Robert estava... Feliz.
Ele conseguia ver Linda todos os fins de semana. No início, ela ia até a casa dele dormir. Mas após algum tempo, ela piorou. O fim inevitável vinha para sua princesa, e Robert sabia que era uma questão de tempo. Todas as semanas, ele a visitava no hospital.
Robert conheceu Willy, o padrasto de Linda. Eles dois se deram bem, apesar de Mary cismar que Robert era perigoso. Apesar de tudo, Robert não odiava Mary. Não odiava Willy. Ele também sabia que não podia se odiar. Não havia culpa em ninguém.
Lá, também conheceu Daniel e Dory, os filhos de Willy. As crianças adoravam quadrinhos, e passavam tempo cuidando de Linda no hospital. Robert até deu alguns presentes para os dois, como agradecimento pelos cuidados.
Sua vida estava... Estagnada. O quê viria depois? Ele se perguntava todos os dias. Ele estava feliz quando ia ver Linda no hospital, apesar de ela precisar de aparelhos para respirar.
Era triste vê-la usando um inalador, enquanto o pôr do sol brilhava na janela acima da cama.
-Oi, papai! -Ela sorriu quando ele entrou em uma das tristes tardes de sua vida.
-Oi, minha princesa! -Robert se sentou na beira da cama, e abraçou ela. Danny e Dory sorriram e cumprimentaram ele. -Olá, campeões!
-E aí!? -Danny era bem animado. -A Linda tá adorando as historinhas de herói que eu conto para ela.
-Sim, papai! Tem muitos heróis! Todos muito legais!
-Você é um bom menino, Daniel. Vai ser um grande herói um dia.
-Que isso. -O garoto riu. -Não levo jeito nisso.
-Ah, você está sendo um herói para mim. Graças a você a Linda está feliz.
Danny sorriu.
-Valeu...
-Papai!
-Oi?
-Olha esse! É meu herói favorito! Ele é muito legal e salva pessoas!
Robert pegou um volume de uma HQ e começou a ler. Os dois se distraíram um pouco, e a tarde passou voando. Ele passou a noite toda com ela.
Enquanto ela dormia, ele a ouviu falar.
-Neve... Linda...
Robert engoliu em seco. Ele se levantou, e começou a chorar. Um médio que estava de plantão passando pelo corredor viu ele ali.
-Olá. Ela... Está bem?
-Sim. -Robert tossiu. -Perdão. Ela está bem.
-Que bom. Sorria, amigo. Ela está bem. Ainda pode ser salva.
-Eu sei. Quem não pode ser salvo sou eu.
Ele tossiu, e se sentou em uma cadeira que estava posta ao lado da cama. Robert não parou de chorar. Ela queria ver a neve... E talvez só pudesse fazer aquilo uma vez na vida.
Robert se recostou na cadeira e ficou ali, existindo e refletindo, a noite toda.
De manhã, Mary chegou ali. Ela o acordou.
-Ei... -Ela o olhou com um olhar de reprovação. -Acorda. Não é hora de dormir. Você não trabalha agora?
Willy e as crianças estavam ali também.
-Não.
-Entendi. Desculpa.
-Mamãe... Cadê o papai? -Linda acordou.
-Estou aqui. -Robert respondeu. -Estou sempre aqui para você, meu amor.
-Papai... Quando eu vou ir embora?
-Não sei, princesa. -Robert segurou o choro.
-Logo, querida. -Mary falou.
Um médico estava ali na sala. Provavelmente entrou enquanto Robert dormia. Ele olhou para Robert com pesar.
-O quadro está piorando. -O médico disse. -Mas você vai vencer isso logo. Você é forte!
-Você é forte! -Willy disse.
O médico abaixou o olhar.
-Ela disse ontem que queria ver a neve um dia. -Dory disse. -Ela vai melhorar até lá, né?
-Sim. -Mary disse. -Ela sempre disse isso. E ela vai ver a neve quando melhorar.
-Não vou. -Linda disse. -Eu vou morrer. E você não vai me levar.
-O quê? -Mary questionou. -Quem foi que disse isso!?
Ela olhou para Robert.
-Não me acuse de uma coisa dessas.
-Robert! É claro que foi você! Tirem ele daqui.
Willy fechou a porta.
-Mary... Pare. Você quer culpar o Robert por coisas que não pode resolver. Por favor, pare.
-O quê!?
-Tio Rob! -Danny disse. -Acorda pra vida!
-O quê? -Robert olhou para o garoto.
-Ela... Ela vai morrer sem ver a neve... Você não pode deixar... VOCÊ É O HERÓI DELA!
-Eu não posso fazer nada... Eu...
-Robert... -Willy disse. -Você pode.
Willy olhou para o médico e para Mary.
-Senhores... -O médico coçou a cabeça. -Não é algo legal de se fazer.
-NÃO! -Mary gritou. -NÃO OUSE!
-Mas se por acaso eu não ver nada... -O médico resmungou.
-NÃO! -Mary berrou. -SOCORRO!
-Linda... -Robert perguntou. -Você quer ir agora ver a neve?
-Papai... -Ela olhou para Mary, que parou de gritar. -A mamãe não vai gostar...
Ela lacrimejou e tossiu freneticamente.
-Por favor... -Mary desabou em lágrimas. -Por favor...
-TIO! -Danny gritou. -VAI! EU SEGURO ELA!
Algumas vozes ecoaram atrás da porta. Alguém tentava abrir. Robert olhou para Linda. E então, para Mary.
-Willy... -Ele disse. -Eu obriguei vocês. Entendeu?
-Não! Se você fizer isso...
-Então serei o único culpado.
-Não há culpa em agir em prol do amor. -O médico disse.
Robert pegou Linda no colo, junto do inalador que ela usava.
Ele pulou a janela do quarto. Robert correu, e Mary foi atrás dele. Robert correu até seu carro no estacionamento. Ele abriu a porta, e colocou Linda no banco de trás.
-Mary... Cuida dela.
Mary entrou junto dele, e ali ela ficou.
Robert de lembrava de ter dado a partida e acelerado enquanto vozes de seguranças ecoavam atrás dele.
Mas era tudo... Tudo como um sonho. O quê estava acontecendo mesmo? Era tudo como uma lembrança distante.
Ele acordou. Estava... Estava em uma cama. Estava em um chalé. Sim, ele levou Linda até lá, para o chalé que ele alugou para passar os últimos momentos de Linda. Três dias antes, ele havia fugido do hospital junto com ela e Mary. Ele as levou até aquele chalé, bem distante. As coisas aconteceram tão rápido...
Ele se levantou. Linda estava tossindo.
-Vamos ver a neve? -Ele perguntou.
-Vamos! -Ela pulava e sorria, animada.
Robert invocou suas mãos, e elas envolveram Linda.
-Precisa ficar bem quentinha. -Ele colocou uma blusa nela, cobriu seu rosto delicado com uma pequena máscara. -Vamos.
Os três saíram do chalé e foram brincar. Fizeram bonecos de neve, fizeram castelinhos, riram e foram uma família. Por apenas algumas horas, apenas. Linda logo começou a tossir. Robert a levou para dentro.
-Obrigada... Papai, mamãe.
Robert sorriu.
-Está feliz?
-Muito. -Ela sorriu e deitou no colo de Robert.
-Querida... -Mary disse. -Quer uma sopa?
-Quero, mamãe.
-Eu vou fazer a melhor sopa para a gente!
Mary sorriu. Ela pegou uma panela que estava guardada no armário, junto de vários utensílios e ingredientes que eles compraram no caminho. Tudo foi planejado para aquele dia. Linda não sobreviveria. E tudo aquilo parecia apenas uma lembrança para Robert. Quem era ele mesmo? Quem eram... Elas?
Quando anoiteceu, os três dormiram juntos. Robert e Mary foram aquecer Linda. Ela amou a sopa. Era sua última refeição. E naquela noite, Linda morreu durante o sono.
De manhã, Mary chorava, inconsolável.
Robert não tinha mais lágrimas. Ele se levantou.
-Mary... -Ele baixou o olhar. -Eu vou chamar a polícia. E... Morrer. Acho que a gente nunca mais vai se ver. Viva bem.
-Espera! Robert! Para com isso!
Ela chorava vendo Robert. Seu rosto se borrou. Robert olhou para sua mão e viu um telefone ali. Aquilo era realidade? Era um sonho? Ou somente uma lembrança?
-Alô? -A voz ecoou do telefone.
-Eu sequestrei minha ex-esposa. Minha filha morreu... elas estão no...
Onde elas estavam? Onde ele estava? Em um sonho que se desfazia?
Depois da ligação, ele abraçou Mary.
-Eu acho que fiz o melhor por ela...
Sua visão ficou turva outra vez.
Ele abriu a porta, uma nevasca estava caindo. Ele andou. E andou. E andou. Mary gritava, desesperada. Mas ele não voltou. Ele andou mais e mais. E então... Ele encontrou algo. Algo frio. Era... O fim?
Ele viu árvores enormes e brancas por causa da neve. Ele viu luzes. Era a polícia? Era a morte? Ele continuou andando. Ninguém alcançaria ele ali.
Robert desabou. Ele viu vozes e viu alguém. Mas sua consciência se dissipou daquela lembrança. Ele se foi daquele sonho macabro. Toda aquela imagem maldita se desfez, e desapareceu, como lágrimas na neve.