Em meio ao deserto de Jahi, um local inóspito e praticamente sem vida, ali vagava uma mulher montada em um bocão de plumagem amarronzada, logo atrás vinha um animal, um lagarto emplumado bípede de cabeça achatada, este estava carregando algumas bugigangas.
— Depois encontramos outra para você, Akar. — A mulher passou a mão na cabeça do lagarto de cabeça achatada.
O lagarto, Akar, emitiu um som um pouco melancólico e confortou-se na mão da mulher, aparentemente sua mestra, a qual pegou um binóculo e observou o horizonte, ali havia uma pequena cidade.
— Chegamos, vocês finalmente vão ter o que comer — disse a mulher enquanto passava a mão nas penas da cabeça do bocão.
O trio formado pela humana e pelos dois lagartos emplumados chega a cidade, a qual fora construída às margens de um oásis, essa cidade era bem pobre, as pessoas viviam humildemente e algumas caravanas estavam descansando ali.
O trio se aproximou de uma estalagem aparentemente bem precária, mas havia um lugar para guardar os lagartos emplumados, era a única na pequena cidade, a mulher amarrou os dois lagartos em um local seguro e adentrou a estalagem e colocou os braços cruzados no balcão.
— Quanto seria uma noite? — perguntou a mulher.
— Está acompanhada? — perguntou o balconista que estava revendo a agenda de estadias.
— Apenas de um bocão e um cabeça-de-chapa-espinhenta — a mulher respondeu.
O balconista se incomodou um pouco, uma mulher desacompanhada de um homem era meio incomum, mas anotou a estadia contando uma pessoa e dois animais de médio porte, cobrando uma quantia barata para uma noite.
O balconista a instruiu a levar os dois animais para a parte traseira da estalagem, lá haviam vários outros animais, quadrúpedes, bípedes, comedores de carne e de folhas.
O cheiro de bosta e mijo dos animais era intenso, um esnobe não conseguiria chegar nem perto dali.
Um velho senhor de pele negra pintada e barba branca cuidava dos animais daquele local, ele andava apenas com uma espécie de bermuda e era corcunda, necessitando de uma bengala, suas costas tinham marcas de garras e mordidas, e uma parte havia um pedaço faltando.
Ele se aproximou meio gaguejante e eufórico.
— Oooh! Oooh! O que te-te-temos aqui, uma bela dama — ele pegou na mão que não segurava as cordas dos animais da mulher — Qua-qual é seu nome, senhorita?
— Apenas me chame de Anqtitte — respondeu a mulher.
— Uh! Uh! É um belo nome! Belo nome! Belíssimo! Assim como esses dinossauros, um bocão e um cabeça-de-chapa-espinhenta — o velho tentou acariciar o bocão, porém, o mesmo demonstrou-se incomodado, rosnando com o canto da boca — Calma, calma. Ei, Senhorita Anqtitte, você sabe que cabeças-de-chapa tem que ser mantidos em casal, não é?
— O outro faleceu, era uma fêmea — disse Anqtitte enquanto guardava algumas coisas nas bolsas da sela do bocão.
— Oooh! Que pena, meus pêsames. — o velho ficou um pouco melancólico com a notícia.
— Vou arranjar outra para ele. — Anqtitte pegou algo enrolado em um pano branco e velho.
— Se-se quiser posso te ajudar a procurar uma fêmea — disse o velho tentando se equilibrar em sua bengala.
— Apenas cuide deles, enquanto estou fora, o bocão se chama Anippe, é uma fêmea, o cabeça-de-chapa se chama Akar, um macho, tome cuidado com Anippe, ela está meio estressada, peixe acalma ela, qualquer coisa.
— Oh! Anippe está naqueles dias, então? — perguntou o velho enquanto aproximava sua mão de Anippe, mas a retirava bem rápido.
— Sabe onde é "A Jóia de Jahi?" — Anqtitte ignorou a pergunta anterior completamente.
— Sei, sei, saia daqui, siga reto e vá para esquerda, é o lugar mais chique daqui! Dizem que alguns esnobes vem pra cá por conta desse lugar, mas nunca entrei lá — disse o velho.
Anqtitte concordou com a cabeça e colocou Akar e Anippe no celeiro do local e seguiu as instruções do velho, enquanto andava pela cidade, reparava que a guerra chegava até nessas regiões afastadas, algumas pessoas demonstravam claramente aspectos de fome, algumas sequer tinham casa.
Ela chegou ao lugar e retirou o seu capuz branco com retoques em azul de tecido, mostrando assim, a sua bela face e pele de cor negra clara, em sua face há pinturas em vermelho e branco, representando de onde vem, também usa dois grandes brincos circulares bege e com detalhes em âmbar, a pedra.
Quando entrou, alguns homens olharam para ela, Anqtitte era muito bela, porém pouco se importava para isso. As mesas desse lugar eram baixas e sentava-se em algumas almofadas, ela se dirigiu até a mesa de um homem que aparentava grande poder aquisitivo, este o qual tinha duas jovens ao seu lado, ao lado oposto do homem, Anqtitte se sentou de pernas cruzadas.
— Trouxe o que pediu. — Anqtitte retirou o objeto enrolado no pano do bolso e colocou na mesa.
— É por isso que sempre confio em você, Kasaika. — Kasaika era o primeiro nome de Anqtitte, Kasaika Anqtitte.
Anqtitte retornou o objeto para si.
— Não lhe darei até receber o meu pagamento — ela cerrava os olhos, ameaçando o homem.
— Você sabe, que eu, Husaam al-Haque, sempre cumpro minha palavra, mas diga-me o que quer, dinheiro, uma noite com uma de minhas jovens, uma moradia — ele dizia jogando os braços para cima — ou você pode se juntar a estas duas… — ele acariciou o queixo de uma das jovens
— Você sabe muito bem que eu poderia simplesmente te matar, não é? — disse Anqtitte, enquanto escondia uma arma apontada para Husaam. — Dá-me o dinheiro logo.
— Certo, deixe-me ver — Husaam retira o pano do objeto, então, ali estava uma joia. — O que acha de hmm…, de quinze mil? — disse Husaam enquanto analisava a joia.
— Foi uma trabalheira para roubar isso, no mínimo 40 mil. — disse Anqtitte, ainda apontando a arma para ele.
— Eu coloco…, 25 mil… — disse Husaam enquanto observa a luz refletida na joia.
— Ainda é muito pouco, 39 mil. — Anqtitte começou a retirar lentamente a trava da arma.
— 35 mil. — Husaam percebeu o olhar ameaçador de Anqtitte.
— 5 mil para você não faz muita diferença… — Anqtitte para de retirar a trava da arma.
— Certo, certo…, como você é minha melhor caçadora, vou te dar um bônus de 10 mil, fique com 50 mil para você, com isso você consegue comprar até mesmo mais um bocão!
— Husaam sabia que Anqtitte tramava algo, ele a temia.
Husaam coloca um saco enorme de moedas sobre a mesa.
— Então…, 10 mil nem faz tanta diferença para você, se você me der 100 mil, talvez eu passe a te ver como uma pessoa, pense, você está em perigo, só tem eu ali para te ajudar, e estamos no meio de uma guerra, quem sabe eu te ajude com esses 100 mil… — disse
Anqtitte enquanto batia suas unhas na mesa.
— Certo, Certo…, Haha! Te dou 80 mil, então… — Husaam começou a ficar nervoso.
— Ainda não, ainda não… — disse Anqtitte, enquanto batia as unhas mais rapidamente sobre a mesa.
— Certo, certo, eu te dou 100 mil, porém, você deverá cumprir o que falou! — disse Husaam estufando o peito.
Husaam tinha um grande saco de moedas atrás de si, ele colocou algumas delas em um saco e as pesou.
— Aqui tem um pouco mais de 100 mil, considere um bônus, Kasaika… — Husaam colocou o saco de moedas com força na mesa.
— Obrigada, Husaam, au revoir! — Anqtitte pegou o saco de moedas e se levantou da mesa.
— O que é isso, Anqtitte?! — Husaam se mostrou irritado.
— Quando se viaja muito, você acaba aprendendo coisas até com os francos! — Francos são um povo ao oeste do continente de Euradia.
Anqtitte sai apontando sua arma, uma pistola, para cima, enquanto abria a porta batendo com o saco de moedas, o estrondo causado assustou a maioria dos clientes, já fora do estabelecimento ela ri um pouco e atira duas vezes para cima.
Após a diversão, ela caminha em direção a estalagem com o saco de moedas preso em sua cintura, chegando na estalagem, a qual também era um restaurante, ela se alimentou e subiu para o quarto que lhe foi dado.