
-E ainda extremamente vingativo. Deixa eu ver… se Narcisa não tivesse tentado te deixar inconsciente com o moderatoris, ou de alguma outra forma, provavelmente, tu terias resistido, forçando-a a vos deixar inconsciente para te trazer até mim, e desta mesma forma, te vingarias explodindo todos com o ritual. Isso também mostra que tens um coração frio, e não tens problemas em usar outros para os seus propósitos. Agora deixa eu ver se eu consigo adivinhar suas intenções vindo aqui. Tu sabias que quando três noites se passassem, De Avarum iria caçá-lo com todas as suas forças, e de que não estarias seguro, não importa para onde tu fosse. Por isso, escolhestes buscar proteção abaixo de outro rei, em troca das informações que tens em mãos, porém…
Com um olhar ainda mais mortal, jorrando em intenções assassinas, ele terminou:
-Você teve azar quanto a um detalhe!
Nuntio questionou profundamente:
-E qual foi?
De Sicarium respondeu com um sorriso sinistro:
-Eu não sou o mais diplomata de todos os reis! Sabes, tu podes ser realmente, muito astuto, mas tanto quanto és astuto, és perigoso. Eu como assassino, não vou permitir que uma ameaça fique debaixo de minhas asas, afinal, tu podes querer me esfaquear enquanto ali estais. Não que eu vos tema, mas também prefiro lidar com meus inimigos antes que eles tenham força para resistir aos meus ataques. Afinal, é assim que um assassino trabalha!
Nuntio ouvindo aquilo, surpreso, mas com um olhar resoluto, falou:
-Eu preparei também um outro ritual, tu como assassino deves conhecê-lo, afinal, é um ritual bem comum, geralmente são usados pelos assassinos. Os que serviam sob minhas asas tinham todos, domínio sobre este ritual. Mortem Sibi. Este ritual é curto, basta que eu morda minha língua, para oferecer o sangue, e recitar estas duas palavras. Um dos mais curtos rituais que existem, mas muito eficiente para evitar a divulgação de informações confidenciais.
De Sicarium, ouvindo aquilo começou a cair em gargalhadas enquanto dizia:
-Já encontrei muitos como tu que me ameaçaram da mesma forma, mas deixa eu te contar um segredinho. Mesmo que tires tua vida, eu ainda tenho meios para conseguir o que quero, por isso não se preocupe, eu não vou ficar triste se usares o ritual, vá em frente!
Nuntio, ouvindo aquilo, pelo tom do ceifador das sombras, e por sua fama, sabia que não se tratava de um blefe. Agora em sua mão, só havia sobrado uma carta para jogar, ou ele estaria perdido. De Sicarium olhando para ele com um sorriso zombeteiro falou:
-Foi o que eu pensei. Muito bem, saiba que hoje eu te contei dois segredinhos, e eu até poderia te deixar ir embora, sabe? Mas faz parte da natureza do assassino não deixar que seus segredinhos se espalhem. Então eu vou ser obrigado a lidar contigo aqui mesmo!
Assim que ele terminou de falar, De Sicarium dirigiu uma das agulhas de tricô direto para a jugular de Nuntio com intenção de matá-lo. Nuntio agora só tinha uma carta na mão, mas não estava certo se a carta era real ou não, então ele fechou os olhos enquanto se entregava ao seu destino, esperando que aquela carta pudesse salvá-lo.
O rei sanguinário com um sorriso cheio de malícia estava prestes a matá-lo, mas antes que pudesse fazê-lo, parou de repente em seu caminho. Como uma marionete controlada por algo a ficar paralisada. Era algo estranhamente anormal, já que seus movimentos pararam de repente, ao ponto de que, nem se movia para respirar.
Nuntio, percebendo o silêncio que se instalava no local, abriu os olhos, confuso, e viu De Sicarium, olhando para o nada como uma estátua, com a agulha de tricô extremamente próxima de perfurar seu pescoço. Ele não se moveu um centímetro, e permaneceu desta forma anormal, por um longo tempo. Nuntio não sabia o que acontecia, mas deduziu que poderia ter algo a ver com sua incerta carta restante.